XXIX ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS Eu sou magra: a

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XXIX ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS
Caxambú (MG) – 25 a 29 de outubro de 2005
Eu sou magra: a reconstrução identitária de mulheres que
se submeteram à cirurgia de redução de estômago
Rogério José de Almeida
Mestre em Sociologia (UFG)
Grupo de Trabalho
Corpo, biotecnologia e saúde – GT 03
2
EU SOU MAGRA: A RECONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DE MULHERES QUE SE
SUBMETERAM À CIRURGIA DE REDUÇÃO DE ESTÔMAGO1
Rogério José de Almeida
Mestre em Sociologia (UFG)
Resumo
No mundo contemporâneo, o peso corporal além dos padrões ratificados pela ciência como normais
passa a ser considerado como uma doença crônica. Entretanto, a obesidade severa não se configura
somente como um sério problema de saúde, pois é fato que as pessoas avaliam a própria imagem
corporal em função de normas sociais e culturais de saúde e estética. Com o advento da cirurgia de
redução de estômago, indivíduos outrora obesos severos, num curto período de tempo, passam a ser
enquadrados como fisicamente aceitáveis pela sociedade. A pesquisa para esse trabalho foi realizada a
partir de visitas de campo a um hospital privado da cidade de Goiânia e de entrevistas com mulheres
submetidas à cirurgia de redução de estômago. O objetivo do trabalho foi compreender a identidade
social da mulher com obesidade severa e da mulher não mais obesa severa após a gastroplastia, ou seja,
como se configura o processo de reconstrução identitária dessas mulheres que se submeteram à cirurgia.
Palavras-chave: Identidade social; Mulheres, Preconceito.
Introdução
Certa vez, uma amiga, professora, me contou um fato que ocorreu com ela e que a
deixou muito chateada. Só para situar o leitor, essa minha amiga tem obesidade severa
(IMC>40)2, já passando para super obesidade (IMC>50). Durante um longo período de tempo,
ela fez um tratamento para emagrecer, que envolvia basicamente reeducação alimentar e
aplicação de enzimas. O tratamento deu muito certo e ela emagreceu muito, tanto é que teve que
se submeter a cirurgias plásticas para a retirada de pele, principalmente o avental da barriga e
nas costas. Todos ficaram impressionados (cidade pequena, todo mundo conhece todo mundo,
ainda mais se tratando de uma professora renomada) com o emagrecimento dela 3. Também devo
mencionar que o marido dela mora e trabalha nos Estados Unidos há uns cinco anos.
De modo que, um certo dia, um dia normal de trabalho, uma outra professora muito
impressionada com seu emagrecimento falou: “Nossa Paula, como você está bem! Desse jeito
1
A pesquisa a que se refere este artigo fez parte da minha titulação como Mestre em Sociologia pelo Programa de
Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Goiás (UFG).
2
O Índice de Massa Corpórea pode ser calculado dividindo o peso corporal (Kg) pela altura (cm) ao quadrado. O
IMC normal é entre 20 e 24.
3
É importante destacar que essa amiga perdeu muito peso com o tratamento. Passou de 148 Kg para 83 Kg.
Embora ela tenha emagrecido muito, ainda faltavam cirurgias plásticas da cintura para cima e nos seios. Ela não se
submeteu a essas cirurgias, parou o tratamento e agora engordou novamente. Está hoje com 118 Kg.
3
vou telefonar para o Pedro nos Estados Unidos, para ele voltar o mais rápido possível. Você não
pode ficar bonita e sozinha aqui no Brasil! O Pedro que se cuide”.
Ao me contar esse fato, minha amiga relatou que era freqüente esse tipo de comentário e
disse: “Quando eu era muito gorda, não chegava ninguém para falar que eu estava bonita ou que
era perigoso o Pedro ficar lá nos Estados Unidos e eu aqui no Brasil. Será que quando eu era
muito gorda, eu não era bonita? Será que quando eu era muito gorda, o Pedro não precisava ficar
preocupado, pois ninguém iria me querer?”
Embora a intenção da professora fosse tecer elogios ao corpo que minha amiga
apresentava depois da dieta e do tratamento, ela deixa transparecer um preconceito relativo ao
antigo corpo gordo. Este tipo de preconceito ocorre quase que de forma inconsciente,
permeando todas as interações sociais. Esse relato reflete bem a construção da identidade social
tendo como referência uma estética corporal considerada como a ideal pela sociedade.
Há certos padrões de estética que variam de cultura para cultura. O fato de o obeso
severo destoar muito do que é considerado esteticamente ideal significa que ele possui um
atributo que atrapalha sua aceitação social plena e atrai atitudes de preconceito. Ele é
enquadrado em uma categoria socialmente depreciativa, com estereótipos pré-estabelecidos
culturalmente e é sempre apontado e avaliado na sociedade pelo fato de ser “o gordo”.
O problema da obesidade está crescendo vertiginosamente no mundo ocidental. Para se
ter uma idéia, de acordo com Segatto e Pereira (2003), o programa Fome Zero do governo
brasileiro pretende atingir cerca de 44 milhões de pessoas. Por outro lado, o contingente com
excesso de peso no Brasil já ultrapassa a marca dos 70 milhões4. Ao mesmo tempo em que
cresce a preocupação mundial com o alastramento desse problema de saúde, que já está sendo
considerado como uma epidemia global, cresce também o preconceito para com o indivíduo
obeso, principalmente aquele que possui obesidade severa, pois este é o indivíduo que sofre
mais por se desviar muito do corpo que a nossa sociedade esteticamente valoriza.
Apesar de ser preocupante do ponto de vista médico essa crescente incidência da
obesidade, precisamos nos atentar também para o problema do convívio social de quem possui
esse estigma, que é muito mais antigo do que a preocupação médica atual. Na era da lipofobia,
há uma crescente pressão em favor do corpo magro e saudável (se der, deve ser sarado) advinda
de recomendações científicas para os males da obesidade e da insistente difusão pelos meios de
comunicação de um padrão de estética magro como sendo o bonito e alcançável a todos.
4
Ver artigo, SEGATTO, Cristiane; PEREIRA, Paula. “Obesidade zero”. Revista Época, Rio de Janeiro, n. 275,
ago. 2003. Disponível em: <http://revistaepoca.globo.com/Epoca/0,6993,EPT590194-1653,00.html>. Acesso em:
21 mar. 2004.
4
Para os indivíduos obesos severos emagrecerem, além das tradicionais dietas e
tratamentos com poucos resultados, já existe uma solução para seus problemas que pode ser
definitiva e que está sendo muito procurada atualmente: a cirurgia de redução de estômago ou
gastroplastia. Quais as implicações desse emagrecimento na vida desses indivíduos? Após o
emagrecimento proporcionado pela cirurgia de redução de estômago, o que ocorre com a
identificação social desses indivíduos, quando há a aquisição de um novo corpo que se enquadra
nos padrões de estética das sociedades ocidentais contemporâneas? Ocorreria, talvez, uma
reconstrução da identidade social desses indivíduos?
O trabalho de campo para esse trabalho foi feito no Serviço Integrado de Cirurgia da
Obesidade (SICO) de um hospital privado da cidade de Goiânia, dentre aqueles que realizam a
gastroplastia. Optou-se por entrevistar somente mulheres, das quais foram selecionadas um total
de oito. A maioria das entrevistadas é solteira (total de cinco), três são casadas (com duas no
segundo casamento) e apenas duas possuem filhos. Suas idades variaram de 22 a 47 anos. Todas
têm curso superior e estavam trabalhando na época das entrevistas. Cinco entrevistadas se
declararam católicas, duas evangélicas e apenas uma não tinha uma religião definida.
O objetivo geral desse trabalho remete-nos, portanto, às mulheres que se submeteram à
cirurgia de redução de estômago, tentando identificar, por meio de entrevistas, as conseqüências
sociais e identitárias que esta cirurgia acarretou em suas vidas, ou seja, quais as implicações
sociais decorrentes da cirurgia, no tocante às interações e/ou relações empreendidas por essas
mulheres em seus cotidianos. É objetivo compreender também as implicações da obesidade
severa na vida dessas mulheres. Procura-se analisar o lugar da obesidade severa e a produção de
identidades e suas conseqüências para o convívio em sociedade, para posteriormente identificar
uma eventual reconstrução da identidade social, tendo como referência a aquisição de um novo
corpo pós gastroplastia.
O presente artigo está estruturado em três partes. A primeira tem por objetivo direcionar
a discussão para a problemática relacionada ao corpo e suas manifestações na sociedade
ocidental contemporânea. Na segunda, discute-se o conceito de identidade, mostrando como as
relações que envolvem os corpos são construtoras de identidades sociais. Com base na análise
das entrevistas, passa-se a identificar e discutir as conseqüências sócio-culturais que a obesidade
severa acarretava na vida dessas mulheres antes de se submeterem à gastroplastia. Na terceira,
procura-se analisar e compreender a reconstrução identitária dessas mulheres, mostrando o que
ocorre quando o estigma é corrigido e as conseqüentes alterações de suas identificações sociais.
5
Em Pauta: O Corpo
Um marco no pensamento sociológico acerca das questões que norteiam as reflexões
sobre as relações corporais se deu a partir da célebre obra de Marcel Mauss (1974), na qual trata
das técnicas corporais. Com ela, viu-se que a forma como os corpos são manuseados e
representados varia de sociedade para sociedade, e, mais ainda, de cultura para cultura, pois
numa mesma sociedade podem conviver diferentes culturas. Nesse sentido, pode-se afirmar que
o corpo humano é mais do que um sistema biológico. Cada cultura tem suas próprias maneiras e
atitudes para com o corpo.
Seguindo com essa concepção, segundo Carvalho (2002), o corpo humano é constituído
e representado simbolicamente na sociedade. Nesse caso, o corpo é visto como um portador de
significados sociais, não sendo somente um depositário de processos biológicos e fisiológicos.
Aos atributos anatômicos e também aos fatores biológicos são imputados significados
construídos pela sociedade em que se está inserido, como por exemplo, as diferentes
interpretações para uma “piscadela”, como bem aponta Geertz (1978). Assim, pode-se afirmar
que “o corpo humano é um objeto ao qual a sociedade atribui significados, expectativas e
sensações, ditando-lhe normas, seja em relação à estética, à expressão, à saúde, à higiene e à
sexualidade” (CARVALHO, 2002, p. 27).
Nessa mesma linha de argumentação, Victora (2001) procura mostrar que é importante
compreendermos que nosso corpo é como uma matriz que carrega consigo uma gama de
significados atribuídos na interação que temos com outros indivíduos. Deste modo, é por isso
que sempre se encontrará alguém que, por exemplo, numa festa, gostou da maneira que você
estava vestido, enquanto outras pessoas podem não ter gostado de suas roupas; que concordaram
com determinado comportamento e outras não; pessoas que acharam você um pouco feio por
estar acima do peso, ao mesmo tempo em que outras pessoas te acharão lindo desse jeito.
As diferenças culturais de cada sociedade se expressam também nas maneiras como os
corpos são vistos e apreciados. Por exemplo, de acordo com Helman (1994), por um lado, em
algumas regiões da África Ocidental, os ricos freqüentemente enviavam suas filhas para
“clínicas de engorde”, onde eram alimentadas à base de gorduras e faziam o mínimo de
exercícios físicos para ficarem “rechonchudas” e pálidas, uma forma culturalmente definida que
indica riqueza e fertilidade5. Por outro lado, a cultura ocidental vê a gordura com um sinal de
problema de saúde.
5
Rodrigues (1986) também discorre sobre essa prática cultural que identifica beleza com obesidade, sendo a moça,
à época de sua puberdade, submetida às mais diversas técnicas capazes de fazê-la o quanto mais gorda possível.
6
Depreende-se desse argumento que as diferentes culturas, cada uma a seu modo,
projetam certos padrões e ideais, não só de beleza e estética (corpo magro), mas de
comportamentos (não arrotar em público, desligar o celular no teatro), valores morais (não
roubar), ritos (casamento, batismo) e tabus (incesto), que a grande maioria das pessoas de uma
determinada sociedade procura buscar e seguir. Nessa incessante busca para se enquadrem num
padrão estético definido socialmente como ideal, segundo Rodrigues (1986), os indivíduos
utilizam-se de inúmeros recursos, como dietas variadas, academias, SPAs, remédios, cirurgias
cosméticas e plásticas.
Mas, de onde vem esse padrão de estética cultural das sociedades contemporâneas
ocidentais? Por que na estética atual prevalece como padronização os corpos magros e,
conseqüentemente, uma repulsa aos corpos mais gordos? Há alguns anos, mais especificamente
da Idade Média a Idade Moderna, o ganho de peso e o acúmulo excessivo de gordura ainda eram
vistos e representados socialmente como sinais de saúde e prosperidade pelos nobres europeus
da época. Contudo, não podemos incorrer no equívoco de pensarmos que todas as pessoas, nesta
época, tinham excesso de gordura ou que eram obesas severas e que, por sua vez, eram
idolatradas, como a figura do “Rei Momo”. É importante deixar claro que sempre houve as
pessoas mais magras e também pessoas cujo corpo tinha uma gordura mais proeminente. Nesse
sentido, a diferença se encontra no padrão cultural com o qual, nas diferentes épocas, os povos
encaram essas categorias da estética corporal.
Vincent (1992) observa que, nas cidades italianas da Idade Média, popolo grosso
designava a aristocracia dirigente e popolo magro designava a plebe6. Nesse mesmo sentido,
Fischler (1995) destaca que a distribuição social da gordura, nos países desenvolvidos, mudou
totalmente. No passado, nesses países, o popolo grosso ocupava os extratos superiores, e o
popolo magro, as camadas mais baixas da hierarquia social. Hoje, essa concepção acerca do
corpo mudou: são os pobres que são gordos e os ricos que são magros.
Um retrato dessa época de valorização de padrões de civilidade7 e de uma estética
corporal que não discriminava quem possuía excesso de gordura e não idolatrava quem era
magro pode ser visto também na literatura, mas principalmente nas obras de arte, onde as
mulheres eram retratadas e/ou descritas ressaltando suas rechonchudas e arredondadas formas
físicas. Um exemplo apresentado por Pope Jr., Phillips e Olivardia (2000) é o quadro “Vênus e
Adônis”, pintado pelo italiano Tiziano Vecellia di Gregório. Nesta obra, esse pintor da
renascença mostra Adônis prestes a ir caçar com seus cães e com Afrodite em seus braços. O
6
7
Povo gordo e povo magro.
Ver, Elias (1994).
7
Adônis de Tiziano parece gordo e fora de forma (em se comparando com o modelo estético
contemporâneo ocidental) e Afrodite se destaca por seu excesso de gordura.
A estetização dos padrões de beleza, convergindo para a magreza, iniciou-se no Brasil,
embalado pela experiência européia, quando se começou o processo higienista burguês no
século XIX. Além desse “projeto burguês de sociedade” que foi importado da Europa, outra
influência externa, também européia, foi decisiva para o delineamento de um ideal de beleza
magro no Brasil. Essa influência deve-se aos inúmeros viajantes, principalmente ingleses, que
aqui desembarcavam. De acordo com Stenzel (2002), a partir dos relatos desses viajantes podese perceber de forma bem clara uma redefinição quanto aos valores e padrões vigentes em
direção aos padrões europeus. “Esses viajantes criticavam a corpulência das brasileiras e
ridicularizavam seus costumes tendo como corretos os seus padrões de beleza e de estética, que
já traziam o corpo magro como referência” (STENZEL, 2002, p. 34).
De acordo com Rabelo (1997), com a inserção da mulher nos saraus, bailes e teatros, a
partir da segunda metade do século XIX, onde ela deveria mostrar suas habilidades em
conversar e ser elegante, havia aqueles homens que defendiam a importância da beleza da
mulher, especialmente da magra, condenando a tradicional matrona obesa descrita pelos
viajantes europeus no início daquele século. A moda do espartilho exaltou a figura longilínea da
mulher, desvalorizando a mulher gorda.
Fischler (1995) analisa essa mudança no padrão estético dos corpos, mostrando que, sem
dúvida, a percepção social da gordura mudara. Nosso modelo dominante afastou-se daquele que
reinava no século XV ao XIX e daquele que ainda impera hoje em certas culturas. Nesse
sentido, na perspectiva analítica de Mira (2004), o que houve foi uma poderosa confluência
histórica entre o discurso estético importado de outras regiões do mundo, principalmente dos
europeus, onde já no século XIX o padrão estético do corpo magro se firmava como a regra e o
discurso médico-higiênico, levando ao atual e aparentemente obsessivo culto ao corpo esbelto e
à magreza. Agora, estamos na era da lipofobia8.
Aqueles corpos (principalmente femininos) de formas rechonchudas, que um dia foram
imortalizados nas pinturas renascentistas, passam a dar lugar, hoje, a corpos magros, por vezes
até esculpidos. Tudo isso no intuito de não se distanciar dos padrões de estética considerados
“ideais” e, conseqüentemente, para não destoar daquilo que é insistentemente apresentado pelos
meios de comunicação como o “bonito de se ver”. De acordo com Goldenberg e Ramos (2002),
no Brasil, no fim do século XX e início do XXI, estamos assistindo a uma crescente
8
Nesse contexto, lipofobia significa uma aversão que é cultural ao excesso de gordura ou ainda o medo de se
afastar do ideal do corpo magro.
8
“glorificação do corpo”, com ênfase, sobretudo, cada vez maior na exibição pública do que antes
era escondido e, aparentemente, mais controlado.
Nos Estados Unidos, segundo Kilbourne (1994 apud Mckinley, 2004), a magreza é um
dos mais importantes componentes de aparência aceitável para o sexo feminino. As mulheres
indicam que perder peso é uma meta importante na vida e freqüentemente esta opção está acima
de outras metas, como seguir em frente com suas carreiras e trabalhos ou ainda ter sucesso.
É importante atentarmos para o papel que as formas de difusão da cultura, como os
meios de comunicação, a indústria cultural e as diversas ciências, estão tendo na era da
lipofobia. Villaça e Góes (1998) identificam que os atuais desenvolvimentos das ciências da
vida oferecem a possibilidade aos indivíduos de modificarem seu corpo tanto na sua aparência
física exterior quanto nos elementos fundamentais de sua estrutura orgânica.
Ribeiro (2004) argumenta que esse conceito muito difundido de culto ao corpo já vem
percorrendo há tempos as diferentes formas de mídia, em muitos momentos de maneira até
crítica. Entretanto, quase sempre vem atuando como construtoras e legitimadoras de
determinadas práticas, principalmente quando procuram enaltecer o padrão de magreza e
transformar o conceito de beleza numa configuração de corpos perfeitos, ou seja, corpos que não
apresentem ou que tenham em pouca quantidade estrias, celulites, rugas, tudo muito durinho e
sem sinais de desleixo.
O que se nota com relação ao papel dos meios de comunicação nesse processo, segundo
Stenzel (2002), é que, ao abordarem o tema obesidade versus magreza, as mídias se apresentam
extremamente ambivalentes, pois ao mesmo tempo em que reforçam o ideal de magreza,
parecem estimular o aumento do excesso de gordura por meio do apelo ao consumo de diversos
produtos, principalmente da linha fast food.
Precisamos compreender que essas determinações culturais não são exigências
exclusivas, como discutem Goldenberg e Ramos (2002), apenas para as atrizes que vemos na
televisão ou para aquelas modelos fotográficas e manequins de passarela. Por intermédio do
cinema, da televisão, da publicidade e de reportagens de jornais e revistas, essa exigência acaba
atingindo os simples mortais, que são atingidos cotidianamente por imagens de rostos e corpos
colocados como os perfeitos e saudáveis.
Vê-se, nesse sentido, que o corpo moldado vem, segundo Bruch (1997), de uma obsessão
do mundo ocidental pelo padrão estético da magreza. Há uma condenação por parte da
sociedade para qualquer grau de aumento de peso que destoe dos padrões, pois essas distorções
são vistas como indesejáveis e feias para uma apresentação social do corpo.
9
Sendo assim, observa-se que, atualmente, o ganho de peso além dos padrões ratificados
pela ciência como ideais, ou seja, o que se chama de obesidade mórbida ou severa9, passa a ser
considerada como uma doença crônica10, que está afetando boa parte da população dos países do
ocidente. Porto et al. (2002) mostram que no Brasil estima-se que 26,5% das mulheres e 22%
dos homens tenham excesso de peso, 11,2% das mulheres e 4,7% dos homens têm obesidade
leve e moderada e que 0,5% das mulheres e 0,1% dos homens apresentam obesidade severa.
Então, em se considerando que a população brasileira seja na ordem de 180.000.000, há cerca de
900.000 mulheres e 180.000 homens com obesidade severa.
De acordo com Segal e Fandino (2002), a orientação dietética, a programação de
atividade física e o uso de fármacos anti-obesidade são os pilares principais do tratamento
convencional.
Entretanto,
para a obesidade severa
continua produzindo
resultados
insatisfatórios, com 95% dos pacientes recuperando seu peso inicial em até dois anos. Esse é um
problema grave, chamado “efeito sanfona”, que atinge quase todo obeso severo que tenta perder
peso. Num primeiro momento, é perdida uma certa quantidade de peso, a qual, tempos depois, é
recuperada, e, como foi dito, chega a ultrapassar o peso que esse indivíduo tinha antes.
De acordo com o Consenso Mundial sobre Tratamento da Obesidade11, organizado pelo
Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos no ano de 1991, ficou estabelecido que o
tratamento mais eficaz, não o único, na perda e manutenção do peso corporal com relação ao
obeso severo é por meio de intervenção cirúrgica de redução de estômago. Essa indicação é
também corroborada pela Organização Mundial da Saúde (OMS)12: “Estimamos hoje que a
cirurgia gástrica é o tratamento mais eficaz para fazer perder peso e manter este peso no caso de
indivíduos que a obesidade é grave (IMC>35) ou muito grave (IMC>40)”13.
Na maior parte das vezes, a cirurgia é executada considerando que a obesidade severa é
definida como uma doença, mas pode-se dizer que tal cirurgia também vem sendo realizada por
9
Segundo Ribeiro et al. (2003), devido ao aspecto estigmatizante e pejorativo que o termo “obesidade mórbida”
carrega, essa denominação está sendo substituída por “obesidade severa”.
10
No presente artigo não há o interesse de discutir se a obesidade severa é uma doença stricto sensu ou não, nem de
questionar a validade do discurso médico nesse caso. Ora, é fato que as concepções de doença são influenciadas por
fatores sócio-culturais, como mostram alguns autores. Para Ferreira (1994), por exemplo, as noções de saúde e
doença são também construções sociais, pois o indivíduo é doente segundo a classificação de sua sociedade e de
acordo com critérios e modalidades que ela fixa. Isto implica que o saber médico também está intimamente
articulado com o social. Também segundo Carvalho (2002), o indivíduo é considerado doente, mutilado ou
deficiente conforme critérios e modalidades fixados pela sociedade da qual ele faz parte.
11
Ver Gastrointestinal Surgery for Severe Obesity. NIH Consens Statement Online 1991. Mar 25-27 [citado em 06
de janeiro de 2004]; 9(1):1-20.
12
OMS. Obésité: prévention et prise en charge de l’épidémie mondiale: rapport d’une consultation de l’OMS.
Genève: OMS, 2003. 300 p. (Série de Rapports Techniques; 894).
13
No original, “on estime aujourd’hui que la chirurgie gastrique est le traitement le plus efficace pour faire perdre
du poids et maintenir cette perte de poids chez des sujets dont l’obésité est grave (IMC >35) ou très grave (IMC
>40)” (2003, p. 249).
10
outras motivações sócio-culturais. Não é demais lembrar que há um descontentamento
generalizado relacionado ao peso e à estética corporal, o que muitas vezes pode levar a uma
imagem negativa do corpo e do eu. Daí para a gastroplastia como panacéia para os males do
corpo talvez seja apenas um passo.
Nesse sentido, percebe-se na sociedade contemporânea ocidental que cada vez mais está
havendo uma emergência de instrumentos de intervenção no corpo, o que constitui uma
tendência progressiva à racionalização de práticas que visam não somente o tratamento de males
físicos, mas também a adequação da imagem corporal às normas culturais indicadas pela
sociedade. A cirurgia de redução de estômago se constitui, assim, em uma prática racionalizada
de intervenção no corpo e uma de suas conseqüências é desencadear um processo de
transformação da identidade social do individuo que a ela se submete.
Identidade, Estigma e Obesidade Severa
Segundo Haraway (2000), na atualidade, as identidades parecem contraditórias, parciais
e estratégicas. Hoje em dia, fatores como as relações que envolvem os corpos (o tamanho, a
forma, as transformações, as marcas) passam a ter um importante papel na construção e
reconstrução das identidades. De acordo com Woodward, “o corpo é um dos locais envolvidos
no estabelecimento das fronteiras que definem quem somos, servindo de fundamento para a
identidade” (2000, p. 15).
Para Hall (2001), o indivíduo é composto não de uma única, mas de várias identidades,
algumas vezes contraditórias ou não resolvidas. Nesse sentido, Stuart Hall nos apresenta sua
perspectiva de pensar a identidade como sendo “identidades descentradas”, isto é, deslocadas ou
fragmentadas. Portanto, o autor utiliza o conceito de identidade:
Para significar o ponto de encontro, o ponto de “sutura”, entre, por um lado, os
discursos e as práticas que tentam nos “interpelar”, nos falar ou nos envolver
para que assumamos nossos lugares como os sujeitos sociais de discursos
particulares e, por outro lado, os processos que produzem subjetividades, que
nos constroem como sujeitos nos quais se pode “falar”. As identidades são,
pois, pontos de apego temporário às posições-de-sujeito que as práticas
discursivas constroem para nós (HALL, 2000, p. 111-112).
Seguindo com a mesma linha argumentativa apontada por Stuart Hall, Silva (2000)
concebe o conceito de identidade também como uma construção, que é instável, fragmentada e
contraditória. Nas suas palavras:
11
A identidade não é uma essência, não é um dado ou um fato (seja da natureza,
seja da cultura). A identidade não é fixa, estável, coerente, unificada,
permanente. A identidade tampouco é homogênea, definitiva, acabada,
idêntica, transcendental. Por outro lado, podemos dizer que a identidade é uma
construção, um efeito, um processo de produção, uma relação, um ato
performativo. A identidade é instável, contraditória, fragmentada,
inconsistente, inacabada. A identidade está ligada a estruturas discursivas e
narrativas (SILVA, 2000, p. 96-97).
Nessa perspectiva, de acordo com Woodward (2000), em todas as situações da vida
cotidiana, podemos nos sentir, literalmente, como sendo a mesma pessoa, mas nós somos, na
verdade, diferentemente posicionados pelas expectativas e restrições sociais envolvidas em cada
uma dessas situações, representando-nos, diante dos outros, de forma diferente em cada um
desses contextos.
Esse argumento nos possibilita compreender a obesidade severa e a situação do
indivíduo obeso severo num contexto mais amplo, num processo que envolve identificação e
categorização no âmbito da sociedade. Como exemplo, num círculo de amizades ou mesmo num
campo das relações íntimas, o chamado, em geral de forma pejorativa, “gordo”, é muitas vezes
visto e, conseqüentemente, identificado como aquele que é o bem humorado da turma ou o
ombro amigo. Como destaca Fischler, “as pessoas com um físico um pouco arredondado, são
via de regra, percebidas como de convívio mais amável, mais abertas à comunicação e à empatia
do que as magras” (1995, p. 69). Contudo, mudando de posicionamento na sociedade, como
exemplo, para conseguir um emprego, o obeso severo é identificado como um funcionário cuja
aparência sugere problemas, como baixa produtividade, faltas ao trabalho e altas despesas
trabalhistas. Segundo Fischler (1995), em 1984, na França, um eletricista foi despedido porque
seu peso de 123 Kg tornava-o, de acordo com o empregador, “inapto para o trabalho”.
As seguintes passagens refletem bem essa realidade: “da mesma forma que ser ‘gordo’ é
freqüentemente associado com a preguiça e uma falta de autocontrole, ser ‘magro’ é visto como
evidência de motivação e auto-disciplina, duas características altamente valorizadas na
sociedade ocidental”14. E também: “nós temos a crença de que as pessoas gordas são agradáveis,
contentes, engraçadas, mas também que são tolas, ‘gordurosas’ e avarentas” 15. O que ocorre,
como podemos observar com os exemplos, é a criação de uma multiplicidade de estereótipos
dos indivíduos que possuem obesidade severa. Essa identificação se dá sempre em relação a um
14
No original, “just as being ‘fat’ is often associated with laziness and a lack of self-control, being ‘thin’ is viewed
as evidence of one's motivation and self-discipline, two characteristics highly valued in western society”
(CRANDALL & SCHIFFHAUER, 1998 apud GREENLEAF et al., 2004, p. 374).
15
No original, “we have the beliefs that fat people are good-natured, contented, likable, funny, and also that they
are foolish, ‘greasy’, and greedy” (POWDERMAKER, 1997, p. 208).
12
padrão cultural ou a uma identidade específica que serve como parâmetro para que outras
identidades sejam identificadas.
Na perspectiva de Woodward (2000), a identidade depende, para existir, de algo fora
dela. A identidade é, assim, marcada pela diferença. O fato de se identificar alguém requer que
esse indivíduo a que se está referindo seja colocado dentro de uma categoria socialmente
determinada. Essa categoria carrega em si uma variedade de símbolos e de estereótipos préestabelecidos culturalmente. Podemos ver um exemplo claro na passagem que se segue: “mesmo
as crianças de 6 anos descrevem a silhueta de uma criança obesa com adjetivos tais como: sujo,
estúpido, feio, mentiroso e trapaceiro”16. A passagem citada refere-se a um trecho de um livro
da OMS sobre obesidade. Nela pode-se perceber que a categoria “obesidade” carrega consigo
uma grande variedade de estereótipos negativos pré-estabelecidos socialmente e que são
culturalmente inculcados nas crianças via processos de socialização.
Esses estereótipos contribuem de uma forma muito objetiva para a construção de uma
imagem totalmente negativa da categoria “obesidade” e, conseqüentemente, dos indivíduos que
possuem obesidade severa. O ponto central do argumento desenvolvido é que a construção da
identidade dos indivíduos obesos severos tem como referência a identidade do padrão de corpo
culturalmente dominante, ou seja, o corpo magro.
De acordo com Silva (2000), são os próprios indivíduos que elegem de forma arbitrária
uma identidade específica como parâmetro ou padrão cultural em relação à qual as outras
identidades são avaliadas e identificadas. Assim, a produção da identidade está inserida num
contexto de hierarquização e poder, ou seja, a categoria “normal” sempre vai implicar a
existência de uma outra categoria, o “anormal”.
No intuito de compreender o universo dos indivíduos que se desviam do padrão normal
da sociedade, ou seja, de indivíduos que possuem um estigma, Erving Goffman (1988) escreveu
seu livro “Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada”. Para ele, o fato de um
indivíduo carregar um estigma social, como é o caso do obeso severo, implica carregar consigo
um atributo que pode desviar a atenção, num contexto de interação social, para seu aspecto mais
marcante, nesse caso, o grande excesso de gordura.
O conceito de estigma se apresenta, assim, como um conceito importante para
compreendermos a situação de um indivíduo obeso severo e sua relação com a sociedade.
Goffman mostra que o estigma é “um tipo especial de relação entre atributo e estereótipo”
(1988, p.13). O autor utiliza o termo relacionando-o a atributos que são profundamente
depreciativos. De forma mais precisa:
16
No original, “même des enfants de 6 ans décrivent la silhouette d’un enfant obèse avec des adjectifs tels que
paresseux, sale, stupide, laid, menteur et tricheur” (OMS, 2003, p. 63).
13
Um indivíduo que poderia ter sido facilmente recebido na relação social
quotidiana possui um traço que se pode impor à atenção e afastar aqueles que
ele encontra, destruindo a possibilidade de atenção para outros atributos seus.
Ele possui um estigma, uma característica diferente da que havíamos previsto
(GOFFMAN, 1988, p. 14).
De acordo com Goffman (1988), são os indivíduos vivendo em sociedade que
estabelecem os meios de categorizar as pessoas e o total de atributos considerados como
comuns, naturais ou normais para os membros de cada uma dessas categorias. São os diversos
ambientes sociais que estabelecem as categorias de pessoas que têm probabilidade de serem
neles encontradas. As chances de encontrarmos, por exemplo, um fisiculturista em um grupo de
vigilantes do peso são bem remotas.
O termo estigma, segundo Goffman (1988), oculta uma dupla perspectiva: a do indivíduo
desacreditado e a do indivíduo desacreditável. O desacreditado assume que a sua característica
distintiva ou já é conhecida ou é imediatamente evidente na interação e o desacreditável assume
que sua característica distintiva não é conhecida pelos presentes nem imediatamente perceptível
por eles. Os indivíduos obesos severos são, na perspectiva analítica de Goffman, desacreditados,
pois possuem uma característica ou um atributo totalmente visível que se impõe, o excesso de
gordura, na interação social direta.
Como foi dito ao longo desse trabalho, é fato que em nossa sociedade o indivíduo obeso
severo não é categorizado como se enquadrando num padrão de normalidade estética, nem pela
ciência, nem pela sociedade. Nossos padrões de cultura estética contemplam como o saudável, o
bonito ou, na perspectiva de Goffman (1988), o normal17, sempre aquele indivíduo que possui
um corpo magro e, se possível, esculpido e esbelto. O obeso severo, sendo o indivíduo desviante
desses padrões, torna-se o estigmatizado ou, mais ainda, o desacreditado por ter um estigma
físico visível.
De acordo com Goffman (1988), a característica fundamental do indivíduo
desacreditado, por ser portador de um estigma totalmente visível, é possuir um traço que pode se
impor à atenção dos outros indivíduos e que, conseqüentemente, pode afastar aqueles que ele
encontra, destruindo a possibilidade de atenção para outros atributos seus. Nesse sentido,
destaco dois exemplos dessa perspectiva no discurso das entrevistadas: Hanna que se trancava
em casa no final de semana no intuito de se esconder e Mirela que deixava de tomar sorvete
enquanto passeava pelo shopping. Elas faziam isso, por conhecer a visibilidade do estigma que
possuíam e por temerem críticas. Percebe-se que há nessas entrevistadas uma consciência da
17
O indivíduo normal, na concepção de Goffman (1998), é aquela pessoa que não se afasta negativamente das
expectativas particulares.
14
grande visibilidade de seus estigmas e de suas conseqüências sociais, por esse motivo se “autoprivavam”, de certa forma, de fazerem determinadas coisas.
Eu fazia [trabalhar] porque eu tinha que fazer. Eu saía porque eu tinha que sair.
Já teve época deu entrar em casa sexta-feira a tardezinha, porque eu chegava do
serviço, e saía segunda-feira. Antes eu não via isso, hoje eu vejo que eu me
escondia. Isso era uma forma de eu me esconder, “deixa eu quieta aqui, que tá
melhor assim”. (Hanna)
O magro sempre pode tomar sorvete, comer o que for andando no shopping, as
pessoas nem vêem, passa despercebido. Agora, se for um gordo com um
sorvete na mão pode ter certeza que todo mundo te olha e ainda critica.
Certeza, as pessoas olham com a cara de cinismo (...) Eu já passei inúmeras
vezes vontade no shopping, meu esposo adora aqueles sorvetes do McDonald,
todo mundo adora aquilo, eu também adorava aquilo. Ele compra e toma
normalmente... Eu nunca, nunca comprei sorvete pra ir tomando dentro do
shopping. Comprei pra ir tomando, nunca! Porque a pessoa olha pro gordo
tomando soverte é motivo de crítica, eu falava: “Eu não vou dar esse gosto pra
ninguém”. (Mirela)
Partindo do principal pressuposto de que o obeso severo é um individuo com uma
identidade social estigmatizada, cria-se toda uma imagem socialmente negativa desses
indivíduos, que pode ser constatada nas piadas do dia-a-dia e nos programas de TV,
principalmente naqueles de cunho humorista. Quando se precisa de uma mulher feia, geralmente
se apresenta uma pessoa gorda. De acordo com Pinsky (2000), imagens televisivas, como vistas
em alguns programas, deveriam nos fazer meditar sobre o assunto, em vez de nos fazer aceitar
idéias preconceituosas como verdades definitivas. Nesse sentido, “tem gente que leva o
preconceito na brincadeira, achando que piadinhas e gozações sobre as minorias não têm maior
significado. Errado” (PINSKY, 2000, p. 8).
Os programas que usam indivíduos estigmatizados (obesos severos, homossexuais,
negros, deficientes, etc.) como fonte de piadas e de chacota, com certeza, contribuem para a
difusão cada vez mais de um preconceito que já está enraizado em nossa sociedade. No caso do
obeso severo, é freqüente vermos em programas e filmes um link direto entre feiúra e obesidade
severa, acarretando uma disseminação e, conseqüentemente, uma internalização da compreensão
de que indivíduos que se encontram nessa situação são feios. Com relação a essa perspectiva,
constata-se, inclusive na maioria das entrevistadas, uma concepção própria da obesidade severa
relacionada diretamente com o ser ou estar feio.
Eu tinha uma prima que nós éramos quase a mesma idade, e era assim, eu
falava assim: “Nossa, fulano tá tão bonitinho” e ela ia e namorava ele.
Entendeu como que era? Ela era a bonita e eu era a feia. Eu mesmo me
discriminava. (Márcia)
15
É uma marmota [gordo], é uma marmota, que nem diz minha tia. Uma roupa
num gordo não fica bom, o “trem” não assenta. Não tô falando de gordinho
não, tô falando de 150 Kg, tô conversando de 150 Kg. É uma coisa diferente, é
uma coisa que choca na hora que você olha, na minha opinião. “Cara, ele é
gordo demais”. A manga de uma camisa curta dá no meio do braço, por
exemplo. Ou o trem é grande demais. É uma coisa meio que feia, pra não falar
a palavra feia. É uma coisa que você olha com outro olho mesmo. (Diene)
Não há como negar que, em nossa sociedade contemporânea, os indivíduos obesos
severos são confrontados todos os dias com inúmeras dificuldades práticas impostas pela
sociedade. Torna-se relevante destacar, como bem podemos identificar nas entrevistas abaixo, as
várias privações e as discriminações sofridas pelos indivíduos com obesidade severa, seja para ir
ao cinema, se divertir, para passar na catraca do ônibus, para dirigir um carro ou mesmo
comprar uma roupa.
Minha vaidade tava nula, pra mim tanto fazia sair como não sair, ou aprontar
ou não aprontar, aprontar pra quê? Não tinha uma roupa que caía bem, não
tinha uma nada que eu olhasse e falasse: “Tá legal” (...) Para comprar uma
roupa, quando você acha é caríssima. (Hanna)
Você vai ao cinema, se senta na poltrona e você fica no incômodo. Sabe, você
vai num parque da Disney, você senta na montanha russa e não te cabe. Não te
cabe! E olha que é um país de gordos. Quando eu fui para os Estados Unidos,
eu sentei na montanha russa eu achei que eu não ia sair, e eu não tava... eu tava
com 90 Kg, quer dizer, não era tão... Eu sentei, eu achei que eu ia ficar presa lá,
não tava tão gorda assim. Avião! O cúmulo do absurdo, o avião. Ônibus! É o
cúmulo do absurdo um ônibus. (Mirela)
Segundo Brodie, Drew e Jackman (1996 apud Almeida, Loureiro e Santos, 2002), essa
tendência estereotipada de avaliar a imagem corporal baseada em padrões culturais da estética
da magreza podem acarretar graves conseqüências, como por exemplo, uma tendência crescente
a insatisfação com o próprio corpo e imagem. Quando estes se configuram diferentes dos
padrões aceitáveis de peso e estética, cresce a preocupação com o "ser/estar diferente", que
passa a se fazer presente na vida dessas pessoas que, por fim, sofrem ainda mais pela sua
obesidade severa.
Goffman (1988) explica essa situação destacando que, quando normais e estigmatizados
se encontram na presença imediata uns dos outros, ambos os lados enfrentam diretamente as
causas e os efeitos do estigma. O indivíduo estigmatizado pode descobrir que se sente inseguro
diante os normais, nesse caso, surge no estigmatizado a sensação de não saber aquilo que os
outros estão realmente pensando dele. Mesmo sem esse conhecimento, as mulheres
entrevistadas tendem a se auto-excluírem, achando ou imaginando o que os normais estariam
pensando delas. Como na constatação da Organização Mundial da Saúde: “a maioria dos obesos
16
tem uma imagem ruim deles mesmos, eles dizem que são feios e pensam que os outros almejam
excluí-los das relações sociais”18. Também nas palavras das entrevistadas:
Nessa época dos quinze eu era muito gordinha, então eu me sentia feia (...) Eu
ouvia muito aquela velha história: “Nossa você tem o rosto tão bonito” e quase
falava: “Mas o corpo é triste”. Mas, eu ouvia isso demais, ouvia isso demais.
Agora, a visão que eu acho que as pessoas tinham de mim era essa, assim, de
“nossa, mais é tão, tão legal, tão assim, mas que pena que é gorda”. (Mirela)
Agora, o que te passa, na maior parte do tempo, que você é feio, que você tá
deslocado daquele espaço (...) Então, a impressão que dá é que não está
agradando. Não que vá agradar, porque não era agradável pra mim, a minha
imagem. (Fabiana)
De acordo com Fischler (1995), a classificação social de um obeso resulta de uma
relação entre os traços físicos e a imagem social da pessoa, como exemplo, sua profissão. Com
certeza há uma diferenciação da percepção social dos distintos estados corporais, que varia de
acordo com o posicionamento do indivíduo na sociedade. Contudo, quando se trata, como neste
trabalho, dos indivíduos obesos severos, sejam ricos, pobres, famosos ou inteligentes, todos
carregam consigo um grande excesso de gordura que os destaca, que os torna “referenciais” no
âmbito da sociedade, ou seja, todos obesos severos, por mais que alguns lidem bem com o fato
de terem esse atributo, carregam um estigma. Essa constatação é fortemente observável nos
discursos das entrevistadas:
O obeso é sempre assim: “Tá vendo aquele gordo ali, atrás dele”. Ele é um
ponto de referência. (Hanna)
Então, eu sempre fui referencial da turma. Você tá assim num lugar e dizem
assim: “Oh, depois daquela gorda lá”. (...) Eu sempre tive o ouvido muito
aguçado, então isso aí de longe eu ouvia e isso é prejudicial pra você, você se
sente mal. (Márcia)
No trânsito, no trabalho, as pessoas, por exemplo, vão me indicar em vez de
falar: “A Fabiana, que tem o cabelo vermelho” ou então: “Aquela que fica
sentada em tal mesa”. Enfim, um outro exemplo de você dá uma indicação pra
pessoa: “Ah, aquela gorda lá” ou então, a gerente... Não, a indicação é a mais
pejorativa possível: “Aquela gorda lá”. (Fabiana)
Nesse sentido, o fato de ser considerado como uma referência, de ser observado e,
conseqüentemente, de ser avaliado negativamente em muitos lugares na sociedade, por causa do
estigma, é crucial para o desenvolvimento social dos indivíduos obesos severos. Ser uma
18
No original, “de nombreux sujets obèses ont une mauvaise image d’eux-mêmes, c’est-à-dire qu’ils se trouvent
laids et pensent que les autres souhaitent les exclure des rapports sociaux” (2003, p. 64).
17
referência, de acordo com as entrevistadas, significa ter cada movimento sendo observado
constantemente pelas outras pessoas. Isto faz com que o indivíduo obeso severo procure
controlar suas ações para não chamar ainda mais a atenção para seu atributo que é visível na
interação social, ou seja, o grande excesso de gordura, como bem podemos observar nos
discursos de Diene e Simone:
Mas eu lembro assim que eu não colocava comida em restaurante, eu não
colocava. Nos meus 15, 16 anos eu não colocava, minha mãe que tinha que
servir meu prato. Porque eu não, não vou pôr, todo mundo vai me olhar e eu
não quero. (Diene)
Eu não ia ao Bouganville19. No Bouganville tem uma cadeira que era assim, um
oco, se eu me enfiasse lá dentro depois na hora que eu levantava minha bunda
ficava presa. Então não tinha condições de ir. (...) Ficava com vergonha de
sentar naquelas cadeiras de bar, de plástico, eu morria de medo de quebrar.
Meu quadril enfiava nelas assim sabe, era difícil. (Simone)
Na perspectiva analítica de Marchesini, S. (2001), a obesidade severa, insistentemente,
condena os indivíduos a viverem em um mundo onde há sempre o envolvimento de uma grande
carga de discriminação e uma compreensão preconceituosa sobre a figura do chamado “gordo”.
Essa interpretação dos indivíduos obesos severos, muita das vezes feita de forma apressada, por
conseqüência do estigma visível do excesso de gordura, pode ser notada nas passagens que se
seguem que destaco do discurso das entrevistadas:
Eu já entrei várias vezes pra comprar um presente e a pessoa te atente tipo
assim: “Nossa, não tem roupa aqui pra você, não tem roupa aqui que te serve”,
aí você fala: “Olha, tô querendo ver essa roupa aqui”. “Olha, mas só vai até
quarenta e... quarenta e quatro”. “Não, mas eu quero número quarenta pra
presente”. (Mirela)
Uma vez eu escutei uma pessoa falando assim, nós estávamos com uns casais,
eu escutei uma falar assim: “Ela não representa perigo pra você, seu marido
não vai olhar para aquele tamanho”. Fiquei quieta e não falei nada, mas isso
marcou. (Hanna)
Estas são situações preconceituosas semelhantes as que ocorrem com indivíduos negros.
Um exemplo claro pôde ser visto em uma propaganda veiculada na mídia televisiva, onde um
rapaz negro estava manobrando um carro na garagem para sair e no banco de trás estavam uma
mulher e um bebê. Uma antiga amiga dessa mulher se aproxima do carro e diz: “Nossa amiga,
você está bem, tem até um motorista!”. E a mulher responde: “Não, ele é meu marido!”.
19
Bouganville é um shopping center da cidade de Goiânia.
18
Portanto, tanto nos exemplos relacionados ao estigma da obesidade severa quanto do
estigma de ser negro, percebe-se claramente que há uma discriminação das mulheres obesas
severas e um preconceito para com o homem negro por se desviarem do padrão considerado
como o normal pela sociedade e, principalmente, pelas mulheres obesas severas e o homem
negro carregarem um estigma que direciona a atenção e a interpretação dos outros indivíduos,
baseando-se unicamente em sua forma física ou em sua cor da pele.
Contudo, não podemos generalizar o argumento acima, pois é evidente que uma
interpretação preconceituosa e apressada pode mudar no decorrer do processo de interação
social. Com o início da comunicação entre os envolvidos no contexto de interação, as
interpretações acerca dos indivíduos estigmatizados podem mudar, direcionando a atenção para
outros atributos que esses indivíduos provam possuir, o que pode levar o estigma a ficar, pelo
menos temporariamente, em segundo plano. Um exemplo dessa perspectiva é destacado no
seguinte trecho da entrevista de Simone, cuja característica de relacionar-se bem com as pessoas
e de manter uma conversação interessante, fazia com que a interpretação dos outros sobre si,
muitas vezes, não ficasse apenas baseada no estigma:
Depois que eu separei, muitas vezes assim, eu tinha um grupinho de amigas, eu
saía com as minhas amigas, umas amigas bonitinhas, magrinhas e tal. Aí,
chegava aquele grupinho de homens, né. Aí assim, é lógico que chegava já
flechando as outras que eram bonitas. Aí, começava conversar, conversar,
conversar. Aí, começou a conversar comigo, passava um pouco, tava assim, as
minhas amigas lá de um lado quietas e eu conversando com os três homens que
tinham chegado. Então, aí acabava virando o jogo e muitas vezes dava namoro.
(Simone)
Para Pinto (1999), ao desviar-se desses padrões de corpo saudável apresentado
socialmente, o obeso severo torna-se, de certa forma, um rejeitado desde muito cedo. É
freqüentemente vítima de gozações e seu percurso existencial é marcado por atitudes
preconceituosas, humilhações, piedade, hostilidade e uma grande variedade de apelidos
pejorativos. Em relação a esse aspecto, todas as entrevistadas se manifestaram a respeito. Por
isso, destaco aqui dois exemplos de como essas mulheres já foram tratadas (lê-se:
discriminadas) apenas pelo “simples” fato de serem portadoras de um estigma:
Uma semana antes da minha cirurgia, eu fui pegar um ônibus e tinha um só
lugar vago, o rapaz na hora que ele me viu, ele colocou a mochila em cima do
banco. Aí, entrou uma mulher, uma morena muito bonita, magrinha,
ajeitadinha, ele foi e tirou a mochila pra ela sentar. Eu pensei: “Daqui uns
tempos você vai me dar o lugar”. Isso doeu, mas isso doeu tanto, eu chorei
tanto. (Hanna)
19
Uma vez, eu entrei na faculdade, eu fiquei tão chateada com a menina que até
hoje eu não gosto da cara dela. Eu sentei na cadeira e ajeitei assim, tal. Aí, ela
virou e falou assim: “Nossa, Simone, você tem que emagrecer, olha aí pra você
ver, você não tá nem cabendo na cadeira. Daqui alguns dias, você deixa de vir
pra faculdade, de tanto que tá apertado. Você nem cabe na cadeira”. Aquilo me
deixou tão chateada. (Simone)
Portanto, como o indivíduo estigmatizado responde à situação de ter que conviver a vida
inteira com um atributo tão marcante e depreciativo que pode acarretar problemas para sua
aceitação social? Em alguns casos lhe seria possível tentar corrigir o que considera a base
objetiva de seu problema? Se este é um defeito físico, faz-se uma cirurgia plástica; se o
indivíduo é analfabeto, procura estudar. Nesse sentido, para Goffman (1988), não ocorre a
aquisição de um status completamente normal, mas uma transformação do ego. Será que o
estigma (da obesidade severa), após todo o processo da gastroplastia continuaria a estar presente
na vida das mulheres submetidas à cirurgia de redução de estômago? O que ocorre com a
identidade social dessas mulheres após a gastroplastia?
Um Processo de Reconstrução Identitária
O processo de reconstrução identitária se inicia a partir do momento em que o obeso
severo toma a decisão de se submeter à cirurgia. Esta não é uma decisão fácil e que envolve toda
a família. Na mente de quem toma essa decisão, nesse instante é a perspectiva de uma nova
vida, de um novo corpo e de uma nova imagem social que se abre em seus horizontes. Pode-se
identificar essa perspectiva desse novo renascimento no seguinte depoimento:
Eu disse: “Mãe, eu tenho uma coisa para falar para senhora. Não estou pedindo,
não estou pedindo opinião e não estou pedindo autorização. Estou
comunicando que vou fazer a cirurgia de redução de estômago”. Aí, ela
começou a chorar. Aí, eu falei: “Mãe, não chora... Essa é a decisão mais feliz
que eu já tomei na minha vida. A senhora não tem noção do quanto eu estou
feliz” (...) Eu entrei na sala de cirurgia feliz. Se eu morresse naquela cirurgia,
eu estaria feliz. Isso eu falo para qualquer um (...) Eu fui para a sala assim, a
mais feliz das criaturas. (Mirela)
“Por que você resolveu se submeter à gastroplastia”? O que se analisa das respostas
dessa pergunta direta vem corroborar aquilo que discuto ao longo deste trabalho, ou seja, há
diversas maneiras que a sociedade usa (diferentes mídias, indústrias do bem-estar, ciências) para
propagar e legitimar regras de adequação corporal que motivam os indivíduos a fazerem
determinadas coisas e a seguirem certas normas de enquadramento social. Observa-se que, em
20
todas as entrevistadas, a vontade de emagrecer de uma forma definitiva é muito forte, se
sobressaindo até sobre a preocupação com doenças ou o futuro aparecimento delas.
Na entrevista de Diene percebe-se que não há uma preocupação estética tão presente
quanto das outras mulheres. Entretanto, apesar dessa entrevistada apresentar sérios problemas de
saúde, constata-se que a cobrança por parte da sociedade também é muito presente em sua vida.
Essa cobrança da sociedade reflete-se muito mais na maneira como são tratadas essas pessoas no
meio social. Para exemplificar esse argumento, destaco um trecho da entrevista de Simone:
Agora, o gordinho, se ele for colocar um tanto de comida fica todo mundo
olhando, todo mundo preocupado. “Nossa, mais você anda comendo, fulano!”
(...) Eu queria ter mais liberdade. O povo parar de preocupar com minha vida.
(Simone)
Voltando a Diene, em seu caso específico, ela admite que tomar a decisão de ir contra
esses padrões estéticos considerados ideais significa travar uma séria batalha contra a sociedade.
Fiz a seguinte pergunta a ela: “Você acha que é melhor se adequar aos padrões corporais que
você disse que a sociedade tem do que ir contra eles?” E ela me respondeu:
É, a luta é mais difícil. A luta é bem mais difícil. Não é que você não possa
ganhar, você ganha a batalha, mas tem caminho mais fácil pra você: a cirurgia.
(Diene)
Apesar de haver uma vontade de emagrecer em definitivo, visto que essas mulheres
tiveram uma vida de “sanfona”, não há como deixar de observar que a preocupação e o medo de
adquirir doenças por causa da obesidade severa são bastante recorrentes em seus depoimentos.
Você não é mais uma criança. Então, o que pode acontecer? Pode vir mil...
acontecer alguma doença, que a obesidade não é saúde, a obesidade não é
saúde (...) A obesidade é uma doença e uma doença que hoje, através dessa
cirurgia você pode resolver o seu problema. (Márcia)
Vale ressaltar que várias entrevistadas não tinham problemas de saúde relacionados com
a obesidade severa e, tirando Diene que tinha hipertensão, as que tinham algum problema, não
possuíam um alto grau de seriedade20. Nesse sentido, aponto uma forte vontade de emagrecer,
motivada por um padrão de corpo difundido e em decorrência de uma cobrança externa da
20
Importante deixar claro que essa constatação decorre dos depoimentos das mulheres entrevistadas e, por isso, não
se relaciona com o fato de que a obesidade severa é uma doença que, se não tratada, pode causar no futuro inúmeras
outras doenças e problemas de saúde muito sérios em decorrência do aumento excessivo de peso, como diabetes,
hipertensão e doenças neuro-musculares.
21
sociedade, a qual todos estamos sujeitos, como a principal motivação para as mulheres
entrevistadas se submeterem à cirurgia de redução de estômago.
E se os indivíduos optarem por ir contra as normas de estética corporal estabelecidas pela
sociedade? Para responder a essa pergunta, é sempre bom lembrar de Durkheim (1977), quando
nos mostra que há grandes dificuldades para aqueles que procuram não se submeter a uma
convenção mundana. De acordo com Durkheim (1977), as tentativas empreendidas pelos demais
membros da sociedade para impedir esse desvio de conduta são várias: as punições, a censura, o
riso, o opróbrio, o preconceito e outras tantas restrições. Estas são suficientes para nos advertir
que estamos diante de algo que não depende somente de nós, o que vem comprovar essa
cobrança que age sobre os indivíduos obesos severos.
Entretanto, isso não significa que as pessoas ficam totalmente estáticas diante dessa força
externa da sociedade que age sobre elas. Há a possibilidade de um comportamento inovador,
como a criação de grupos organizados de obesos severos para reivindicar os seus direitos21 e,
nesse caso, o principal direito que exigem é o de ser como são. Mas, como citado no trecho da
entrevista de Diene, para não ter que travar uma difícil batalha contra a sociedade, muitos
obesos severos procuram um caminho mais fácil, rápido e, medicamente legitimado: a cirurgia
de redução de estômago.
Constata-se que após a cirurgia, há uma mudança de tratamento das outras pessoas para
com as entrevistadas que reflete uma alteração mais geral de comportamento relacionada
basicamente com a aquisição de um novo corpo e de uma nova imagem que é transmitida à
sociedade. “Você tem o rosto tão bonito!”. Essa era a frase que as entrevistadas mais ouviam
durante o período que eram obesas severas e que, por sua vez, odiavam. “Como você está
bonita!” ou “Você tá magra, tá linda!”. Essas são algumas das frases que as entrevistadas mais
passaram a escutar após a gastroplastia e que, por sua vez, adoram. O trecho abaixo, retirado da
entrevista de Júnia, vem destacar bem essa diferenciação baseada unicamente na forma física do
antes e depois da gastroplastia:
“A Júnia é uma menina boa”, nunca que ela era bonita. “A Júnia era uma
menina boa”. Hoje, a Júnia é boa e bonita (...) Ainda elas [pessoas] falavam
assim: “Não que você era feia, mas hoje você tá linda”, dão uma corrigida.
(Júnia)
21
Um exemplo desses grupos vem dos Estados Unidos. É a National Association to Advance Fat Acceptance
(NAAFA). De acordo com Evans (2003), nos Estados Unidos o número de obesos cresce e eles não se intimidam
mais: defendem com todas as forças os seus direitos, movendo ações contra companhias aéreas, academias,
empresas e agências de publicidade.
22
As próprias entrevistadas relataram que a mudança de padrão corporal foi uma alteração
para melhor. Até entre as mulheres que relataram não se sentirem feias pelo fato de serem
obesas severas apontaram que após a gastroplastia houve ainda mais um realce em suas belezas,
como podemos ver nos depoimentos de Daniela e Júnia:
Eu falo pra todo mundo que foi a melhor coisa que eu fiz na minha vida. Eu já
me achava bonita, agora eu acho que eu sou mais bonita ainda (...) Eu gostei de
me ver magra, eu nunca tinha visto. (Daniela)
Depois que eu fiz a cirurgia, que hoje eu tô magra, eu vi o tempo que eu perdi,
que eu podia tá assim há muito tempo (...) Hoje eu vejo minhas fotos e não
acredito que era eu. (Júnia)
Até agora, procurei tratar da mudança da imagem social, ou seja, a apresentação do
corpo aos outros indivíduos na sociedade, por meio da aquisição de uma nova compleição
corporal que passa a ser inserido num padrão aceitável de estética. Para Droguett (2001), são os
próprios indivíduos que reduzem o corpo a um objeto com vistas a sua apresentação social.
Assim, procura-se ficar de acordo com os padrões culturais, para que o corpo nos represente da
melhor maneira nas relações sociais, ou seja, aos olhos das outras pessoas.
Nesse sentido, num contexto de interação social o que se apresenta primeiramente aos
outros é a imagem física de um corpo coberto por roupas. Os indivíduos avaliam uns aos outros
com base, dentre outros tantos atributos que geram significados sociais (cor da pele, cor e tipo
de cabelo, tipo de roupa), também no tamanho e volume que este corpo possui. Assim, após a
gastroplastia, estando tudo dentro das convenções estéticas corporais, significa que as mulheres
outrora constantemente avaliadas não possuem mais nenhum atributo visível ou estigma.
Além de facilitar a aceitação social, o novo corpo e a nova imagem social permitem que
lugares outrora até evitados, possam agora fazer parte dos planos para uma possível visita ou
divertimento. Com o novo corpo que não chama mais a atenção quando aparece e que,
diferentemente do obeso severo, “cabe em qualquer lugar”, as privações impostas pela
sociedade deixam de existir. Ora, depois do emagrecimento, essas mulheres passam a se
enquadrarem, se não num modelo estético perfeito de beleza e saúde, pelo menos, se encaixam
nas regras básicas de perimetria corporal. Esse enquadramento da perimetria a que me refiro
permite não só a possibilidade de pegar um ônibus ou dirigir um carro para ir comprar novas
roupas e de se acharem mais bonitas com essas roupas, mas também de saírem para se divertir
com essas roupas, se sentarem, cruzarem as pernas e não terem medo de quebrar a cadeira ou
ficarem presas nela, como destaco nos três exemplos a seguir:
23
Nada substitui o prazer de você ir à uma loja comprar uma calça jeans e você
pedir o número quarenta e ela ficar grande. Aí, a moça traz uma trinta e oito e
você vestir e ficar perfeita. Nada substitui isso, pra mim. (Mirela)
Você acaba sendo mais despachada. Você não tem tantos medos. Você não tem
tantas barreiras. Hoje, eu vejo que eu não tenho tantas barreiras. Tipo assim, de
sentar, chegar numa boate, ter uma cadeira: “Ah, eu não vou sentar nessa
cadeira, porque ela não vai agüentar”. “Ah, não vou colocar um vestido, porque
vai ficar ridículo”. “Ah, eu não vou dançar, porque eu sou gorda”. Não, hoje eu
sou mais despachada. (Diene)
Hoje, minha vaidade foi lá pra cima. Eu visto uma roupa e ela fica bem. Eu
tenho prazer em aprontar e sair. Eu tenho prazer em falar assim: “Hoje, eu vou
comprar uma roupa”, coisa que eu não tinha, porque o dia de comprar roupa era
dia de chorar, porque não achava. Hoje não, qualquer lugar que eu entro tem
uma roupa que me sirva. Eu tenho facilidade de locomoção e eu morria de
medo de entalar na catraca de ônibus. (Hanna)
Portanto, o processo de reconstrução identitária, no caso dos indivíduos obesos severos,
passa indiscutivelmente por uma mudança da estética corporal e, como conseqüência disso, uma
nova imagem social se cria, atuando na produção das fragmentadas e múltiplas identidades
sociais que nos são imputadas pelos outros indivíduos nas interações sociais. Esse novo corpo,
sem o atributo estigmatizante do excesso de gordura, proporciona o aparecimento de uma nova
imagem para a sociedade, que viabiliza a reconstrução de sua identidade social. Assim, a forma
de tratamento das outras pessoas se altera basicamente motivada pela mudança da percepção
corporal proporcionada pelo emagrecimento via gastroplastia, como podemos constatar no
seguinte trecho da entrevista de Simone:
Eu acho engraçado, sabe? Como as pessoas são levadas pela aparência, são
volúveis, mudam da opinião assim. Acho que as mesmas pessoas que me
criticavam antes, que tão aí hoje babando. “Nossa, como a Simone tá
diferente”. Eu acho que são as mesmas pessoas, que me criticavam, porque as
pessoas são meio hipócritas nesse ponto. Elas vão muito pela estética só
mesmo e não percebem as outras coisas. (Simone)
Importante também para essas mulheres é poderem fazer coisas que antes não seria
possível pela condição física, poderem ser elogiadas como um todo e não só por algumas partes
e, principalmente, poderem sair na rua sem que outra pessoa fique olhando com curiosidade ou
mesmo tendo um alívio momentâneo por ter uma confirmação de sua normalidade aparente.
Terminei a segunda parte deixando algumas perguntas para serem respondidas neste
momento. Ressaltei que Goffman (1998) considera que uma das formas de adquirir, pelo menos,
uma transformação do ego é por meio da correção direta do atributo que estigmatiza o
indivíduo. Para Goffman (1988), as pessoas que se descobrem livres de um estigma podem ser
24
consideradas por si mesmas e pelos outros como pessoas que alteraram o seu ego, uma alteração
em direção ao padrão aceitável para se viver em sociedade, sem que isso as tenha transformado
automática e completamente em normais. Então, podemos considerar que, uma vez
estigmatizado, sempre estigmatizado?
Agora, tendo como referência a discussão conceitual sobre identidade22, esta se apresenta
como sendo fragmentada, múltipla e instável. A identidade social é construída e reconstruída
dependendo da forma como os indivíduos são identificados socialmente numa relação de
linguagens. Essa identificação situa os indivíduos em categorias socialmente construídas,
imputando, assim, estereótipos pré-estabelecidos, que valorizam ou que depreciam as pessoas,
na produção de suas identidades sociais.
Nesse sentido, analiso que, a partir do momento em que o estigma não se faz mais
presente na interação social, foi constatado que as mulheres entrevistadas não mais tiveram suas
identidades sociais produzidas com base no estigma do excesso de gordura. Isto se deu pelo
simples fato de que não existe mais o atributo corporal que as depreciava, as identificava e as
enquadrava na categoria pejorativa “gordas”. Assim, avanço nesta argumentação, apontando
para uma constatação: as entrevistadas passam a se sentirem num status de normalidade, na
medida em que deixaram de ser “referência” para a sociedade.
Você é discriminado e, quando você emagrece, você deixa de ser discriminado.
(Márcia)
Quando eu quero que me vejam, eu me produzo. Mas, não sou mais um ponto
de referência. Eu já não sou mais ponto de referência. (Hanna)
Como citado, essas mulheres que tiveram o seu atributo corrigido não são mais
identificadas e categorizadas socialmente como sendo “as gordas”. Com certeza são colocadas
em outras categorias, como nós todos somos, mas não nessa especificamente. Portanto, isto
implica dizer que, além de uma transformação do ego, como aponta Goffman, e de uma
substancial elevação da auto-estima, uma das identidades sociais dessas mulheres, antes
produzida com referência ao padrão de estética corporal prevalecente, se modifica.
Marchesini S. (2001) prefere utilizar a expressão “novo magro”, em detrimento de “exgordo”. Para essa autora, a palavra “gordo”, muito usada de forma pejorativa, deve ser
exorcizada também da mente de cada pessoa que conseguiu emagrecer. Na opinião da autora,
isto seria o ideal. Entretanto, na prática, o que se observou foi que as mulheres submetidas à
22
Ver, (Bento, 2003, Hall, 2000, 2001; Woodward, 2000; Silva, 2000; Strauss, 1999).
25
gastroplastia não fazem questão de esquecer seu passado recente 23, muito menos se importam de
revelarem que já foram obesas severas.
Foi constatado que, em nenhum caso, as entrevistadas procuram esconder que se
submeteram à gastroplastia e que um dia foram obesas severas. Muito pelo contrário, as novas
magras gostam de falar sobre o assunto e, principalmente, procuram passar adiante suas
experiências com a cirurgia. Como é o caso de Márcia, que faz questão de falar sobre todo o
processo porque passou para ser operada e também sobre a pós-cirurgia. Ela passou por uma
séria complicação – teve fístula24 – no início de seu pós-operatório.
Eu conto pra todo mundo, falo com todo mundo, porque eu tive fístula e eu não
tenho vergonha de falar pra ninguém que eu fiz. Eu acho bom para as pessoas
saberem que hoje a gente tem essa possibilidade, que a medicina tá bem
evoluída. (Márcia)
Muito longe de esconderem seus passados, em torno dessas mulheres operadas cria-se,
de certa forma, toda uma rede de troca de experiências. As pós-operadas fazem questão de
darem todas as informações sobre a cirurgia, tanto em palestras dirigidas pelo SICO quanto na
rua mesmo, principalmente quando se trata de obesos severos. Podemos ver um bom exemplo
desse argumento num trecho da entrevista de Hanna:
Eu nunca falo pra ninguém: “Faça a cirurgia”. Geralmente, as pessoas até
brincam que aqui em casa é consultório. As pessoas me ligam, uma conta pra
outra e as pessoas me ligam, eu dou total liberdade para as pessoas me ligarem.
Eu falo da minha experiência, o que eu passei, como foi pra mim, mas eu não
falo pra ninguém: “Vai, opera!”. Eu acho que isso é muito pessoal. (Hanna)
Portanto, constato que é fato que a mudança na identificação social dessas mulheres após
o emagrecimento ocorre. Isso é evidenciado simplesmente porque há uma alteração no
tratamento dispensado a essas novas magras em suas interações sociais. Como podemos ver nas
seguintes entrevistadas:
Pessoas que não conversavam com você no elevador, vizinhos, agora, puxam
assunto. Talvez [o fato de ter emagrecido], é até uma forma de se abrir um
diálogo. (Mirela)
23
Destaco “passado recente” pelo fato de que essa constatação refere-se às circunstâncias que envolveram o
trabalho de campo, ou seja, o tempo de operação das mulheres selecionadas para as entrevistas girou em torno de
um ano de pós-operatório. Sendo assim, não posso fazer essa afirmação para indivíduos com muito mais tempo que
já foram operados.
24
Comunicação anormal de duas estruturas ou de dois órgãos.
26
Eu lido com o público, então, é um outro tratamento que você recebe. Parece
que quando a gente emagrece, a gente é até mais respeitado. (Hanna)
O processo de reconstrução identitária, cujas conseqüências produzem uma nova
identidade social sem a presença do excesso de gordura, proporcionada pelo emagrecimento e
pela aquisição de um novo corpo que se enquadra nos padrões estabelecidos pela sociedade, não
se concretiza somente por meio do tratamento vinculado à cirurgia de redução de estômago, pois
é bom salientar que há outros tipos tratamentos que podem também acarretar esse
emagrecimento e, conseqüentemente, essa reconstrução identitária. A gastroplastia foi o meio
que escolhi para tratar desse assunto.
Considerações Finais
Na atualidade, o foco para a adequação a um padrão de estética corporal ainda tem um
direcionamento muito mais visado nas mulheres. Os modelos de beleza propagados como os
mais bonitos reforçam ainda mais um padrão dado como obrigatório. Nesse contexto, qualquer
indício de excesso de gordura (estrias, celulites, flacidez, varizes, etc.) é amplamente
condenável, o que tem como conseqüência, por exemplo, o grande número de mulheres com
problemas como bulimia e anorexia nervosa.
Esse enfoque e essa importância dispensados aos atributos corporais têm conseqüências
diretas para o convívio em sociedade, principalmente no que concerne à construção e
reconstrução de identidades sociais. Na realidade da vida cotidiana, o corpo é o primeiro a se
impor num contexto de interação social, de modo que ele aparece como um importante fator na
busca por adequação numa sociedade que propaga ansiedades estéticas e cria estereótipos
identitários negativos com os quais os indivíduos são identificados e categorizados socialmente.
A percepção que permeia o relato das entrevistadas é o de terem sido por muito tempo
consideradas como referências para os outros indivíduos, que literalmente costumavam apontálas. Freqüentemente precisavam controlar suas ações em público, deixavam de sair ou de fazer
determinadas coisas por causa da reação dos outros à sua gordura, e muitas praticamente
deixavam de viver por estarem dependentes dos tratamentos sem resultados duradouros.
Algumas entrevistadas tinham uma visão totalmente preconceituosa da própria imagem
corporal, já que internalizaram o olhar do opressor. Muitas delas se sentiam feias e pensavam
que os outros também tinham esse pensamento, o que confirma o que vemos nos meios de
comunicação, ou seja, um preconceito estereotipado da figura de mulheres gordas relacionado à
feiúra, em contraste com mulheres magras, consideradas belas.
27
E após o emagrecimento proporcionado pela cirurgia de redução de estômago?
Constatou-se nas entrevistas que a vontade de emagrecer em definitivo, por motivações
estéticas, é bem maior do que a relacionada ao medo de adquirem doenças por causa da
obesidade severa. Para as entrevistadas, muito mais do que apenas se livrarem de um peso que
carregavam, uma das principais conseqüências positivas do emagrecimento via gastroplastia é
poderem usufruir de determinadas coisas que, em seus entendimentos, somente pessoas mais
magras podem. O fato de comprarem roupas, sem precisarem ir a lojas especializadas para
obesos, é algo muito importante para elas. O medo de quebrarem uma cadeira desaparece, o
medo de serem identificadas e avaliadas de forma negativa também se dilui.
Tenho, porém, consciência de que no estudo desse objeto, há outros desdobramentos que
poderiam se enfatizados, principalmente no que se refere à questão de gênero, uma vez que há
uma distinção na forma como homens e mulheres concebem as representações sociais para os
inúmeros atributos corporais. Com certeza, agregando num só estudo empírico os discursos de
homens e mulheres que se submeteram a essa cirurgia poderiam ocorrer novas percepções e
outras características importantes com relação à forma como se dá a reconstrução identitária
poderiam emergir. Não só com relação a uma perspectiva de gênero, mas outros tantos estudos
comparativos poderiam vir a ser realizados, como por exemplo, entre indivíduos de diferentes
níveis sócio-econômicos, de diversos graus de instrução, etc.
Seria interessante retornar a entrevistar essas mulheres daqui a alguns anos,
considerando que nessa pesquisa as mulheres entrevistadas tinham um tempo médio de um ano
de pós-operatório. E com relação à auto-representação dessas mulheres após um período mais
longo de pós-operatório? Talvez elas percebessem que o emagrecimento via gastroplastia não é
aquela varinha de condão que acaba de uma vez com todos os seus problemas. Talvez elas
passassem a compreender que somente um corpo magro não é garantia de aceitação social, mas
que muitos outros atributos corporais são apontados e avaliados negativamente pelos outros e,
quem sabe, a obesidade severa não era o maior problema que tinham em suas vidas.
Essa pesquisa me fez pensar a partir de uma outra perspectiva sobre os significados de
certos fenômenos que antes passavam despercebidos, assim como passam para a maioria das
pessoas. Agora, relembrando o caso de minha amiga Paula, mencionada na introdução desse
trabalho, consigo perceber claramente em seu processo de emagrecimento que, quanto mais ela
se aproximava de um padrão de corpo magro aceitável socialmente, mais sua identificação
social ia se alterando. Lembro-me que os elogios em relação ao seu novo corpo iam
aumentando no mesmo passo em que perdia peso e também recordo que ela já estava sendo
28
colocada, tomando como base as falas de nossos alunos em comum, em uma outra categoria,
ou seja, da categoria gorda para magra.
Como a Paula parou o tratamento e voltou a engordar novamente, infelizmente constato
que essa transição em seu processo de reconstrução identitária foi interrompida. Digo
infelizmente, porque vejo novamente minha amiga sendo vítima de preconceito e
discriminação somente pelo fato de ter um corpo que difere muito dos padrões ideais de
estética. Mas ela não se submeteu à gastroplastia. O que aconteceria com sua autorepresentação caso se submetesse a essa cirurgia? Provavelmente o mesmo que me relataram
Daniela, Diene, Fabiana, Hanna, Júnia, Márcia, Mirela e Simone: uma reconstrução identitária
que as coloca em outras categorias que não a das gordas.
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