As Moléculas do sexto sentido - Ciência Viva na Imprensa Regional

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AS MOLÉCULAS DO SEXTO SENTIDO
Em ciência, são necessários pequenos passos para chegar a grandes descobertas. Para um
observador, esses pequenos passos parecem por vezes não fazer sentido ou mesmo serem um
desperdício de tempo e dinheiro dos contribuintes. É o caso de muitos dos estudos feitos com
animais não humanos. Mas estes estudos têm, muitas vezes, implicações para o conhecimento
acerca da nossa espécie. Este é um exemplo.
Existe um sexto sentido, o vomerolfato, que, como o olfato, deteta estímulos químicos presentes no
meio ambiente. Este tem um papel na nossa biologia, ao intervir na exploração que fazemos do meio
e, particularmente, na seleção sexual. Recentemente, deu-se mais um grande passo para entender
melhor como funciona este sentido. Como modelo de estudo, os cientistas usaram o ratinho. Já se
conheciam dezenas de possíveis recetores nervosos para feromonas neste animal, localizados no
órgão vomeronasal. Este órgão envia a informação detetada ao cérebro, de modo a que o animal
possa “decidir” o que fazer perante um odor: Fugir? Aproximar-se?
Não se sabia a que sinais químicos respondiam cada um desses recetores e foram estes novos
resultados, fruto de 15 anos de investigação, que foram publicados pela equipa de Catherine Dulac
(Universidade de Harvard) na prestigiosa revista Nature (2011, 478: 241-245). Neste trabalho, a
equipa marcou os neurónios dos ratinhos com um composto que muda de cor quando os recetores
desse neurónio são ativados. Ao apresentar o animal com vários compostos diferentes provenientes
de potenciais parceiros, competidores ou predadores, puderam fazer um mapa dos recetores
específicos (que reagiam mudando de cor).
Surpreendentemente, para além de haver recetores para odores de outros ratinhos (o que seria de
esperar porque os odores são muito importantes para o seu comportamento reprodutivo), os
cientistas descobriram que havia também muitos e variados recetores para odores provenientes de
outras espécies. Quer isto dizer que, para além da reprodução, para o ratinho é muito importante
saber “quem anda por ali”. Afinal de contas, eles são presa de muitas espécies de predadores bem
diferentes (répteis, aves de rapina, mamíferos, etc.) e a sua deteção é bem importante para a
sobrevivência.
E que mais implicações tem então esta descoberta? Ora, com este trabalho, ficamos a perceber
melhor como funciona o reconhecimento social ao nível do cérebro e abrem-se novas portas ao
conhecimento, a nível molecular e não só, de como os animais (mamíferos, neste caso) reagem aos
estímulos olfativos que os rodeiam. Para além disso, ao sabermos como é que os ratinhos
interpretam estes odores, abrem-se também pistas e caminhos para perceber algumas doenças
humanas relacionadas com o reconhecimento social, como o autismo ou a esquizofrenia, uma vez
que processos nervosos semelhantes dão-se também no nosso cérebro. Por outro lado, no futuro,
estes investigadores esperam também poder separar os processos de reconhecimento que são
inatos e os que são aprendidos pelo animal ao longo da vida.
Diana Barbosa
7-01-2012
Referência:
Isogai, Y., Si, S., Pont-Lezica, L., Tan, T., Kapoor, V., Murthy, V. N., Dulac, C. (2011) Molecular
organization of vomeronasal chemoreception. Nature 478: 241-245.
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