ISSN 2317-3297 Uma nota sobre a caracterização de grafos de intervalos próprios de Mertzios Jorge E. C. Walder∗, Sheila M. Almeida, Câmpus de Ponta Porã, UFMS 79907-414, Ponta Porã, MS E-mail: [email protected], [email protected] Palavras-chave: grafos de intervalos próprios, caracterização, representação de grafos Resumo: Em [4] é apresentado um algoritmo que, dada uma representação de um grafo através de uma famı́lia de intervalos quaisquer, constrói uma representação com a qual se pode reconhecer um grafo de intervalos próprios. Segundo o autor, quando a famı́lia de intervalos dada na entrada representa um grafo de intervalos próprios, a saı́da é uma representação por intervalos em que nenhum intervalo contém propriamente um outro. Neste trabalho, mostramos uma representação por intervalos de um grafo de intervalos próprios que, dada como entrada do algoritmo, resulta em uma representação por intervalos onde um intervalo contém propriamente outro. Provamos que, nesse caso, a representação resultante pode ser convertida em uma representação em que nenhum intervalo contém propriamente outro, garantindo a caracterização apresentada em [4]. 1 Introdução Um conjunto C qualquer contém propriamente um outro conjunto C 0 se, e somente se, C contém C 0 e C \ C 0 6= ∅. Essa definição se aplica a intervalos da reta real, de forma que um intervalo [a, b] contém propriamente outro intervalo [c, d] se, e somente se, a < c e b >= d ou a <= c e b > d. Um grafo G é um grafo de intervalos próprios se, e somente se, G pode ser representado por uma famı́lia F de intervalos da reta real, tal que cada vértice corresponde a um intervalo distinto de F, nenhum intervalo de F contém propriamente outro e dois vértices em G são adjacentes se, e somente se, os intervalos correspondentes tem interseção não-vazia. Os grafos de intervalos próprios possuem diversas caracterizações. As mais comuns são a de possuirem uma representação pela interseção de intervalos de tamanho unitário [5] e a de possuirem uma ordem dos vértices em que vértices da mesma clique maximal são consecutivos [5]. Esta classe de grafos tem sido bastante estudada [1, 2, 3, 4]. Em [4], Mertzios apresenta um algoritmo que, dada uma representação de um grafo G através da interseção de intervalos da reta real, gera uma nova representação por intervalos para o grafo G que satisfaz as propriedades apresentadas na Definição 1.1. Definição 1.1 [4] Uma representação de n intervalos é chamada Representação por Intervalos Normal (RIN), se todos os intervalos são da forma [i, j), 0 ≤ i < j ≤ n, e exatamente um intervalo começa em i, para todo i ∈ {0, 1, ..., n − 1}. Usando a RIN resultante da execução do algoritmo, o autor garante que, se a representação por intervalos dada na entrada corresponder a um grafo de intervalos próprios, então a representação resultante desse algoritmo é uma RIN em Escada, definida a seguir. ∗ Bolsista PET-Fronteira 329 ISSN 2317-3297 Definição 1.2 [4] Uma RIN é uma Representação por Intervalos Normal em Escada (RINE) se, para todo par de intervalos [a, b) e [c, d) em que a < c, tem-se b ≤ d. Para caracterizar os grafos de intervalos próprios usando sua RIN, Mertzios prova que quando a representação por intervalos dada na entrada do algoritmo representa um grafo de intervalos próprios, a saı́da do algoritmo é uma RINE [4]. Para garantir que obter uma RINE na saı́da do algoritmo é condição suficiente para que o grafo seja de intervalos próprios, Mertzios diz que uma RINE é, claramente, uma representação através de interseções de uma famı́lia de intervalos em que nenhum intervalo contém propriamente outro. Neste trabalho, apresentamos um contraexemplo para essa afirmação e provamos que, ainda assim, a existência da RINE é condição suficiente para garantir que o grafo representado pela mesma é um grafo de intervalos próprios. 2 Algoritmo de Mertzios Mertzios [4] apresentou o algoritmo a seguir que, dada uma representação por intervalos, gera uma RIN onde são preservadas as relações de interseção da famı́lia de intervalos dada na entrada do algoritmo. Algoritmo 1 RINE (G) entrada: uma famı́lia com n intervalos da reta real. 1. Suponha que alguns intervalos tenham exatamente um ponto x ∈ R em comum. Considere 2 > x, o próximo maior ponto onde algum intervalo começa. Considere também 1 < x, o próximo menor ponto onde algum intervalo termina. Substitua todo intervalo [a, x] pelo intervalo [a, (x + 2 )/2] e todo intervalo [x, b] pelo intervalo [(x + 1 )/2, b]. Repita esse passo enquanto possı́vel. 2. Substitua todo intervalo [a, b] pelo intervalo [a, b). 3. Suponha que exatos l > 1 intervalos começam no mesmo ponto a e o próximo maior ponto onde algum intervalo começa ou termina é o ponto b > a. Mova a extremidade esquerda do i-ésimo intervalo dos l intervalos do ponto a para o ponto a + (i − 1)(b − a)/l. Repita esse passo enquanto possı́vel. 4. Suponha que as extremidades esquerdas dos n intervalos são os pontos a1 ≤ a2 ≤ ... ≤ an . Substitua todo intervalo da forma [aj , b), onde j ≤ i e ai < b < ai+1 , pelo intervalo [aj , ai+1 ). Substitua também todo intervalo da forma [aj , b) com b ≥ an pelo intervalo [aj , an + 1). 5. Seja pi um ponto onde pelo menos um intervalo começa ou termina, 0 ≤ i ≤ n. Suponha que tais pontos estão ordenados: p0 < p1 < ... < pn . Substitua o intervalo [pi , pj ) pelo intervalo [i, j), 0 ≤ i, j ≤ n. 3 Caracterização dos Grafos de Intervalos Próprios A Figura 1 apresenta um caso em que a famı́lia de intervalos dada na entrada do Algoritmo 1 corresponde a um grafo de intervalos próprios e a RINE resultante é uma famı́lia de intervalos em que o intervalo b contém propriamente o intervalo c e que o intervalo e contém propriamente os intervalos f e g ao fim da execução, contradizendo a afirmação de Mertzios [4]. Com o lema a seguir mostramos que qualquer RINE pode ser transformada em uma representação através de interseções de uma famı́lia de intervalos em que nenhum intervalo contém propriamente outro, preservando-se as interseções entre quaisquer dois intervalos. Logo, toda RINE representa um grafo de intervalos próprios. 330 ISSN 2317-3297 Saída: Entrada: 3 2 1 4 5 7 6 d a b c 8 9 10 11 f e R 0 2 1 3 6 5 4 a 7 e R b g f c d g Figura 1: Famı́lia de intervalos dada na entrada do Algoritmo 1 e a saı́da após a execução do algoritmo. Lema 3.1 Se R é uma RINE, então existe uma representação por intervalos P , tal que cada intervalo de R corresponde a um intervalo distinto de P e dois intervalos pertencentes a R têm interseção não-vazia se, e somente se, os intervalos correspondentes em P têm interseção não-vazia. Além disso, nenhum intervalo em P contém propriamente outro intervalo de P . Demonstração: Considere uma RINE, R, e suponha que não existam dois ou mais intervalos de R que terminem em um mesmo ponto. Neste caso, faça P = R. Logo, P é uma RINE. Pela Definição 1.2 e, como não existem dois intervalos de P que terminam em um mesmo ponto, para dois intervalos [a, b) e [c, d) em P , se a < c então b < d e, portanto, P é uma representação em que nenhum intervalo contém propriamente outro. Seja D o conjunto dos intervalos de R que não terminam no mesmo ponto que nenhum outro intervalo de R. Inclua os intervalos pertencentes a D em P . Suponha que existam exatos l > 1 intervalos em R \ D que terminam em um mesmo ponto a e seja L, o conjunto desses intervalos. Considere que os intervalos de L estão em ordem crescente dos seus pontos iniciais: l1 < l2 < l3 < . . . < ll . Para 1 ≤ i ≤ l, insira em P o intervalo [li , a − 1 + i/l). Se dois intervalos não têm interseção em R, então seus correspondentes não terão interseção em P , pois os intervalos em P são exatamente os mesmos ou menores. Se dois intervalos têm interseção nãovazia em R, então seus correspondentes têm interseção não-vazia em P , pois para cada intervalo [li , a) ∈ L, tem-se li ≤ a − 1. Como a extremidade direita de qualquer intervalo pertencente a L ∩ P é extritamente maior que a − 1, quaisquer dois intervalos com interseção entre os ponto a − 1 e a na representação R correspondem a intervalos com interseção no ponto a − 1 em P . O resultado que apresentamos torna válido o Teorema de Mertzios, que caracteriza os grafos de intervalos próprios. Teorema 3.2 [4] G é um grafo de intervalos próprios se, e somente se, G tem uma Representação por Intervalos Normal em Escada. Referências [1] D. G. Corneil, H. Kim, S. Natarajan, S. Olariu, and A. P Sorague. Simple linear time recognition of unit interval graphs. Information Processing Letters, 55:99–104, 1995. [2] C. M. H. Figueiredo, J. Meidanis, and C. P. de Mello. A linear-time algorithm for proper interval graph recognition. Information Processing Letters, 56(3):179 – 184, 1995. [3] F. Gardi. The roberts characterization of proper and unit interval graphs. Discrete Mathematics, 307:2906–2908, 2007. [4] G. B. Mertzios. A matrix characterization of interval and proper interval graphs. Applied Mathematics Letters, 21:332–337, 2008. [5] F. S. Roberts. On the compatibility between a graph and a simple order. J. Comb. Theory, 11:28–38, 1971. 331