CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS VÍRUS Profa. Dra. Dolores U. Mehnert 1. Histórico 1876 - A. Mayer - agente do mosaico do tabaco não é bacteria e não é fungo. 1892 - D. Ivanosky - demonstrou a transmissibilidade da doença do mosaico 1898 - M. Beijerinck - denominou o agente do mosaico de fluído vivo contagioso ou vírus - Loeffler e Frosch - demonstraram a transmissibilidade da febre aftosa 1915/1917 - Twort (Inglaterra) e D’Herelle (França) observaram a ação de vírus bacteriófagos em culturas bacterianas. 1940 - Invenção do microscópio eletrônico - permitiu a visualização dos vírus 2. Definição 3. Hospedeiros: animais, vegetais, fungos e bactérias 4. Dimensões - variam de 10 nm a 300 nm 5. Formas - arredondada ou icosaédrica ex.: vírus da poliomielite, rotavírus, adenovírus paralelepípedo ex.: vírus da vaccínia, vírus da varíola projétil ex.: vírus da raiva helicoidal ex.: vírus do sarampo, vírus da gripe 6. Estrutura e composição química Genoma - localização central; ácido nucléico (DNA fita dupla/simples ou RNA fita dupla/simples) Capsídeo - capa protéica com simetrias : icosaédrica ex.: vírus da poliomielite helicoidal ex.: vírus do sarampo complexa ex.: vírus da vaccínia Envelope - envoltório mais externo, nem sempre presente, composto por lipídeos e proteínas 7. Inativação por agentes físicos e químicos: calor, radiação, detergentes, compostos clorados, fenólicos, drogas anti-virais. Vírus nú Vírus com envoltório Adaptado de Leland, D.S. – Clinica Virology, W.S.Saunders Co., 1995 Vírus no ambiente aquático e o impacto da poluição por água de esgoto Profa. Dra. Dolores U. Mehnert Departamento de Microbiologia – ICB/USP Estudos tem revelado que o ambiente marinho apresenta uma grande diversidade de vírus e um número em torno de 104 a 108 partículas por ml de água (BERGH et al., 1998). Estes vírus infectam em sua maioria células procarióticas (MURRAY & JACKSON, 1992), mas componentes do fitoplâncton e do microzooplâncton também são infectados (STEWART & AZAM, 2000) contribuindo sobremodo para uma agilização do turn-over de nutrientes como carbono, fósforo, nitrogênio e íons ferro na cadeia alimentar (WILHEM & SUTTLE, 2000). A poluição das águas por lançamentos de esgotos domésticos e/ou industriais sem tratamento provavelmente interfere neste processo de reciclagem. Substâncias poluentes como hidrocarbonetos aromáticos (naftalenos, pirenos, fenantrenos), pesticidas (DDD, BHC, DDT) e PCBs (bifenilos policlorados) induzem um aumento na população de vírus no ambiente, decorrente da ativação de prófagos existentes em grande parte das bactérias presentes no ambiente aquático (PAUL et al., 2000). A contaminação de águas doces ou marinhas por lançamentos de águas de esgoto tem contribuído também para a ocorrência de epidemias de diarréia e hepatite A na população humana em diversos países. A escassez de água doce já é uma ameaça atual, por isso o uso racional da água e principalmente o seu reuso se farão obrigatórios em futuro bem próximo. Vírus entéricos, como por exemplo vírus da poliomielite, rotavírus, vírus da hepatite tipo A e alguns tipos de adenovírus, são excretados nas fezes e na urina em grandes quantidades por indivíduos infectados e são frequentemente encontrados em águas contaminadas por lançamentos de esgoto. Uma vez ingeridos juntamente com a água ou alimentos irrigados ou cultivados nestas águas, podem vir a causar doença. Estudos tem demonstrado que, apesar das pequenas quantidades de vírus existentes nas águas de córregos, de esgoto e de abastecimento público (MEHNERT & STEWIEN, 1993), uma unidade infectante de vírus é suficiente para infectar um hospedeiro susceptível (GRAHAN et al., 1987). A qualidade da água sempre foi avaliada utilizando bactérias do grupo dos coliformes como indicadores biológicos. Entretanto, nos últimos anos com o avanço dos métodos de estudo em Virologia e, principalmente, com a introdução de métodos moleculares para fins de detecção e identificação viral, pesquisadores tem proposto uma reavaliação do uso destes indicadores biológicos (PINA et al., 1998). Este fato é justificado pela maior labilidade das bactérias frente aos fatôres ambientais e processos de tratamento de água do que os vírus (PAYMENT et al., 1985; ENRIQUEZ, 1995). Assim sendo, alguns aspectos favorecem a inclusão dos vírus como indicadores biológicos da qualidade da água como: boa resistência aos fatôres ambientais e aos métodos de tratamento de água, inclusive cloração; alguns tipos de vírus circulam no meio ambiente o ano todo; estão presentes em quantidades detectáveis; não guardam nenhuma correlação em termos quantitativos com os atuais indicadores (coliformes fecais). De todos os fatôres mencionados, o quarto é o mais forte indício de que uma água livre ou com baixíssima contagem de coliformes jamais poderá ser considerada livre de vírus. Estudos comparando os números de Enterovírus (STEWIEN, 1979) e de rotavírus (MEHNERT, 1989) com os de coliformes fecais mostraram que não há uma correlação entre estes agentes nas amostras de água de esgoto e córrego examinadas. Os estudos nesta área da Virologia Ambiental ainda são muito restritos, pois exigem a análise de amostras volumosas, que necessitam a aplicação de métodos de concentração eficientes e de métodos de detecção sensíveis, muitas vezes onerosos e de complexa implantação. Contudo, a aplicação das metodologias existentes possibilitará não só avaliar a qualidade da água a ser reutilizada pela população, mas conhecer a circulação dos vírus patogênicos humanos mais importantes em nosso país. Além disso, uma avaliação adequada da qualidade da água a ser devolvida ao meio ambiente, quanto aos parâmetros físico-químicos, parasitológicos, bacteriológicos e virológicos é fundamental para re-estabelecer o equilíbrio na Natureza e consequentemente a qualidade de vida da população. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BERGH, O. et al. High abundances of viruses found in aquatic environments. Nature 340: 467-468, 1987 ENRIQUEZ, C.E., HURST, C.J.; GERBA, C.P. 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No Brasil, diversos estudos têm enfatizado o lado positivo desta opção (ANDREOLI et al., 1999; VALIM et al., 1999; ANDREOLI et al., 2000; COSTA et al.,2001; SILVA, 2001). Entretanto, a aplicação do lodo proveniente das ETEs, sem tratamento preliminar adequado, representa um risco à Saúde Pública, pois pode levar à contaminação de águas subterrâneas, solos e grãos com patógenos, metais pesados, nitrato e compostos orgânicos tóxicos e carcinogênicos (SCHWARTZBROD & MATHIEU, 1986; SCHWARTZBROD, 1995; BITTON, 1997d). Os lodos provenientes de ETEs possuem, comprovadamente, inúmeros microrganismos patogênicos, cuja variedade dependerá das condições socioeconômicas e epidemiológicas das diferentes comunidades (RÉNDON et al., 2002). RÉNDON et al. (2002) realizaram uma avaliação microbiológica em lodo no México e detectaram colifagos, coliformes fecais, Salmonella typhi, Pseudomonas aeruginosa, cistos de protozoários e ovos de helmintos em números bastante superiores aos níveis relatados na bibliografia internacional. A exposição dos seres humanos e animais aos patógenos presentes no lodo pode ser por contato direto, ao manipular ou caminhar na área com lodo, ou indireto, através da ingestão de grãos cultivados nessas áreas ou de produtos de animais que pastam em pastos tratados com lodo (BITTON, 1997d). Dentre os patógenos presentes no lodo, destacam-se os vírus entéricos humanos, que não são necessariamente inativados após o tratamento de efluentes (RAO & MELNICK, 1986b). No tratamento de efluentes, qualquer procedimento de sedimentação resulta na remoção de um grande número de vírus do efluente para o lodo devido à adsorção às partículas sólidas e capacidade de se agregarem espontaneamente, em estruturas pseudocristalinas que não são rompidas espontaneamente, razão pela qual os vírus são altamente resistentes a agentes desinfetantes ou à pressão da seleção ambiental (RAO & MELNICK, 1986c; WARD, 1987; FARRAH, 1987; SCHWARTZBROD, 1995; GERBA, 2000). Apesar dos indicadores bacterianos como coliformes fecais e estreptococos serem tradicionalmente considerados como indicadores de contaminação ambiental, eles não são indicadores satisfatórios do conteúdo de vírus e da eficiência dos tratamentos de desinfecção na eliminação de vírus entéricos (SCHWARTZBROD, 1995; MEHNERT & STEWIEN, 1993). Há quase 150 tipos de vírus entéricos humanos conhecidos que entram no corpo humano pela via oral, multiplicam-se no trato gastrintestinal e são excretados em grande número nas fezes dos indivíduos infectados (portadores sintomáticos ou não), atingindo números em torno de 10 8 a 1011 partículas por grama de fezes. A presença de vírus no lodo está diretamente relacionada aos vírus presentes no efluente doméstico, que, por sua vez, dependerá dos vírus que estão sendo excretados pela população no momento. A epidemiologia dos vírus entéricos humanos é influenciada pelo nível de higiene e saneamento ambiental no ambiente, pois há explosão de surtos em populações que ingerem água ou alimentos contaminados com efluente doméstico (RAO & MELNICK, 1986b; ABAD et al., 1994; SCHWARTZBROD, 1995; ABBASZADEGAN et al., 1999). No caso da cidade de São Paulo, diversos tipos de vírus entéricos foram detectados nas águas de córrego e de esgoto da cidade de São Paulo, como vírus pertencentes ao gênero Enterovirus, adenovírus humanos, vírus da Hepatite A e rotavírus (CHRISTOVÃO et al., 1967, MARQUES, 1987; MEHNERT & STEWIEN, 1993; MEHNERT et al.,1997; QUEIROZ, 1999; SASSAROLI, 2002; PAULI, 2003; SANTOS, 2002). Estes vírus poderão estar presentes no lodo tratado, ainda infecciosos. Assim, o lodo proveniente das ETEs pode ser uma fonte de contaminação ao meio ambiente e aos seres humanos quando é introduzido como fertilizante na agricultura sem nenhum tratamento, razão pela qual é de extrema importância a realização de estudos que visem a detecção, quantificação e distribuição de vírus que circulam no meio ambiente (ABBASZADEGAN et al., 1999). STRAUB et al (1995) realizaram estudos durante 7 anos em uma fazenda, cujo solo foi irrigado com lodo digerido anaerobicamente. Os pesquisadores detectaram partículas virais em 21 das 24 amostras examinadas por PCR e demonstraram um transporte significativo de vírus no solo tanto horizontal quanto verticalmente. A manutenção da viabilidade das partículas virais no solo depende principalmente do tipo de solo, nível de umidade e temperatura. Os vírus entéricos presentes no solo como resultado da pulverização ou irrigação migram para estratos mais profundos do solo, podendo atingir a água subterrânea como resultado do sucessivo fenômeno de adsorção-desorção, dependentes dos tipos de vírus presentes, as características do solo e precipitação pluviométrica. Os fatores que mais controlam o transporte de vírus no solo são: tipo de solo, tipo do vírus, comprimento iônico da solução do solo, pH, compostos orgânicos solúveis presentes nos efluentes e taxa hidráulica de escoamento (SCHWARTZBROD, 1995). O vírus de Norwalk, rotavírus e os adenovírus estão entre os principais agentes etiológicos dos casos de gastrenterite e diarréia aguda em crianças e são transmitidos, mesmo em um baixo número, pela via fecal-oral. A veiculação destes agentes é mundialmente associada à origem hídrica pela ingestão de água e de alimentos contaminados. A gastrenterite viral é causa de óbito de 5 a 10 milhões de pessoas por ano no mundo devido à diarréia intensa, associada ou não a febre e vômitos, que pode levar crianças a uma grave desidratação (UHNOO et al., 1984; HUDSON et al., 2004). O vírus de Norwalk atualmente é o principal agente responsável por surtos de gastrenterites virais agudas e diarréia esporádica em comunidades no mundo.É um vírus altamente debilitante que causa surtos repentinos de gastrenterite. Altamente infectivo e estável, é mais resistente às técnicas de desinfecção que a maioria das bactérias e outros agentes virais, tais como níveis de cloro inferiores a 10 ppm, congelamento, aquecimento a 60°C. Também podem persistir no meio ambiente, sendo proposto que podem circular no ambiente em pequeno número em uma população até que um indivíduo infectado contamine uma fonte comum de água ou alimento, resultando em um surto explosivo (DOLIN et al., 1972; FANKHAUSER et al., 1998; ROPER et al, 1990; GRAHAM et al., 1994; HUDSON et al., 2004). A detecção deste agente em amostras ambientais, apesar de possível, é ainda bastante onerosa. Os adenovírus, mais especificamente os sorotipos HAdV40 e HAdV41, pertencentes à espécie F (UHNOO et al., 1984; ALLARD et al., 1990; HÁRSI et al., 1995) são os patógenos que ocupam o terceiro lugar em termos de importância no estabelecimento de diarréia em nosso país. Os adenovírus também causam infecções persistentes caracterizadas pela excreção fecal prolongada e intermitente. Aproximadamente metade das crianças menores de 5 anos de idade infectadas com adenovírus tipos HAdV1, HAdV2, HAdV3 ou HAdV5 excretam vírus nas fezes por períodos longos (ALLARD et al., 1992). Há 51 sorotipos de adenovírus conhecidos que são divididos em 6 subgêneros (A a F) baseado na homologia de DNA e propriedades biológicas e bioquímicas (BENKÔ, 1999). Dos 51 sorotipos, são associados a gastroenterite infantil: HAdV1, HAdV7, HAdV12, HAdV28, HAdV31, HAdV40 e HAdV41, dos quais HAdV40 e HAdV41 possuem uma estabilidade a ação de agentes físicos e químicos, possibilitando uma permanência prolongada no meio ambiente.Também se apresentam resistentes a fase inicial em tratamentos de esgoto, facilitando, portanto, a contaminação da população por estes agentes virais (ENRIQUEZ, 1995). A detecção destes agentes em amostras ambientais é possível e pouco onerosa (SANTOS et al., 2004). O vírus da Hepatite A tem grande importância devido ao alto número de surtos no mundo. Estima-se que a incidência mundial seja superior a 1,4 milhões de casos ao ano, com uma maior incidência em jovens e adultos com mais de 50 anos. Sua infecção ocorre pela via fecal-oral, pela ingestão de material contaminado; cerca de 50% dos casos são subclínicos, com isso os indivíduos não procuram tratamento, mas liberam os vírus nas fezes, contaminando o meio ambiente. A excreção do vírus nas fezes do paciente ocorre em concentrações relativamente altas 2 a 3 semanas antes do estabelecimento de sintomas clínicos e 8 dias após estabelecimento da icterícia (HOLLINGER & TICEHURST, 1996; FAGAN & HARRISON, 2000). A detecção deste patógeno é possível, mas um pouco mais onerosa dadas suas características moleculares (SASSAROLI, 2002). A presença destes diversos tipos de vírus no lodo torna clara a necessidade de um tratamento do lodo produzido pelas estações de tratamento de efluentes para uma disposição adequada desse material. SCHWARTZBROD (1995) afirma que o método de tratamento de lodo que eliminará totalmente os vírus é o tratamento térmico. Apesar do tratamento por digestão anaeróbia e aeróbia ou a remoção de água reduzirem a população numérica de agentes patogênicos no lodo, um número significativo destes presentes no efluente doméstico bruto muitas vezes permanecem no lodo, pois eles são concentrados durante a sedimentação primária. Grandes organismos, como helmintos, são concentrados devido à sedimentação, enquanto os vírus adsorvem ao lodo (GERBA, 2000). A temperatura é um dos fatores mais críticos na compostagem e as elevadas temperaturas atingidas durante o processo são fundamentais para a alta taxa de decomposição, para destruição de coliformes e inativação de vírus. O sucesso da compostagem também depende da construção da leira e do nível de oxigênio (GERBA, 2000). METCALF et al. (1995) afirmam que os processos de tratamento de lodo, incluindo compostagem reduzem, mas não eliminam os vírus entéricos, que permanecem viáveis por um período superior a 30 dias de digestão a 50°C, período que pode ser superior no caso do vírus da hepatite A (HAV) por ser termoresistente. Assim sendo, sugerimos que a aplicação de lodo de ETE para fins agrícolas seja extremamente criteriosa, uma vez que os danos à saúde pública e, principalmente, ao meio ambiente poderão ocorrer, talvez até de forma irreversível para o país. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ABAD, F. X.; PINTÓ, R. M.; BOSCH, A. Survival of enteric viruses on environmental fomites. Appl Environ Microbiol, v. 60, p. 3704,3710, 1994. 2. ABBASZADEGAN, M.; STEWART, P.; LeCHEVALLIER, M.; A strategy for detection of viruses in groundwater by PCR. Appl Environ Microbiol, v. 65, p. 444-449, 1999. 3. 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