Pensamento do Dia Economistas analisam a Economia, o Brasil e o mundo, mundo, na mídia diária 17 02 2011 2011 ------------------------------------------------------------------Valor Econômico - 17/02/2011 Corte de R$ 50 bi tem que ser o "começo do começo" Felipe Salto e Samuel Pessoa O equilíbrio fiscal é peça central de uma política econômica que pretenda ampliar o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de forma perene, via expansão da formação bruta de capital fixo, tendo na redução dos juros reais o impulso central dessa estratégia. Esse é o modelo que impera no cerne do projeto do governo Dilma Rousseff. Por isso, o contingenciamento de R$ 50 bilhões anunciado soa como uma medida positiva, crível, que conduzirá a um superávit primário alinhado à meta fixada no orçamento. A situação é próxima à de 2003, porém, não tão grave. Há uma crise de credibilidade fiscal, que precisa ser revertida com a solidez que só a execução de um bom programa fiscal contém. Em 2003, o então presidente Lula e a Fazenda tiveram que adotar o discurso da responsabilidade fiscal, implementando um corte significativo de gastos, para compensar a queda de receitas no ano e evitar uma piora fiscal. Houve, entre 2002 e 2003, uma redução de 0,58 ponto percentual do PIB na despesa total do governo central, suficiente não apenas para compensar a redução de 0,42 ponto percentual do PIB nas receitas, como para elevar em 0,16 ponto percentual do PIB o superávit primário do governo central naquele período. Entre 2010 e 2011 deve ocorrer algo parecido, mas com a diferença de que, em função do crescimento econômico, as receitas ajudarão. Será possível produzir um ajuste de 0,42 ponto percentual do PIB na despesa, enquanto as receitas devem crescer 0,34 ponto percentual do PIB. Outra diferença é que, naquela oportunidade, boa parte da redução do gasto foi em salários em função da aceleração inflacionária, bem como em contenção do investimento, o que se identifica pela redução de 0,5 ponto percentual do PIB na rubrica investimentos, conforme desagregação feita no último balanço do PAC. Para 2011, prevemos redução mais uniforme nas diversas rubricas do gasto do governo central. Isto é, o superávit primário do governo central, em 2010, descontando-se a "contabilidade criativa", terá um aumento de 0,76 ponto percentual do PIB, de 1,24% para 2% do PIB. Esses valores já consideram a nova projeção de PIB do governo, de crescimento real de 5% em 2011. Em termos nominais, o governo central tem como meta R$ 81,1 bilhões e, junto a Estados e municípios, bem como a estatais, o setor público consolidado tem como meta R$ 117,9 bilhões (ou 2,9% do PIB), em 2011. É uma dinâmica fiscal parecida com a de 2002 e 2003, mas menos rígida, já que exigirá esforço menor do lado do gasto. Dos R$ 50 bilhões a serem contingenciados, em relação ao Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), aprovado pelo Congresso, R$ 18 bilhões referem-se a emendas parlamentares. Isto é, simplesmente será "cortado" o aumento em relação ao PLOA do Executivo no valor total equivalente a esse montante. Além disso, há espaço para cortes nas discricionárias, se supusermos constância do gasto real (deflacionado pelo IPCA) em relação ao orçamento disponível em 2010. Em outras palavras, haveria possibilidade de economia de R$ 13,9 bilhões em relação ao PLOA só com essa hipótese, considerando apenas as discricionárias de "educação", "saúde" e "demais". Além disso, se mantivermos, para os ministérios ligados à produção, a hipótese de um contingenciamento de 38% na parte das despesas discricionárias, teremos uma contenção de R$ 2,6 bilhões. Só com isso, já seria possível contingenciar R$ 34,5 bilhões. No entanto, há ainda as despesas com pessoal, que devem sofrer cortes, que poderiam somar algo entre R$ 5 bilhões e R$ 7 bilhões. Finalmente, a conta fecharia e até sobrariam possibilidades de contingenciamento, no cenário mais "otimista", sob a hipótese de que o governo cortará, sim, o PAC, ainda que não o tenha manifestado nesse anúncio. Na verdade, não haveria alteração do que ocorreu em anos anteriores, ou seja, a execução do PAC sistematicamente fica abaixo da dotação orçamentária. Se considerarmos que o governo executará em 2011 os mesmos 65% do valor previsto pela lei orçamentária anual (como em 2010), isso significa que o orçamento de R$ 43,6 bilhões do PAC poderá ser segurado na "boca do caixa", mês a mês, em até R$ 15,3 bilhões. Vale ressaltar que os gastos de R$ 15,3 bilhões com o PAC representariam um crescimento do total pago, em relação a 2010, de R$ 22,1 bilhões para R$ 28,3 bilhões, ante R$ 17,9 bilhões em 2009. Registre-se, entretanto, que o corte das emendas no total de R$ 18 bilhões provavelmente poderá conduzir a uma redução do orçamento total de investimentos, isto é, quando considerados não apenas os relativos ao PAC, visto que parte das emendas parlamentares é para investimento. Pode, portanto, haver alguma redução da execução do investimento total em relação a 2010. Com isso, os R$ 34,5 bilhões somam-se aos R$ 5 bilhões de pessoal e aos R$ 15,3 bilhões do PAC, totalizando uma possibilidade de "cortes" no orçamento de até R$ 54,8 bilhões. Sendo ainda mais conservador, pode-se excluir a quase totalidade dos cortes de pessoal e, ainda assim, com o controle do PAC, o contingenciamento atingiria os R$ 50 bilhões. O ajuste fiscal anunciado é factível. O corte é doloroso, mas possível, e levará ao cumprimento da meta fiscal cheia em 2011. E deve haver, sim, vontade política para realizá-lo, uma vez que, no presidencialismo, o governo precisa estar bem avaliado no final do mandato. Um forte ajuste fiscal, hoje, é condição necessária (embora não suficiente) para que Dilma termine o mandato de forma positiva. Evidentemente, salário mínimo mais baixo e o corte de gastos, em apenas um ano, não garantirão toda sorte de benesses (a possibilidade de redução de juros no topo dessa lista) para sempre. O anúncio foi um passo inicial, apenas, mas bastante positivo e suficiente para indicar que o cenário para 2011 tomou novo rumo. No entanto, fica a dúvida de qual será a forma que o Executivo adotará nos próximos anos para produzir primários suficientemente elevados que garantam simultaneamente a queda dos juros e a manutenção do contrato social, cujo item mais importante é a fórmula de reajuste do salário mínimo que elevará em muito a despesa já em 2012. Felipe Salto economista pela FGV-EESP e mestrando em Administração Pública e Governo pela FGV-EAESP, é analista da Tendências Consultoria. Samuel Pessoa Consultoria. doutor em economia pela USP, é sócio da Tendências ---------------------------------O Estado de S.Paulo -17/02/11 Trem-bala, trem doido Roberto Macedo Pode parecer estranho que este mineiro seja contrário ao projeto do Trem de Alta Velocidade (TAV) que ligaria Campinas ao Rio de Janeiro via São Paulo, porque sabidamente gostamos de trens. Contudo, esse TAV merece a execração de todos os que se empenham no uso de recursos públicos em projetos que econômica e socialmente se justifiquem. E que também não se conformam em ver um projeto deste alcance - e de nome também apropriado à ligeireza de seu preparo - que se quer empurrar goela abaixo da sociedade sem uma ampla e profunda discussão, provavelmente temida pelo governo pelo que traria de contraditório. Como economista, sou também alérgico a uma proposta que não passaria pelo exame de um curso de análise econômica e social de projetos, tamanhos os despautérios que apresenta. Em Portugal, 28 economistas de prestígio assinaram em 2009 manifesto contrário a projetos locais desse tipo. Na linguagem típica de seu país, e com fundamentos nessa análise, há um diagnóstico que vejo também aplicável ao Brasil. Assim, afirmam que "...estudos parcelares disponibilizados sobre a sua rentabilidade econômica e social (mesmo se baseados em pressupostos optimistas), mostram que sua contribuição previsível para a essência econômica do País é muito diminuta, e pode ser até amplamente negativa em termos de Rendimento Nacional. E tem elevados custos de oportunidade no que toca aos fundos públicos, aos apoios da União Europeia e aos financiamentos (dívida externa) da Banca Nacional e do Banco Europeu de Investimentos. ...Tais estudos também evidenciam que, pelo menos na primeira década de exploração, não haverá procura suficiente para a rentabilização econômica e social de tão pesados investimentos. Irão originar, por conseguinte, prejuízos de exploração significativos, a serem suportados pelo contribuinte." (www.static.publico.clix.pt/docs/economia/apelo_economistas.pdf). Transpondo essa avaliação para o projeto do TAV brasileiro, quanto aos fundos públicos eles serão imensos. Estima-se que o valor presente do custo para o erário seria, na hipótese mais otimista, de R$ 14 bilhões e, na mais pessimista, de R$ 36,4 bilhões. Ora, a própria discrepância desses números revela os enormes graus de incerteza e de risco que marcam o projeto, além de a experiência nacional mostrar que hipóteses pessimistas de custo são as mais atingidas, e frequentemente ultrapassadas. Quanto ao "custo de oportunidade", ou seja, relativamente a projetos alternativos, não é preciso muita ciência para perceber que nessa área de transportes os recursos previstos para o TAV poderiam encontrar retorno econômico e social muito maior. Em particular, se aplicados nas grandes cidades ao transporte de passageiros que nelas gastam várias horas se locomovendo no vaivém de casa para o trabalho, entre outros movimentos. Não há como resolver esse problema, que exige redes metroviárias entre outros vultosos investimentos, apenas com recursos estaduais e municipais. Supondo que o custo do TAV alcançasse perto de R$ 40 bilhões, isso daria para fazer 100 km de metrôs nessas cidades, a um custo estimado para São Paulo. Contudo, o governo federal, com os muito maiores recursos de que dispõe relativamente a esses outros entes federativos, deixa-os à míngua nessa área, e quer porque quer levar adiante esse TAV baseado em benefícios no plano das miragens. Quanto à Banca Nacional, no caso o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), prevê-se que este abriria suas torneiras de recursos e subsídios para o financiamento do TAV, a um custo de R$ 4,8 bilhões só no segundo item. E há mais subsídios, pois, para garantir a realização do leilão do TAV, o governo vem estimulando interessados, que não são bobos, por meio de garantia da demanda de passageiros, a um custo que poderá alcançar R$ 5 bilhões. Em contraponto ao projeto, no Brasil o economista que mais se tem destacado é Marcos Mendes, doutor em Economia pela USP e consultor legislativo do Senado. A última versão de sua importantíssima contribuição, da qual retiramos alguns dos números acima, pode ser consultada em www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_discussao/NOVOS%20TEXTOS/Texto82Marcos%20Mendes.pdf. Na mais recente cartada para atrair interessados na empreitada, o governo federal novamente forçou a barra e na aventura envolveu tanto os Correios como a Eletrobrás como participantes. O grande mistério do projeto é que forças o levam adiante em Brasília. Transparecem governantes megalomaníacos, políticos inescrupulosos, construtoras e investidores em alvoroço e traços de uma futura grande festa regada a doações para campanhas eleitorais. De estranhar também a atitude do tradicional lobby ecológico, estimulado também de fora para dentro do País, que se manifesta tão agressivamente contra novas hidrelétricas na Amazônia, mas tem praticamente ignorado o TAV, apesar dos enormes danos ambientais que traria à região de seu trânsito. Ele não admite passagens de nível, exige cercas fortificadas, muitas linhas retas e curvas de grande arco, atropelando assim o que viesse pela frente, como nascentes, córregos, rios, várzeas, mata nativa e tudo o mais. Tampouco as comunidades em torno do trajeto projetado acordaram para esses e outros danos, inclusive a possibilidade de sua divisão em partes. E mais: com o projeto e seu leilão para abril retomando velocidade, o TAV já segue na contramão fiscal mesmo antes de ser construído. A atitude do governo, que hoje se diz seriamente empenhado em ajustar suas contas a uma grave realidade, inclusive no plano da inflação, não condiz com seu renovado empenho no projeto. Sua tarefa hoje é recuperar a confiança da sociedade na sua política econômica, o que é indispensável à eficácia dela e que um trem doido como esse só pode atrapalhar. ECONOMISTA (UFMG, USP E HARVARD), PROFESSOR ASSOCIADO À FAAP E VICE-PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO COMERCIAL DE SÃO PAULO. -------------------------------------- O Estado de S.Paulo – 17/02/2011 Comida ou biocombustível Celso Ming Na sua edição de ontem, o New York Times publicou matéria com este título: “Precisamos de proteína, não de biocombustíveis” (We Need Protein, Not Biofuels). A escalada dos preços da comida está aumentando a fervura política. O Banco Mundial já avisou que a escassez de alimentos empurrou 44 milhões de pessoas para abaixo da linha de pobreza. O presidente da França, Nicolas Sarkozy, na condição de presidente rotativo do Grupo dos 20 (G-20) países mais ricos do mundo, quer intervenção para garantir a segurança alimentar. Por enquanto, Sarkozy e os críticos ainda vêm pondo força no diagnóstico errado, o de que a disparada dos preços está sendo provocada preponderantemente pela ação dos especuladores financeiros. Mas à medida que esse argumento vai sendo rebatido – até mesmo pelo governo brasileiro – duas consequências parecem inevitáveis. A primeira delas é a maior flexibilização para desenvolvimento e produção de culturas geneticamente modificadas (transgênicas), que ainda hoje encontram fortes resistências na Europa e também aqui no Brasil. A outra é o crescimento das pressões para proibir o desvio de grãos e de outros alimentos para a produção de biocombustíveis. Os Estados Unidos, por exemplo, canalizam mais de 100 milhões de toneladas de milho para a produção de etanol, o suficiente para alimentar 240 milhões de pessoas, nos cálculos do professor Kenneth Cassmann, da Universidade de Nebraska, citado em outra matéria do New York Times. A própria União Europeia usa óleos vegetais (especialmente de canola e girassol) para a produção de biodiesel. E o Brasil também tem lá seus fortes programas de etanol e biodiesel. No ano passado cerca de 335 milhões de toneladas de cana-de-açúcar foram usadas para a produção de etanol e mais não foram porque os próprios usineiros puxaram mais matéria-prima para suas fábricas de açúcar, cujos preços saltaram 72% no mercado internacional. Também por aqui 1,9 milhão de toneladas de óleo de soja deixaram de ser utilizadas na alimentação e foram empregadas na produção de 2,5 bilhões de litros de biodiesel. Por enquanto, o Brasil vem defendendo a produção de biocombustíveis a partir de matéria-prima alimentar com o argumento de que há espaço para os dois segmentos. Mas à medida que crescer a escassez de alimentos, maiores serão as pressões e mais vulnerável ficará o governo brasileiro. O crescimento da procura de proteína tanto vegetal como animal parece inexorável à medida que cresce a população dos países emergentes que ascendem à condição de consumidores. Desapareceram as montanhas de trigo e de manteiga nos países ricos que caracterizaram os anos de pós-guerra. Esta é uma extraordinária oportunidade para o Brasil. No entanto, um após o outro, os governos brasileiros renunciaram a ter uma política agrícola. A produção vai crescendo, sim, mas na base da inércia, estimulada apenas pelo que Deus manda, enfrentando custos predatórios e uma infraestrutura precária e desestimuladora. CONFIRA Foi demais. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, tem surpreendido. Já vinha puxando seu quase inédito lado fiscalista ao defender a contenção de despesas. Ontem, reconheceu que o avanço do consumo de 10% em 2010 “talvez tenha sido excessivo”. Mais equilíbrio. Até recentemente, Mantega não admitia que o consumo avançava à frente da oferta e, nessas condições, produzia inflação de demanda. Agora, não só vem defendendo o vigor das importações (que ajudam a garantir a oferta) como a necessidade de contenção do consumo e da produção para que a economia volte a se reequilibrar. Mais previsível. Ao afirmar que “a inflação no Brasil é menos volátil do que em outros emergentes”, o ministro Mantega está reconhecendo implicitamente outra verdade: a de que a maior previsibilidade da economia brasileira foi obtida graças a uma política fiscal mais consistente e a uma política monetária mais firme. -------------------------------------------Folha de S.Paulo - 17/02/2011 Um plano em busca de dinheiro Vinicius Torres Freire ECONOMISTAS de banco e consultorias revisaram para baixo suas projeções de crescimento neste 2011. Na média dos mais certeiros, as previsões andam em torno de 4%. Não sabemos ainda nem a quanto andou o PIB em 2010, mas há também previsões de crescimento ainda menor para 2012 -nenhum problema, a vida é assim mesmo e não é possível trabalhar sem estimativas. Por falar nisso, na estimativa do Banco Central, a economia brasileira cresceu 7,8% em 2011. Voltando às previsões, suponhamos que elas estejam certas. Crescer a 4% não é nada mal, embora se trate de um ritmo ainda lento para um país ainda tão pobre e, pior, tão desigual. De resto, é menos difícil, menos conflituoso, distribuir renda em país que cresce mais rápido. Mas, ao menos no curto prazo, o problema macroeconômico maior desse ritmo de crescimento é o seu efeito sobre receita de impostos e tamanho relativo da dívida pública. Crescendo a 4%, e não a 5% ou 6%, como imagina o governo, a arrecadação de impostos tende, em tese, a ser menor. Além do mais, segundo alguns economistas, de agora em diante a arrecadação de impostos tende a não crescer tanto mais em relação ao PIB. Nos anos Lula, a receita de impostos chegou a crescer quase ao dobro da velocidade do PIB. Houve mais fiscalização e mais formalização de negócios e empresas. Agora, não há tanto mais a formalizar ou, ao menos, os negócios e empregos restantes são precários demais para serem plenamente legalizados e pagar impostos bastantes. Portanto, crescimento menor e menor resposta da receita em relação ao crescimento do PIB tendem a reduzir o aumento da receita federal. No entanto, algumas despesas vão com certeza crescer bem. Haverá o gasto decorrente do aumento forte do salário mínimo em 2012. Haverá despesas com as obras e desperdícios da Olimpíada e da Copa do Mundo. Há a intenção declarada do governo de colocar mais dinheiro do Tesouro em empresas estatais, novas ou velhas, e novos financiamentos para o BNDES. Etc. Haverá mais despesas com juros da dívida pública -a fim de manter um balanço nominal decente, com redução razoável da dívida pública, será preciso ainda manter um superavit primário alto (o que, no entanto, não tem ocorrido desde 2009 e não vai ocorrer de novo em 2011). Note-se que, no cálculo do balanço nominal das contas públicas, são incluídas as despesas com o pagamento de juros da dívida pública. No entanto, o aumento dos investimentos públicos é um projeto mais ou menos declarado da presidente Dilma Rousseff, assim como o é o plano de reduzir impostos sobre empresas, em particular sobre empresas exportadoras e/ou que empregam muita mão de obra. Também era uma promessa de campanha reduzir a dívida pública a 30% do PIB em 2014 -a dívida pública está hoje na casa dos 40%. Para reduzi-la, é preciso fazer mais superavit primário e gastar menos com juros, o que implica, ao menos no curto prazo, o controle da inflação. Os planos mais ou menos anunciados de Dilma Rousseff não parecem, pois, coerentes. Se faltar receita, vai sobrar plano. Ou bem se cortam despesas correntes a fundo (proibindo aumentos de salários, contendo despesas do INSS etc). Ou se aumentam impostos. ---------------------------------Correio Braziliense - 17/02/2011 O acordo possível Antonio Machado Consenso no G-20 em Paris só haverá quanto à excelência do vinho francês no jantar oficial Os ministros de finanças das maiores economias do mundo, unidas no Grupo dos 20 (G20), reúnem-se este fim de semana, em Paris, com muita polêmica. Como de hábito, haverá alguma tensão, ampla cobertura de imprensa e nenhum resultado. Será apenas retórica e jogo de cena. A economia global começa a sair da crise, o que está em curso aos trancos e barrancos e com tudo o que a gerou varrido para baixo do tapete, à revelia dos nobres propósitos do G-20 — uma instância de discussão entre os países avançados e os emergentes criada em 1999 como resposta às crises em série ao longo daquela década. Pouco ou nada produziu de útil, afora reconhecer que o antigo fórum do G-8, com EUA na cabeceira da mesa, já não mandava no resto do mundo. Esse G-20 até então sem a presença de chefes de governo, reunindo apenas ministros de finanças e presidentes de bancos centrais, foi reformado no fim de 2008, quando Wall Street ruía — e o fantasma da depressão dos anos de 1930 parecia ter ganhado vida —, para ser o grande fórum dos problemas econômicos do mundo. O embrião de uma governança mais efetiva que a da Organização das Nações Unidas. O ideário do G-20 continua na teoria. As ações organizadas contra os efeitos do colapso do crédito no mundo ou resultaram de medidas unilaterais, como quando o Federal Reserve franqueou a uma seleção de países, Brasil entre eles, linhas de crédito emergenciais, ou foram decisões soberanas individuais. Concertado não houve nada. E mesmo a reforma dos padrões de risco do sistema bancário é mais obra de negociações no Bank for International Settlements (BIS) — uma coalizão dos bancos centrais de 56 países —, cujas normas são conhecidas como “Acordos de Basileia”, em referência à cidade da Suíça em que está sediado, que a um tratado combinado no G-20. O chamado Basiléia-3, que reforça a contabilidade prudencial dos grandes bancos no mundo, incluindo aqui Banco do Brasil, Bradesco e Itaú, formalmente surge por demanda dos chefes de governo do G-20. De fato, é consequência das articulações dos bancos centrais, cujo âmbito de discussão, no BIS, nada tem de retórico, atendo-se às questões técnicas, com aplicação soberana e alcance global. Os gatos de Sarkozy Faça-se agora um corte rápido e vamos à agenda parisiense do G-20 neste ano, em que a sua direção rotativa é do presidente da França, Nicolas Sarkozy. Nela, tem a espuma da vez — a proposta de Sarkozy para o G-20 controlar os preços das commodities agrícolas —, e a reprise da crítica à supremacia do dólar como reserva de valor e meio de pagamento. O mesão do G-20 gostaria que o privilégio fosse partilhado com outras moedas. Mas ninguém se atreve a atirar o pau no gato. Uma agenda dessas sugere que consenso só haverá quanto à excelência do vinho francês no jantar oficial de sábado à noite. Seis por meia dúzia A crítica ao dólar, depois de exatos 40 anos de lambança dos EUA com a sua moeda, quando o governo Nixon rompeu a conversibilidade em ouro, faz todo sentido. Não se vê opções, com o euro em crise de identidade, o iene sem horizonte, a libra como recordação de quando o sol nunca se punha sobre o Império Britânico e moedas das potências emergentes, como China, Índia e Brasil (sim, Brasil, por que não?), inconversíveis e alvos de manipulação disfarçada. Mude-se isso e o dólar não estará mais sozinho. Mas a China topa, como querem os EUA, valorizar o renminbi? E o Brasil? O ministro Guido Mantega vai ao G-20 levando a proposta de fazer do Direito Especial de Saque (DES), moeda escritural do FMI, uma sombra para o dólar. Bacana. Só que o DES não circula. É uma cesta de moedas que reúne o dólar ao euro, o iene e outras menos cotadas. E nela o dólar é carro-chefe. Seria como trocar seis por meia dúzia. Por qué no te callas? E o choque de preço dos alimentos, que turbina a inflação e põe em risco a estabilidade de governos, principalmente os mal-amados? O governo brasileiro se aliou aos EUA e Argentina, também celeiros mundiais, para dizer algo assim a Sarkozy: Por qué no te callas? A agricultura francesa é a mais protegida na Europa. Ao associar a alta de preços à segurança alimentar, o plano de Sarkozy atenta contra o agronegócio eficiente, caso do Brasil, desviando o foco. Mantega vai dizer ao G-20 que a resposta a choques de preços é o aumento da produção. O G-20 é um fórum superior ao da velha ordem, quando EUA e ex-União Soviética mandavam e o resto seguia. Mas é um projeto em construção que por ora não permite nenhuma ilusão. Bola entre as pernas A diplomacia brasileira passou os últimos anos procurando sinais de solidariedade internacional que só ela enxergava, o que, ainda que não tenha implicado em prejuízos graves aos interesses nacionais, não trouxe resultados concretos. Seu maior mérito foi ter tornado o país mais percebido no mundo. Mas decisões, como reconhecer a China como economia de mercado durante a visita do presidente Lula a Pequim, se mostraram precipitadas. A China não atendeu sua parte nesse compromisso, e o Brasil enrola desde então o que prometera. Ainda agora, com um brasileiro na direção da FAO, o braço da ONU contra a fome, se aceita sem discussão pesquisas indicando que o aumento de preço seria recorde, quando, em base histórica, nunca se superou a relação de troca com os manufaturados exportados pelo mundo rico. E agora pela China. Isso é tomar bola entre as pernas. ------------------------------------- ECONOMIA E OUTRAS NOTÍCIAS O Globo - 17/02/2011 Governo vai ampliar o Bolsa Família A ministra Tereza Campello (Desencolvimento Social) confirmou que, como parte do plano de erradicação da miséria no país, será ampliada a cobertura do programa Bolsa Família, e que o valor dos benefícios será reajustado. Governo confirma aumento do Bolsa Família Ministra anuncia também que estuda ampliar número de pessoas atendidas; programa não será afetado pelos cortes Demétrio Weber BRASÍLIA. A ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello, confirmou ontem que uma das medidas em estudo no plano de erradicação da miséria é ampliar a cobertura do Bolsa Família. Ela disse também que o valor dos benefícios do programa será reajustado, mas não revelou o percentual do aumento nem quando isso ocorrerá. - Estamos estudando como incorporar ainda algumas parcelas da população que estão fora do Bolsa Família - disse a ministra, após reunião com o fórum de secretários estaduais de Assistência Social. Tereza disse que os programas do Ministério do Desenvolvimento Social não serão afetados pelo corte de R$50 bilhões no Orçamento da União, assim como o próprio plano de erradicação da pobreza. Cerca de 90% das verbas da pasta vão para ações de transferência de renda, como o Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC), que atende idosos e deficientes de baixa renda. A ministra disse que o plano está sendo formulado e não quis antecipar detalhes. Mas, segundo ela, estimativas preliminares indicam que o número de famílias pobres fora do Bolsa Família seria inferior a dois milhões. Ela afirmou que, a pedido da presidente Dilma Rousseff, estão sendo traçadas metas para todos os passos. O objetivo é monitorar os resultados do plano. Tereza confirmou, também, que será estabelecida uma linha de pobreza. Hoje, o Bolsa Família atende 12,8 milhões de famílias, que recebem entre R$22 e R$200 mensais, conforme o número de filhos. O último reajuste foi concedido em 2009. Novo aumento é discutido no governo desde o ano passado. A previsão, em 2010, era que o programa consumisse R$14,4 bilhões em 2011. Mas esse valor não é uma "camisa de força", segundo o secretário-executivo Rômulo Paes. Tereza afirmou que a intenção é aperfeiçoar o Cadastro Único, banco de dados que lista a população pobre de todo o país, e ampliar o Bolsa Família: - É um programa de sucesso, certamente o programa mais importante dessa envergadura no mundo. Não vamos lançar um outro programa. Estamos articulando um conjunto de ações. Algumas ações estão sendo revistas, mas não no caso de transferência de renda. O ministério terá que cortar gastos com passagens, diárias e alugueis. O valor ainda está em aberto. - Vamos participar desse esforço de gerar mais economia em relação a passagens, diárias, publicações, contratos, aluguéis, ou seja, todas as atividades-meio que o ministério faz - disse Rômulo. -----------------------------O Estado de S.Paulo - 17/02/2011 Para BC, País se expandiu 7,8% em 2010, mas ritmo caiu A economia brasileira cresceu 7,8% no ano passado, mas já rodava a um ritmo menor e mais próximo de sua capacidade no último trimestre. É o que apontou ontem o Índice de Atividade Econômica do Banco Central, que em dezembro ficou praticamente estável ante novembro. No último trimestre, houve crescimento médio de 1,02% em relação ao terceiro trimestre. Isso evidencia uma aceleração no final do ano, porque o crescimento do terceiro ante o segundo semestre foi de 0,3%. Economia brasileira cresceu 7,8% em 2010, mas esfriou no fim do ano IBC-Br, índice do BC que antecede dados oficiais do IBGE, mostra que a economia teve desempenho estável em dezembro em relação a novembro Fabio Graner - O Estado de S.Paulo A economia brasileira cresceu em torno de 7,8% no ano passado, mas já rodava a um ritmo menor e mais próximo de sua capacidade de expandir sem pressionar a inflação no último trimestre. É o que apontou ontem o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), que fechou o mês de dezembro em 140,6 pontos, praticamente estável ante novembro, já com os ajustes de fatores típicos do período. O IBC-Br é um indicador antecedente do resultado do Produto Interno Bruto (PIB), que vem sendo divulgado pelo Banco Central desde 2010. Olhando-se apenas os dados do último trimestre de 2010, o IBC-Br mostra que houve crescimento, na média, de 1,02% ante o terceiro trimestre do mesmo ano. Em termos anualizados, essa taxa representa pouco mais de 4% de alta. Isso evidencia uma aceleração no fim do ano em comparação com o ritmo dos três meses anteriores, quando o crescimento sobre o segundo trimestre foi de apenas 0,3%. Na comparação com o quarto trimestre de 2009, o IBC-Br apresentou, na média, alta de 5%, taxa abaixo do resultado do ano, que ainda mostra um ritmo de crescimento econômico significativo da economia brasileira. Os resultados apontados pelo indicador do BC, segundo economistas ouvidos pelo Estado, já sinalizam que o País entrou em uma rota de crescimento menos intensa e não colocará em risco os índices de inflação, o que pode representar menor carga de juros pelo Comitê de Política Monetária (Copom), que se reúne no início de março. "Algo acontecendo". O professor de economia da Universidade de São Paulo, Fábio Kanczuk, disse que esperava um resultado muito forte no quarto trimestre, até por causa do fraco desempenho nos três meses anteriores. "Mas os números mostram a economia andando mais lentamente do que se imaginava", afirmou. Ele projeta um aumento do PIB de 3,5% em 2011. Para ele, é possível que as medidas macroprudenciais tenham impactado a economia em dezembro, afetando o IBC-Br. O professor considera que os dados de janeiro servirão para consolidar tal percepção. "Já tem algo acontecendo. A economia está trabalhando em nível mais próximo do seu potencial." Kanczuk diz que, ante esse quadro, o BC pode fazer um ajuste menor que o antecipado na Selic - os analistas esperam que os juros saiam dos atuais 11,25% para 12,5% ao ano -, de modo a evitar que a economia não desacelere demais. Juros. O ex-diretor do BC Carlos Thadeu de Freitas concorda que a situação permite antever um ajuste menos intenso da Selic. "O IBC-Br já mostra a economia se desacelerando, por isso o ciclo de juros deve ser mais curto." Na sua visão, a indústria tem mostrado enfraquecimento e o comércio, com base nos resultados de dezembro, exibe um ritmo menos intenso. Além disso, o governo está atuando para conter a expansão com aperto fiscal, monetário e creditício. "O crescimento econômico mudou de faixa. A partir de agora está mais na casa dos 4%, o que não é um resultado ruim, já que o País cresceu demais em 2010", afirmou Freitas. Ele destaca que o real valorizado deve manter o estímulo às importações, garantindo uma perda de crescimento ainda significativo em 2011. --------------------------------