HISTÓRIAS DO MEU LUGAR: História Local como fundamento para

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HISTÓRIAS DO MEU LUGAR:
História Local como fundamento para o Ensino de História
André Luiz Felismino da Rocha1
Uma inquietação permanente diante de critérios pedagógicos contraditórios, entre a retórica
oficial e a vivência diária dos alunos da rede pública e, residentes na chamada “periferia” urbana,
motiva a realização dessa experiência. Portanto, explorar a complexidade histórica do lugar onde se
vive e, verificar sistematicamente toda a sua estruturação espaço-temporal, para estimular o alunado a
descobrir representações do mundo na História da vila de Ouro Preto em Olinda e, conseqüentemente,
produzir o conhecimento básico necessário ao seu amadurecimento humano é o fundamento desse
trabalho. A sua realização transcende os muros das escolas, levando professor e alunos a vivenciarem
o seu lugar, não apenas como espaço físico, mas, sobretudo, como base social para a construção e
manutenção de sua identidade e cidadania.
Palavras chave: Ensino de História; Conhecimento; Cidadania.
ABSTRACT
A permanent inquietude in front of contradictory pedagogic criteria, between the official
rhetoric and the students' of the daily public school mesh and the residents in the so called urban
"periphery", motivates the accomplishment of that experience. Therefore, to explore the historical
complexity of the place where ones live and systematically verify all of their own structuring
space-time in order to stimulate the students to discover the representations of the world in the
History of the suburb of Ouro Preto in the city of Olinda and consequently, to produce the necessary
basic knowledge of the human ageing
is the foundation of that work. Its
accomplishment
transcend the walls of the schools, taking teachers and students to share their place, not only as a
physical space, but, above all, as a social base for the construction and maintenance of their identity
and citizenship.
Keywords: History Teaching; Knowledge; Citizenship
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[email protected]
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Esse é um estudo preocupado com a radicalidade social, priorizando os processos vivenciados
pelas chamadas classes populares. E, “nesse estudo do ‘acontecer na base’ não esquecemos o sonho,
a festa, a dimensão amorosa, o imaginário em geral” (HOONAERT, 1994, p.10).
Uma radicalidade histórica, prioritariamente voltada à valorização das bases sociais,
sobretudo porque “o sonho ou, se quiserem, o ‘princípio esperança’ – como diria Ernst Bloch -, se
nos impõe de maneira insistente na documentação histórica” (Id. Ibidem.).
Essa perspectiva afirma a minha posição sobre o tema proposto e, sobre o problema a ser
investigado, visando a sua compreensão e possíveis alternativas. Mesmo porque, compreendendo a
história como passível de mudanças, a pretensão é contribuir para a democratização das relações
sociais.
Essa contribuição passa pelo entendimento de que, “o grande desafio que se apresenta nesse
novo milênio é adequar nosso olhar às exigências do mundo real sem sermos sugados pela onda
neoliberal que parece estar empolgando corações e mentes” (In. KARNAL, 2005, p. 09).
Assim, para efeito da radicalidade proposta nesse trabalho é fundamental assimilar que, “é
preciso, nesse momento, mostrar que é possível desenvolver uma prática de ensino de História
adequada aos novos tempos (e alunos): rica de conteúdo, socialmente responsável e sem ingenuidade
ou nostalgia” (Id. Ibidem.).
O termo democratização é utilizado concordando com a afirmação de Coutinho, citando
Lukács, alertando que “a democracia deve ser entendida como um processo, não como um estado”
(In. FÁVERO & SEMERARO, 2002, p.16). E também por perceber a inexistência da possibilidade
de uma democracia participativa para as camadas populares brasileiras.
Assim, explorando a complexidade histórica do entorno onde se vive e, verificando
sistematicamente toda a sua estruturação espaço-temporal, essa vivência objetiva estimular os alunos
a descobrirem representações do mundo na história do seu Lugar. E, conseqüentemente, produzirem
o conhecimento básico necessário ao seu amadurecimento humano.
Dessa forma, é pertinente afirmar essa realização estruturada por relações interpessoais, onde
os envolvidos serão estimulados a se reconhecerem como protagonistas na construção do seu
conhecimento e, da afirmação de sua identidade no processo histórico, como elaboração coletiva.
Essa prática também é conseqüência de um encantamento com o Ensino de História. Ensino
como processo para a afirmação de cidadanias vinculadas às coletividades, porém, respeitando-se as
individualidades. Uma História lastreada pelo entendimento sobre as contradições presentes na
sociedade, como lugar de produção.
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Um encantamento apaixonante onde sistematização e prática docente não se excluem. Pelo
contrário, convergem para um ambiente de elaboração histórico-pedagógica, promovendo,
eticamente, compreensões sobre identidades e, sobre cidadanias.
Um Ensino de História, portanto, como necessidade social, apresentando um ambiente
histórico como, “o lugar do outro que se projeta e resiste, o sempre imprevisível” (NIKITIUK, 1996,
p.24). Um Ensino de História, radicalmente comprometido com a possibilidade da emancipação
cidadã das ‘classes populares’.
Isso porque, na maior parte dos lugares onde sobrevivem e convivem as pessoas pertencentes
à chamada ‘classe popular’, um olhar mais atento percebe o quanto a retórica oficial é
instrumentalizadora e, a “legislação educacional passa a ser estratagema ideológico, prometendo
exatamente aquilo que não pretende conceder” (In. BRZEZINSKI, 2002, p. 60).
Nesse sentido, é inevitável a vinculação do conceito de cidadania à linha de reflexão traçada
até o momento. Uma cidadania com a qual a maioria dos brasileiros possa, realmente, interagir com o
meio e com os outros. Onde, como afirma Joana Neves, o “direito à cidadania não prescinde do
dever, mas, com certeza, o antecede” (In. OLIVEIRA, 2000, p.31).
Consequentemente, a compreensão sobre as identidades, priorizando a afirmação de autoestimas, é uma ação política direcionada para a conquista do conhecimento, já que “sem
conhecimento, cidadania é discurso vazio. Não se sustenta; não constrói uma sociedade democrática e
não liberta o indivíduo” (Id. Ibidem, p.35). Sem conhecimento, esses brasileiros não podem se
apropriar do seu espaço, nas suas dimensões social, política e emocional.
Dessa forma, lidar com o imprevisível no lugar onde professores e alunos interagem e
estabelecem identificações, envolvidos com imaginários e representações, é um desafio instigante.
Uma vivência com a qual todos os envolvidos podem, e devem, amadurecer a compreensão da
importância e, sobretudo, da necessidade do conhecimento como possibilidade real para a afirmação
da sua cidadania.
Uma cidadania pautada pela democratização e, visando a emancipação política das camadas
populares. Uma cidadania ratificada como, “competência humana de fazer-se sujeito, para fazer
história própria e coletivamente organizada” (DEMO, 1995, p.01).
Nesse contexto, e valorizando a convergência entre sistematização e práticas de vida,
apresento o tema “Histórias do meu lugar: História Local como fundamento para o Ensino de
História”, lembrando Paulo Freire, reconhecendo-nos como seres “condicionados, mas não
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determinados”; reconhecendo a História como “tempo de possibilidades e não de determinismos” e, o
futuro como “problemático e não inexorável” (FREIRE, 2000, p.21).
É sob essa perspectiva que, o Ensino de História a partir da análise do Lugar onde se vive e
sobrevive, registrando relações e representações e, visando a qualificação do incentivo pedagógico
sobre o alunado, é o mote central desse trabalho. Porém, priorizando a produção do conhecimento
histórico de uma forma plural, isto é, levando-se em consideração todos os aspectos da produção
humana como igualmente importantes.
Torna-se pertinente então, esclarecer que Lugar para essa investigação converge para o
entendimento de que, “os geógrafos da vertente crítica conceituam o espaço como um fato social,
produto da ação humana e portanto dotado de historicidade em inter-relação com os processos
sociais” (In. NIKITIUK, 1996, p.82).
E é como profissional envolvido com os processos sociais, que apresento essa temática,
também a partir de uma inquietação provocada por Marília Cruz, afirmando que “o maior desafio que
se apresenta aos professores é a educação das camadas populares da sociedade, que não tem
encontrado na escola o atendimento necessário para a superação das suas dificuldades” (In.
NIKITIUK, 1996, p.69).
Essa provocação instiga a elaboração desse trabalho, como uma contribuição para a solução
do seguinte problema: como efetivar um bom Ensino de História para alunos das camadas
populares, priorizando a auto-estima e a produção de conhecimento, em jovens que estão crescendo
sob o estigma da incapacidade?
Esse problema é uma das resultantes estruturais, de uma organização social historicamente
produtora de exclusão, onde a maioria dos jovens é induzida a um padrão de comportamento nocivo à
construção do seu amor próprio. Uma realidade indesejável, mas ainda muito presente no cotidiano
das camadas populares.
Inseridos nesse contexto estão os professores de História, sobretudo os que trabalham nas
escolas da periferia dos grandes centros urbanos. Escolas no século XXI, cronicamente submetidas a
um sistema claramente direcionado a “desqualificar o professor de História, ou qualificá-lo e preparálo para uma escola que impunha tarefas e necessidades de submissão à maioria da sociedade
brasileira” (FONSECA, 2003-a, p. 29).
Para esses profissionais e seu alunado, tal realidade ainda significa “sem dúvida, fortalecer e
legitimar um modelo antidemocrático e concentrador de riquezas, além de limitar ainda mais as
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possibilidades de debates mais profundos no interior das nossas escolas” (Id. Ibidem.), justificando
frustrações e insatisfações coletivas, prejudiciais para a aquisição de conhecimento.
Sendo assim, é relevante trabalhar a História do Lugar onde se vive, também enquanto
contribuição para a ciência da educação e, como qualificação para o exercício do Ensino de História.
Principalmente, quando se percebe a importância para o professor, da compreensão sobre o
envolvimento do alunado com as representações sociais.
O fato desse envolvimento, ser preliminar e superficial é pedagogicamente estimulante. Até
porque, sob essa ótica, a relação em sala de aula incentiva uma produção intelectual analítica,
privilegiando a formação de uma consciência crítica aberta, com a qual os alunos possam entender
melhor, as relações sociais onde convivem e sobrevivem.
Consciência crítica nesse trabalho é “aquela que examina os fatos com profundidade, que
aceita as mudanças da realidade, que busca os princípios causais autênticos”. Uma consciência
voltada para a democratização e, portanto, que “testa, revisa, é livre de preconceito, repele posições
acomodadas, aceita responsabilidade, é indagadora, investiga, força, choca, ama e nutre-se do
diálogo”. Uma consciência libertária, que “aceita o novo, assim como o velho na medida em que são
válidos” (TELLES, 1997, p.18).
Ser professor de História nesse contexto implica em sentir que, toda sociedade na qual valha a
pena viver deve considerar as coletividades periféricas, onde sobrevivem as pessoas excluídas da
chamada ‘cultura letrada’. Esse sentimento é uma exigência ética, simplesmente porque “o mundo
não é feito para o nosso benefício pessoal, e tampouco estamos no mundo para o nosso benefício
pessoal. Um mundo que afirme ser esse o seu propósito não é bom e não deve ser duradouro”
(HOBSBAWM, 1998, p.21).
Compreender a importância da consciência crítica e do sentimento ético, como elementos
estruturadores para o ensino de História, é fundamental, reafirmando a argumentação desenvolvida
até o momento. Isto porque, o respeito aos alunos é um imperativo de humanidade, nos lembrando
que o mundo, como nos ensina Hobsbawm, não deve existir apenas para o nosso benefício pessoal.
Cabe então, lembrar Paulo Freire afirmando que, “uma das tarefas do educador ou educadora
progressista, através da análise política, séria e correta, é desvelar as possibilidades, não importam os
obstáculos, para a esperança” (FREIRE, 2005, p.11).
Tentando a continuidade no grupo dos esperançosos, juntamente com alunos motivados pela
curiosidade sobre possíveis e interessantes descobertas, fomos às ruas da vila de Ouro Preto em
Olinda, desvelar Lugares e Histórias.
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Isso, sem perder o foco do realismo cotidiano, até porque “não basta dizer que a nossa escola
pública é livre, gratuita e aberta a todas crianças brasileiras para que nossa educação pública seja
efetivamente democrática e avalizadora da cidadania” (SEVERINO, 1994, p. 99), sobretudo quando a
histórica negação dos direitos elementares é uma constante para a maioria desses brasileiros.
Mesmo assim, esse desvelamento a partir de um Ensino de História direcionado para a
qualificação intelectual, tem sido promissor e gratificante. Isso porque, as descobertas são
permanentes e enriquecedoras, sobretudo quando a experiência empírica instiga o alunado a verificar
realidades físicas e representativas.
Uma experiência libertadora, na qual professor e alunos interagem com o tempo/espaço do
Lugar a ser investigado, repercutindo as várias possibilidades de aprendizado sobre a História do
Lugar e, das pessoas nele viventes e sobreviventes.
Uma experiência com produção real de conhecimento, onde as descobertas se transformam
em conteúdos de aprendizagem. Descobertas efetuadas em um cenário onde foi edificada a vila de
Ouro Preto em Olinda, na década de 1960. Uma gama enorme de possibilidades para promover
conexões históricas com temas mundiais e nacionais.
Descobertas importantes, considerando-se a história “como disciplina fundamentalmente
educativa, formativa, emancipadora e libertadora”, principalmente porque a História tem como
“papel central a formação da consciência histórica dos homens, possibilitando a construção de
identidades, a elucidação do vivido, a intervenção social e praxes individual e coletiva” (FONSECA,
2003-b, p. 89).
Nesse sentido e, lembrando que o Lugar de vivências e sobrevivências, nesse trabalho, é
tratado como elemento pedagógico onde as descobertas possibilitam a qualificação do Ensino de
História, é fundamental enfatizar que, “a humanização não é um atributo intrínseco que qualifica os
homens só pelo fato de eles pertencerem à espécie humana”, principalmente porque a humanização
“é, antes de tudo, uma construção histórica” (SEVERINO, 1994, p. 101).
Como construção histórica, o processo de humanização para a maioria da juventude das
‘classes populares’, a décadas vem sendo negligenciado pelos chamados ‘gestores da coisa pública’.
Uma negligência fortemente sentida nas salas de aula das periferias, onde jovens sem referenciais
humanísticos, descarregam toda a violência acumulada em sua curta sobrevivência.
Uma juventude sobrevivendo sob o estigma da incapacidade e, conseqüentemente, sentindo-se
desqualificada para a sociedade letrada e tecnológica do século XXI. Um cenário cruel para jovens
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que, muitas vezes não tendo o de comer e onde morar decentemente, têm que entender a historicidade
do seu entorno social.
Portanto, e reconhecendo visceralmente essa realidade, esse trabalho se propõe como uma
colaboração pedagógica, para qualificar a aprendizagem de um alunado inserido numa sociedade
onde, “um presente repleto de contradições, um futuro duvidoso e um passado confuso, fragmentado,
construído por informações dos diversos meios de comunicação, pela escola e pela história vivida”
(BITTENCOURT, 2005, p. 07), em lugar de colaborar para lhes situar no mundo, conspiram contra a
sua cidadania.
Secretaria de Educação de Pernambuco - SEDUC
Secretaria de Educação e Desportos de Olinda - SEDO
Referências
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TELES, Maria Luiza Silveira. Educação: a revolução necessária, 3ª Ed. Petrópolis:
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