“Meus heróis morreram de overdose”

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Diagramação desta página: Mariana Simões
PRIMEIRA IMPRESSÃO | Março de 2017
“Meus heróis morreram de overdose”
Como bem diz a música de Cazuza, o vício das drogas tirou cedo a vida de muitos ídolos
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Mariana Simões
Cheios de dinheiro, fama
e visibilidade, muitos famosos acabam sendo arrastados
para o vício e, em alguns casos, chegam ao fundo do poço
e, infelizmente, morrem.
Foi isso que aconteceu com
Alexandre Magno Abrão, o
cantor “Chorão”, da banda
Charlie Brown Jr. Apesar de
aparentar ser uma pessoa forte nos palcos e nas entrevistas, quem era do convívio do
artista costumava comentar
que ele era uma pessoa sensível, vindo daí o seu apelido:
Chorão. Seu lado sentimental
e romântico se misturava com
o outro, agressivo, que, vez ou
outra, aparecia na mídia. Traços de uma certa bipolaridade
que o levaram ao colapso.
Depois de tentar alguns
tratamentos contra o vício,
Chorão abriu mão de se recuperar após brigas na banda
em 2005. Assim, ele começou
a se isolar e cheirar cocaína
cada vez mais.
Transformou seu apartamento na Capital o refúgio
para seu vício, onde sequer recebia a visita da esposa, a estilista Graziela Gonçalves, de 43
anos. Por isso, ela resolveu se
separar do cantor meses antes
da morte dele.
Chorão foi encontrado morto no dia 6 de março de 2013,
sozinho, em seu apartamento
no bairro de Pinheiros, em São
Paulo. Ele tinha 42 anos.
RIFYYOU
Chorão e Amy Winehouse foram apenas duas de muitas personalidades da música que morreram pelas drogas
um familiar, fazendo com que
a mãe insistisse no início de
um tratamento. Ele aceitou e,
durante o tratamento, entrou
para a ONG Project Limelight,
onde se formou ator.
A partir daí, sua vida parecia ter tomado um novo rumo.
Em 2009, entrou para uma série musical estadunidense que
fez bastante sucesso, Glee. Os
colegas de elenco confirmavam que ele estava “limpo”,
bem como sua namorada (e
companheira de cena), Lea
Michele. Eles estavam inclusive pensando em morar juntos.
Mas, em 2013, algo aconteceu e Cory passou a ter recaídas. Foi internado duas vezes
naquele ano, uma em março,
outra em abril. Os amigos coOutro caso
meçaram a reparar nos hemaUm quadro muito parecido tomas provocados pelas injeao de Chorão aconteceu com o ções no braço do ator.
ator, cantor e baterista canaMonteith foi encontrado
dense Cory Monteith. Ambos morto no dia 13 de julho de
tiveram uma infância difícil 2013, aos 32 anos, em um
– os pais de Chorão se separa- quarto de hotel em Vancouram quando ele tinha 12 anos, ver, no Canadá. Sozinho.
os de Cory, aos 7 – além de
não terem terminado o colé- Aspectos psicológicos
gio – o brasileiro abandonou
Segundo a psicanalista pauos estudos na 7ª série, assim listana Cristiane Maluf Martin
como o canadense.
– especialista em comportaMonteith começou a ter mento humano, dependência
problemas com álcool e drogas química, alcoolismo e codeainda na infância, aos 12 anos. pendência – doenças psíquiAos 19, ele foi pego roubando cas como ansiedade grave, de-
pressão, síndrome do pânico e
transtorno bipolar são comuns
em dependentes químicos, e,
pelo menos uma delas é facilmente percebida nos casos famosos de morte por overdose
ou intoxicação medicamentosa.
Ela explica que “a dependência química é uma doença comportamental, portanto dizemos que a ‘droga do
comportamento’ leva à droga
do uso”. Isso quer dizer que a
pessoa começa a apresentar
comportamentos nunca antes
apresentados – mentir, manipular, ser agressivo, se despersonalizar e isolar. Ela está
precisando de ajuda, porém, a
maioria não aceita tratamento, buscando na droga uma
rota de fuga para aliviar os
sintomas que estão sentindo.
Além de Chorão e Cory,
muitos artistas sofreram – e
sofrem - desse mal. E um fator
importante é o quão parecidos
são os sintomas psicológicos
apresentados por eles, mesmo
que por motivos diferentes.
Um dos maiores guitarristas do rock, Jimi Hendrix, que
morreu após uma intoxicação
de remédios para dormir, sofria com a pressão de empresários e parceiros de banda.
O guitarrista tinha uma espécie de “vida dupla”. Enquanto nos palcos e no mundo artís-
tico era uma pessoa explosiva e
tipicamente rock ‘n roll, no dia
a dia era tímido e quieto.
Mudanças de humor sao
comuns, mas quando são
drásticas e acompanhadas
de drogas e álcool, geralmente são relacionadas a algum problema psicológico,
como a bipolaridade.
Doses altas de remédio levaram à morte de Michael Jackson. A vida do Rei do Pop foi
marcada pelos abusos que ele
e os irmãos sofreram na infância. A criação da banda The
Jackson Five, apesar de ter trazido fama e reconhecimento
aos irmãos Jackson, também
trouxe mais pressão por parte
do pai, que batia e aterrorizava
psicologicamente as crianças.
Em carreira solo, Michael
Jackson se consagrou por sua
genialidade na música e na
inovação no mundo dos videoclipes. Mas os traumas do passado nunca foram superados e
ele parecia sempre querer viver a infância perdida, tendo a
sua própria Neverland, Terra
do Nunca, em casa.
Problemas familiares afetaram a vida de outra artista,
vítima dos abusos do álcool. A
infidelidade do pai e a consequente separação mudaram a
vida de Amy Winehouse para
sempre, levando-a para uma
vida repleta de consumo de
drogas lícitas e ilícitas. Morreu
aos 27 anos, assim como Janis
Joplin, esta encontrada em um
hotel de Hollywood, vítima de
overdose de heroína.
Quadros depressivos eram
constantes em Amy, que demonstrava essa fragilidade
até mesmo em seus clipes e
letras das músicas.
Doenças psíquicas também
afetaram Elis Regina. Bipolaridade e depressão marcaram a vida da cantora que fez
história na música brasileira.
Mesmo com fama e uma vida
familiar – Elis deixou três filhos, um deles, a cantora Maria Rita com apenas três anos
de idade – a doença e o consequente vício levaram a musa
da MPB à ruína.
Risco da fama
O fato de serem pessoas
públicas contribuiu de forma
negativa para Amy e Chorão,
por exemplo. E isso é algo
comprovado pela psicanálise.
“A fama e o glamour geralmente vêm acompanhados
de uma série de fatores que
mexem bastante com o ego
de qualquer pessoa. Quando
falamos de adictos (dependentes químicos), tudo isso
se potencializa e a compulsão
pelo uso fica mais suscetível”,
explica Cristiane Martin.
Lembranças do passado
também podem contribuir
para recaídas. No caso do
ator Cory Monteith, a família
e amigos dos Estados Unidos
comentam que boa parte dos
problemas voltavam quando
ele visitava os antigos colegas no Canadá. Isso é explicado pela psicologia.
Segundo a psicóloga Vivian Sbrama Mauger, o cérebro relaciona as memórias
geradas ao uso da droga com
a sensação de prazer. “Mesmo depois de terminarem os
sintomas da abstinência, o
indivíduo está vulnerável a
essas associações inconscientes, que podem desencadear
um desejo, aparentemente do
nada”, completa.
Relação fã e ídolo
Há sempre um sentimento de identificação e amor
forte entre fã e ídolo, o que,
em alguns casos, pode chegar a ser prejudicial para a
pessoa, principalmente durante a adolescência. “Onde
eles não só imitam a maneira de se vestir dos seus
ídolos, como também seus
comportamentos e, muitas
vezes, infelizmente, o de
usar drogas, pois associam
a fama e o sucesso, ao consumo de entorpecentes”,
explica a psicanalista Cristiane Maluf.
Claro que isso não é
uma regra. Muitos admiradores não compactuam
com o vício do ídolo, e torcem para que ele faça algum tipo de tratamento.
Com as redes sociais, é
cada vez mais comum ler
mensagens de apoio e soli-
dariedade enviada por pessoas do mundo todo para esses famosos que passam por
momentos delicados.
Nos piores casos, quando
o vício culmina na morte,
o problema se torna outro.
“Como diz a música do Cazuza ‘meus heróis morreram
de overdose!’ (letra da música Ideologia), os fãs acabam sofrendo como se fosse
alguém da própria família,
vivenciam o luto na íntegra,
pois o consideravam realmente seus heróis. Ficam
com a sensação de que estão
órfãos”, destaca.
“Se este sentimento, esta
apatia, não melhorar no
decorrer dos dias, o ideal
é procurar ajudas psiquiátrica e psicológica para não
desencadear um transtorno depressivo mais grave”,
alerta Cristiane.
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