32 Diagramação desta página: Mariana Simões PRIMEIRA IMPRESSÃO | Março de 2017 “Meus heróis morreram de overdose” Como bem diz a música de Cazuza, o vício das drogas tirou cedo a vida de muitos ídolos YOUTUBE Mariana Simões Cheios de dinheiro, fama e visibilidade, muitos famosos acabam sendo arrastados para o vício e, em alguns casos, chegam ao fundo do poço e, infelizmente, morrem. Foi isso que aconteceu com Alexandre Magno Abrão, o cantor “Chorão”, da banda Charlie Brown Jr. Apesar de aparentar ser uma pessoa forte nos palcos e nas entrevistas, quem era do convívio do artista costumava comentar que ele era uma pessoa sensível, vindo daí o seu apelido: Chorão. Seu lado sentimental e romântico se misturava com o outro, agressivo, que, vez ou outra, aparecia na mídia. Traços de uma certa bipolaridade que o levaram ao colapso. Depois de tentar alguns tratamentos contra o vício, Chorão abriu mão de se recuperar após brigas na banda em 2005. Assim, ele começou a se isolar e cheirar cocaína cada vez mais. Transformou seu apartamento na Capital o refúgio para seu vício, onde sequer recebia a visita da esposa, a estilista Graziela Gonçalves, de 43 anos. Por isso, ela resolveu se separar do cantor meses antes da morte dele. Chorão foi encontrado morto no dia 6 de março de 2013, sozinho, em seu apartamento no bairro de Pinheiros, em São Paulo. Ele tinha 42 anos. RIFYYOU Chorão e Amy Winehouse foram apenas duas de muitas personalidades da música que morreram pelas drogas um familiar, fazendo com que a mãe insistisse no início de um tratamento. Ele aceitou e, durante o tratamento, entrou para a ONG Project Limelight, onde se formou ator. A partir daí, sua vida parecia ter tomado um novo rumo. Em 2009, entrou para uma série musical estadunidense que fez bastante sucesso, Glee. Os colegas de elenco confirmavam que ele estava “limpo”, bem como sua namorada (e companheira de cena), Lea Michele. Eles estavam inclusive pensando em morar juntos. Mas, em 2013, algo aconteceu e Cory passou a ter recaídas. Foi internado duas vezes naquele ano, uma em março, outra em abril. Os amigos coOutro caso meçaram a reparar nos hemaUm quadro muito parecido tomas provocados pelas injeao de Chorão aconteceu com o ções no braço do ator. ator, cantor e baterista canaMonteith foi encontrado dense Cory Monteith. Ambos morto no dia 13 de julho de tiveram uma infância difícil 2013, aos 32 anos, em um – os pais de Chorão se separa- quarto de hotel em Vancouram quando ele tinha 12 anos, ver, no Canadá. Sozinho. os de Cory, aos 7 – além de não terem terminado o colé- Aspectos psicológicos gio – o brasileiro abandonou Segundo a psicanalista pauos estudos na 7ª série, assim listana Cristiane Maluf Martin como o canadense. – especialista em comportaMonteith começou a ter mento humano, dependência problemas com álcool e drogas química, alcoolismo e codeainda na infância, aos 12 anos. pendência – doenças psíquiAos 19, ele foi pego roubando cas como ansiedade grave, de- pressão, síndrome do pânico e transtorno bipolar são comuns em dependentes químicos, e, pelo menos uma delas é facilmente percebida nos casos famosos de morte por overdose ou intoxicação medicamentosa. Ela explica que “a dependência química é uma doença comportamental, portanto dizemos que a ‘droga do comportamento’ leva à droga do uso”. Isso quer dizer que a pessoa começa a apresentar comportamentos nunca antes apresentados – mentir, manipular, ser agressivo, se despersonalizar e isolar. Ela está precisando de ajuda, porém, a maioria não aceita tratamento, buscando na droga uma rota de fuga para aliviar os sintomas que estão sentindo. Além de Chorão e Cory, muitos artistas sofreram – e sofrem - desse mal. E um fator importante é o quão parecidos são os sintomas psicológicos apresentados por eles, mesmo que por motivos diferentes. Um dos maiores guitarristas do rock, Jimi Hendrix, que morreu após uma intoxicação de remédios para dormir, sofria com a pressão de empresários e parceiros de banda. O guitarrista tinha uma espécie de “vida dupla”. Enquanto nos palcos e no mundo artís- tico era uma pessoa explosiva e tipicamente rock ‘n roll, no dia a dia era tímido e quieto. Mudanças de humor sao comuns, mas quando são drásticas e acompanhadas de drogas e álcool, geralmente são relacionadas a algum problema psicológico, como a bipolaridade. Doses altas de remédio levaram à morte de Michael Jackson. A vida do Rei do Pop foi marcada pelos abusos que ele e os irmãos sofreram na infância. A criação da banda The Jackson Five, apesar de ter trazido fama e reconhecimento aos irmãos Jackson, também trouxe mais pressão por parte do pai, que batia e aterrorizava psicologicamente as crianças. Em carreira solo, Michael Jackson se consagrou por sua genialidade na música e na inovação no mundo dos videoclipes. Mas os traumas do passado nunca foram superados e ele parecia sempre querer viver a infância perdida, tendo a sua própria Neverland, Terra do Nunca, em casa. Problemas familiares afetaram a vida de outra artista, vítima dos abusos do álcool. A infidelidade do pai e a consequente separação mudaram a vida de Amy Winehouse para sempre, levando-a para uma vida repleta de consumo de drogas lícitas e ilícitas. Morreu aos 27 anos, assim como Janis Joplin, esta encontrada em um hotel de Hollywood, vítima de overdose de heroína. Quadros depressivos eram constantes em Amy, que demonstrava essa fragilidade até mesmo em seus clipes e letras das músicas. Doenças psíquicas também afetaram Elis Regina. Bipolaridade e depressão marcaram a vida da cantora que fez história na música brasileira. Mesmo com fama e uma vida familiar – Elis deixou três filhos, um deles, a cantora Maria Rita com apenas três anos de idade – a doença e o consequente vício levaram a musa da MPB à ruína. Risco da fama O fato de serem pessoas públicas contribuiu de forma negativa para Amy e Chorão, por exemplo. E isso é algo comprovado pela psicanálise. “A fama e o glamour geralmente vêm acompanhados de uma série de fatores que mexem bastante com o ego de qualquer pessoa. Quando falamos de adictos (dependentes químicos), tudo isso se potencializa e a compulsão pelo uso fica mais suscetível”, explica Cristiane Martin. Lembranças do passado também podem contribuir para recaídas. No caso do ator Cory Monteith, a família e amigos dos Estados Unidos comentam que boa parte dos problemas voltavam quando ele visitava os antigos colegas no Canadá. Isso é explicado pela psicologia. Segundo a psicóloga Vivian Sbrama Mauger, o cérebro relaciona as memórias geradas ao uso da droga com a sensação de prazer. “Mesmo depois de terminarem os sintomas da abstinência, o indivíduo está vulnerável a essas associações inconscientes, que podem desencadear um desejo, aparentemente do nada”, completa. Relação fã e ídolo Há sempre um sentimento de identificação e amor forte entre fã e ídolo, o que, em alguns casos, pode chegar a ser prejudicial para a pessoa, principalmente durante a adolescência. “Onde eles não só imitam a maneira de se vestir dos seus ídolos, como também seus comportamentos e, muitas vezes, infelizmente, o de usar drogas, pois associam a fama e o sucesso, ao consumo de entorpecentes”, explica a psicanalista Cristiane Maluf. Claro que isso não é uma regra. Muitos admiradores não compactuam com o vício do ídolo, e torcem para que ele faça algum tipo de tratamento. Com as redes sociais, é cada vez mais comum ler mensagens de apoio e soli- dariedade enviada por pessoas do mundo todo para esses famosos que passam por momentos delicados. Nos piores casos, quando o vício culmina na morte, o problema se torna outro. “Como diz a música do Cazuza ‘meus heróis morreram de overdose!’ (letra da música Ideologia), os fãs acabam sofrendo como se fosse alguém da própria família, vivenciam o luto na íntegra, pois o consideravam realmente seus heróis. Ficam com a sensação de que estão órfãos”, destaca. “Se este sentimento, esta apatia, não melhorar no decorrer dos dias, o ideal é procurar ajudas psiquiátrica e psicológica para não desencadear um transtorno depressivo mais grave”, alerta Cristiane.