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A posição na fratria. Contributo para uma abordagem grupanalítica da violência 1
Francisco Salgado
XIII Congresso Nacional da Sociedade Portuguesa de Grupanálise
Lisboa, 19 e 20 de Outubro de 2012.
A posição na fratria. Contributo para uma abordagem
grupanalítica da violência1.
Autor:
Francisco Salgado
Psicólogo Clínico. Membro Titular da Sociedade Portuguesa de Grupanálise e Psicoterapia Analítica
de Grupo
[email protected]
Resumo
Propõe-se uma breve abordagem aos conceitos de agressividade e violência, para de seguida os
enquadrar no contexto da relação fraterna. Destaca-se o grupo de grupanálise como espaço
terapêutico privilegiado de encenação emocional da relação entre irmãos, questionando-se a
importância do papel, decorrente da posição na fratria. Valoriza-se o impacto relacional, da
experiência única, que o evoluir individual no grupo de grupanálise proporciona, ao permitir, a cada
um dos seus membros, vivenciar diferentes posições na fratria. Será que esta experiência relacional
única, vivenciada em grupanálise, que podemos designar por “vivência posicional plural fraterna”, é
facilitadora de uma mais ampla compreensão, transformação e plasticidade psíquica? A presente
comunicação pretende assim refletir sobre o impacto terapêutico desta “nova realidade”,
nomeadamente na abordagem da violência.
Palavras- - Chave: violência; posição na fratria; grupanálise
Abstract
It is proposed a brief approach to the concept of aggressiveness and violence, in order to fit them in
the context of the relationships between brothers. The group-analysis group stands out as a
privileged therapeutic space, where an emotional relationship between brothers is played,
questioning the importance of the fraternal position. The group-analysis group values the relational
impact, the self-experience and also the self-evolution, allowing to each member to experience
different positions between brothers. Can we say that this unique relational experience,
experienced during group-analysis, which can be designated as “plural positional experience
between brothers”, allows a broader psychic understanding, transformation and plasticity? This talk
pretends to reflect over the therapeutic impact of this new reality, namely approaching violence.
Keywords: violence; position between brothers; group-analysis
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Comunicação apresentada no XIII Congresso Nacional da Sociedade Portuguesa de Grupanálise, realizado em Lisboa, a
19 e 20 de Outubro de 2012.
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I - Nota Introdutória
Há já muito tempo que a ordem de nascimento foi considerado como um fator de influência no
desenvolvimento da personalidade.
Em 1917, Freud (cit. in Fernandes, O. M. 2002) afirmava: ”a posição que uma criança ocupa na
família é um fator de extrema importância na determinação da vida futura, devendo ser valorizada
na elaboração da sua anamnese”.
Mas é com Adler (1870-1937, cit. in Fernandes, O. M.; Alarcão, M.; Raposo, J. V. 2007) que se faz o
primeiro estudo sobre as características da personalidade, correspondentes a cada uma das
posições na fratria.
Um pouco arredada da investigação psicanalítica, a relação fraterna, onde se inclui o estudo da
posição na fratria, tem sido objeto, a partir dos anos 2000, de uma acentuada valorização, traduzida
num número significativo de novos trabalhos, provenientes sobretudo das terapias analíticas de
grupo.
É pois, estimulado por este movimento, que damos continuidade a trabalhos que temos vindo a
desenvolver nesta área.
Assim, a presente comunicação, inicia-se com uma breve abordagem aos conceitos de agressividade
e violência, para de seguida os enquadrar no contexto da relação fraterna.
Destaca-se o grupo de grupanálise, como espaço privilegiado de encenação emocional do
relacionamento entre irmãos, questionando-se, a importância do papel, decorrente da posição na
fratria.
Valoriza-se o impacto relacional, da experiência única, que o evoluir individual no grupo de
grupanálise proporciona, ao permitir vivenciar, a cada um dos seus membros, diferentes posições
na fratria.
Será que esta experiência relacional única, em grupanálise, que designamos por “vivência posicional
plural fraterna”, é facilitadora de uma mais ampla compreensão, transformação e plasticidade
psíquica?
Pretende-se assim, refletir sobre o impacto terapêutico desta “nova realidade”, nomeadamente na
abordagem da violência.
II – Agressividade e Violência
Toda a proposta freudiana de construção do sujeito supõe um exercício ambivalente entre Eros e
Tanatos.
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Para Freud, como afirma Paula Heimann (1978), o instinto de vida e o instinto de morte são os
agentes motores do comportamento humano.
Estes dois instintos básicos estão fundidos um no outro, mas lutam, entre si, dentro do próprio
organismo. O instinto de vida procura a união; o instinto de morte a desagregação.
A agressividade, na conceptualização freudiana, está ao serviço do instinto de morte, sendo
definida como uma tendência especificamente humana, marcada pelo caráter ou vontade de
cometer um ato violento contra outrem.
Esta violência pode ser entendida como um sintoma. Nesse sentido, a violência supõe uma ordem
instituída da qual emerge e à qual reage, manifestando aquilo que não funciona, aquilo que impede
o acesso à felicidade, ou melhor, aquilo que impede a expressão do princípio do prazer. A violência
identificada assim é pois uma forma de dizer que algo não está bem, na relação com a ordem
instituída pela civilização.
Em “Totem e tabu”, Freud (1913, citado em: Goldsmid; Féres-Carneiro, 2007) cria um mito sobre a
origem da civilização. A formação da fraternidade seria uma consequência da renúncia coletiva ao
lugar de pleno poder, antes ocupado pelo pai. O grupo fraterno tem como estrutura básica, um
acordo, um pacto social, fundamentado na necessidade de controlar a rivalidade fraterna e com ela,
os sentimentos associados à inveja e ao ciúme.
O laço libidinal que é abordado, por Freud, em Totem e Tabu (1913) e mais tarde em Psicologia das
Massas e Análise do Eu (1921) destaca a relação entre pai e filhos e entre irmãos. (Teixeira, L. 2002)
É a partir da representação de um ato de violência, que o complexo edipiano é conceptualizado. É o
mesmo ato que funda o sujeito e a cultura, sendo esta concretizada por uma comunidade de iguais,
em contraponto a um núcleo centralizado de poder. É o ódio e o desejo de matar, por um lado, e a
culpabilidade e o arrependimento por outro, que criam a possibilidade de coesão grupal, no seio da
fratria. Kaufman (1977 cit. In Teixeira, L. 2002) afirma: “o caráter coletivo do assassinato, distingue o da passagem ao ato individual” garantindo a comunidade social e evitando um ato de
totalitarismo do chefe da horda.
III - O complexo fraterno/função fraterna
Ao privilegiar o complexo edipiano, como estrutura nuclear na formação da personalidade, a
psicanálise clássica secundariza o valor específico do complexo fraterno. Este é habitualmente
considerado, um deslocamento do complexo de Édipo.
Para Kaes (2008) o valor nuclear atribuído, pela conceptualização freudiana ao complexo de édipo,
ofusca a importância específica do complexo fraterno. Em seu entender, o complexo fraterno é
determinante na preparação da elaboração do complexo de Édipo. Para defesa desta sua tese,
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recorre à relação triangular pré-edipiana (mãe-criança-falo), relação que representa no plano
fantasmático, o desejo da mãe. Nesta relação, o pai está presente através do discurso da mãe, não
sendo ainda percebido como portador de falo.
Assim, Kaes afirma que no triângulo pré-edipiano, o rival é o objeto parcial concorrente da criança.
Nesse sentido, o pai pode ser rival, mas não é identificado pela criança como pai genital,
pertencendo à mãe da mesma maneira que um irmão. Sendo assim, o irmão ou irmã, podem
assumir o lugar do pai, sem que tenham que fazer um verdadeiro deslocamento do complexo de
Édipo.
Esta base relacional do complexo fraterno deve, no entanto, ser desenvolvida e elaborada no
quadro do complexo Edipiano.
A par do complexo fraterno, a “função fraterna” explicita o caráter necessário e determinante da
participação do semelhante no processo de tornar-se individuo (Khel, 2000).
Pela análise do complexo fraterno e das relações fraternas podemos constatar que o irmão
desempenha um papel fundamental, quer no reconhecimento da alteridade, quer no
estabelecimento de vínculos sociais.
Contrariamente às relações fraternas, o complexo fraterno é uma organização intrapsíquica, que
integra o papel do irmão no psiquismo de cada um, processo a que todos os seres humanos estão
sujeitos, quer sejam ou não membros de uma fratria.
A função fraterna decorre do complexo fraterno, estando vinculada à relação entre irmãos, ao
reconhecimento da diferença e da relatividade das características próprias de cada um.
A aceitação do lugar do irmão, implica uma mudança de comportamento, nomeadamente de
hostilidade, assentes em fantasia de aniquilamento, para comportamentos assentes sobretudo em
laços de amizade. Mudança que pressupõe um equilíbrio entre Eros e Tanatos ou se quisermos
entre a rivalidade e a fraternidade.
IV - Posição na fratria e personalidade
Como já vimos, Adler (1870-1937 cit. in Fernandes, O. M.; Alarcão, M.; Raposo, J. V. 2007) foi o
primeiro a definir, em traços gerais, a personalidade correspondente a cada uma das principais
posições na fratria.
Adler afirmava mesmo que a posição na fratria é de tal modo importante na modelação do caráter
individual, que é possível reconhecer rapidamente um primogênito, um filho único, o do meio ou o
mais novo, desde que se tenha experiência suficiente.
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Assim, para Adler (Stein, 2006 cit. in. Fernandes, O. M.; Alarcão, M.; Raposo, J. V. (2007) o mais
velho é caracterizado por ser autoritário ou disciplinador. “Sente que o poder é o seu direito
natural”, podendo “tornar-se prestável desde que encorajado”; quanto ao segundo, diz que: “ É
mais competitivo, deseja alcançar o irmão mais velho” podendo “tornar-se um rebelde ou tentar
superar toda a gente. A competição pode descambar em rivalidade”; quanto ao do meio, Adler diz
que: “Pode ser equilibrado, com uma atitude de tanto faz. Pode ter problemas em encontrar um
lugar, ou tornar-se o combatente da injustiça”; finalmente quanto ao mais novo, Adler diz que este
“ quer ser maior do que os outros. Pode ter grandes planos, que nunca passam disso. Pode ficar o
bebé. Frequentemente é mimado.”
Num estudo realizado em 2007, por Otília Fernandes, Madalena Alarcão e José Raposo, sobre
diferenças de personalidade decorrentes da posição na fratria, concluiu-se:
Os irmãos mais velhos são mais conscienciosos, mais altruístas e menos hostis do que os do meio.
Os mais velhos são, unanimemente, vistos como aqueles que aderem aos “padrões de conduta,
princípios éticos e obrigações morais”. A situação de primogênito da fratria impõe-lhes a
responsabilidade de ser o detentor das normas e valores familiares, o que os torna mais
conservadores do que os não primogénitos (Sulloway, 1997; Toman, 1993 cit. in. Fernandes, O. M.;
Alarcão, M.; Raposo, J. V. (2007) e consequentemente, mais cautelosos do que esses.
Os irmãos do meio – que, contrariamente aos mais velhos têm papéis pouco definidos no seio da
família – tornam-se mais hostis com “tendência a experienciar raiva e estados afins, como a
frustração e a amargura”, resultante das lutas que travam em nome da sua identidade e em nome
da conquista de espaço no grupo familiar. Esta situação pode justificar, também, o facto de que os
irmãos do meio se mostrem menos altruístas que os mais velhos.
Os mais novos são mais amáveis, mais retos e complacentes do que os do meio. Têm, à semelhança
dos mais velhos e por oposição aos do meio, uma posição bem definida na fratria, o que lhes
assegura a possibilidade de poderem ser mais frontais, com menos tendência para manobras de
manipulação, além de poderem ser também menos agressivos, antagônicos, contestadores e
competitivos.
Num outro estudo, Otília Fernandes (2002) chama a atenção para a destronação como
problemática central para compreender o desenvolvimento da personalidade dos primogénitos. A
competitividade e o conservadorismo são as facetas mais comuns resultantes da destronação no
caráter dos primogênitos.
Nesse seu estudo, o primeiro filho é descrito como franco, generoso protetor; simultaneamente
abdicador e reivindicador; auto-suficiente e mais conformado; autoritário, líder, dominador, rígido,
controlado e flexível, mais responsável e com um elevado sentido de ordem; independente mas
suscetível a pressão social; menos popular e menos original e artisticamente criativo.
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Os do meio, segundo, Léglise (1999, cit. in Fernandes, O. M. 2002) tendem habitualmente a contra
identificarem-se com o mais velho e a identificarem-se com o mais novo. Têm mais facilidade de
verbalizar e admitir o ódio, relativamente ao mais novo, do que ao mais velho. O ódio/ciúme
primitivo do irmão do meio para o mais velho, que Gayet (1993 cit. in Fernandes, O. M. 2002)
designou de “complexo de Abel”, pode ser mais facilmente deslocado para o irmão mais novo.
Decorrente habitualmente da indefinição do seu papel na fratria, à pouca atenção e interacção
familiar, e à diferença de desenvolvimento, relativamente ao irmão mais velho, alguns autores
consideram que estas crianças tendem a desenvolver baixos índices de auto-estima, sentimentos de
inferioridade, de insegurança e de abandono.
Por outro lado, continuando com Fernandes (2002) esta posição de “nem carne nem peixe”,
possibilita-lhes serem independentes: não têm de ter as responsabilidades do mais velho, nem as
“desresponsabilidades” do mais novo, assumindo uma ou outra posição, conforme lhes convém.
Habitualmente tem um espírito competitivo, são mais “revolucionários” e criativos, face ao
primogênito.
O irmão mais novo, como já vimos é o mimado, o irresponsável, o oposto ao primogénito e algo
semelhante ao do meio. Ele nunca é destronado.
Tem por objetivo ultrapassar o mais velho, mas, em caso de vitória, fica com sentimentos de
culpabilidade e de medo: “De medo, por um lado, da cólera e da vingança do mais velho, mas
também, de se encontrar só, muito distante e à frente, fora da esfera de influencia do mais velho
(Klagsbrun, 1994 cit. in Fernandes, O. M. 2002).
Comparativamente aos primogénitos são menos convencionais, mais criativos e mais sociáveis.
Do exposto e ainda que de uma forma dispersa, podemos afirmar que os estudos desenvolvidos
confirmam a existência de características próprias na expressão e elaboração da agressividade,
decorrentes da posição na fratria.
V – A posição na fratria, no contexto grupanalítico –
“A vivência posicional plural fraterna”
Em trabalhos anteriores, a propósito da rivalidade fraterna, procurámos demonstrar que o grupo de
grupanálise se oferece como um espaço privilegiado de emergência, clarificação e elaboração da
agressividade fraterna.
Neste contexto, a posição na fratria e toda a problemática associada à agressividade, goza de uma
situação particular. Cada posição na fratria, como vimos, tem uma expressão própria da
agressividade, que num grupo de grupanálise, pode ser vivenciada e trabalhada ao longo do
processo analítico.
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De facto, cada membro do grupo no seu itinerário analítico conhecerá as diferentes posições da
fratria, que vão desde o lugar do mais novo, ao do meio, até ao lugar do mais velho, experiência que
é particularmente enriquecedora, já que permite vivenciar as características próprias de cada uma
dessas posições, nomeadamente as relativas à agressividade, fomentando assim uma mais ampla
compreensão, tolerância e flexibilidade psíquica.
Nesse sentido, trata-se de uma experiência relacional nova, já que a realidade factual não pode
proporcionar esta vivência. Por outras palavras, no seio de uma família não é possível ser o filho
mais novo, o do meio e o mais velho.
Esta experiencia relacional nova, que designámos por “vivência posicional plural fraterna”, só é
possível num grupo de grupanálise já rodado, no qual, um novo membro pode identificar membros
mais velhos e mais novos, à semelhança de uma fratria mais ou menos numerosa.
Esta experiencia permitirá assim ao analisando viver, entre outros aspectos, a amabilidade e
complacência do mais novo, a hostilidade e competitividade do irmão do meio, e a responsabilidade
e poder do mais velho; experiencia que, se juntarmos a vivência da destronação, é, como já
referimos, de grande riqueza ao nível da maturidade e plasticidade psíquica.
VI – Discussão
Um primeiro ponto que gostaríamos de destacar é que, a ordem de nascimento constitui um fator
influente na formação da personalidade, que deve ser somado a muitos outros fatores, como o sexo
do próprio e dos irmãos, as diferenças de idade, o tamanho da fratria, o padrão de relação dos
pais…
Só esse conjunto de fatores pode permitir a determinação das semelhanças de personalidade entre
sujeitos que têm a mesma configuração fraterna.
Nesse sentido, a abordagem à posição na fratria, é apenas mais um vértice de observação da
personalidade, a somar a muitos outros, com o objetivo de assegurar uma visão mais ampla e mais
saturada da mesma, contextualizada num grupo de grupanálise, onde se poderá fazer uso da
experiência única que é “ a vivência posicional plural fraterna”.
Um segundo ponto prende-se com a agressividade. Como pudemos ver, cada posição na fratria
apresenta características próprias que vão surgindo ao longo da análise, podendo ser vividas,
identificadas e metabolizadas.
Trata-se de um vértice de observação/contextualização da agressividade que pode permitir analisar,
de forma mais detalhada, fenómenos de rivalidade, inveja, ciúme, disputas de poder…
Um terceiro ponto refere-se à perspetiva genético evolutiva da expressão e elaboração da
agressividade. Partindo de uma visão tradicional, mais generalista, em que o filho mais velho é
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descrito como tendo características de personalidade mais próximas da dos pais, podemos
considerar a caminhada posicional em grupanálise, como uma caminhada de maturação emocional
e afetiva, em que o lugar do mais velho, corresponde a um modelo evolutivo, mais estruturado e de
identificação mais próximo do pai analista.
Um quarto ponto prende-se com a especificidade do espaço terapêutico. O complexo fraterno,
como nos diz Kaes (2008), ao contrário das relações fraternas, é uma organização intrapsíquica, que
não implica necessariamente uma relação real.
Nesse sentido, é ao nível da relação fraterna, que tem por base o complexo fraterno, que a
encenação grupanalítica ganha especificidade e, com isso, um lugar privilegiado de vivência e
intervenção terapêutica, fazendo interagir simultaneamente os níveis inter e intrapsíquicos.
Um quinto ponto refere-se à “vivência posicional plural fraterna” como processo inter-psíquico.
Inscrita numa dinâmica relacional de longo curso, permite uma vivência única, ao nível emocional e
afetivo, de cada uma das diferentes posições na fratria.
Os constrangimentos e privilégios, as relações de poder e submissão, de confronto e sedução,
decorrentes de cada lugar na fratria, permitem uma consciência mais ampla e empática
relativamente ao outro, contribuindo para uma maior plasticidade e funcionalidade psíquica.
Finalmente, um sexto ponto diz respeito à contratransferência do Grupanalista. Este deve ter
presente a sua posição na fratria, referente à sua “matriz familiar”, apesar de ter sido sujeito à
“vivência posicional plural fraterna” na grupanálise pessoal.
Nesse sentido, pode questionar até que ponto estes aspetos, ligados à personalidade foram
suficientemente trabalhados nas análises pessoais, e até que ponto podem interferir na sua forma
de estar e ser em “setting” grupanalítico.
Dentro do espírito que nos caracteriza, mais que certezas deixo-vos alguns pontos para reflexão,
com o propósito de tentar alargar o debate a novos vértices de observação e de aprofundamento
do fórum analítico, convicto de que, o grupo de grupanálise, pelas suas características específicas,
oferece-se como um espaço terapêutico de eleição.
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Bibliografia
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Editores, Rio de Janeiro: Brasil.
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