A QUESTÃO DA PRATICA EM PESQUISA COMO ESPAÇO DE

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A QUESTÃO DA PRATICA EM PESQUISA COMO ESPAÇO DE ESTAGIO
EM PSICOLOGIA EDUCACIONAL.
Sônia da Cunha Urt - [email protected]
INTRODUÇÃO
A pesquisa como fonte de iniciação à prática de Estágio Básico em Psicologia é
a premissa básica da apresentação deste trabalho. As ferramentas, os instrumentos, as
normas, a linguagem científica, o produto final sob a forma de um artigo até sua
divulgação em evento científico e/ou publicação, enfim todo o artefato que envolve o
fazer uma investigação sendo disponibilizado para alunos de Psicologia de terceiro ano
tem sido foco de nossos estudos, desafio e aposta na construção de uma base para se
pensar a relação mais ampla da Psicologia com a Educação.
Os alunos são apresentados incialmente aos projetos de pesquisa do professor e
juntamente com os pós-graduandos – mestrandos e doutorandos - dá-se o início ao
processo de formação e iniciação em pesquisa ou ao processo de tornar-se pesquisador
em Psicologia.
Leitura de textos de metodologia, de Psicologia Educacional, de determinadas
abordagens da Psicologia e sobre algumas temáticas específicas são os materiais
utilizados como procedimento adotados nessa fase, até que seja elaborado o projeto de
trabalho que assim definido o professor passa a ser o orientador desse processo. Os
instrumentos de pesquisa também são aprendidos em seguida. As pesquisas são
iniciadas com o acompanhamento do professor e então, com supervisões semanais há
uma socialização entre todos os alunos dos temas de investigação até que resultem em
um artigo final com a entrega para apresentação em eventos e encaminhamento para
publicação.
PESQUISA E PRODUÇÃO COLETIVA: PREMISSAS DA PROPOSTA
DE ESTÁGIO
Partilhar e produzir significa muito mais do que juntar pessoas em torno de algo.
Produção científica coletiva deve se referir a um ritual que pressupõe disciplina e
aproximação de pesquisadores, técnicos e alunos em torno de temas e objetivos comuns.
2 Para isso, estudam, fazem levantamentos, organizam e participam de eventos,
apresentam e publicam trabalhos, desenvolvem suas pesquisas ou participam de algum
projeto de pesquisa, expressam e discutem suas dificuldades e crescem juntos, portanto,
o conhecimento é compartilhado.
Organizar e participar de um processo de produção coletiva do conhecimento
exige que as pessoas diminuam suas expectativas em relação a grandes possibilidades
individuais momentâneas e aumentem suas responsabilidades em relação ao
compromisso com o grupo ao qual se vincula, e isso pressupõe aprendizagens para
todos os envolvidos.
Urt, S. C.; Azzi, R.; Larocca, L. (2002, p.93) corroboram esse argumento, em
relação à responsabilidade do pesquisador, ao destacar que “... o saber produzido pela
ciência contribuirá para o avanço tecnológico e estará mais perto de propiciar a
transformação da sociedade e da qualidade de vida das pessoas, ao mesmo tempo em
que estimula a livre expressão de cada um sobre a sua forma diferente de apreender o
mundo”.
Vale destacar que essa questão é extremamente complexa, considerando que
nosso modelo de sociedade e, em consequência, de universidade, alicerça exatamente o
oposto, ou seja, o cultivo do individualismo e de ações particularizadas.
A formação do pesquisador e a institucionalização da Pesquisa devem estar
presentes na academia, sistematicamente, desde a graduação. O primeiro passo será
ligar a atividade do professor com a do pesquisador, na teoria e na prática, considerando
a pesquisa como princípio científico e educativo. Somente um pesquisador pode de
modo coerente, motivar o interesse pela produção própria no aluno, passando de
professor a orientador.
Sampaio (1984) defende o engajamento em pesquisa desde a graduação, em
projetos de pesquisa de docentes ou em projetos institucionais, e a melhoria das
condições de desenvolvimento da atividade nos programas de Pós - Graduação.
Suas ideias são referendadas por Azzi (2000), ao apontar que pesquisa se
aprende fazendo e que quanto antes a formação for iniciada, maior a probabilidade de
seu sucesso. Estes dois pontos, pesquisa e produção coletiva, são os balizadores que
devem servir de leme para as ações de um grupo que busca unidade nas concepções
básicas de se pensar o conhecimento e a sua produção, independentemente da opção
teórico-metodológica.
3 O desenvolvimento de pesquisas tomando por base as teorias educacionais e
psicológicas historicamente construídas e suas implicações na dinâmica educativa da
atualidade tem garantido espaço substancial na produção de novos conhecimentos. O
pressuposto básico é de que a formação do profissional-pesquisador deve criar as
condições necessárias à consolidação de uma visão ampliada sobre a profissão.
Entendemos que a construção do conhecimento como processo dinâmico e
coletivo se constitui na mediação do sujeito com o contexto social, histórico e cultural.
Trata-se, então, de criar as condições necessárias para a formação do profissionalpesquisador em suas múltiplas dimensões, científica, técnica e política.
A apropriação do conhecimento traz claramente expresso, o objetivo de
“formar” e “informar” e retomam a constituição do profissional como sujeito concreto
nas relações que estabelece, através da dialética apropriação/objetivação.
Estamos diante de uma Pedagogia por “competências” e de uma preocupação
com a avaliação de seus resultados. Nesse sentido, o debate educacional encontra-se
reduzido a uma cultura de mercado que clama por competitividade, competências,
flexibilidade, autonomia e tomada de decisão.
Os alunos e os professores são
responsáveis pelas estratégias que poderão levá-los a ter sucesso ou não - o indivíduo
deve estar “apto” para acompanhar as mudanças existentes.
As características pessoais que o aluno precisa possuir, ou adquirir na academia,
para corresponder às expectativas do mercado, volta a construir o mesmo modelo – o
padrão que os profissionais precisam entender e ao qual precisam corresponder para
bem desempenharem a sua função. O fato é que a sociedade contemporânea vem
gerando novas exigências para os psicólogos, especialmente no campo da educação e
recorrendo a ela como recurso para enfrentar os desafios da alta competitividade. Dessa
forma, voltaram a usar na educação as propostas renovadoras, e o novo discurso
subentendido é que a Psicologia possa ajudar a Educação na “adaptação” do homem à
complexidade da vida moderna.
Diante da onda da política neoliberal apregoada hoje, que quer transformar a
Educação em mercado e o aluno em consumidor, é que se questiona o tipo de escola
pretendida pela sociedade que induz a educação a “ajustar-se” às exigências do mercado
e, ainda, o papel da Psicologia no enfrentamento dessas novas tendências.
4 Duarte (1999) chama a atenção para o fato de a Educação passar a ser valorizada
cada vez menos por seus conteúdos concretos e mais pelas capacidades concretas, que
permitiriam o “aprender a aprender”. Segundo o autor, o importante, então, nessa
perspectiva não é formar um indivíduo que possua determinados conhecimentos, mas
um indivíduo disposto a aprender aquilo que é útil à sua incessante adaptação às
mutações do mercado globalizado.
É importante perceber como se dá a apropriação das idéias das correntes
psicológicas a partir das novas exigências a respeito das chamadas competências que o
novo profissional deve possuir. Segundo Sadalla (1998), as teorias psicológicas
contribuíram para que se acreditasse que o fenômeno do fracasso escolar, por exemplo,
tinha sua origem nos determinantes situados prioritariamente no aluno - determinantes
biológicos. A conseqüência de se buscar compreender o fracasso como dependente
unicamente do aluno, de suas deficiências ou desajustamentos foi a criação de grupos de
marginalizados e estigmatizados.
Posteriormente, a explicação passou da dimensão biológica para a social e a
queixa escolar foi justificada como pobreza, carência, desnutrição e falta de interesse
dos pais na vida escolar do filho. E, apesar de muitos programas para compensar as
chamadas deficiências, as mudanças metodológicas e curriculares não apresentaram aos
professores possibilidades reais de assumir sua parcela de responsabilidade diante das
dificuldades.
Os estudos sobre infância, adolescência e outras etapas da vida associados às
questões da aprendizagem, da identidade profissional e pessoal, a consideração das
instituições escolares, sociais e culturais, permitirão que as investigações praticadas por
professores e alunos contribuam com a produção na área da atuação do psicólogo
considerando sua formação em geral e suas diferentes matizes.
Em síntese, o que se propõe neste exercício de Estágio x Pesquisa é articular as
amplas temáticas: Educação, Psicologia e Prática Profissional com uma concepção
concreta de sujeito que se singulariza através do pensar e do fazer.
A constituição do sujeito como algo dinâmico e dialético e a identidade do
profissional psicólogo educacional é permeada pelas temáticas aprendizagem,
desenvolvimento, infância e formação, entendida como um processo de apropriação e
reconstrução de si e do outro, que se dá nos espaços e territórios onde ocorre a
sistematização do saber socialmente construído.
5 CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, APRENDIZAGEM, E A
PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO.
Desde a década de 1980, inúmeras produções científicas na área da
Psicologia Histórico-Cultural, começam investigações orientadas por uma concepção
psicológica que procura entender o homem como ser concreto, social, cultural,
biológico e psicológico, que se constitui através das relações sociais que estabelece e de
suas condições objetivas de vida.
Assim sendo, a nossa proposta de Estágio vem construindo produções em
Psicologia e Educação orientadas pela “matriz” da Psicologia histórico-cultural e, de
outras abordagens psicológicas e pedagógicas. Não se pode prescindir das ideias e do
conhecimento psicológico para a compreensão do ato educativo. Mas não se defende
qualquer ideia ou qualquer conhecimento psicológico, mas sim, aquele comprometido
com uma visão de sujeito que se constitui através das relações sociais e culturais
estabelecidas.
Olhar e fazer educação, formar alunos e profissionais, envolve considerar o
contexto histórico, filosófico e político das questões educacionais, entretanto, não são
estas miradas suficientes para a compreensão do fenômeno educativo em sua totalidade,
Quem aprende é um sujeito concreto que expressa sua singularidade por meio da
internalização dos conceitos, ideias, valores que percebe no mundo social. Mas é
também um sujeito da emoção, da afetividade, do desejo. Isso não pode ser negado.
Na escola ou em qualquer instância em que ocorra aprendizagem a
Psicologia pode contribuir de forma singular e efetiva na questão da relação professor x
aluno, da disciplina, da identidade pessoal e profissional, do desenvolvimento, da
aprendizagem e de suas dificuldades, da avaliação, do currículo etc., desde que essas
temáticas não sejam enfocadas de forma medicalizante, como se a escola fosse uma
instituição hospitalar.
Buscamos realizar pesquisas referendadas em uma Psicologia comprometida
com a transformação do sujeito e da sociedade, com a compreensão de que a
inteligência é construída e que de que a aprendizagem refere-se à apropriação dos bens
disponíveis pela humanidade, por meio da educação. Esses são indicadores que
corroboram esse modelo de estágio que estamos desenvolvendo e que se propõe a
articular Educação, Psicologia e Prática Profissional e que
aprendizagem e do conhecimento.
perceba o sujeito da
6 PENSANDO A PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO – O ESTÁGIO – E A PESQUISA
Pensar a Psicologia da e na Educação pressupõe sublinhar alguns de seus
aportes. Vejamos alguns deles. Coll (2000) aponta a definição do campo de
conhecimento da Psicologia da Educação como resultado dos esforços de utilização das
explicações e métodos da Psicologia Científica, para a melhoria das práticas educativas,
em geral, e da escolarização, em particular.
As teorias pedagógicas também fizeram suas tentativas de desenvolver-se às
margens das correntes filosóficas, buscando uma fundamentação científica, mas foi a
necessidade de se introduzir mudanças qualitativas no Ensino que fez com que as
expectativas de solução se voltassem para a Psicologia.
Muitos pesquisadores evidenciam em seus estudos, que a configuração da
Psicologia da Educação surgiu da tentativa da Psicologia em estudar cientificamente
fenômenos educativos, procurando contribuir para a melhoria da Educação,
influenciando tanto as teorias, quanto as práticas educativas.
Guerra (2002), afirma que as diferentes formas de produzir conhecimento para
as questões educacionais deram origem às diferentes concepções sobre a Psicologia da
Educação que, ainda hoje, coexistem. Cada uma dessas concepções expressa a
importância atribuída aos componentes psicológicos no estudo e na compreensão dos
fenômenos educativos. As diferentes concepções oscilam, desde posições que ainda
enfatizam o reducionismo aos aspectos de natureza psicológica e sua aplicabilidade nos
conhecimentos produzidos no campo da Educação, até a renúncia explícita a esta
proposição, passando por diversas posturas intermediárias.
A importância atribuída à Psicologia, de certa maneira, contribuiu para a
psicologização do processo educacional. O fenômeno do reducionismo dos problemas
educacionais aos aspectos psicológicos passou a ser objeto de muitas críticas, que,
muitas vezes partiram de estudiosos da própria Psicologia, que apontavam a
necessidade de se considerar outros indicadores na análise dos fenômenos, mesmo
psicológicos, como a ênfase na perspectiva do indivíduo, principalmente com a
contribuição da Sociologia.- (ALVITE -1981; FERREIRA-1986; PATTO -1984).
Placco (2004) afirma que a Educação e a Psicologia precisam responder à
necessidade de uma transformação radical na sociedade tal como se encontra hoje
7 organizada e, para isso, devem ter clareza de seu papel histórico e do referencial teórico
que as sustenta.
Entendemos que diferentes “leituras” feitas sobre as abordagens da
Psicologia se constituem num referencial muito rico para se discutir as formas como se
consolida “o discurso” sobre a prática docente.
Compreende-se que o profissional em formação, ao se apropriar do
conhecimento veiculado, nas diferentes situações da aprendizagem, nas relações sociais,
acaba gerando um "saber" pela prática, que não é o conhecimento historicamente
acumulado, mas um saber reelaborado, adquirido nas apropriações realizadas, a partir
das atividades exercidas.
Duarte (1999), ao retomar as características do processo de apropriação
assinaladas por Leontiev, relembra que a formação do indivíduo se dá a partir da
apropriação dos resultados da história social, quando ele se objetiva no interior da
história, apropriação / objetivação, como já se pontuou, anteriormente, neste trabalho.
Observa ainda que, esse processo se efetiva no interior das relações concretas com
outros indivíduos, que atuam como mediadores entre ele e o mundo, atividade humana
objetivada. Nesse sentido, o autor enfatiza que a formação do indivíduo é sempre um
processo educativo, mesmo que não se dê no interior de determinada prática social e
mesmo sem a consciência dessa relação. Duarte retoma ainda a questão de que, nessa
perspectiva, a educação também pode ter um sinal negativo, isto é, tanto a apropriação
quanto a objetivação podem fazer parte dos processos sociais alienantes.
A partir dos trabalhos de Leontiev (1978), nas apropriações realizadas, o
professor pode se constituir como um sujeito crítico, capaz de questionar as crenças e/ou
cristalizações, que permeiam o contexto social, ou não, ele pode se deixar orientar pelos
"parâmetros" que permeiam o contexto social em que vive e trabalha.
Ciampa (1994), ao estudar o processo de constituição da identidade, chama
de autodeterminação o movimento de transformação das condições exteriores, e não
uma simples libertação dessas condições, e de re-posição a não-transformação. A reposição envolve uma identidade pressuposta que é re-posta a cada momento: uma
réplica" (p. 163) como é o caso do professor que se deixa levar pelo discurso "do novo",
sem se aprofundar na questão.
É importante observar que a preocupação com a forma como as ideias de
Vygotsky são veiculadas liga-se à aquisição do "saber" pelo professional, uma vez que
os conhecimentos formais da Psicologia sempre representaram um forte ponto de apoio
8 à ação desse profissional. Cabe refletir, também, se esse "saber" representa saltos
qualitativos no processo de constituição do profissional, ou não; isto é, se ele significa
mais uma "construção social", resultante do amálgama gerado na interligação dos
conhecimentos adquiridos com o senso-comum, nas "relações intersubjetivas"
(sujeito/sujeito e/ou sujeito/objeto) do "contexto social" ou nas "atividades
compartilhadas", como se convencionou pontuar.
Esse saber, gerado na ponte que se estende entre o saber científico e a
instituição acadêmica, a partir das apropriações realizadas, não pode se constituir de um
saber superficial, e sim de um saber articulado que ajude o profissional teorizar sua
prática, transformando-a para melhor.
A IMPORTÂNCIA DO CONHECIMENTO DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA NA
EDUCAÇÃO E NA PSICOLOGIA
GATTI (1995), ao tratar do papel da Psicologia na Educação, situa com
propriedade a questão, afirmando que, quanto às diferentes formas pelas quais a
Psicologia tem abordado problemas relativos à Educação, infere-se que suas
contribuições têm sido escassas e, na maioria das vezes têm sido utilizadas para
justificar cientificamente a seletividade existente, fundamentando medidas paliativas e
não transformadoras.
A autora continua afirmando que estudos na área da Psicologia da Educação,
numa perspectiva transdisciplinar, apresentam alternativas para a compreensão dos
fenômenos ao desenvolvimento humano, à cognição, ao ensino etc, porém barreiras
existentes na socialização dessas novas contribuições da Psicologia, trazidas pelas
pesquisas acadêmicas, reduzem seu impacto na Educação.
Essas barreiras referem-se a:
 emprego de bibliografia antiga, não revisada e com erros na tradução;
 ensino de uma Psicologia abstrata, sem correspondência com a realidade
escolar;
 necessidade dos profissionais da Psicologia da Educação refletirem mais
sobre os processos de ensino, pois eles têm se ocupado mais com o
aprender, quando a compreensão dos processos da aprendizagem humana
não garante a compreensão do ato de ensinar.
9 A autora continua afirmando que, para se compreender os processos de Ensino e
de Aprendizagem, há que se considerar duas perspectivas distintas:

o ato de ensinar implica uma construção específica daquilo que é o
ensino- ato intencional, de natureza relacional, executado para
transmitir um conjunto sistematizado e selecionado de conhecimento,
com o objetivo de que seja compreendido e assimilado:

quanto aos processos de aprendizagem o foco inside nas teorias de
ensino e nas teorias de aprendizagem, sendo que as primeiras têm um
papel fundamental no delineamento das propostas de formação de
professores.
Concluindo, afirma que, enquanto os estudiosos se dedicam ao estudo dos
processos cognitivos, os professores desejam saber o que fazer, como e por que, em
cada dia letivo, em sua escola, em sua disciplina.
Para se criar condições que integrem e combinem aquilo que essencial na
produção científica com a prática adotada na escola, há que se avançar para além dos
fundamentos científicos, alcançando posições históricas- filosóficas que tenham a ver
com o sentido e as finalidades dessa mesma prática.
CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO INTELECTUAL DOS PROFISSIONAIS DA
PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
GATTI chama a atenção para outro aspecto importante: a necessidade de pensar
na formação tanto de psicólogos quanto de pedagogos, de modo que ambos tenham uma
formação polivalente.
Nessa perspectiva, a convivência e a participação dos dois grupos em
experiências partilhadas de formação, ações e pesquisa deve ser o caminho que pode
engendrar novas concepções e formas de ação para uma área inter e transdisciplinar
como é a Psicologia da Educação.
Nesse sentido, campos de conhecimento vêm sendo construídos, cada um com
uma sistemática de atuação específica. Cada campo de estudo lança uma luz diferente
na direção da compreensão do homem e das coisas na natureza e no universo. Todos
esses campos interpenetram-se permitindo a contemplação dos fenômenos, de forma
cada vez mais abrangente, a partir de construções integradoras de novas maneiras de
10 olhar os fenômenos e compreender o que se processa nesse universo em que os seres
humanos se situam.
Assim sendo, para GATTI, o campo de conhecimento que se refere à Psicologia
da Educação situa-se entre as diferentes formas de se tratar fenômenos com
características mais abrangentes, com uma perspectiva nova, cujas origens podem estar
na Psicologia e na Educação como campos de conhecimento, mas que na integração
mostra-se como uma nova síntese.
Vale lembrar a importância da discussão sobre a formação do pesquisador e a
institucionalização da Pesquisa na Universidade
Para LUNA (1992), há uma baixa valorização da pesquisa por significativa
parcela dos docentes universitários, reforçada pela falta de definição da Instituição sobre
a relação ensino- pesquisa, e por práticas institucionais que apontam para um quase
reconhecimento da dissociação entre eles.
AZZI (1995) acredita que o maior entrave para a institucionalização da pesquisa
na Universidade seja a falta de compromisso com o saber, com a ideia de que à
Universidade cabe a função de superação da mera reprodução do saber instituído.
Ao se tratar da qualidade e modernidade da Educação Superior DEMO (1991),
faz uma crítica à "universidade do ensino", isto é, aquela onde não ocorre nada além da
reprodução do conhecimento. Em contrapartida, defende a pesquisa como inspiradora
do processo educativo, tanto no que diz respeito à competência para a produção própria
do conhecimento- qualidade formal como à competência política- qualidade política.
Somente a conjugação dessas duas modalidades, formal e política, pode garantir que a
universidade cumpra o seu papel de agente de mudanças.
Para o autor, a pesquisa como princípio científico decorre da sua concepção de
instrumento de produção de conhecimento. Implica domínio metodológico e
competência técnica. É expressão da qualidade formal. Em geral, é encarada como
atividade sofisticada e reservada a poucos. É preciso desmistificar esse estereótipo.
DEMO (1991), afirma que a pesquisa será encarada como princípio educativo
quando for assumida como princípio de vida, como estratégia de autoconstrução e não
como um rito acadêmico. É a atitude básica de questionar, de não acreditar na primeira
impressão, nas ordens vigentes nos conhecimentos rígidos e envelhecidos e nas teorias
comuns.
O autor utiliza a proposta da pesquisa como princípio científico e educativo para
fundamentar sua crítica no processo educativo tradicional e para propor uma revisão
11 desse processo que ponha a pesquisa como estratégia fundamental para superar a marca
da escola reprodutora, imitadora, pela escola criadora, onde aprender é sinônimo de
elaboração própria.
O ENVOLVIMENTO DO ACADÊMICO EM PESQUISA NA
UNIVERSIDADE
Envolvidos com o tema sobre a importância da pesquisa na Universidade e a
inclusão do acadêmico nessas pesquisas, concorda- se com essas ideias, na medida em
que elas apontem para a consideração da importância da formação do pesquisador e do
profissional nessa fase de formação em exercício.
Segundo DEMO (1990) faz-se necessária uma mudança radical na postura
didática e pessoal dos professores, frente ao processo de formação dos alunos. Para
formar indivíduos criadores e autônomos é preciso que eles próprios sejam criadores de
conhecimentos. Mas, principalmente é preciso superar a dissociação entre ensino e
pesquisa, na prática universitária. Essa é a condição para que o ensino não seja "ensinar
a copiar", a reproduzir, a imitar e nisso reside a importância de se envolver o acadêmico
em pesquisas, na universidade.
Contudo o autor (1991) afirma que a transformação do "professor que dá aulas"
em orientador de pesquisa, passando pela produção própria de pesquisa como
fundamento inseparável, é, na prática, a grande questão. A maioria dos ditos
"professores" nunca superou a condição histórica de alunos que só aprendem.
Mudar isso é tarefa complexa e, ao mesmo tempo essencial. O primeiro passo
será ligar a atividade de professor com a atividade de pesquisador, na teoria e na prática
(pesquisa como princípio científico e educativo). Somente um pesquisador poderia de
modo coerente, motivar o interesse pela produção própria no aluno e aí passar de
professor a orientador.
MARTINS (1971), ao discorrer sobre a preparação de pesquisadores alerta que,
"nem sempre a pesquisa pode ser ensinada em cursos de métodos de pesquisa". O
processo é aprendido por meio de estágios de participação, num ambiente contagioso de
pesquisa.
Nesse sentido, o depoimento de GATTI (1987), é bastante ilustrativo:
Minha formação como pesquisadora foi feita em
núcleos de pesquisa seja na Universidade, seja na
Fundação Carlos Chagas, e não através de cursos. Desde
o primeiro ano do Curso de Pedagogia participei de
Grupos de pesquisa existente na Universidade de São
12 Paulo, primeiro como "mão de obra", coletando dados,
entrevistando pessoas aplicando questionários, fazendo
tabulações cansativas, enfim participando de pesquisas
de professores que, naquela época faziam pesquisa nos
cursos de Graduação. Mais tarde, evidentemente, na
preparação para o doutoramento e na Fundação Carlos
Chagas teve a oportunidade de desenvolver as
habilidades de pesquisa. (p.7).
AS PESQUISAS DENOMINADAS "ESTADO DA ARTE"
Segundo FERREIRA (1999), no Brasil, nos últimos quinze anos, tem-se
produzido um tipo de pesquisa denominado "Estado da Arte" ou "Estado do
Conhecimento". Trata-se de pesquisa de caráter bibliográfico, que se propõe a organizar
e discutir certa produção acadêmica, em diferentes campos do conhecimento, buscando
respostas acerca de quais aspectos vem sendo destacados e privilegiados, em diferentes
épocas e lugares, de que formas e em que condições têm sido produzidas certas
dissertações de mestrado, teses de doutorado, publicações em periódicos e
'comunicações em anais de Congressos e de Seminários.
Para SOARES (1987), a compreensão do estado de conhecimento sobre um
tema, em determinado momento, é necessária no processo de evolução da Ciência, afim
de que se ordene periodicamente o conjunto de informações e resultados já obtidos,
buscando identificar possibilidades de integração de diferentes perspectivas,
aparentemente autônomas, bem como reconhecer duplicações ou contradições e
determinar lacunas e vieses.
FERREIRA (1999), afirma que essa é uma resposta exigida por uma sociedade
que vê a Universidade como prestadora de serviços e que, por isso, deve ser avaliada.
Segundo CHAUÍ (1999), a Universidade passa a ser vista não como instituição
social, mas como organização social cujo reconhecimento e legitimidade são definidos
pela ideia de eficácia e sucesso, que significa quantidade de resultados em curto espaço
de tempo.
É FERREIRA (1999), que conclui dizendo que determinados pesquisadores
fizeram uma opção metodológica por se tratarem de pesquisas de levantamento e de
avaliação do conhecimento sobre determinado tema, vindo ao encontro de seus anseios
em conhecer o já construído e produzido, para depois buscar o que ainda não foi feito,
de dedicar mais atenção às pesquisas realizadas de difícil acesso, de dar conta de
13 determinado saber que se avoluma cada vez mais rapidamente e de divulgá-lo para a
sociedade.
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