REGIÃO CULTURAL E O MOVIMENTO MANGUEBIT: “Pernambuco

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REGIÃO CULTURAL E O MOVIMENTO MANGUEBIT:
“Pernambuco embaixo dos pés e a mente na imensidão”.
Bruno Picchi
Mestrando em Geografia (Organização do Espaço)
PPGG – UNESP Rio Claro.
[email protected]
Paulo Roberto Teixeira de Godoy
Professor Doutor do Departamento de Geografia
UNESP Rio Claro.
[email protected]
INTRODUÇÃO
“A lama injeta, alimenta, abastece, recarrega as baterias da beleza” – proclama Frederico
Montenegro, co-liderança do movimento Manguebit da cidade de Recife (PE, Brasil). Sob a
alcunha de Fred Zeroquatro e ao lado de Francisco de Assis França - o Chico Science -, articula
um circuito de interessados (na maioria músicos, jornalistas e desempregados) em fazer das Artes
sua expressão de cidadania. Contemporânea, urbana, regional e local, criou-se uma nova leitura
de Recife a partir da visão de uma classe média que vive numa cidade grande junto aos
caranguejos; onde seus escritórios estão alicerçados sob depósitos quaternários, instáveis, mal
cheirosos, porém férteis. Lá vivem em coexistência aratus, guaiamuns e outros artrópodes junto
aos homo sapiens sapiens - assim como o Palácio do Campo das Princesas, sede do Governo
do Estado de Pernambuco -.
A híbrida paisagem dessa metrópole, conhecida como a “capital do Nordeste”, serviu de
inspiração para essa cena cultural que surge no início dos anos 1990, sendo o próprio
neologismo/estandarte “Manguebit” um exemplo dessa sintética estética - uma “cidade anfíbia” pois representa a interação do ecossistema mangue com um chip de computador (o bit é a menor
unidade de cibermemória). Cena Mangue, Manguebit ou ainda Manguebeat, como preferiu a
mídia em razão da sonoridade da batida (beat) das alfaias de maracatu muito usada nos arranjos
musicais, foi em razão de um press release no Jornal do Commercio de Recife, escrito por Fred
Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3
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Zeroquatro e intitulado de “Manifesto Caranguejos com Cérebro”, que ganharam status de
movimento artístico.
A música foi sua expressão de maior revelação. Os ritmos apresentam inovação ao juntar
elementos regionais, como maracatus de baque virado e de baque solto, cavalo marinho e
caboclinho, junto aos riffs de guitarras elétricas e samplers. As letras musicais de suas bandas,
em destaque as de Chico Science e Nação Zumbi, mundo livre s/a e Eddie, apresentam grande
riqueza de elementos da paisagem urbana entrecortada com a natureza dos manguezais, citam
personagens do folclore nordestino colocando-os ao lado de ícones geopolíticos, como Emiliano
Zapata e os Panteras Negras, e proclamam o surgimento de uma bizarra nova espécie de
caranguejos com antenas wi-fi. Um caranguejo globalizado.
Essa riqueza de elementos geográficos, junto à grande influência que o movimento
Manguebit provocou na produção artística nordestina no final do recente século passado, é um
componente fundamental para o entendimento das transformações da cultura regional no Brasil
contemporâneo, sendo o próprio conceito de região cultural passível de uma nova análise para o
mapeamento de nova região cultural.
OBJETIVOS
O trabalho buscou a fundamentação teórica do conceito de região cultural sob a
perspectiva do movimento Manguebit. Alega-se que os feitos dessa cena artística exerceram
grande influência no cenário cultural contemporâneo; catapultou Recife enquanto novo pólo de
produção e criação artística de qualidade; e redefiniu a região cultural brasileira (PICCHI, 2008).
A emergência na identificação de novas regiões culturais se faz em razão de terem sido
definidas ao final dos distantes anos de 1940, sendo que a partir da próxima década, em razão do
intenso processo de urbanização e industrialização do Brasil, este quadro foi alterado. Assim,
tendo em vista que cada divisão regional tem a marca de seu tempo, existe a necessidade de
revisões de ordem conceitual e operacional – uma atualização renovada (CORRÊA, 2008, p.
32-33).
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O artigo de Corrêa (2008) tem na proposição de Diégues Jr. o quadro de referência
empírica por tratar do cenário nacional e soma apontamentos relativos à identificação e formação
de regiões culturais contemporâneas. São oito os pontos centrais de discussão, sendo o sexto a
justificativa que traz a sustentação sobre regiões culturais emergentes que melhor representa o
caso do movimento Manguebit.
6. Onde e em que condições aparecem as regiões culturais emergentes?
Este ponto é de fundamental importância em um país como o Brasil, onde
há, no começo do século XXI, áreas a serem efetivamente incorporadas à
economia brasileira e global. Se há regiões em dissolução, levantamos a
hipótese de que novas regiões emergem, quer pela transformação de
regiões culturais tradicionais, quer, mais ainda, pela fragmentação de
regiões culturais preexistentes, das quais emergem duas ou mais regiões.
(idem, p. 35-36).
METODOLOGIA
A articulação, interação entre essas duas paisagens da cidade de Recife – uma natural e
outra antrópica -, assim como o intercâmbio das esferas globais e locais, apresentam interessante
potencial de análise pelas metodologias trabalhadas na geografia acadêmica acerca do
contemporâneo, em destaque as abordagens regional e cultural.
Dentre as referências bibliográficas, o destaque da pesquisa recai sob a Coleção
Geografia Cultural, organizada pelos professores Zeny Rosendahl e Roberto Lobato Corrêa,
ambos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Esse recorte amostral representa o intuito
investigativo de mapear o material produzido atualmente no Brasil acerca dessa nova escola.
Dentre seus dezoito volumes, destacam-se os artigos de Roberto Lobato Corrêa (2008), “Região
cultural – um tema fundamental”, apresentado na conferência do V Simpósio Nacional sobre
Espaço e Cultura e I Simpósio Internacional sobre Espaço e Cultural em setembro de 2006, na
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, que trabalha o conceito de região cultural e aponta
caminhos de investigação sobre a dinâmica regional brasileira; e o artigo de George O. Carney
(2007), “Música e lugar”, originalmente publicado como “Music and Place” em The sounds of
people and places: a geography of American music from country to classical and blues to
bop (2003), que resgata a importância e a possibilidade de trabalhar com música enquanto objeto
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de análise em trabalhos de geografia. Os artigos encontram-se, respectivamente, nos volumes 14
e 15.
Quanto à cena Mangue, destacam-se as teses de CALAZANS (2008), uma trilogia
construída entre elementos fundamentais no Manguebit (lama, parabólica e rede), e LIMA
(2007), sobre mangue e caranguejo na poesia de Chico Science. Esses dois trabalhos foram
escolhidos como referências (ou “p’referências”) bibliográficas em meio à produção acadêmica
sobre o movimento em razão de o primeiro abordar familiares diálogos com a geografia e o
segundo ser uma profunda pesquisa de análise de discurso das letras musicais. Quanto às essas,
destacamos as bandas Chico Science e Nação Zumbi, mundo livre s/a e Eddie, assim como o
manifesto “Caranguejos com Cérebro”, escrito por Fred Zeroquatro (1992).
RESULTADOS PRELIMINARES
Recife não foge à tradição de ser uma urbe capital de Estado da região Nordeste
localizada no litoral - apenas Teresina (Piauí) encontra-se no interior -. Com a fama de “Capital
do Nordeste”, em razão do ciclo econômico da cana-de-açúcar que a enriqueceu na época do
Brasil colonial e início da República, foi ao longo do século passado que apresentou seus sinais de
desgaste.
É só uma cabeça equilibrada em cima do corpo/
escutando o som das vitrolas, que vem dos mocambos/
entulhados à beira do Capibaribe/
na quarta pior cidade do mundo/
Recife cidade do mangue/
incrustada na lama dos manguezais.
(Chico Science, Antene-se, 1994).
Dessa açucarada economia resultou numa cidade não mais rica, e sim violenta, caótica e
pobre. Favelas ciliares, horizontalizadas, conhecidas como “mocambos”, habitam as margens dos
rios Capibaribe e Beberibe: essa é a paisagem da cidade de Recife nos anos 1990, que desde
Josué de Castro, quando escreveu seu romance “Homens e Caranguejos” na década de 1960,
vem denunciando a omissão social e a realidade excludente que a própria geografia de Recife se
encarrega por fazer. Lugar de pobre é na fedentina do manguezal.
Há um tempo atrás se fala em bandidos/
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há uma tempo atrás se falava em solução/
há um tempo atrás se falava em progresso/
há um tempo atrás que eu via televisão.
(Chico Science, Banditismo por uma questão de classe, 1994).
Não mais condizente com o glamour do movimento Regionalista de Gilberto Freire e nem
com o romantismo dos Armoriais de Arianos Suassuna, o Manguebit vêm tratar da realidade de
Recife enquanto uma metrópole problemática inserida num mundo globalizado. Eis uma grande
ruptura na cultura nordestina de até então.
Em meados de 91 começou a ser gerado e articulado em vários pontos da
cidade um núcleo de pesquisa e produção de idéias pop. O objetivo é
engendrar um ‘circuito energético’, capaz de conectar as boas vibrações
dos mangues com a rede mundial de circulação de conceitos pop. Imagem
símbolo: uma antena parabólica enfiada na lama.
Os mangueboys e manguegirls são indivíduos interessados em quadrinhos,
TV interativa, anti-psiquiatria, Bezerra da Silva, Hip Hop, midiotia, artismo,
música de rua, John Coltrane, acaso, sexo não virtual, conflitos étnicos e
todos os avanços da química aplicada no terreno da alteração e expansão
da consciência.
(Fred Zeroquatro, Caranguejos com Cérebro, 1994).
Essa nova percepção da cidade, resultado de uma nova realidade onde esses jovens
estavam inseridos, é um pressuposto inicial para a formulação do conceito de uma nova região
cultural. Com impactantes artigos lançados na mídia considerados verdadeiros manifestos de
vanguarda artística, como o fragmento acima do “Caranguejos com Cérebro” (1994), e,
principalmente, a música, o Manguebit expressa uma estética inovadora.
As características únicas de lugares específicos podem oferecer as
pré-condições necessárias a novas idéias musicais. O contexto histórico,
ambiental e social de um lugar fornece cenário e inspiração para
determinado indivíduo ou grupo criar música (CARNEY, 2007, p. 138).
O desenvolvimento da música específica de lugares abrange incontáveis
fatores. Na medida em que ela é uma expressão da sociedade, inúmeras
considerações socioeconômicas pertinentes aos lugares envolvidos
contribuem para a sua evolução (idem, p. 139).
A cidade ou o habitat? Eis uma pergunta de grande valia que o Manguebit responde com
uma proposta sui generis: os dois – metade cidade, metade mangue -, uma Manguetown.
Segundo Lima (2007, p. 275), “O Manguebeat é, de certa forma, um canto alternativo para
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reafirmar um valor afirmativo dos manguezais. Mesmo falando da miséria, a música aponta para a
alegria como ‘prova dos nove’”.
Estou enfiado na lama/ é um bairro sujo/
onde os urubus tem casas/ e eu não tenho asas/
mas estou aqui em minha casa/ aonde os urubus tem asas/
vou andando, segurando nas paredes de lama do meu quintal/
Manguetown.
(Chico Science, Manguetown, 1996).
A exaltação ao ecossistema manguezal de Recife pode ser visto com a interface do lixo
gerado pelas aglomerações urbanas.
Tô sentado na beira do rio/ Esperando a sujeira passar
Saco plástico de todas as cores/ Garrafas bóiam junto da espuma
Cheiro forte caracteriza Beberibe como de costume/
Como água, um caldo grosso, escura, escorre, como referência/
Como tem lixo como tem doença, como tem lixo como tem doença.
(Fábio Trummer, Sentado na beira do rio, 2002).
Híbrida forma de expressar sua arte pelas trocas de influências globais com locais,
emprego de palavras anglo-saxônicas na construção de neologismos (Manguetown, Manguebit),
mistura de guitarras com alfaias e antigas cirandas de roda cantadas no ritmo da black music.
Esse é o pressuposto para a delimitação da peculiar região cultural polarizada por Recife no final
do século XX.
Na deglutição que faz o movimento Mangue entra também outras
linguagens e ritmos em consonância com a cultura ‘glocal’
contemporânea. Enquanto os tropicalistas, ao misturarem expressões
coloquiais a ritmos estrangeiros, dedilhavam notas de MPB para alcançar
o rock ´n roll, o Manguebit usa o batuque das notas do berimbau
eletrônico para transgredir a música popular brasileira (LIMA, 2007, p.
277).
Os apontamentos de Corrêa (2008) acerca a identificação de regiões culturais são:
formais, funcionais, vernaculares e ilhas culturais; agrupamento e divisão lógica; perspectiva
saueriana; duplicação, desvio e fusão; estágios de evolução regional; e mecanismos de
predisposição cultural, adaptação cultural e autoridade de tradição. Dentre esses seis, o
movimento Manguebit se firma nos grupos:

Formais, funcionais, vernaculares e ilhas culturais;
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A identificação da região cultural do movimento Manguebit, em um primeiro momento,
assemelha-se ao contexto da região vernacular, em razão da miscelânea proposta por esta
estética. Condiz a relação, pois segundo Corrêa (2008, p. 13) apud Norton (2000), “Nela
(região vernacular), diversos traços culturais estão combinados. Pode ser entendida como
produto da percepção espacial dos habitantes da região e de fora dela”. No Mangue, os diversos
traços culturais formam um verdadeiro pastiche de influências nordestinas, moldados sob uma
ótica modernizada, urbana e contemporânea.
A engenharia cai sobre as pedras/
Um curupira já tem o seu tênis importado/
Não conseguimos acompanhar o motor da história/
Mas somos batizados pelo batuque/
E apreciamos a agricultura celeste.
(Chico Science, Enquanto o mundo explode, 1996).

Agrupamento e divisão lógica;
Ao tratar de uma abordagem que privilegia critérios quantitativos (por isso a enorme
validade para o conhecimento da realidade socioespacial) e também estabelecer critérios de
hierarquização, a divisão por regiões conceitualizadas apresenta imprecisão para a análise do
movimento Manguebit. Porém, em razão dos critérios estabelecidos na investigação desse artigo
– a identificação da região cultural do Manguebit segundo os apontamentos de CORRÊA (2008)
-, os procedimentos de divisão lógica são os que mais se assemelham no caso da cena Mangue,
em razão da clara identificação de dissonâncias sonoras, da poesia e do modo de viver na cidade
versus na zona rural de Pernambuco, sendo essas as diferenças buscadas na metodologia em
questão. Essa possibilidade é mais condizente do que a tentativa de agrupamento de outras
localidades de onde o Mangue interagisse. Vale lembrar que o agrupamento seria de pequena
extensão em razão de a cena cultural ter se limitado basicamente apenas à Região Metropolitana
do Recife em seu início, ao núcleo urbano.

Perspectiva saueriana;
Segundo essa perspectiva, o foco inicial (heart) do movimento Manguebit é a cidade de
Recife, assim como seu núcleo (core), pois são o berço histórico e centro de controle e área
onde os traços culturais são mais intensos. Os domínios (domain) e franja (sphere), também
classificados conjuntamente no caso da cena, seriam os municípios de Olinda e Jaboatão dos
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Guararapes, pertencentes à região metropolitana da cidade do Recife. Isso se dá em razão de
Chico Science ser da periferia de Recife (bairro de Peixinhos), assim como a maioria de sua
banda Nação Zumbi (bairro de Chão de Estrelas); o mundo livre s/a é de Jaboatão dos
Guararapes; e Eddie é de Olinda. A letra de “Rios, Pontes & Overdrives” cita diversos bairros
dessa região:
É Macaxeira, Imbiribeira, Bom Pastor, é o Imbura, Ipsep, Torreão,
Casa Amarela,/
Boa Viagem, Genipapo, Bonifácio, Santo Amaro, Madalena, Boa
Vista,/
Dois Irmãos, é o Cais do Porto, é Caxangá, é Brasilit, Beberibe,
CDU,/
Capibaribe é o Centrão/
Rios, pontes e overdrives – impressionantes esculturas de lama/
Mangue!
(Chico Science e Fred Zeroquatro, Rios Pontes e Overdrive, 1996).

Duplicação, desvio e fusão;
A fusão, mais frequente processo pela qual se formam as novas regiões culturais, se
assemelha ao caso do Manguebit, pois “nele fundem-se traços culturais oriundos de dois um mais
focos iniciais ou núcleos, com a resultante formação de uma nova região cultural” (CORRÊA,
2008, p. 19). Como pressuposto dessa afirmação, o diálogo que realiza o Manguebit entre as
esferas local e global, tradicional e moderno, sertanejo e urbano, etc., como tratado por Picchi
(2009), explicita o encaixe referente ao citado processo específico de difusão espacial.
Sou eu transistor/
Recife é um circuito/
O país é um chip/
Se a terra é um radio/
Qual é a música?
(Fred Zeroquatro, Manguebit, 1994).

Estágios de evolução regional;
A definição de uma região cultural baseada na influência da cena Mangue através da
contribuição de Meinig (1972) apud Corrêa (2008, p.19) reafirma o conceito anteriormente
exposto de fusão.
O primeiro estágio é o de transplante cultural, no qual verificam-se
experimentações e adaptações ao novo ambiente. O segundo foi
denominado de cultura regional. O terceiro, por sua vez, foi chamado de
impacto da cultura nacional, no qual padrões culturais gerais penetram na
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região, graças às melhorias nas comunicações. O quarto, finalmente, é o
da dissolução da região cultural e do aparecimento de novas configurações
culturais, resultantes do processo de fusão. Os dois últimos estágios
marcam a integração nacional e definem a perda da identidade regional
(idem).
O quarto estágio representa a senilidade do estudo de caso.
A horizontalidade construída com os elementos de fora implica escolha.
Nesse sentido, vale marcar que a escolha dos elementos que compõem
suas expressões artísticas não é aleatória, mas também não é restritiva.
(...) Assim, a tradição não é um ponto de chegada, onde permanecia
imaculada, com uma pretensa pureza. É um ponto de partida, que
incorpora elementos de seu cotidiano (CALAZANS, 2008, p. 141).
Os estágios de evolução regional, que afirmam o caráter evolutivo das regiões culturais,
apresentam nítida característica sequencial que se assemelha ao modelo de evolução do relevo de
W. M. Davis, onde criação, desmantelamento e recriação destas contribuem para a compreensão
da dinâmica regional brasileira (CORRÊA, 2008, p. 19-20).
O encaixe das metodologias de investigação proposta por Corrêa (2008), com exceção
de um por serem mecanismos de matrizes culturais constituídas por imigrantes, apresenta íntima
relação com o movimento Mangue enquanto modelador de uma região cultural expoente.
A influência do movimento Mangue na transformação da cultura regional se faz também
em razão do engajamento dos músicos em fazer parte de uma intelectualidade preocupada em
refletir cultura. “Tal proeminência de uma importância que ultrapassa o campo musical pode ser
evidenciada na participação de Fred Zeroquatro no Conselho de Cultura de Recife. Com relação
a DJ Dolores e Renato L., os dois foram colunistas do Diário de Pernambuco” (CALAZANS,
2008, p. 170). Atualmente Renato L., parceiro de Chico Science e co-autor de “Caranguejos
com Cérebro”, é coordenador da Secretaria de Cultura da Prefeitura do Recife.
Em novembro de 2005, o Ministério da Cultura (sendo o ministro à época Gilberto Gil)
concedeu a medalha de “Ordem do Mérito Cultural” ao Movimento Manguebit de Recife, em
razão de ter transformado a capital pernambucana e resgatado a auto-estima do próprio público
local, que passou a valorizar e a se orgulhar de seus artistas. “A turma dos caranguejos com
cérebro recolocou Recife como centro catalisador e difusor de inovadora cultura pop. E abriu um
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novo capítulo na história da música brasileira. Da lama ao céu” (MINISTÉRIO DA CULTURA,
2005).
O Manguebit ocupa os vários lugares da cultura, mas se reconhece pertencente à cultura
de Pernambuco. Porém, por estar inserido em um contexto diferente ao que se conhecia,
produzia e viva até então, esse Pernambuco que é uma aldeia global apresenta características
regionais inéditas através da expressão artística. “Repensar o desenvolvimento da ‘manguetown’
é rever, não apenas, a ecologia urbana, a geografia, a sociologia, a antropologia, mas também um
apanhado de linguagens que aparece e desaparece no cotidiano de encruzilhadas e traduções
culturais” (LIMA, 2007, p. 227). O “Pernambuco embaixo dos pés com a mente na imensidão”,
como proclamou Science, transparece de intenção.
BIBLIOGRAFIA
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Ciências) – Instituto de Ciências Sociais, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro,
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Música e Espaço. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2007. p. 123-150.
CORRÊA, R. L. Conferência região cultural - um tema fundamental. In: CORRÊA, R. L.,
ROSENDAHL, Z. (Org.). Espaço e cultura: pluralidade temática. Rio de Janeiro:
EdUERJ, 2008. p. 11-43.
LIMA, T. M. de A. Teia de sincretismo: uma introdução à poética dos mangues. 2007. 401 f.
Tese (Doutorado em Teoria da Literatura) – Centro de Artes e Comunicação,
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