SOLU Ç Õ ES INOVADORAS Desempenho térmico Adriana Camargo de Brito - Arquiteta, mestre em Tecnologia na Construção de Edifícios (IPT) e doutoranda em Eficiência Energética (USP), é pesquisadora e professora do curso de Mestrado Profissional do IPT Maria Akutsu - Física e mestre em Engenharia (USP), doutora em Arquitetura e Urbanismo (USP), é coordenadora de Programa de Mestrado Profissional em Habitação do IPT Envie seus comentários, críticas, perguntas e sugestões de temas para esta coluna: [email protected] [email protected] Atualmente, há um contexto econômico favorável ao crescimento da construção civil brasileira, com a utilização de sistemas construtivos racionalizados, pré-fabricados ou pré-moldados, diante de suas vantagens construtivas. O incremento na produção deste setor, aliado à inovação dos sistemas construtivos, tem gerado preocupações com a qualidade dos edifícios construídos, o que é evidenciado pela criação do Sinat (Sistema Nacional de Avaliações Técnicas) e peloo aumento das exigências de órgãos governamentais para a concessão de financiamentos. Nesse sentido, as edificações produzidas precisam atender a requisitos mínimos de desempenho quanto à segurança, estanqueidade, desempenho acústico e térmico. Contudo, vários sistemas construtivos podem não ter desempenho adequado em todos os quesitos necessários. A esbelteza excessiva de muitos dos elementos de vedação inerentes a estes sistemas pode repercutir de maneira negativa no desempenho térmico da edificação, dependendo das características climáticas do local, da geometria e do uso do edifício. Dentre os vários fatores climáticos que influenciam a resposta térmica de uma edificação –como temperatura, umidade relativa do ar, radiação solar global e amplitude térmica diária–, destaca-se esta última por estar relacionada diretamente à demanda por capacidade térmica dos componentes da envoltória. Geralmente em locais com maior amplitude térmica diária há necessidade de se empregar elementos com maior capacidade térmica, ou seja, “mais pesados”, como é o caso de várias regiões Figura 1 - Sistemas de fachadas Sistema “Leve” Sistema “Pesado” brasileiras, onde a amplitude térmica diária é da ordem de 10º C ou mais (Brito et. al., 2010; Brito et. al., 2011). Um fechamento externo leve, típico dos sistemas steel frame ou wood frame, possui massa de aproximadamente 50 kg/m2 de fachada, enquanto uma parede com componentes tradicionais, como por exemplo alvenaria de tijolos maciços cerâmicos revestidos com argamassa em ambas as faces, com espessura de 26 cm, possui massa da ordem de 500 kg/m2. Como o calor específico dos materiais que compõem as duas vedações são da mesma ordem de grandeza, em torno de 840 J/kg.K, a capacidade térmica da fachada leve é 10 vezes menor que a da parede de alvenaria. A resposta térmica de uma edificação pode ser muito diferente com a adoção de um ou outro destes componentes na fachada, por conta da grande diferença na capacidade térmica dos mesmos. Para ilustrar o efeito da massa e, portanto, da capacidade térmica da fachada no desempenho térmico de um edifício não climatizado, são apresentados os resultados da análise comparativa do comportamento térmico de duas edificações habitacionais com o mesmo projeto arquitetônico, utilizando-se fechamentos com massas diferentes (Figura 1). Foi empregada a ferramenta computacional EnergyPlus, considerando-se as características climáticas de um dia típico de verão da cidade de São Paulo. No projeto considerado na análise, apresentado na Figura 2, os dormitórios têm janela voltada para Oeste, sem a presença de fontes internas de calor. Ilustrando os resultados, apresentam-se na Figura 3 as temperaturas do ar exterior e do ar interior de um dormitório no segundo pavimento da edificação, com uso dos dois sistemas apresentados. Observa-se que, com o emprego do sistema com elementos “pesados”, há uma tendência de diminuição das amplitudes diárias das temperaturas do ar interior em relação à Figura 2 amplitude diária do ar exterior, fator que ressalta as propriedades de inércia térmica da edificação. Com o sistema com componentes “leves”, as amplitudes diárias das temperaturas do ar interior são muito próximas às do ar exterior, o que indica baixa inércia térmica da edificação. A habitação com elementos mais “pesados” apresenta um desempenho térmico melhor, em comparação com a edificação com elementos “leves”, visto que proporciona temperaturas internas mais próximas às da zona de conforto humano ao longo de todo o dia. Dessa forma, se um empreendedor optar pela aplicação do sistema com componentes leves na habitação, há necessidade de aprimoramento do projeto arquitetônico. Isso pode ser efetuado por meio de soluções que melhorem o desempenho térmico do edifício e o conforto térmico do usuário no período de verão, tais como: escolha da orientação solar mais adequada, diminuição de área envidraçada na fachada, aumento dos beirais, uso de cores claras nas fachadas, aumento do isolamento térmico da cobertura. Em um edifício climatizado, o desempenho térmico da envoltória repercute diretamente no consumo de energia para a manutenção das condições internas adequadas ao conforto térmico do usuário. Dependendo da geometria da edificação, das fontes internas de calor e do clima do local, o efeito do desempenho térmico da envoltória no consumo de energia em climatização pode ser bastante significativo. Edifícios altos com fachadas leves com grande porcentagem de área envidraçada são mais adequados a locais onde há necessidade de calefação. No contexto climático de muitas regiões brasileiras, como São Paulo, esta tipologia de edificação pode representar grande impacto no consumo de energia em resfriamento dos ambientes (Figura 4). Soluções de projeto com menor área envidraçada nas fachadas e elementos de vedação com maior massa podem garantir menor carga térmica de resfriamento dos ambientes. Quando se adota como premissa a utilização de elementos leves e grandes áreas envidraçadas na fachada, fica definido um patamar de maior consumo energético pelo sistema de ar condicionado para o resfriamento dos ambientes, que se torna inevitável. Resta apenas o aprimoramento do projeto arquitetônico, por meio de ações visando a determinação da geometria mais favorável à diminuição da incidência de radiação solar direta, a utilização de elementos de sombreamento externo e a especificação de vidros mais eficientes. Em resumo, as características dos componentes da envoltória de uma edificação precisam ser determinadas considerando-se, além de vantagens construtivas, sua adequação às condições climáticas do local de implantação. Quando isso não for possível, seja por limitações técnicas ou econômicas, o projeto arquitetônico deve ser elaborado com maior cuidado. Atualmente há diversas ferramentas computacionais, como o programa EnergyPlus, que podem ser utilizadas durante o desenvolvimento do projeto arquitetônico, para o estudo das alternativas de projeto que produzam melhores resultados do ponto de vista do conforto do usuário, nos edifícios não climatizados, ou relativo ao consumo de energia em climatização de edificações. Figura 3 foto Adriana Brito Adaptada de Caderno de Tipologias da CDHU Figura 4 Prédios envidraçados próximos à av. Paulista, em São Paulo Adaptada de Caderno de Tipologias da CDHU