Ministério da Saúde Fundação Oswaldo Cruz Escola Nacional de Saúde Pública Departamento de Administração e Planejamento em Saúde PLANOS PRIVADOS DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE NO MUNDO DO TRABALHO Candidata: Isabela Soares Santos Dissertação apresentada para obtenção do grau de Mestre em Saúde Pública, área de concentração Administração e Planejamento em Saúde da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz Orientador: Adolfo Horácio Chorny Rio de Janeiro 2000 2 DEDICATÓRIA Este trabalho é dedicado a todos os brasileiros que desejem um sistema de saúde que atenda de forma justa à nossas necessidades, independente de nossa raça, sexo, profissão, status financeiro, estado de saúde e, como não poderia deixar de dizer nos dias atuais, do nosso vínculo empregatício. 3 AGRADECIMENTOS Antes de tudo, é preciso registrar a importância do financiamento do CNPQ para o cumprimento do mestrado, bem como da Escola Nacional de Saúde Pública, instituição que acreditou no meu projeto de pesquisa. Também ao carinho daqueles que me acolheram no Rio de Janeiro (tia Keyla, Ilana e cia) e companheiras (os) de casa. Minha gratidão ao professor orientador Chorny, pela tolerância para com minhas angústias e perseverança no acompanhamento da realização do trabalho. Agradeço ao fundamental apoio de Nilton Freitas, que me apontou o SINDIQUIM; ao próprio SINDIQUIM, pelas portas abertas e boa vontade de seus funcionários para a realização da pesquisa de campo, bem como aos Centros de Referência de Saúde do Trabalhador e das Secretarias Municipais de Saúde dos municípios da região do ABC paulista. À Beth Dias (UFMG) e Heleno Corrêa (UNICAMP), pelo incentivo para que eu adentrasse numa seara até então pouco conhecida para mim, que é a Saúde do Trabalhador. Às secretárias do Conselho Nacional de Saúde e às Bibliotecas do Ministério da Saúde, da Câmara dos Deputados, da Escola Nacional de Saúde e do Instituto de Economia da UNICAMP, pela presteza em disponibilizar os documentos requisitados. Aos técnicos do Laboratório de Informática da ENSP e ao Murilo (ANS), pelo suporte técnico. Aos amigos da ENSP, adquiridos durante o mestrado, pela cumplicidade. Há instituições que foram determinantes na minha formação, como a USP, a UNICAMP, a PUC/SP e a FUNDAP. Desta última, para sempre serão utilizados os ensinamentos de Lu, Rose e Ferdi. Agradeço com carinho à todos do projeto Ressarcimento, aos colegas da ANS, à Marizélia que pacientemente vem me dando apoio no trabalho, psicologicamente imprescindível para que pudesse ser finalizada a dissertação, e ao Barroca. Também agradeço à querida Lêda Lucia, por quem tenho profunda admiração e identificação nas idéias. À minha amiga Ligia, figura tão importante neste processo de amadurecimento que é a dissertação, sempre presente. Ao querido Pipo, Maria amor paulistano, minha deliciosa familiagem, à Ju que, além de tudo (...), me reensinou português. Ao Chico, pela alegria de amá-lo. 4 RESUMO A intenção deste trabalho é compreender, por meio do entendimento das articulações entre os órgãos e instituições específicos do setor, o modelo de assistência à saúde ao trabalhador e entendê-lo diante da forma com que a atenção à saúde é proporcionada aos demais brasileiros. O estudo realizado divide-se em três grandes eixos. Um primeiro de pesquisa bibliográfica, portanto mais teórico, sobre as políticas de assistência à saúde do trabalhador, que inclui, ainda uma recuperação dos acontecimentos históricos das políticas de saúde do trabalhador no Brasil como base para a compreensão dos atuais instrumentos de regulação desse setor, bem como os atores e instituições envolvidos; o segundo concentra uma pesquisa de campo, onde se observa e analisa como a assistência à saúde é proporcionada, na prática, ao trabalhador, em três casos considerados significativos: três grandes empresas do ABC paulista. O terceiro e último grande eixo concerne à relação entre o presente modelo de saúde brasileiro e a discussão anterior, visando a situar os setores público e privado de assistência à saúde no contexto de Reforma do Estado e de aumento do mercado de trabalho informal, pelo qual o país vem passando desde a década de 1990. Buscou-se, assim, contribuir com material para que se possa, com novos estudos que complementem este, elaborar políticas públicas que apresentem resultados mais coerentes com as necessidades da população brasileira. 5 ABSTRACT The present work is intended to understand, through the analysis of the articulations among the sector’s specific organs and institutions, the model of workers’ health care policies and compare them to the way health is provided to other Brazilians. In order to achieve this goal, the research conducted was divided in three large axis. The first one, more theoretical, is the bibliographic research on the workers’ health policies, which also includes a historical review of such policies in Brazil. This provides the basis for understanding the current instruments for regulating this sector, as well as the actors and institutions involved. The second axis concentrates the field work, with the observation and analysis of the way health care is actually provided to the worker in three cases we considered meaningful: three large companies in the state of São Paulo industrial ABC region. The third and last large axis refers to the relation between the Brazilian health model and the previous discussion, in order to place the private and the public health care sectors within the context of State Reform and the increase of the informal labor sector, which the country has been undergoing since the 1990’s. This attempts thus to gather subsidies for, along with further complementary studies, contribute to a type of public policy making that may provide results more coherent with the needs of the Brazilian population. 6 SUMÁRIO LISTA DE SIGLAS ........................................................................................................................................... 8 APRESENTAÇÃO...........................................................................................................................................11 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................14 CAPÍTULO I: ARTICULAÇÃO ENTRE ÓRGÃOS ENVOLVIDOS NA SAÚDE DO TRABALHADOR ............................................................................................................................................................19 1.1 – INTRODUÇÃO AO CAPÍTULO 1 .............................................................................................................19 1.2 – O PROCESSO DE TRABALHO E DE EMPREGO – FINANCIAMENTO, A TORES E INSTITUIÇÕES ENVOLVIDOS....................................................................................................................................................................21 1.3 – POLÍTICAS DE A SSISTÊNCIA À SAÚDE DO TRABALHADOR – BREVE HISTÓRICO.........................25 1.4 – FORMAS A TUAIS E VIAS DE REGULAMENTAÇÃO DA SAÚDE DO TRABALHADOR .......................31 1.4.1 – DIREITO TRABALHISTA.....................................................................................................................31 1.4.2 – DIREITO PREVIDENCIÁRIO ................................................................................................................31 1.4.3 – DIREITO CIVIL TRABALHISTA..........................................................................................................32 1.4.4 – NORMAS REGULAMENTADORAS (SECRETARIA DE SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO - SSST/MTE) ......................................................................................32 1.5 – O DEBATE EM TORNO DA REGULAÇÃO DA SAÚDE DO TRABALHADOR: SISTEMA DE INFORMAÇÕES, FINANCIAMENTO E INSTITUIÇÕES – SOBREPOSIÇÃO OU INTEGRAÇÃO?.....................................37 1.5.1 – Â NGULO DA OFERTA DOS PROCEDIMENTOS REFERENTES À ATENÇÃO À SAÚDE DO TRABALHADOR NO INTERIOR DO LOCAL DE TRABALHO............................................................................................37 1.5.2 – Â NGULO DOS TRABALHADORES ......................................................................................................39 1.5.3 – COMO SE DÃO AS ARTICULAÇÕES?..................................................................................................41 1.6 – CONSIDERAÇÕES ...................................................................................................................................46 1.7 – P RESSUPOSTO, OBJETIVOS GERAIS E ESPECÍFICOS DO TRABALHO...............................................50 CAPÍTULO II: METODOLOGIA DA PESQUISA E TRABALHO DE CAMPO – ANÁLISE DOS RESULTADOS ..................................................................................................................................51 2.1 – M ETODOLOGIA ......................................................................................................................................51 2.1.1 – SELEÇÃO DE CASOS PARA O ESTUDO..............................................................................................53 2.2 – INTRODUÇÃO ÀS DIMENSÕES, CATEGORIAS E INDICADORES UTILIZADOS..................................54 2.3 – A S EMPRESAS- CASOS ..........................................................................................................................58 2.3.1 - HISTÓRICO DA ASSISTÊNCIA À SAÚDE NAS EMPRESAS- CASOS.....................................................59 2.3.1.a - Empresa A..................................................................................................................................59 2.3.1.b - Empresa B..................................................................................................................................61 2.3.1.c - Empresa C ..................................................................................................................................65 2.4 - CATEGORIAS A NALISADAS...................................................................................................................67 2.5 - CONSIDERAÇÕES A CERCA DA PESQUISA DE CAMPO........................................................................69 2.5.1 – BENEFÍCIOS OFERECIDOS..................................................................................................................69 2.5.1.a Contrato de Trabalho.................................................................................................................72 2.5.2 – P REVENÇÃO À SAÚDE, SAÚDE OCUPACIONAL E A SSISTÊNCIA MÉDICO-HOSPITALAR...........74 2.5.2.a –Informações ; Utilização e Qualidade dos serviços...........................................................76 2.5.3 – COBERTURA E FINANCIAMENTO.....................................................................................................78 2.5.3.a - Financiamento do plano, Transferência do risco...............................................................80 2.5.4 - CONSIDERAÇÕES ACERCA DA ESTRUTURA DO PLANO EM FUNÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO, FINANCIAMENTO E UTILIZAÇÃO ....................................................................................................................................83 2.5.4.a – Financiamento..........................................................................................................................84 CAPÍTULO III: O MODELO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE E O MUNDO DO TRABALHO ......................................................................................................................................................................86 3.1 – O MODELO ASSISTENCIAL DE SAÚDE BRASILEIRO E O PAPEL DO ESTADO....................................89 3.1.1 – DO DESENVOLVIMENTO DO SETOR DE PLANOS PRI VADOS DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE .............92 3.1.2 – DÉCADA DE 1990 – A SPECTOS LEGAIS DO M ODELO DE SAÚDE ................................................93 3.1.3 – A SSUNTOS FISCAIS ............................................................................................................................95 3.2 – A REFORMA DO ESTADO E A REGULAMENTAÇÃO DO SETOR DE SAÚDE SUPLEMENTAR ..........97 7 3.2.1 – RECONFIGURAÇÃO DO SETOR DE PLANOS PRIVADOS DE A SSISTÊNCIA À SAÚDE ....................99 3.3 – M UNDO DO TRABALHO ......................................................................................................................103 3.3.1 – O MUNDO DO TRABALHO E A ASSISTÊNCIA À SAÚDE..................................................................106 3.4 – CONSIDERAÇÕES .................................................................................................................................108 IV – CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÕES .......................................................................................111 V – BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................................117 VI – ANEXOS .................................................................................................................................................122 ANEXO 1 – INDICADORES E DIMENSÕES ......................................................................................123 ANEXO 2 – TABELA 6: DISTRIBUIÇÃO DA COBERTURA E DO FINANCIAMENTO DO SISTEMA DE ASSISTÊNCIA MÉDICA SUPLEMENTAR NO BRASIL, 1987 – 1996 ..................127 ANEXO 3 – LISTA DE TABELAS, QUADROS E FIGURAS .........................................................128 8 LISTA DE SIGLAS ACT - Acordo Coletivo de Trabalho AIS - Ações Integradas em Saúde ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar ANVISA - Agência Nacional DE Vigilância Sanitária ASO - Atestado de Saúde Ocupacional BNDES - Banco Nacional para o Desenvolvimento Econômico e Social CAP - Caixas de Aposentadorias e Pensões CASSI - Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil CAT - Comunicado de Acidente do Trabalho CCTSMA - Comissão de Condições de Trabalho, Saúde e Meio Ambiente CE - Constituição Estadual CF - Constituição Federal CIPA - Comissão Interna de Prevenção de Acidentes CIST - Comissão Interministerial de Saúde do Trabalhador CLT - Consolidação das Leis do Trabalho CNS - Conselho Nacional de Saúde CNST - Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador CODEFAT - Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador COFINS - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social CONASEMS - Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde CONASP - Conselho Nacional de Administração da Saúde Previdenciária CONASS - Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde CONSU - Conselho de Saúde Suplementar COPPE - Coordenação dos Programas de Pós-Graduação de Engenharia CRE - Conselho de Reforma do Estado CRM - Conselho Regional de Medicina CRST - Centro de Referência de Saúde do Trabalhador CSS - Câmara de Saúde Suplementar CUT - Central Única dos Trabalhadores DIEESE - Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio Econômicos DIESAT - Departamento Intersindical de Estudos de Saúde e Ambiente do Trabalho EPI - Equipamento de Proteção Industrial FAT - Fundo de Amparo ao Trabalhador FAS - Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social 9 FNS - Fundação Nacional de Saúde FUNDACENTRO - Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho GEISAT - Grupo Executivo Interministerial de Saúde do Trabalhador IAP - Institutos de Aposentadorias e Pensões IAPB - Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Bancários IBGE - Instituto Brasileiro de (Geografia e Estatística) INAMPS - Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social INSS - Instituto Nacional de Seguridade Social INST - Instituto Nacional de Saúde do Trabalhador IRPF - Imposto de Renda de Pessoa Física IRPJ - Imposto de Renda de Pessoa Jurídica LEM - Laudo Exame Médico LOS - Lei Orgânica da Saúde MARE - Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado MDIC - Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior MEC - Ministério da Educação MP - Medida Provisória MPAS - Ministério do Planejamento e Assistência Social MS - Ministério da Saúde MTE - Ministério do Trabalho e Emprego NOB - Norma Operacional Básica OIT - Organização Internacional do Trabalho OMS - Organização Mundial de Saúde ONU - Organização para as Nações Unidas PASEP - Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público PCMSO - Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional PCV - Pesquisa de Condições de Vida PDV - Programa de Demissão Voluntária PEA - População Economicamente Ativa PED - Pesquisa de Emprego e Desemprego PIS - Programa de Integração Social PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PPA - Plano de Pronta Ação PPRA - Programa de Prevenção de Riscos Ambientais PST - Programa de Saúde do Trabalhador 10 RDC - Resolução da Diretoria Colegiada RG - Registro Geral RMSP - Região Metropolitana de São Paulo SAF - Secretaria da Administração Federal SAS - Secretaria de Assistência à Saúde SEADE - Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados SEMSAT - Semana de Saúde do Trabalhador SENAC - Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio SENAI - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial SES - Secretaria Estadual de Saúde SESC - Serviço Social do Comércio SESI - Serviço Social da Indústria SESMT - Serviços Especializados de Segurança e Medicina do Trabalho SINDIQUIM - Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Químicas, Petroquímicas, Farmacêuticas, Tintas e Vernizes, Plásticos, Resinas Sintéticas, Explosivos e Similares do ABC, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra SIPAT - Semana Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho SSST - Departamento de Segurança e Saúde no Trabalho (MTE) SUDS - Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde SUS - Sistema Único de Saúde SUSEP - Superintendência de Seguros Privados UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro 11 APRESENTAÇÃO Desde os anos em que estudava Ciências Sociais na Universidade de São Paulo, o interesse pelas relações entre o Público e o Privado tomava a frente de meus trabalhos. As palavras estão com as iniciais maiúsculas na tentativa de que o leitor sinta a minha dificuldade em compreender seus significados e reais sentidos. Sem sombra de dúvida, esta dissertação foi guiada por estas preocupações, porém sinto adiantar que uma das grandes conclusões a que cheguei é que a maior confusão na utilização dos conceitos de público e privado é feita não por acaso, mas como uma estratégia de apropriação que corresponde a interesses específicos. Muito se fala sobre a diferença entre público, privado, publicizado, etc., porém, como minha atenção sempre privilegiou o foco na área da saúde (criada por pai e mãe médicos, a probabilidade de cair nesta teia não é pequena), tive que direcionar meus desejos de conhecimento. Como já diz o título da dissertação, fui “bisbilhotar” a “saúde suplementar”, tão maldita entre profissionais da saúde pública, quanto desconhecida. Há muita confusão sobre o que deve representar o mercado de saúde suplementar no sistema de saúde do Brasil. Para clarear meu horizonte, busquei o significado do termo utilizado para denominar este setor. No dicionário Aurélio, suplemento é definido como a “parte que se adiciona a um todo para ampliá-lo, esclarecê-lo, aperfeiçoá-lo”, enquanto que complemento como aquilo “que complementa ou completa; acabamento, remate”. Entendo, então, que um complemento tem a função de preencher um espaço existente não ocupado, enquanto que o suplemento vai aperfeiçoar algo já existente. Neste sentido, como o SUS propõe oferecer toda a assistência à saúde necessária ao bem estar da população, penso que o uso da expressão suplementar não deveria ser feito no caso do mercado de assistência privada à saúde. Diante da oportunidade de definir o que investigar, selecionei como mais importante, para este momento, contribuir na compreensão do real alcance do SUS e de suas diretrizes, bem como as do mercado suplementar. Não me entretive na terminologia utilizada para saúde suplementar, complementar, etc. Também devo avisar o leitor que este mercado de saúde suplementar é conhecidamente dividido em modalidades empresarias (as seguradoras, as medicinas de grupo, as cooperativas médicas e as empresas próprias, também conhecidas por 12 autogestões), mas que não me preocupei com tal tipologia por não considerá-la determinante para a realização deste trabalho. Outra notificação é quanto à diferença entre operadora de “plano/seguro de saúde”, de “plano ou seguro de saúde”, de “plano e seguro de saúde” e, por último, de “plano privado de assistência à saúde”: não há diferença entre estes termos na redação desta pesquisa, da mesma forma que “convênio médico-hospitalar” tem o mesmo significado que “plano privado de assistência à saúde”. Como as pessoas que trabalham nesta área costumam utilizar todos os termos comentados, aqui o seu uso se deu de acordo com o desejo momentâneo. No primeiro capítulo é feita uma recuperação de como vem se estruturando o processo de trabalho e emprego no Brasil, bem como da história das políticas de atenção à saúde do trabalhador. Para tanto, identificou-se as principais instituições responsáveis pela sustentação do modelo de atenção à saúde do trabalhador. O Capítulo 2 apresenta a pesquisa de campo, em que foram selecionadas três empresas da região do ABC do paulista, de grande porte e ligadas a um mesmo sindicato1 . Para o estudo destes 3 casos, foi elaborada uma relação de indicadores objetivando o dimensionamento das Características da Empresa; das relações desta Empresa com o Empregado no tocante ao Contrato de Trabalho e no à Assistência à Saúde; das Relações desta empresa com a Operadoras ou Administradora do Plano Privado de Assistência à Saúde, bem como com a Rede Credenciada de Estabelecimentos de Saúde (acesso, cobertura, utilização e financiamento dos serviços). Procurou-se compreender qual é a Estrutura do Convênio médico-hospitalar das Empresa estudadas, inclusive quais as principais mudanças que a afetaram. Portanto, fez-se necessário o conhecimento da extensão das relações da Empresa com os Trabalhadores, com a Assistência à Saúde que recebiam e com o Movimento Sindical. Para analisar como se dão as articulações entre as dimensões pesquisadas no Capítulo 2, e as instituições identificadas no primeiro Capítulo 1, no Capítulo 3 é feita uma abordagem do contexto em que o sistema de saúde brasileiro se desenvolve desde a década de 1920 até a década de 1990, balizada pela Reforma do Estado, e por mudanças estruturais no Mundo do Trabalho. 1 Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Químicas, Petroquímicas, Farmacêuticas, Tintas e Vernizes, Plásticos, Resinas Sintéticas, Explosivos e Similares do ABC, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra – SINDIQUIM. 13 Intentou-se entender o que é esse sistema de saúde, ou seja, o se objetiva com o SUS e com o setor suplementar, e o porquê uma sociedade convive com diferentes modelos de saúde que, dada a divergência de ideais norteadores de suas das ações, possivelmente apresenta diferentes graus de resolutividade. 14 INTRODUÇÃO A partir dos anos 90, o setor supletivo de assistência médica no Brasil tornou-se mais visível e vem adquirindo maior importância na agenda governamental. No entanto, o mercado de planos e seguros de saúde no Brasil vem se constituindo desde a década de 40, mesma época em que os trabalhadores do Banco do Brasil criaram a Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil (CASSI) com o propósito de complementar o atendimento médico que era realizado pela Previdência oficial através do Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Bancários (IAPB). A implantação das grandes empresas estatais e de muitas multinacionais nos anos 50 foi acompanhada por uma política de benefícios diferenciada para estes trabalhadores, implicando a montagem de esquemas próprios de assistência médicohospitalar, em especial na região do ABC do estado de São Paulo. Mais tarde, nos anos 60, surgiram empresas médicas2 que se voltaram para o atendimento de segmentos de trabalhadores da indústria de transformação, metalurgia e química, estimuladas pela Previdência Social que deixava de recolher uma parcela da contribuição devida, estimulando o financiamento dos planos privados de assistência à saúde. Esta forma de cobertura se preservou, mesmo quando os subsídios diretos da Previdência Social se tornaram irrisórios, através de outros mecanismos de incentivos fiscais. Até a década de 80, os planos de saúde estavam voltados, quase que exclusivamente, para os clientes empresa. Eram planos coletivos acessíveis somente pela posse de contrato de trabalho. A partir da segunda metade dos anos 80, as operadoras de planos de saúde captaram as demandas de clientes individuais (trabalhadores autônomos – profissionais liberais –, aposentados, trabalhadores de empresas de pequeno porte), bem como a de trabalhadores formalmente empregados que não estivessem envolvidos com os planos privados de assistência à saúde, como os de algumas empresas da administração pública das três esferas de governo. Nesta mesma época, outras instituições governamentais optaram por implantar ou incrementar planos próprios de assistência à saúde, pela constituição de entidades de previdência fechada, em conjunto com seus sindicatos e associações profissionais, trazendo para a cobertura de planos privados de saúde, um grande contingente de funcionários públicos. Este é também o momento da entrada das seguradoras no 15 mercado de assistência suplementar. Estas passam a disputar clientes de planos-empresa e de planos individuais, com as outras modalidades empresariais de plano de saúde (medicina de grupo e cooperativas médicas), se tornando mais uma alternativa à administração dos planos próprios das empresas. Quando se observa o desenvolvimento histórico do setor do lado da oferta de serviços, pode-se advertir que, durante a década de 70, houve grande incentivo do governo ao crescimento dos prestadores privados de assistência médica. Isto ocorreu, principalmente, sob duas formas. Uma delas, foi o incentivo financeiro, através do Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social – FAS –, onde os prestadores privados de serviço de assistência médico-hospitalar obtinham financiamentos para expansão e incremento dos serviços, além da formação de capital fixo. A segunda forma de incentivo governamental deu-se pela ligação entre o Estado e os prestadores de serviço, sob a forma de contratos e convênios. O Estado ocupava a posição de importante comprador de serviços de assistência médica desses prestadores privados, estabelecendo uma relação de dependência. Estes prestadores de serviço que integravam a rede conveniada e contratada de assistência médico-hospitalar, conseguiram se modernizar, ao mesmo tempo que tenderam a se desvincular da rede pública devido à visão de que o setor supletivo tornava-se mais lucrativo. Neste sentido, Mendes (1993) considera que a conjuntura econômica e política do fim da década, marcada por crise fiscal do Estado, deterioração da situação cambial, aceleração inflacionária e recessão e o processo de redemocratização brasileiro, tornaram mais atrativa a ligação dos prestadores privados de assistência médico-hospitalar com o setor supletivo do que com o setor público. Tanto FAVARET & OLIVEIRA (1990), como MENDES (1993), defendem a existência de uma relação entre o desfinanciamento do setor público de saúde, a queda da qualidade dos serviços prestados, e o crescimento do setor supletivo brasileiro. Entretanto, BAHIA (1991) considera que essa relação tem que ser avaliada de forma mais criteriosa. A crise dos serviços públicos não seria tão genérica, apesar dos indícios na queda da sua qualidade, já que na década de 80 houve uma expansão na oferta de serviços ambulatoriais públicos. 2 Conhecidas como Cooperativas médicas e Medicina de Grupo. Entretanto, durante o decorrer deste trabalho não será utilizada a tradicional classificação das empresas de planos privados de assistência à saúde por serem consideradas semelhantes – ao menos nos propósitos dessa pesquisa - quanto ao produto comercializado. 16 Além disso, a representação da qualidade dos serviços de saúde para o usuário, quando comparado o setor público com o privado, parece estar mais ligada ao acesso – envolvendo o tempo em filas de espera e a possibilidade de ser atendido dentro das especialidades pelo profissional desejado do que incerteza de ser atendido – do que à critérios de elaboração do conceito de qualidade e de seus indicadores. A relação entre a oferta pública e a privada de assistência médico-hospitalar é, porém, mais complexa. Do lado dos provedores privados, o que se observa é uma diversidade de relações de credenciamento. Um mesmo estabelecimento pode ser conveniado ao SUS, credenciado a uma ou mais operadoras do setor suplementar, e utilizado por indivíduos e famílias de forma privada. Considerando a remuneração dos procedimentos, existe uma variação dos valores pagos de acordo com a clientela usuária. Essa articulação se dá na busca do provedor de assistência médica em obter o maior ganho possível com a venda dos seus serviços. De acordo com BAHIA (1991), isso acontece porque as parcelas de demandas relacionadas com a oferta diferenciada de serviços, não são suficientes para determinar uma especialização mais rígida do lado dos ofertantes. A conseqüência disso é que muitos estabelecimentos de saúde oferecem diferentes formas de atendimento, que podem se refletir tanto na qualidade do serviço prestado, como na forma como é prestada a assistência. No que diz respeito às clientelas que utilizam os serviços do setor público e do setor supletivo de saúde, não se pode considerar que exista uma divisão rígida entre elas. O que se observa, é uma sobreposição da clientela pois, pelo menos uma parcela dos beneficiários das empresas de planos e seguros de saúde, também é usuária do Sistema Único de Saúde – SUS. O gráfico a seguir apresenta resultados de uma pesquisa3 realizada com usuários do SUS onde observa-se que, dentre aqueles entrevistados que são beneficiários de planos e seguros de saúde, 54% declara utilizar os serviços do SUS, o que permite supor que as operadoras de planos e seguros de saúde não estejam proporcionando a seus clientes a cobertura completa de serviços que eles necessitem ou escolham utilizar (Figura 1). 3 Pesquisa realizada em conjunto pelo IBOPE, Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (CONASS) e a Fundação Nacional de Saúde (FNS). 17 FIGURA 1 Proporção de Beneficiários de Planos/ Seguros Saúde por Intensidade de Utilização dos Serviços do SUS Brasil - 1998 Exclusivo 5% Frequente 6% Não Usuário 46% Eventual 43% Fonte: Rodrigues, 1998 Elaborado por Bahia, L. Esta mesma pesquisa investigou como o entrevistado possui o plano, isto é, se é plano individual (financiado pelo indivíduo), ou se é plano-empresa. Neste último caso, pode ser financiado integralmente pela empresa ou em conjunto com os beneficiários. Ademais, o beneficiário de um plano-empresa pode ser o titular, que é o trabalhador, como pode ser dependente, geralmente esposa(o) e filhos. De acordo com a Figura 2, percebemos que a grande parte dos beneficiários o são pelo vínculo empregatício, ou seja, 66% da totalidade. FIGURA 2 DE QUE FORMA POSSUI O PLANO? Empresa, como dependente 39% Individualmente 34% Empresa, como titular 27% Fonte: Rodrigues, 1998 18 Em função do acima colocado, pode-se afirmar que a relação entre a oferta pública de serviços de saúde e a oferta privada é complexa. No presente trabalho, entende-se que o Estado deve ser o mediador dessa relação, para que se possa atingir níveis socialmente aceitos de igualdade e justiça social. Isto significa considerar que é fundamental que todo o setor supletivo de assistência médico-hospitalar tenha uma legislação específica que regulamente a atuação das suas operadoras no mercado, processo iniciado em 1998 com a Lei n.º 9.656. 19 CAPÍTULO I: ARTICULAÇÃO ENTRE ÓRGÃOS ENVOLVIDOS NA SAÚDE DO TRABALHADOR 1.1 – Introdução ao Capítulo 1 As ações do Estado direcionadas ao setor de saúde do trabalhador estão contextualizadas na conjuntura nacional e internacional de desemprego, precarização do emprego e aumento do emprego informal. Assim, imagina-se como certo que o maior vencedor nesse meio de campo acaba por ser aqueles trabalhadores que de alguma forma conseguiram se manter formalmente empregados, garantindo à si e à sua família, além do emprego que já fala bastante por si mesmo, benefícios como, a assistência médica e os do seguro acidente do trabalho (SAT), proporcionados por seu empregador e pelo Estado. Para obter mais elementos que traduzam a assistência à saúde do trabalhador brasileiro, primeiramente é elaborado um arcabouço teórico desta realidade que servirá de base para posterior momento de trabalho, realizado através de pesquisa de campo. A intenção é contribuir para o conhecimento do atual modelo de políticas de assistência à saúde ao trabalhador e do restante da população brasileira. Para tanto, num primeiro momento buscou-se compreender como se deu o processo de industrialização brasileiro e quais as suas articulações com as questões do trabalho e do emprego. Foram destacadas quais as principais instituições envolvidas, como o Ministério do Trabalho e do Emprego, com a FUNDACENTRO, as organizações dos trabalhadores, as federações da indústria e sua participação nas entidades sociais mistas quanto ao seu financiador (público e privado) que são aquelas entidades do sistema “S” (SESI, SESC, SENAI e SENAC), etc., que também são importantes atores por cumprirem um papel de apoio e provisão de serviços relativos á saúde do trabalhador. Aparece então a necessidade de verificar a cobertura social com a qual o trabalhador está provido, em especial aquela derivada da articulação entre a Previdência e a Saúde. Para tanto é revisto o histórico das políticas de assistência à saúde ao trabalhador, desde o aparecimento do profissional médico no interior das empresas nos séculos XVIII e XIX (quando se desenvolveu a Medicina do Trabalho), a criação de organizações como a Organização Internacional do Trabalho (OIT) no início do século XX, depois da Organização das Nações Unidas (ONU) e Organização Mundial de 20 Saúde (OMS) pós-II Guerra Mundial, o desenvolvimento da Saúde Ocupacional a partir da metade do século XX, e a Saúde do Trabalhador na década de 1970. A saúde do trabalhador vai ser observada através da análise da legislação brasileira que designa a responsabilidade do acidente do trabalho ora para o Estado, ora para o empregador, ora para o próprio trabalhador que termina sendo cobrado para atuar de forma mais efetiva na organização dentro do local de trabalho de modo a fazer com que a legislação seja cumprida. A Legislação acerca dos benefícios previdenciários somente é estendida aos trabalhadores informais de forma inespecífica e sem instrumentos que garantam sua efetividade. Este é mais um dos problemas apontados que se perpetua até os dias atuais. Também é colocada a estrutura do modelo de saúde, um mix de formas públicas e privadas de provimento e administração, ou seja, regida por distintas lógicas regentes. As questões que daí derivam, como a dificuldade de interferência no processo de trabalho serão observadas, além de seus aspectos legais, sob a ótica dos trabalhadores e das organizações sindicais, assim como da visão de especialistas do tema. Percebe-se, assim, que a sobreposição de responsabilidades, da administração e do financiamento desse modelo se torna ineficaz para responder às necessidades da sociedade. Fundamental para o debate é o papel do empresariado que, através de suas políticas de recursos humanos, torna-se sujeito estratégico da assistência à saúde que chega ao trabalhador brasileiro – seja pela assistência contratada de empresas de plano/seguro saúde, ou pelo departamento médico localizado no interior das empresas, ou pelos serviços do SUS ou mesmo a proposta pelos serviços do sistema “S”. Desta maneira, será discutida a incapacidade do modelo de políticas de saúde em satisfazer as necessidades do trabalhador, neste campo, não perdendo de vista que o modelo de assistência à saúde ao trabalhador é determinante de grande peso do modelo de saúde brasileiro que, por sua vez, ao mesmo tempo o determina, o que acaba por colaborar na integração dos diferentes interesses envolvidos, reforçando a importância do setor supletivo de saúde como o principal administrador da assistência à saúde que estes trabalhadores e seus familiares recebem. É a velha história da raposa tomar conta do galinheiro, ou seja, são as empresas de plano/seguro de saúde, que têm que se preocupar em administrar seus custos, quem administra a saúde de considerável parte da população do país. Uma outra conseqüência, que acaba fechando o círculo, é o reforço à não integração dos serviços 21 relativos à saúde do trabalhador no interior das empresas, o que retorna à não discussão do processo de trabalho. Embora não seja objeto da discussão, também será comentada a não interferência da recente regulamentação do setor (Lei n.º 9.656/98) nas principais demandas desse modelo - pelo menos em seu primeiro momento e no tocante à amplitude das coberturas oferecidas. E que não bastam pequenas mudanças; a real mudança depende de articulações entre o empresariado (seja do setor de planos/seguro saúde, seja dos ramos produtivos que são os grandes empregadores, sejam os produtores de equipamentos e medicamentos, seja a classe médica) e a elite política do país. O que só pode ser realizado a partir da ação reguladora do Estado. 1.2 – O processo de Trabalho e de Emprego – Financiamento, Atores e Instituições Envolvidos O processo de industrialização brasileiro, ausente de uma estrutura de ocupações ou mesmo de um projeto de reforma agrária, contou com um mercado de trabalho nos centros urbanos com excessiva oferta de mão-de-obra, em especial na indústria de transformação, garantindo baixos custos. De acordo com DEDECCA, consolidou-se um mercado “pouco estruturado associado a um sistema de relações de trabalho frágil, onde o poder de alocação do trabalho pelas empresas continuou sendo a regra dominante” (DEDECCA, 1998:279). Assim, a configuração desse mercado não podia contar com um sistema que controlasse o uso da mão-de-obra, inclusive a qualidade dos serviços desta. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) pouco contribuiu neste processo pelo fato de legislar as questões referentes aos direitos gerais de trabalhadores e da atividade sindical sem, contudo, incentivar o desenvolvimento de uma negociação coletiva que formasse uma estrutura de ocupações por setor de produção, o que certamente esbarraria na qualificação profissional/perfil educacional da força de trabalho. Esse quadro teria propiciado grandes empresas a organizarem suas estruturas de ocupações com autonomia, a qualificação da mão-de-obra contratada era feita de forma específica, no interior das empresas. Atualmente este quadro é diferente, a formação de mão-de-obra pode contar com algum apoio governamental através da co-gestão das escolas técnicas ou com o sistema “S” que são aqueles serviços sociais públicos e 22 privados de desenvolvimento da educação profissional, como o SENAI e SESI (indústria), SENAC e SESC (comércio)4 . A estrutura do SESI se fortaleceu quando da mudança nas Normas Regulamentadoras, em especial a NR 7 e a NR 95 , na década de 1970. Pré 1974 o SESI já realizava exames relativos à prevenção de acidentes e riscos ambientais e da saúde ocupacional, porém é a partir de 1975 quando as empresas passam a ser responsáveis pela questão do acidente do trabalho que o sistema “S” se torna mais procurado, principalmente para realização dos exames prescritos nas normas. De acordo com a coordenadoria geral da Secretaria de Políticas de Emprego e Salário do Ministério do Trabalho e Emprego, o governo brasileiro realiza suas ações buscando consolidar uma Política de Emprego “de modo a integrar o pagamento do benefício do seguro desemprego às ações de qualificação profissional e intermediação ao emprego” (VALLE, 227: 1998). Tal política é desenvolvida e coordenada pelo governo federal e realizada com maior ênfase pelas esferas estaduais e municipais de forma descentralizada6 . Essa política seria a interface que o governo faz com o sistema “S”. O caráter assistencialista da intervenção do Estado neste setor, herança do Estado Novo, também explica em parte um sistema previdenciário complexo e a constituição de serviços públicos de emprego. Um exemplo é o seguro desemprego, acima comentado, criado em 1986 e que visa a promover uma assistência ao trabalhador de cunho financeiro e de sua reinserção no mercado de trabalho pela qualificação profissional – leia-se “intermediar os trabalhadores na busca de emprego; orientar e propiciar a formação ou readaptação profissional; recolher e coletar sistematicamente informações sobre o mercado de trabalho (...)” (VALLE, 229: 1998). Ao ver de VALLE, a Constituição Federal de 1988 (CF/88) expande os “benefícios sociais” já existentes (do sistema “S”) ao instituir fonte de recursos para a seguridade social. Nesse sentido teria sido criado o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), operando a partir de 19907 com recursos provenientes do PIS e PASEP. Sua 4 SENAC: Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio; SENAI: Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial; SESC: Serviço Social do Comércio; SESI: Serviço Social da Indústria. 5 NR 7: Norma que regulamenta o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional e NR 9 o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, comentadas mais adiante. 6 Como se pode verificar adiante, uma crítica que se faz ao sistema “S” é justamente pela forma de sua configuração que, descentralizada demais, não permite uma organização institucional com princípios comuns, uma política orientadora, o que reflete nas ações que dos “Ss” partem, ou seja, autônomas e independentes. 7 Lei n. 7.998, de 11 de janeiro de 1990. 23 gestão é feita pelo Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (CODEFAT) composto por representantes patronais, dos trabalhadores e governamentais. Parte dos recursos do FAT (40%) são destinados a ações de cunho econômico, desenvolvidas pelo BNDES, enquanto que os 60% restantes financiam o Programa Seguro Desemprego e programas de capacitação e qualificação profissional (Artigo 239 CF/88). Para autores que consideram imprescindível a existência de uma política de formação profissional para o Brasil com características públicas (financiamento misto público/privado, e gestão que inclua a participação dos trabalhadores) a atuação do chamado sistema “S” ainda não atingiu um grau satisfatório de execução de projeto conjunto (AZEREDO, 1998, SALM & FOGAÇA, 1994). Para esses autores o SESI, SENAI, SESC e SENAC são entidades privadas que devem ser preservadas por representarem um modelo misto (escolar e empresarial), porém que necessitam ter suas funções readequadas para um projeto maior que integre os programas do setor. Além do fato de essas instituições serem dependentes de um modelo de financiamento calcado na compulsoriedade da contribuição empresarial, que está na pauta atual da discussão sobre encargos sociais, seus serviços também podem ser questionados já que o público alvo é apenas o trabalhador empregado – os trabalhadores desempregados não costumam ter acesso a esses serviços (AZEREDO, 1998). Ainda é delicado falar sobre o financiamento dos serviços do sistema “S” devido à polêmica que este assunto causa. Há quem defenda que não sejam permitidas isenções das contribuições à essas instituições para que “possam representar de fato um instrumento de incentivo para as empresas que investem em seus próprios empregados” (AZEREDO, 1998). Observando pelo ângulo da estrutura de organização dos trabalhadores, a contribuição sindical, tanto antes da CF/88 como atualmente, é realizada compulsoriamente por todos aqueles que fazem parte de determinada categoria econômica ou profissional, ou de profissão liberal. Os recursos arrecadados se destinam ao sindicato representativo ou à Federação (caso não haja o sindicato). 24 O recolhimento da contribuição é feito uma vez ao ano e corresponde a um dia de trabalho para os trabalhadores8 . Do montante de recursos financeiros recolhidos pela contribuição, a distribuição era feita, até a CF/88 da seguinte maneira: 5% destinada para a Confederação, 15% para a Federação, 60% para o Sindicato de base e 20% para a conta especial de Emprego e Salário do MTE. Com a Carta Magna de 1988 não é mais repassada a parte referente ao MTE, já que iria de encontro à impossibilidade de interferência do Poder Público nos sindicatos. Acadêmicos e representantes sindicais vêm defendendo o fim da obrigatoriedade da contribuição sindical já que esta teria sedimentado o corporativismo sindical no Brasil (MATTOSO & SIQUEIRA NETO, 1997), possibilitando o financiamento das atividades dos sindicatos independentemente do interesse dos representados, inclusive a criação de diversos sindicatos e sindicatos “fantasmas”. Além do mais, a compulsoriedade também interfere na liberdade de adesão do contribuinte/trabalhador (MATTOSO & SIQUEIRA NETO, TODESHINI, CUT). Os sindicatos devem aplicar a contribuição em assistência técnica, jurídica, médica, dentária, hospitalar e farmacêutica, prevenção de acidentes do trabalho, educação e formação profissional. Porém, tanto o sistema “S” como os sindicatos atuam tendo como objeto primeiro o trabalhador empregado. Como o leitor poderá observar mais à frente, a regulação da saúde do trabalhador se propõe a dar conta apenas do trabalhador formalmente empregado, ficando os trabalhadores informais e os desempregados à margem daquele sistema de saúde destinado a funcionários de empresas que têm setor médico para garantir o acompanhamento prescrito na legislação e que, por muitas vezes, também têm assistência à saúde proporcionada pelos “convênios médicos” (entre as empresas empregadoras e empresas de planos e seguros de saúde) para si e para sua família. Além dessas opções, os trabalhadores ainda podem utilizar os serviços públicos de saúde disponíveis para toda a população brasileira, e também aqueles dirigidos apenas aos trabalhadores como os Centros de Referência de Saúde do Trabalhador. Como veremos adiante, todas essas formas se sobrepõem tanto no que diz respeito ao 8 “(...) consistindo em um dia de trabalho para os trabalhadores, em uma importância correspondente a 30% do maior valor de referência fixado pelo Poder Executivo para os agentes ou trabalhadores autônomos, e em um a importância proporcional ao capital social da firma ou empresa, de acordo com a tabela progressiva para os empregadores.” (MATTOSO & SIQUEIRA NETO, 1997:32) 25 provimento dos serviços como no financiamento, gerando um sistema nacional frágil e de baixa resolubilidade. 1.3 – Políticas de Assistência à Saúde do Trabalhador – Breve Histórico A filosofia de manutenção do trabalhador sadio se fortalece no século XVIII – Revolução Industrial, êxodo rural e ruins condições de saneamento urbano associados à miséria de grande parte da população – pela necessidade de dar respostas às demandas dos empregadores daquele ser humano que trabalhava nas fábricas, que passava por ruins condições de trabalho, contribuindo para a mudança do perfil epidemiológico do trabalhador (FRIAS JUNIOR, 1999). Neste momento já era possível verificar a atuação do profissional médico no interior de empresas francesas que se preocupavam com a capacidade do trabalhador de produzir (OLIVEIRA, 1998), modelo difundido nos demais países europeus no século XIX (MENDES & DIAS, 1991). No início do século atual ocorreram as reivindicações de trabalhadores londrinos por 8 horas de trabalho, 8 horas de lazer e 8 horas para dormir, o que significa uma forte interferência no processo de produção, surgida pela necessidade de melhoria das condições de trabalho e vida desses trabalhadores no sentido de adaptar o trabalho às necessidades do ser humano trabalhador e não o contrário como era a tendência da atuação médica no interior das empresas. Em 1919 é criada a Organização Internacional do Trabalho (OIT) que desde então reconhece a existência de doenças profissionais. Após a II Guerra Mundial aparece mais claramente a idéia de Saúde Ocupacional, acompanhada de movimentos que levaram à criação da Organização das Nações Unidas (ONU) em 1945, Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1946 e a I Sociedade Mundial de Ergonomia em 1949, de modo que na década de 1950 já está incorporada a Medicina do Trabalho. Na década de 1970, ganha forças a Saúde do Trabalhador com o movimento de trabalhadores da indústria automobilística de Turim (Itália) que começa a opinar sobre questões relativas às condições de trabalho, mais especificamente reivindicando o direito ao conhecimento dessas condições. Assim, este é um momento em que o trabalhador aparece como ator na história da Saúde do Trabalhador. Ainda em 1970 o Canadá estabelece juridicamente a necessidade de proteção prévia ao risco de modo a não necessitar a utilização de equipamento de proteção industrial (EPI) pelo trabalhador. Atualmente pode-se observar esforços em direção à Qualidade de Vida no Ambiente de Trabalho, onde se busca a satisfação do trabalhador. 26 No Brasil a história se dá com forma e em momentos diferentes. As primeiras reivindicações dos trabalhadores foram compiladas no I Congresso Operário, realizado em 1906, e nas posteriores Leis acerca do acidente do trabalho que, contudo, não davam conta da questão sobre a responsabilidade do risco, transferindo o cerne da questão do processo de produção responsabilidade do ao empresário. Posteriormente, considerou-se que a acidente do trabalho competia às empresas seguradoras, à Previdência e ao próprio trabalhador. A primeira legislação sobre o tema foi editada sob forma de Decreto-Lei9 , em 1919, quando se definiu o Estado o interventor dos diversos interesses (empregado, empregador e sindicato), a responsabilidade do acidente ao empregador e as reivindicações dos trabalhadores transformadas em norma ao estabelecer que quando ocorrido acidente, ficaria o patrão obrigado a indenizar ao operário ou à família. Porém, ainda assim, não estava garantida a indenização ao acidentado já que este teria que provar o ocorrido. Ademais, o acidente de trabalho era definido como acidente no trabalho, ou seja, para ser caracterizado como tal teria que ter acontecido no local de trabalho. Após 15 anos muda-se esta legislação através do Decreto n.º 24.637 de 1934, que conseguiu tornar desnecessária a prova do acidente pelo acidentado ou por quem fosse ser beneficiado pela indenização. Outro fato importante foi que então se instituiu a possibilidade de realização do seguro-acidente através de depósito caucionário no Banco do Brasil ou nas Caixas Econômicas da União, com a vantajosa possibilidade de classificar tais gastos como custos operacionais da empresa, o que permite a dedução do imposto de renda devido. Pode se dizer que a responsabilidade do risco ainda era do empregador, entretanto compartilhadas com as empresas seguradoras. De acordo com COHN, o acidente do trabalho somente foi concebido como decorrente do trabalho com a terceira Lei sobre o assunto, em 194410 , quando foi transferida a responsabilidade do empregador à empresas seguradoras, através do seguro-acidente obrigatório (COHN et allii, 1985), isto é, a partir de então a responsabilidade passa a ser obrigatoriamente das seguradoras. Foi em 1967 que o âmbito do risco passou a ser social, quando o seguro passou a ser administrado pela Previdência Social que, além de indenizar o acidentado ou sua 9 Decreto-legislativo n.º. 3.724 de 1919. Decreto-Lei n.º. 7.036, de 1944. 10 27 família, teria que ampará-lo financeiramente (auxílio aposentadoria ou benefícios financeiros diretos)11 . É nesse período que começam a ser legalmente impostos os serviços de saúde no interior das empresas com a contratação de profissionais competentes. Foi a criação dos Serviços Especializados de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT), já recomendados pela OIT desde 1959 (FRIAS JUNIOR, 1999:40). Também nesta década é editada a portaria n.º 3.214 de 1968, que estabelece as Normas Regulamentadoras, comentadas mais adiante. Em 1976 nova legislação interfere no conteúdo das regras12 : o financiamento do seguro-acidente obrigatório passa a ser realizado também pelo empregado, cabendo ao empregador apenas uma parcela do montante, caracterizada como contribuição. Nas palavras de COHN, “o custeio das prestações por acidentes do trabalho cabe ao Estado e ao segurado sendo que a tarifa paga pelo empregador, conforme as faixas preestabelecidas, conta apenas como uma complementação de recursos (...) agora o segurado não é mais o empregador mas o próprio empregado” (COHN et allii, 1985: 143). Nesse meio tempo (início da década de 1970) a Medicina do Trabalho ganhou força no Brasil, começando a Saúde Ocupacional se expressar no fim desta década (1978). Nessa década são realizadas mudanças estruturais; além da transferência do seguro-acidente obrigatório aos trabalhadores, as Normas Regulamentadoras passam para as empresas a responsabilidade da realização dos exames relativos ao PCMSO e PPRA. Nesse mesmo contexto são criados os Programas de Saúde do Trabalhador (PST), traduzindo a responsabilidade do Estado ao menos no tocante à formação de uma política nacional de saúde do trabalhador. Como pode-se ver adiante, não consegue cumprir seu papel. Assim, é na década de 80, com a criação dos Programas de Saúde do Trabalhador, com a VIII Conferência Nacional de Saúde (1986) e com a Constituição Federal de 1988, que foi ampliada a idéia de Saúde do Trabalhador. As Constituições Estaduais (CEs) em geral constatam que a Constituição Federal estabelece a saúde do trabalhador mais como parte do campo do trabalho que do da saúde, de modo que grande parte das CEs procuram resgatar a fiscalização e inspeções para a 11 12 Decreto-Lei n.º. 5.316, de 1967. Decreto-Lei n.º. 6.367, de 1976. 28 responsabilidade do SUS 13 . Este tema foi desenvolvido na Lei Orgânica da Saúde n.º 8.080 de 1990 (OLIVEIRA et allii, 1997). Os principais articuladores das demandas da saúde do trabalhador é a Comissão Intersetorial de Saúde do Trabalhador – CIST e o Grupo Executivo Interministerial de Saúde do Trabalhador – GEISAT. Os Ministérios da Saúde, do Trabalho e Emprego e da Previdência e Assistência Social participam na formulação e na implementação das políticas relativas às condições e aos ambientes de trabalho, pela definição de normas, critérios e padrões para o controle das condições e dos ambientes de trabalho, coordenando a política de Saúde do trabalhador no âmbito nacional, tanto na esfera pública como na esfera privada. Considera-se que o desenvolvimento destas atividades seja negociado e pactuado nesse locus, ratificado pelo Conselho Nacional de Saúde. Ainda foram promulgadas mais 2 Leis a respeito da saúde do trabalhador. A Lei n.º 8.213 de 1991 assegura estabilidade no emprego para os incapacitados de trabalhar por mais de 15 dias. Em 1995 a legislação de acidentes do trabalho é modificada; o seguro do acidente do trabalho é vinculado exclusivamente ao trabalhador formalmente empregado através da contribuição para o seguro de acidentes do trabalho (Lei n.º 9.032/1995); a legislação não abrange aqueles que estão na economia informal. O SAT, gerido pelo INSS, é uma das fontes de custeio do Fundo de Previdência e Assistência Social, no âmbito do MPAS. Os benefícios do INSS – auxílio-doença, auxílio-acidente, aposentadoria por invalidez, pensão por morte, serviço social e reabilitação profissional14 – são concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa. Embora os acidentes do trabalho possam ter aspectos relacionados com a assistência à saúde, não o são: quando as empresas empregadoras contribuem, conforme o grau de risco da atividade preponderante, com 1, 2 ou 3% do total de remunerações pagas aos segurados, não estão contribuindo para a assistência médico-hospitalar do trabalhador. Portanto, o financiamento do SAT só contempla a assistência à saúde relacionada ao acidente e à doença do trabalho, o que permite afirmar que, além dos benefícios do INSS, os trabalhadores formais e os informais estão no mesmo patamar quando falamos de garantias de saúde. A maior diferença é quanto à possibilidade que 13 Já a questão das informações via CAT ficou resignadamente destinada à Previdência Social, instituição que paga os benefícios, o que não colabora num maior enfoque para as ações preventivas ao acidente e doenças do trabalho (Oliveira et allii, 1992). 14 Lei de Benefícios n.º 8.213 de 1991 e Lei de Custeio n.º 8.212 de 1991. 29 os formalmente empregados têm de pleitearem assistência médico-hospitalar específica para si e seus dependentes15 . Analisando a história da saúde do trabalhador sob o ângulo destes, na região do ABC paulista o movimento sindical se estruturou para tratar, dentre outras, das questões da saúde do trabalhador. Há sindicatos cuja história é fortemente marcada pela atuação em questões da saúde, devido à necessidades de introduzir formas de trabalhar a prevenção ao acidente de trabalho, insalubridade, etc., além da necessidade de contemplar as demandas dos trabalhadores em relação à forma de assistência à saúde, diretamente relacionada aos benefícios que pleteiam (exemplo clássico disso é as famosas greves durante a década de 1980, onde a assistência privada à saúde costumava estar em pauta). Os sindicatos ligados ao setor químico, que será selecionado para estudo de campo são bastante avançados na sua atuação por conta da organização dos trabalhadores do setor, em grande parte localizados no ABC paulista, dos salários (comparativamente às demais categorias, é a química é uma das poucas que conseguiu estabelecer patamares de salários relativamente altos), etc. Os sindicatos têm o apoio institucional do DIESAT (Departamento Intersindical de Estudos de Saúde e Ambiente do Trabalho) sociedade civil fundada em 1980 por sindicatos e ligada ao DIEESE, cuja função abrange os serviços relativos à saúde e condições de trabalho, ao trabalhador em geral. Sua estrutura conta com assessoria de técnicos em sindicatos filiados; estudos e pesquisas sobre saúde e trabalho; perícia técnica nas empresas a pedido dos sindicatos; encontros, seminários e cursos para direções de sindicatos, para cipeiros16 , biblioteca; etc. Além do DIESAT há o INST, Instituto Nacional de Saúde do Trabalhador, diretamente vinculado à CUT, com objeto de trabalho semelhante ao do DIESAT. Outro ramo do movimento sindical, além da CUT, que merece ser realçado é a Força Sindical que, apesar de ter sido fundada recentemente, em 1991, também é atuante nesta área, onde vem se destacando em representações em instituições ligadas ao governo (comissões e grupos técnicos). A forma como a saúde do trabalhador é tratada no Brasil é duramente criticada, tanto pelo movimento sindical como por especialistas. Considera-se a legislação incapaz 15 Problema decorrente dessas questão é que, além de não haver informações acerca dos acidentes do trabalho ocorridos com os trabalhadores informais, não há capacitação suficiente ao estabelecimento do grau de risco correspondente à atividades informais (MÉDICI, 1999), o que demonstra como o Estado brasileiro está aquém de necessidades primordiais como o conhecimento de sua estrutura produtiva. 30 de dar conta das reais necessidades do trabalhador já que, ao invés desta cuidar do ambiente do trabalho, tem como objeto o acidente, atuação vinculada à lógica da insalubridade vigente em toda a legislação como acima comentado. Assim, ao invés de garantir e incentivar ambientes sadios de trabalho e já prevenidos de possíveis acidentes, a legislação estabelece penalidades como o adicional de periculosidade e insalubridade definidos pelo nível de risco em que cada produção se classifica, de forma que acaba por “legitimar o risco através da indenização pelo trabalho insalubre e perigoso” (OLIVEIRA et allii, 1992:154). Dessa forma mantém-se o âmbito da discussão fora do processo de trabalho, não levando em conta que “o fator risco não é inerente ao trabalho, mas sim ao modo como os homens o idealizam e concretizam” (FRIAS JUNIOR, 23: 1999). Essa lógica permite que ocorra no país um processo de adoecimento do ambiente de trabalho. O quadro de morbi-mortalidade dos trabalhadores brasileiros é grave, mesmo não sabendo se os números oficiais correspondem à realidade, ainda há os casos de acidentados do trabalho informal e os casos do trabalhadores rurais, pouco registrados na Previdência Social (OLIVEIRA et allii, 1992). A questão que se coloca até os dias de hoje, é sobre a (im)possibilidade de interferência na organização da produção, ou seja, no processo de trabalho. Não há conhecimento de ações por parte de trabalhador ou sindicato em que se exija adaptações do ambiente do trabalho – há, sim, reivindicação de melhorias em relação à insalubridade, o que não contempla o ambiente do trabalho como um todo. Provavelmente um dos setores mais avançados nesse sentido seja o químico devido à necessidade de organização dos trabalhadores pelo próprio processo de produção que freqüentemente utiliza matéria prima considerada geradora de alto risco ao trabalhador. Nesse setor se encontram altas porcentagens de empresas com Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA) formada e diversos casos de transformação da CIPA em Comissão de Fábrica, com poderes mais abrangentes que a CIPA, incluindo-se os relacionados à saúde do trabalhador como um todo, abrangendo as condições de trabalho e Meio Ambiente17 . 16 17 Membros da CIPA. Comissão de Condições de Trabalho, Saúde e Meio Ambiente (CCTSMA). 31 1.4 – Formas Atuais e Vias de Regulamentação da Saúde do Trabalhador Um dos problemas da área competente para legislar os acidentes do trabalho é a inexistência de disciplina específica nos cursos para juizes, o que os forçaria a copiar modelos quando da aplicação da Lei. Além de influenciar negativamente na formação de um quadro de especialistas que viesse a contribuir na melhoria da legislação em vigor. Mesmo assim, pode-se dizer que, embora em pauta, a idéia de extinção da Justiça do Trabalho 18 não é mais tão fortemente considerada nos dias atuais já que a demanda é tamanha que torna sua existência imprescindível para a área. De qualquer forma, é através da legislação existente que se pode verificar as possibilidades de defesa e promoção da saúde do trabalhador. A legislação pode ser classificada de acordo com a área pertinente para sua aplicação. A seguir, as principais áreas diretamente relacionadas à saúde do trabalhador: 1.4.1 – Direito Trabalhista O movimento sindical da década de 1980 conseguiu que se estabelecesse a garantia de o trabalhador ter estabilidade durante um (1) ano ao retornar ao trabalho (após acidente de trabalho), o que permite o trabalhador ter a capacidade de se recuperar no trabalho. Havendo seqüelas em função de acidente de trabalho (Lei n.º 8.213/91), o critério vai variar de acordo com o número de funcionários na empresa. Assim, nas empresas com 100 ou mais empregados devem ter um percentual mínimo de deficientes reabilitados ou deficientes físicos habilitados (5%). Nos dias atuais, somente há ações para que empresas cumpram o estabelecido juridicamente, no estado de SP, MG e RS. 1.4.2 – Direito Previdenciário Em o acidentado utilizando a previdência, 4 alternativas estão prescritas: • acidentado fica em condições de retorno ao trabalho e o faz, tendo 1 ano de estabilidade; • havendo seqüelas, recebe auxílio acidente; • havendo seqüelas, fica afastado recebendo auxílio doença até estar novamente habilitado a trabalhar e; 18 A Justiça do Trabalho é a expressão do Estado getulista, que trouxe as questões trabalhistas na pauta das políticas governamentais. 32 • havendo seqüelas irreversíveis que incompatibilizem o trabalhador e o trabalho, recebe aposentadoria por invalidez. 1.4.3 – Direito Civil Trabalhista Esta parte da jurisdição é direcionada para aqueles casos em que há dolo ou culpa19 do empregador e que portanto o trabalhador tem o direito a ser indenizado pelo patrão. Os valores serão calculados a partir daqueles recebidos pela previdência e são cumulativos. Tal pena visa a compensar os danos materiais. No caso de danos morais, a jurisdição entende que desta forma estará compensando/minimizando a dor ao mesmo tempo que tal pena teria valor pedagógico para que não se repita o que levou ao acontecimento do acidente em questão. O raciocínio de tal jurisdição é fazer com que o segurador, no caso o INSS, indenize o segurado (trabalhador) e, comprovada culpa da empresa empregadora, esta venha a ressarcir o INSS. Essa jurisdição é a que se propõe a incentivar o desenvolvimento de um processo de cuidados com o ambiente de trabalho 20 . 1.4.4 – Normas Regulamentadoras (Secretaria de Segurança e Saúde no Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego - SSST/MTE)21 O capítulo 5 da Consolidação das Leis do Trabalho é regulamentado pela portaria n.º 3.214 de 1968, que estabelece as Normas Regulamentadoras. Nos dias atuais são o principal instrumento de balizamento do programa de saúde do trabalhador. Nos estabelecimentos industriais são elas que determinam as condições de saúde e trabalho aceitáveis. A seguir serão colocados alguns pontos considerados relevantes para posterior compreensão da assistência à saúde dos trabalhadores das empresas-casos estudadas. 1.4.4.a – NR 5 – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA) A função da CIPA é prevenir acidentes e doenças decorrentes do trabalho “de modo a tornar compatível permanentemente o trabalho com a preservação da vida e a 19 Pode ser assim classificada: grave, leve ou levíssima. Mesmo assim, o quadro atual ainda permite circunstâncias como a análise prévia das condições de saúde dos funcionários de uma empresa candidata a ser comprada por outra como forma de evitar risco de alto custo. Entretanto, o permitido é a análise das condições do ambiente de trabalho. Ocorrências do tipo foram verificadas em privatizações no estado de MG (OLIVEIRA, 1998). 20 33 promoção da saúde do trabalhador”. Devem ser constituídas pelos estabelecimentos que admitam trabalhadores como empregados, definidas de acordo com setores econômicos específicos. É composta por representantes do empregador e dos empregados, sendo que o número de titulares e suplentes é também definido pelo setor econômico. O mandato tem a duração de 1 ano, sendo permitida a reeleição. Neste período e até 1 ano após o final do mandato, os trabalhadores eleitos não podem ser demitidos ou dispensados arbitrariamente ou sem justa causa. São designadas diversas atribuições à CIPA, dentre elas a de “elaborar plano de trabalho que possibilite a ação preventiva na solução de problemas de segurança e saúde no trabalho”; “colaborar no desenvolvimento e implementação do PCMSO e PPRA e de outros programas relacionados à segurança e saúde dos trabalhadores”; “participar, em conjunto com o SESMT, onde houver, ou como empregador da análise das causas das doenças e acidentes de trabalho e propor medidas de solução dos problemas identificados”; “requisitar à empresa cópias das CAT emitidas”; “promover, anualmente, em conjunto com o SESMT, onde houver, a Semana Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho – SIPAT”; “promover, anualmente, em conjunto com a empresa, Campanhas de Prevenção da AIDS”. O treinamento para a CIPA deve contemplar, dentre outros itens, “noções sobre a AIDS, e medidas de prevenção”; “noções sobre as legislações trabalhista e previdenciária relativas à segurança e saúde no trabalho”. 1.4.4.b – NR 4 – Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT) Os estabelecimentos que possuam empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) devem manter os SESMT objetivando a promoção da saúde e proteção da integridade do trabalhador no local de trabalho. Dentre as atividades a serem realizadas, destacam-se a aplicação dos “conhecimentos de engenharia de segurança e medicina do ambiente de trabalho e a todos os seus componentes, inclusive máquinas equipamentos, de modo a reduzir até eliminar os riscos ali existentes à saúde do trabalhador”; “determinar, quando esgotados todos os meios de conhecidos para a eliminação do risco e este persistir, mesmo 21 A competência dos SESMTs está em processo transitório, havendo diferentes propostas do seu remodelamento. 34 reduzido, a utilização, pelo trabalhador, de Equipamentos de Proteção Individual- EPI (...)”; “manter permanente relacionamento com a CIPA, valendo-se ao máximo de suas observações, além de apoiá-la, treiná-la e atendê-la (...)”; “promover a realização de atividades de conscientização, educação e orientação dos trabalhadores para a prevenção de acidentes do trabalho e doenças ocupacionais, tanto através de campanhas quanto de campanhas de duração permanente”; “analisar e registrar em documento(s) específico(s) todos os acidentes ocorridos na empresa ou estabelecimento, com ou sem vítima, e todos os casos de doença ocupacional, os fatores ambientais, as características do agente e as condições do(s) indivíduo(s) portador(es) de doença ocupacional ou acidentado(s)”; registrar mensalmente os dados (...) devendo a empresa encaminhar um mapa contendo avaliação anual dos mesmo dados junto à SSMT/MTE (...)”. Além destas atividades, embora não sejam suas funções, os profissionais dos SESMT podem realizar outras atividades que a de prevenção, como o atendimento de emergência “quando tornar-se necessário”. Os SESMT também devem “manter entrosamento permanente com a CIPA, dela valendo-se como agente multiplicador, e deverão estudar suas observações e solicitações, propondo soluções corretivas e preventivas (...)”. O dimensionamento dos SESMT vai ser determinado pela graduação de risco, medido pela principal atividade exercida e pelo número de empregados. Apenas as empresas enquadradas no grau de risco 1 podem integrar as ações dos SESMT à outros serviços de medicina e engenharia optando então pelo “serviço único de engenharia e medicina” devendo, para tanto, submeter um programa bienal de segurança e medicina do trabalho à aprovação da SSMT/MTE. A SSMT é o órgão competente para analisar também os SESMT das empresas que possuem grau de risco 2, 3 ou 4. A equipe dos SESMT deve ser composta pelos seguintes recursos humanos: engenheiro de segurança do trabalho em nível de pós-graduação, médico do trabalho com residência na área de saúde do trabalhador e em nível de pós-graduação, e enfermeiro do trabalho com especialização em enfermagem do trabalho e em nível de pós-graduação. Esses três profissionais devem cumprir 3 ou 6 horas diárias (depende se é tempo parcial ou integral) para os SESMT. Além destes, também deve trabalhar na equipe auxiliar de enfermagem do trabalho com qualificação em enfermagem do trabalho reconhecida pelo Ministério da Educação (MEC), e técnico de segurança do 35 trabalho com registro reconhecido pelo MTE. Esses profissionais devem destinar 8 horas diárias para as atividades dos SESMT. O financiamento dos SESMT é de responsabilidade do empregador, tanto no que se refere à instalação como manutenção dos serviços. 1.4.4.c – NR 7 – Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional PCMSO Esta norma, de 1995, impõe a obrigatoriedade dos estabelecimentos estarem equipados com material e pessoal treinado para prestação de primeiros socorros, definidos de acordo com as atividades exercidas. Estabelece também a obrigatoriedade da implementação do PCMSO pelos empregadores e instituições que empreguem trabalhadores, objetivando a “promoção e preservação da saúde do conjunto dos seus trabalhadores” com caráter de “prevenção, rastreamento e diagnóstico precoce dos agravos à saúde (...) inclusive de natureza subclínica (...) doenças profissionais ou danos irreversíveis à saúde dos trabalhadores”. Todos os procedimentos do PCMSO devem ser financiados integralmente pelo empregador. Também deve haver um planejamento anual das ações de saúde e, nas empresas em que haja o coordenador do PCMSO, posterior relatório anual a ser apresentado e discutido na CIPA (contendo estatísticas de resultados considerados anormais, número e natureza dos exames discriminados por setor da empresa, e planejamento para o ano seguinte). O coordenador responsável pela execução do PCMSO na empresa vai ser um dos médicos do trabalho que compõem a equipe do SESMT (no caso de a empresa não ser obrigada a ter médico do trabalho, deve se contratar um para tanto. Não havendo médico do trabalho na localidade, pode ser contratado de outra especialidade22 ). O médico coordenador é responsável pela realização (avaliação clínica com anamnese ocupacional e exame físico e mental, e exames complementares) do exame médico admissional (antes de o trabalhador assumir suas atividades); exame periódico (definido de acordo com exposição ao risco23 ); de retorno ao trabalho (no primeiro dia de retorno ao trabalho); de mudança de função do trabalhador (deve ser realizado antes 22 A obrigatoriedade de ter médico do trabalho na empresa é definida pela NR4. Para trabalhadores expostos a riscos ou situações de trabalho que tenham relação com doença ocupacional e para trabalhadores portadores de doenças crônica, os exames devem ser repetidos no intervalo mínimo de 1 ano. Para os demais trabalhadores, devem ser realizados anualmente (menores de 18 e maiores de 45 anos) ou a cada 2 anos (entre 18 e 45 anos). 23 36 de mudança se esta implicar em diferença de exposição ao risco) e do exame demissional (a ser realizado até a data da homologação). A periodicidade de realização e interpretação dos indicadores biológicos dos exames complementares vão ser definidos de acordo com o grau de risco em que a empresa se classifica, por exemplo, o exame demissional tem de ser realizado no trabalhador exposto a alto grau de risco mesmo que tenha sido realizado exame periódico, enquanto que pode ser dispensado para trabalhadores expostos a menores graus de riscos e que tenha realizado o exame periódico em determinado prazo, que também varia com o riscos e é 90 ou 135 dias. Para cada exame realizado devem ser emitidas 2 vias de Atestado de Saúde Ocupacional (ASO), uma para o trabalhador e outra para ficar no local de trabalho, contendo, dentre outros dados, nome, RG, função e riscos ocupacionais existentes na atividade do trabalhador, procedimentos médicos realizados e nome e CRM do coordenador do PCMSO, quando houver. Sempre que seja constatada ocorrência ou agravamento de doenças profissionais (de acordo com os exames anteriormente descritos), ou verificadas alterações dos exames que indiquem disfunção de órgão ou sistema biológico, o médico-coordenador deve solicitar à empresa a emissão do Comunicado de Acidente do Trabalho (CAT), para, posteriormente, definir-se se será realizada a utilização dos serviços da Previdência. Nesses casos, se necessário também deve ser indicado o afastamento do trabalhador da exposição ao risco, encaminhado à Previdência Social para “avaliação de incapacidade e definição de conduta previdenciária em relação ao trabalho”, e “orientar o empregador quanto à necessidade de adoção de medidas de controle no ambiente de trabalho”. Assim, o CAT registrará os dados que poderão servir de referência na aplicação da legislação. 1.4.4.d – NR 9 – Programa de Prevenção de Riscos Ambientais – PPRA Outra norma regulamentadora que articula as questões relacionadas à saúde do trabalhador é a NR 9. Esta norma propõe o reconhecimento, avaliação e controle da ocorrência de riscos ambientais existentes ou que venham a existir no ambiente de trabalho de forma antecipada. 37 A questão novamente aqui colocada é que, para ser efetivada a intenção teórica, seria necessária a interferência no processo de trabalho das empresas. Como grande parte das definições dos limites de tolerância de classificação dos riscos datam de 1978, pode-se dizer que qualquer mudança ainda é incipiente. 1.5 – O Debate em torno da Regulação da Saúde do Trabalhador: Sistema de Informações, Financiamento e Instituições – Sobreposição ou Integração? 1.5.1 – Ângulo da oferta dos procedimentos referentes à atenção à saúde do trabalhador no interior do local de trabalho Como já foi dito anteriormente, formas de regulamentação da saúde do trabalhador e do ambiente de trabalho, bem como equipamentos utilizados e de proteção, dizem respeito ao processo de trabalho. Da mesma forma, como pode ser observado no item anterior, as Normas Regulamentadoras têm como objeto serviços, recursos humanos e indicadores de medição da segurança, saúde e condições de trabalho que, pela sua própria natureza, estão, ou ao menos deveriam estar, interligados. Os Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT) têm como objeto os riscos à que o trabalhador está exposto, devendo a equipe se integrar com a CIPA. O PPRA, por sua vez, opera mais diretamente com a prevenção dos acidentes de trabalho. O PCMSO que trata diretamente com as questões da saúde ocupacional, deve discutir os relatórios do planejamentos anuais com os integrantes da CIPA, deve fazer integrar o trabalho de seus membros com os do SESMT, inclusive o responsável pela sua execução deve ser um dos médicos do trabalho da equipe do SESMT. Já a CIPA, que é formada por representantes do empregador e dos empregados, deve participar na implementação do PCMSO, do PPRA e na atuação do SESMT. Ou seja, é um dos principais instrumentos de participação e controle dos trabalhadores quanto ao processo de trabalho. Quanto às questões relacionadas à FUNDACENTRO, a emissão de CAT, não sendo realizada por serviços do setor público, como os Centros de Referência de Saúde do Trabalhador, deve ser pelo médico coordenador do PCMSO, que também deve indicar afastamento do trabalhador da exposição ao risco considerado necessário. Esse trabalhador vai ser encaminhado à Previdência Social que avaliará sua incapacidade, orientará o empregador e intermediará a remuneração do trabalhador. 38 Também o CAT pode ser importante fonte de informação tanto para que possa ser aplicada a legislação como para prevenção ao acidente. Entretanto, supõe-se, dentre os profissionais ligados ao tema, que não sejam emitidos todos os CATs respectivos aos acidentes ocorridos (OLIVEIRA et allii, 1997). A subnotificação das doenças profissionais, assim como dos CATs leva a conseqüências como erros provocados no já frágil sistema de informações e das vigilâncias epidemiológica e sanitária do trabalhador. É estabelecido pelas Normas Regulamentadoras que, tanto a instalação como a manutenção dos SESMT são de responsabilidade do empregador, por ele devendo ser integralmente financiados. O mesmo vale para os procedimentos do PCMSO. Como grande parte das empresas proporcionam assistência à saúde aos seus funcionários através de contratos com empresas de plano/seguro de saúde, é pertinente fazer um adendo nesta questão: grande parte dos serviços do PCMSO e do SESMT são freqüentemente realizados por intermédio da própria empresa contratada, incluindo-se os exames admissionais e demissionais. Em grande parte das empresas empregadoras – em especial nas de médio e grande porte – os serviços acima citados são realizados por um setor chamado de “Serviço Médico”, localizado no interior das empresas. O coordenador desse serviço tanto pode ser diretamente contratado pela empresa empregadora, como pode ser contratado pela empresa administradora do plano/seguro saúde que a empresa empregadora proporciona para seus funcionários. Dessa maneira, serviços prescritos na regulamentação da saúde do trabalhador podem ser realizados por um profissional contratado pela própria empresa empregadora, como também o podem pela empresa de plano/seguro de saúde contratada. Além destas formas, as empresas empregadoras ainda podem contar com o apoio do sistema “S” que oferece desde a implantação, coordenação e até elaboração de relatórios do PCMSO, do PPRA, além de treinamentos e cursos que abrangem a legislação, higiene industrial, toxicologia ocupacional, diagnósticos, etc. Vale lembrar, conforme assinalado, que o apoio ofertado pelo sistema “S” vai variar de acordo com o estado/região do país. A emissão de CAT também é realizada neste mesmo contexto de sobreposição de responsabilidades e de fontes financiadoras, sendo que muitas vezes a empresa empregadora induz o acidentado a ser atendido apenas pelo médico coordenador do serviço médico da empresa. 39 Assim, embora a responsabilidade da administração e financiamento dos serviços permaneça sendo do empregador, como este pode deduzir os gastos com assistência à saúde do imposto devido, o gasto com aqueles serviços prescritos nas normas muitas vezes tornam-se gastos sociais por deixarem de se juntar ao montante de recursos recebidos pela Receita Federal em função do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica: o governo passou a permitir, a partir de 1982, que as empresas declarassem como despesas operacionais os gastos que têm com planos de saúde de seus empregados no IRPJ, repassando-os, dessa forma, aos preços dos produtos24 . Há casos em que a empresa empregadora desconta, do salário do empregado, parte do valor referente ao plano de saúde. Ademais, muitas empresas também classificam como custos operacionais não somente os gastos com assistência à saúde com seus trabalhadores, como os valores descontados dos salários dos próprios empregados. É fundamental notar que, ao classificar as despesas realizadas com planos de saúde aos empregados como custo operacional, o montante de despesas a serem declaradas aumenta, diminuindo portanto a quantidade de imposto a pagar. Ora, se o peso do gasto social é determinante para o atual modelo de assistência à saúde ao trabalhador, é a sociedade que deve determinar que saúde do trabalhador quer, inclusive se esta se destinará somente ao trabalhador formalmente empregado ou se as políticas devem também abranger os segmentos do trabalhador rural e informal, o que só é possível através de uma política de saúde do trabalhador, definida pelas e integrada nas instituições competentes. Para organizar os problemas, pode-se dizer que são fundamentalmente dois: (i) quem é o trabalhador abrangido pela regulamentação e (ii) o caráter dessa regulamentação, se dá conta da demanda de nexo entre saúde e processo de trabalho ou não. 1.5.2 – Ângulo dos trabalhadores Do ponto de vista do movimento sindical, é comum a reivindicação de uma legislação mais atuante, defensora e incentivadora do trabalhador consciente. Para dar conta de seus problemas, os trabalhadores necessitam uma organização mais ágil. Freqüentemente, integrantes da CUT contestam a legislação sindical corporativa e dependente da Justiça do Trabalho e do Imposto Sindical cuja arrecadação se dá pela contribuição compulsória. 24 Até 1980 as empresas podiam abater até o limite de 7% do gasto com saúde com seus funcionários, sobre os rendimentos da empresa, no IRPJ (MÉDICI, 1992). 40 Assim, sendo as questões trabalhistas resolvidas pela Justiça do Trabalho e estando garantida a sobrevivência dos sindicatos, a negociação coletiva, que seria uma forma de trabalhar a questão da saúde do trabalhador terminaria sendo prejudicado por falta de incentivo. Esse contexto levaria à conformação de um modelo onde as relações de trabalho são definidas com pouca interferência dos trabalhadores (TODESHINI, 1999). Para ALMEIDA, essa situação é possível pela própria conformação do setor industrial, onde as políticas de recursos humanos repressoras das empresas, aliadas ao modelo de funcionamento dos sindicatos fora do âmbito das empresas, desestimulariam o surgimento e, mais ainda, o desenvolvimento de estruturas dos trabalhadores mais determinantes no processo de trabalho (ALMEIDA, 1980). De acordo com este raciocínio, os direitos e benefícios dos trabalhadores já conquistados estariam em jogo, ao mesmo tempo que a flexibilização do trabalho e o aumento do emprego informal estão cada vez mais presentes na estrutura da sociedade brasileira através da política de emprego em vigor. Neste sentido, o fortalecimento das CIPAs e sua transformação em Comissão de Fábrica, ou seja, em Comissão de Condições de Trabalho, Saúde e Meio Ambiente (CCTSMA) é entendido por membros da CUT como fundamental para a integração das questões relativas às necessidades do trabalhador (CUT, 1999; TODESHINI, 1999). Coerentemente, a CUT propõe a inclusão dos trabalhadores terceirizados na formação das CIPAs/CCTSMAs. Essa proposta inclui que as CCTSMAs sejam autônomas e que a eleição de seus membros ocorra, diferentemente das demais comissões, independentemente do número de trabalhadores efetivos ou mesmo do grau de risco em que a empresa esteja classificada, objetivando que as discussões possam alcançar o âmbito do “processo produtivo desenvolvido no interior da empresa” (CUT, 1999). Os objetivos da CUT são complexos e podem ser questionados quanto à sua funcionalidade já que a junção de todas as questões trabalhistas numa única organização no interior da empresa não garante um controle mais efetivo dessas questões. Ao contrário, permite supor que tal organização provavelmente teria dificuldades em diferenciar os problemas de assistência à saúde dos de segurança, meio ambiente, etc., quando da implementação de ações voltadas à eles, estando mais suscetível ao calor das reivindicações momentâneas. Por esta ser uma questão ainda muito embrionária e 41 praticamente sem precedentes – não há registro oficial de experiência de junção das organizações trabalhistas, no âmbito da empresa, em uma só – assinala-se aqui que, embora as equipes tenham que trabalhar integradas, cada assunto deve ter tratamento direcionado e específico, isto é, a integração deve estar, antes de tudo, na compreensão dos problemas do que no problema em si. 1.5.3 – Como se dão as articulações? A compreensão da regulação desse setor só é possível quando se observa quais as interfaces estabelecidas entre as diferentes instituições e atores envolvidos na saúde do trabalhador. Até o momento foram colocadas as questões da não integração dos serviços realizados no interior do local de trabalho prescritos nas normas regulamentadoras, o problema da falta de instrumentos que garantam a qualidade e efetividade do resultado destes serviços. Também foi discutida a dificuldade estrutural dos trabalhadores e das suas organizações para interferir no processo de trabalho de modo que se tornam praticamente impossíveis modificações efetivas no modelo de política de assistência à saúde ao trabalhador. Além destas, há uma questão fundamental, anteriormente apontada, que é sobre quais as articulações institucionais realizadas de fato, e quais ficam “no papel” de modo a impedir que seja colocada em prática uma proposta integrada de saúde do trabalhador. A seguir serão resgatadas as principais tentativas e dificuldades de articulação entre as diversas instituições envolvidas. No sentido de responder às demandas da I Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador (1986), foi realizada uma tentativa governamental de formação de grupo específico para tratar das questões afins. Foi a Comissão Interministerial de Saúde do Trabalhador (CIST), instituída em 1993 e composta pelo Ministério do Trabalho, da Saúde, da Previdência Social e pela Secretaria da Administração Federal (SAF). Apesar do objetivo do trabalho da comissão ter sido justamente a redefinição dos papéis e ações dos órgãos governamentais, e as competências específicas e comuns de cada ministério no sentido de estabelecer critérios conjuntos de diagnóstico, tratamento, concessão de benefícios e prevenção dos acidentes e doenças relacionados ao trabalho, no relatório observou-se que em pouco ou quase nada se avançou de fato (BRASIL, 1993). 42 O próprio plano de custeio das ações teve que ser realizado por cada um dos ministérios participantes devido à falta de condições do grupo em trabalhar de forma integrada no que tange ao financiamento. Afora esse, os demais temas discutidos foram classificados em Prevenção em Saúde do Trabalhador, Assistência Previdenciária, Assistência à Saúde e Informação em Saúde do Trabalhador. Nas discussões verificou-se o por todos já sabido, como a fragilidade do sistema de emissão de CAT, a necessidade de integrar serviços de vigilância e fiscalização dos ambientes de trabalho no sentido de gerar ações preventivas e diagnóstico e controle dos riscos. Não há registro de intenção de redefinição dos critérios de classificação dos riscos. O grupo que debateu a Prevenção em Saúde do Trabalhador constatou que esta deve começar já na concepção do maquinário e equipamentos que serão utilizados pelo trabalhador, no controle da formulação dos produtos utilizados como matéria-prima e na concepção das instalações onde será realizado o trabalho. Uma das questões fundamentais na discussão da relação entre as instituições competentes colocada por este grupo é a função das ações regressivas do MPAS contra empresas que onerem excessivamente o seguro social como compensação aos gastos realizados com trabalhadores lesados, propondo-se a revisão da forma de taxação do seguro de acidentes de trabalho de maneira a estimular ações preventivas por parte das empresas empregadoras. Também é comentado o papel que a atividade sindical pode ter, através das negociações coletivas e da CIPA. A discussão sobre Assistência Previdenciária infelizmente não foi além de questões relacionadas às pecuniárias e de informação, como agilização do fluxo do CAT, manutenção de benefícios. Uma outra questão que não se pode deixar de assinalar é a falta de solução para com os trabalhadores do mercado informal. Admitiu-se que embora tais ações não tenham ação direta sobre os trabalhadores informais, que para estes estariam disponíveis os serviços do SUS, então em fase de implementação, já que garantia universalidade. A Comissão estabeleceu quais seriam os papéis e responsabilidades de cada instituição envolvida. Ao Ministério do Trabalho ficariam as Relações do Trabalho, Política salarial, Formação e Desenvolvimento Profissional e Fiscalização do Trabalho – esta última a ser realizada em conjunto com o Ministério da Saúde. 43 Ao Ministério da Saúde compete a Vigilância Epidemiológica e Sanitária (juntamente com o Ministério do Trabalho), Assistência à Saúde, Reabilitação Física (em conjunto com Ministério da Previdência). Ao Ministério da Previdência e Assistência Social se destina a Perícia médica, Ações Regressivas, Concessão de Benefícios, Recolhimento do Seguro Social e Reabilitação Profissional, emissão de CAT e Laudo de Exame Médico (LEM) juntamente com Ministério da Saúde. A ação conjunta dos três ministérios deve ser Coordenação, Sistema de Informações, Estudos e Pesquisas, Planos de Custeio e Centros Integrados de Referência à Saúde do Trabalhador. Outro encontro determinante nesta área foi a II Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador, realizada em 1994. Mas mesmo assim a presença dos participantes foi muito aquém das expectativas, seja na representação dos trabalhadores como da parte empregadora e do governo. A partir da análise das proposições para políticas sociais realizadas neste evento (BRASIL, 1994), foram destacadas aquelas consideradas de maior relevância: (a) Financiamento da Saúde do Trabalhador. Dentre os apontamentos, ressalta-se a proposição da não permissão, nos acordos coletivos, de realização de convênios médico-hospitalares com os prestadores de serviços privados de saúde e que o empresariado invista os recursos que seriam destinados ao convênio médicohospitalar nos fundos municipais, estaduais e nacional de saúde (BRASIL, 1994). Também é proposto que verbas públicas sejam utilizadas somente em ações públicas de saúde, priorizando-se os procedimentos preventivos de educação e vigilância à saúde, já que uma das conseqüências seria justamente melhorias na saúde do trabalhador em geral. (b) Legislação referente à Saúde do Trabalhador. Ressalta-se a importância do diálogo entre a área da saúde do trabalhador e as diretrizes do SUS, de forma a esclarecer e compatibilizar as responsabilidades. Em relação aos órgãos diretamente relacionados à saúde do trabalhador na empresa, reafirma-se a proposta de transformação gradual das CIPAs em Comissões de Saúde com poder de intervenção no ambiente do trabalho quando este apresentar risco; bem como mudanças na normas regulamentadoras (NRs) de modo a incorporar as decisões dos acordos coletivos firmados entre empregados e empregadores no que diz respeito à 44 atuação da CIPA (eleição direta dos membros, liberação dos cipeiros para as atividades da CIPA sem perdas salariais e estabilidade igual à do dirigente sindical para os cipeiros (BRASIL, 1994:32). Mudanças na NR4 de forma a permitir maior atuação do SESMT junto à CIPA (aprovação do plano de trabalho de prevenção e promoção da saúde, daquele por esta). Não menos importante é proposta de inclusão do enfermeiro em todos os SESMT (não apenas nas empresas com 3 mil ou mais funcionários) para que possa orientar os auxiliares de enfermagem (BRASIL, 1994:33). (c) Desenvolvimento, Meio Ambiente, Saúde e Trabalho. Propõe-se o financiamento de pesquisas que tragam subsídio para rever os critérios de definição do risco que envolve o trabalhador e aqueles “valores aceitos como normais em exames de saúde” de acordo com o meio em que este vive e trabalha, ou seja, abrangendo também as condições bio-psico-sócio-culturais (BRASIL, 1994:37). (d) Gerais. Dentre as proposições, está a criação de comitês de implementação de emprego formal com garantia de assinatura da carteira de trabalho, que a alocação dos recursos do FAT seja feita com controle dos trabalhadores, que “o FAT deve financiar a criação de novos empregos e não as empresas para a introdução de novas tecnologias que eliminam postos de trabalho”, enfim uma política voltada ao emprego formal. Também é defendida a não privatização da Previdência através da rejeição, por parte do trabalhador, dos “fundos de pensões e benefícios muito parecidos com os fundos de planos privados de saúde, viabilizados pelas empresas médicas que ganham milhões com a doença do trabalhador” (BRASIL, 1994:43). Pode-se observar que, apesar das propostas apresentadas serem elaboradas num nível preliminar, ou seja, com insuficiente esforço de problematização das questões das saúde do trabalhador, está mais que claro a urgência do estabelecimento de formas interdisciplinares de operar para que a saúde do trabalhador possa ser entendida como uma questão, embora com interfaces, única, como deve ser. Seja nas questões relativas ao financiamento, legislação, na instituição que for. Atualmente está em vigor a Comissão Intersetorial de Saúde do Trabalhador do Conselho Nacional de Saúde, cujo trabalho será discutido em outro momento. Recentemente foi realizado o I Seminário de Saúde do Trabalhador (ENSP, 1999) com profissionais especialistas e técnicos da área onde pouco ou quase nada se aprofundou em relação à constatação da forma fragmentada como as instituições 45 governamentais envolvidas concebem e implantam as ações relativas à saúde do trabalhador, o que mostra a dificuldade desse vértice em interferir no modelo de assistência à saúde ao trabalhador. Deve ser acrescentada, ainda, a existência de um outro problema na área da saúde do trabalhador que é a questão relevância da inexistência de um sistema de informações de vigilância epidemiológica que integre a assistência médico-sanitáriahospitalar pública com a privada. De acordo com CORRÊA FILHO, as informações epidemiológicas dos acidentes, doenças e atenção médica aos trabalhadores já não seria abertos ao ponto de permitir uma análise substantiva, sem contar que as base de dados existentes não estão interligadas pelas instituições que provém os serviços (CORRÊA FILHO, 1997). Este autor delineia um quadro ainda mais grave ao acrescentar que os “órgãos de vigilância à saúde não dispõem de informações epidemiológicas validadas para trabalhadores brasileiros sobre os níveis aceitáveis de riscos e exposição a agentes agressivos com base em Limites de Tolerância Biológica estudados em condições reais de nutrição, esforço físico e suscetibilidade individual que permitam o acompanhamento de higienistas industriais e profissionais de saúde” (CORRÊA FILHO, 1997:2). À respeito da fragmentação das responsabilidades Neste campo da assistência à saúde do trabalhador, as competências conjuntas e específicas dos ministérios definidas pela Comissão Interministerial de Saúde do Trabalhador em 1993 até os dias atuais são citadas como inovadoras pelos representantes da Previdência Social (SCHUBERT, 1999). No momento presente, os obstáculos, tão bem como os avanços, ainda são basicamente os mesmos. O atual modelo não transferiu a responsabilidade da reabilitação para o SUS, mantendo-a no âmbito da Previdência. Quanto à fiscalização, ao invés de ser vinculada às ações de vigilância sanitária (que são do SUS), é atribuição do Ministério do Trabalho e do Emprego. Ao mesmo tempo, a forma de notificação dos acidentes e doenças do trabalho impede que sejam abertas brechas na lógica do INSS de utilização das informações para o pagamento de benefícios ao invés de análise com vistas à vigilância epidemiológica. Questão não menos grave é a que Oliveira assinala, de proporções maiores do que as até então comentadas, como o fato de a responsabilidade pela assistência médicohospitalar ao trabalhador acidentado/adoentado ser do SUS perpetuar o modelo de 46 atenção à saúde do trabalhador calcado nos convênios com prestadores privados (OLIVEIRA et allii, 1992). Situação reforçada por vários fatos. Um deles é o já bastante comentado sobre, na prática, a prevenção não ser exercida em conjunto entre o Ministério do Trabalho e Emprego e o da Saúde. O outro é a questão da utilização dos serviços do SUS pela clientela dos convênios médico-hospitalares para aqueles procedimentos de alto custo e alta complexidade, historicamente relegados ao setor público, que mais uma vez se onera em pró, tanto do empresariado empregador como do empresariado do setor de planos e seguros de saúde que se vêem livres dos maiores gastos com a saúde dos trabalhadores (TEIXEIRA et allii, 1984). 1.6 – Considerações Do exposto acima pode-se notar que, num país em que grande parcela do mercado de trabalho é pouco estruturada, com um sistema de relações de trabalho frágil, e com os benefícios e a assistência da seguridade social em grande parte vinculada ao mercado de trabalho, torna-se fundamental a elaboração de políticas públicas que dêem conta de necessidades dos trabalhadores como a assistência à saúde, aqui discutida. A seguir, estão selecionadas as questões consideradas de maior relevância para a formulação de apontamentos a serem desenvolvidos juntamente com a próxima fase da pesquisa (pesquisa de campo). Dentro do discutido, pode-se dizer que é fato que aparatos como o sistema “S” não atingem os trabalhadores do mercado informal e tampouco são suficientes para contribuir na melhora do quadro da assistência à saúde dos trabalhadores formalmente empregados. Os Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT), os Programas de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), os Programas de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), organizações como a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), todo o setor de serviços médicos no interior das empresas, e os convênios médico-hospitalares firmados com as empresas de planos/seguros de saúde, têm suas ações e financiamento sobrepostos de forma particular a cada empresa empregadora, com resultados dependentes da política local de recursos humanos de cada empregador, sem a existência de mecanismos que estimulem um planejamento integrado. 47 Deve ser assinalado, ainda, o problema causado pelo exame pré-admissional, realizado nos trabalhadores previamente ao contrato empregatício. Quem realiza tais exames? Falta conhecimento empírico para saber quem realmente o realiza, ou seja, se é o médico coordenador do setor médico da empresa ou se é a empresa de plano/seguro saúde. De qualquer forma, é realizado por profissionais que em algum momento respondem ao empregador e que têm dados de absoluto interesse para quem administrará a saúde do trabalhador empregado. Não é surpresa o fato de esses exames dizerem, ao menos em partes, o quanto se gastará com a saúde do futuro empregado e o quanto este responderá em produtividade. Por outro lado, representam a segurança do trabalhador ao registrar sua situação de saúde nos diversos momentos em que são realizados os exames (admissional, periódicos e demissional), resguardando-o, portanto. Como se pode notar, desde a década de 70, é de interesse dos convênios médicohospitalares a seleção acurada do trabalhador a ser empregado com vistas a redução de futuros custos (TEIXEIRA et allii, 1984). Assim, mantendo-se o modelo do processo de produção no Brasil, pode-se dizer que ainda hoje é a política de recursos humanos que determina “seus interesses” aos profissionais médicos nos exames pré-admissionais e no tempo limite de afastamento do trabalhador adoentado/acidentado (quais as chances do trabalhador que apresenta recuperação lenta ou improvável?). Quanto à emissão dos Comunicados de Acidente do Trabalho (CAT), ainda é inexistente qualquer vislumbre de um sistema de informações que possibilite efetiva análise dos dados, quanto menos posterior utilização das informações nas ações epidemiológicas e sanitárias. Ao mesmo tempo, os avanços obtidos em relação à este frágil sistema de informações permitem uma análise e a realização de projeções e estimativas da situação de saúde dos trabalhadores. Os sistemas localizados que existem no interior das instituições envolvidas também não estão interligados. Pergunta-se, então, como se ter um conhecimento do processo de trabalho? Seria possível alguma interferência no grave quadro de morbi-mortalidade dos trabalhadores brasileiros? A reprivatização do seguro do acidente do trabalho, proposta atualmente em discussão entre governo, empresariado e trabalhadores, não seria o bastante para que aquelas características determinantes do modelo de saúde do trabalhador, que são socialmente indesejáveis, sejam revistas25 . Como o seguro do acidente do trabalho é 25 Além da gravidade de tornar a ser privatizado o seguro do acidente do trabalho, as proposições atualmente em pauta chegam sugerem a criação de uma Agência Reguladora que regule um mercado de seguro do acidente do trabalho, composto pelas empresas empregadoras, pelos trabalhadores, e por empresas seguradoras que 48 vinculado ao emprego formal, é pertinente supor que os integrantes da economia informal continuariam, neste sentido, desamparados, com ou sem a privatização do acidente do trabalho, isto é, não é atingido o cerne do problema. Daí pode-se imaginar o que dizer dos trabalhadores rurais. Também não ficaria garantida mudança alguma na lógica estabelecida, correndo-se o risco de perpetuar um modelo incapaz de questionar e interferir no processo, mantendo-se o mesmo ambiente de trabalho, regido pela lógica da insalubridade e periculosidade conseqüente de sua legitimação através das penalidades adicionais definidas no grau de risco da produção como já foi discutido. Tudo isso perpetua o ciclo vicioso estabelecido pela não promoção da saúde do trabalhador, onde principais agentes determinantes, além dos diretores de recursos humanos que respondem aos interesses do empresariado empregador, são as empresas de planos/seguros de saúde. Também é o Estado. Entretanto, este não tem correlação de forças suficientemente estabelecidas para impor políticas sociais que definam um modelo de saúde mais atraente aos interesses da população brasileira como um todo. Assim, fica reforçada a lógica de pagamento de benefícios do INSS, juntamente ao financiamento do setor supletivo de saúde através da cobertura dos serviços de alto custo e do abatimento do IRPJ devido pelas empresas ao Tesouro Nacional da totalidade dos gastos destas empresas empregadoras com plano/seguro saúde. Esclarecendo, através do financiamento social desse sistema, o Estado termina por patrocinar dois modelos com lógicas divergentes, o de saúde do trabalhador e o do SUS, sendo que este último também é fundamental para a sobrevivência do primeiro, ambos estimulando a utilização de serviços do setor supletivo. Aliado a esta triste situação, também está o baixo “poder de fogo” dos profissionais, especialistas, técnicos e representantes dos próprios trabalhadores perante este modelo, bastando ver os resultados da Comissão Interministerial de Saúde do Trabalhador (CIST/1993), da II Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador (CNST/1994) e do I Seminário de Saúde do Trabalhador (ENSP, 1999), conforme comentado, para confirmar esta asserção. Estes grupos, entretanto, representam os administrariam o seguro. Há propostas, inclusive, de que a assistência integral à saúde do trabalhador também seja prestada por estas seguradoras, o que provocaria uma mudança na estrutura do sistema, pela redefinição dos de benefícios e, acima de tudo, da diferenciação da atenção à saúde entre os brasileiros que possuem vínculo empregatício e os que não o possuem (há diferentes versões de Projeto de Lei para a criação desta agência reguladora, em todas as versões ela ficaria no âmbito do Ministério do Trabalho e do Emprego, MTE, ou no do Ministério da Previdência e Assistência Social, MPAS). 49 esforços e avanços, mesmo que lentos, no sentido do desenvolvimento das contribuições para as necessidades relativas à reformulação e aprimoramento do modelo de políticas de assistência à saúde do trabalhador. Pode-se afirmar, contudo, que a situação dos trabalhadores empregados é questionável já que não está livre das mazelas do sistema de saúde brasileiro como um todo. A regulamentação do setor supletivo de saúde que vem sendo realizada desde 1998 também está muito aquém de qualquer interferência na estrutura desse modelo. Frente à essa situação, o que se pode fazer? Além do melhor conhecimento da situação de fato das responsabilidades, financiamento, administração e provimento da saúde dos trabalhadores por parte do governo, também é necessário que se criem condições de maior participação tanto de profissionais e especialistas da área como dos próprios trabalhadores na elaboração das políticas que lhes dizem respeito. Enfim, não se pode deixar de reafirmar que há dois paradoxos ainda insolúveis. Um, a idealização de que os trabalhadores sejam uma elite do país por, além de estarem empregados terem, na maior parte, plano privado de assistência à saúde, suposição colocada em xeque pela real impossibilidade de fazer tal afirmação por qualquer um que se aproxime da realidade do dia-a-dia dos trabalhadores: a de um mundo do trabalho onde a insalubridade e periculosidade, aliados aos exames pré-admissionais / periódicos e ao tempo limite de afastamento para adoecidos/acidentados, em que seu estado de saúde vai ser constantemente questionado, e isto, para menos da metade do trabalhadores, que são aqueles que se encontram no mercado formal e que, ainda assim, se encontram em melhores situações que os que estão no mercado informal. Outro paradoxo, também bastante discutido aqui é o modelo de saúde do SUS “bancar” o modelo de saúde dos trabalhadores. Uma das principais suposições colocadas assim, é devido às alianças do empresariado que estariam de tal forma alicerçadas que não abririam brechas para a atuação de comissões articuladas entre todas aquelas instituições envolvidas, acima comentadas. Ou seja, não basta existir uma instância que trate diretamente da saúde dos trabalhadores, nem que esta instância tivesse como função clarear as interfaces. O que é preciso? Antes de mais nada, uma proposta que integre tanto as instituições envolvidas, bem como os trabalhadores formais e informais, além de vontade política para iniciar qualquer processo de mudança, que dê sustentação e estímulo à outro modelo de políticas de assistência à saúde ao trabalhador. Quer dizer, 50 sem isso somente as instâncias colegiadas e integradas, é ainda insuficiente. A vontade política deve ser não aquela brotada da atual hegemonia no poder do Estado, mas a resultante de esforço de articulação entre Estado e sociedade organizada. 1.7 – Pressuposto, Objetivos Gerais e Específicos do Trabalho De acordo com o acima exposto, é pertinente afirmar que os objetivos do SUS como sistema de saúde brasileiro não estão sendo alcançados na sua totalidade por, dentre outros motivos, suas imbricações com outras formas de provimento e consumo de serviços de saúde como as do setor supletivo de saúde, que geram sobreposição e interdependência nas relações entre esses setores. Em vista desse pressuposto, o presente trabalho propõe buscar uma maior compreensão do setor supletivo de saúde e de suas relações com o setor público – com a análise dos interesses e das instituições envolvidos nas negociações entre trabalhadores, entidades sindicais e empregadores quanto à assistência à saúde proporcionada aos empregados, seus dependentes e agregados. Uma pergunta permeia essa discussão: o que fazer com dois sistemas de saúde que são divergentes na resolubilidade de suas ações, ou seja, que políticas deveriam nortear as instâncias envolvidas para que as ações de saúde sejam complementares e não sugadoras uma da outra? Para avançar nas questões levantadas, este trabalho busca saber como tais ações ocorrem no interior da empresa empregadora. Assim, foram selecionados alguns pontos de investigação que contribuirão para se aproximar do objetivo geral da pesquisa: • dimensionamento da cobertura da assistência à saúde provida por empresas para seus trabalhadores; • A verificação da dimensão das relações estabelecidas entre empregado, empregador e entidades sindicais quanto ao contrato de trabalho e; • estudo de ambas as relações face às estabelecidas entre empregador, operadora de planos seguros de saúde e rede credenciada quanto aos aspectos de cobertura, utilização dos serviços de saúde, financiamento e a estrutura e mudanças dos convênios médico-hospitalares já contratados pela empresa. 51 CAPÍTULO II: M ETODOLOGIA DA PESQUISA E TRABALHO DE CAMPO – ANÁLISE DOS RESULTADOS 2.1 – Metodologia Em função da escassez de informações acerca do objeto do presente trabalho, optou-se por pesquisa de caráter exploratório. Inicialmente é realizada uma pesquisa bibliográfica que, depois de analisada, contribui para um melhor entendimento do tema e responde parte das dúvidas iniciais – apresentadas no primeiro capítulo – e leva a novas indagações que são investigadas no trabalho de campo. Para definir o recorte geográfico do campo de pesquisa, escolheu-se a região do ABC paulista por vários motivos. Dentre eles, destaca-se o fato de ser esta uma região com alta concentração industrial, onde está reunida significativa parte da população beneficiária de plano/seguro de saúde, ou convênio médico-hospitalar, como costuma ser chamado pelos trabalhadores, dirigentes dos setores de recursos humanos das empresas e representantes do movimento sindical. É nessa região onde começaram as primeiras formas de convênio médicohospitalar, na segunda metade da década de 1950. Um dos dirigentes entrevistados contou que o convênio foi realizado pela empresa para poder atender seus empregados e familiares que moravam na região do ABC, uma vez que não havia ampla rede de serviços na época. O parque fabril do ABC é composto principalmente por empresas metalúrgicas, químicas e petroquímicas. É um local onde a alta demanda por serviços de saúde específicos para trabalhadores empregados e familiares, aliada ao interesse e poder de compra desses serviços pelas empresas empregadoras, propiciou o desenvolvimento do mercado de saúde supletiva. A necessidade de oferecer atendimento médico-hospitalar aos trabalhadores naquela região, isto é, fora da capital São Paulo, provavelmente se constituiu num dos atrativos que estimulou o estabelecimento de serviços de saúde que pudessem responder às demandas das empresas empregadoras. A partir de contato realizado com técnicos pesquisadores do DIEESE ligados a temas como assistência a saúde e benefícios sociais de trabalhadores da indústria, foi indicado o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Químicas, Petroquímicas, Farmacêuticas, Tintas e Vernizes, Plásticos, Resinas Sintéticas, Explosivos e Similares do ABC, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra – Sindiquim –, considerado 52 representativo dada sua história fortemente marcada pela atuação em questões da saúde, devido às necessidades específicas da categoria. O Sindiquim foi criado por trabalhadores da Rhodia Brasil Ltda., empresa do setor químico, em 1938. Este sindicato introduziu formas de operar a prevenção ao acidente de trabalho, bem como as questões relacionadas à periculosidade e insalubridade que se fazem demasiado presentes no ramo químico. Ainda nos dias atuais, o Sindiquim é referência neste campo. Para ilustrar, recentemente foi realizado o Seminário Internacional sobre Saúde do Trabalhador no Ramo Químico26 , com participação da Confederação Nacional do Químicos, ligada à CUT, do Sindicato Nacional dos Trabalhadores Químicos, da Energia e da Mineração da Alemanha, que vem trabalhando em conjunto com o Sindiquim, da FUNDACENTRO e da COPPE/UFRJ. Embora não tenha sido discutida a assistência médico-hospitalar dos trabalhadores, foi amplamente debatida a legislação sobre o uso dos produtos químicos nos locais de trabalho e o sistema de seguro de acidente de trabalho, no Brasil e na Alemanha. O Sindiquim também realiza periodicamente a Semana de Saúde do Trabalhador (SEMSAT), amplamente divulgada e com participação considerável de trabalhadores do ramo. São publicados Boletins, com freqüência variável (ora diariamente, ora semanalmente, sendo que houve momentos em que eram editados e publicados boletins específicos às questões da saúde, chamados “Sindiquim e Saúde”), considerados importante instrumento de informação do sindicato. Este sindicato se articula com instituições ligadas à saúde do trabalhador; por meio do INST/CUT e, além do vínculo com a CUT, também sempre esteve em contato com o DIESAT (Departamento Intersindical de Estudos de Saúde e Ambiente do Trabalho), instituição intersindical vinculada ao DIEESE. O DIESAT é bem estruturado, realiza estudos e pesquisas sobre saúde e trabalho, realiza perícia técnica nas empresas a pedido de sindicatos e promove encontros, seminários e cursos para direções de sindicatos e formação de cipeiros27 . Apresentada a proposta do presente trabalho, dirigentes e consultores do Sindiquim colocaram-se à disposição para a colaboração com esta pesquisa, de forma que o recorte geográfico para construção da amostra foi definido para a assistência à 26 27 Seminário ocorrido nos dias 28 e 29 de fevereiro e 01 de março de 2000, no auditório da sede nacional da CUT. Indivíduo membro da CIPA. 53 saúde proporcionada aos trabalhadores da indústria química e da região do ABC do estado de SP, em grande parte filiados ao Sindiquim. Assim, foram realizadas diversas visitas ao Sindiquim, que se localiza em Santo André, um dos municípios do ABC paulista, entre abril e dezembro de 1999, quando foram realizadas entrevistas informais com dirigentes do sindicato. Supunha-se que por meio dos Acordos Coletivos de Trabalho (ACTs) das empresas estudadas, aqui chamadas de empresas-casos, compreenderia-se como é a assistência à saúde de seus trabalhadores e dependentes. Entretanto, a quantidade de ACTs obtida foi insuficiente para realização de qualquer tipo de consideração acerca das relações entre empregadores, trabalhadores, operadoras de planos e seguros de saúde e a assistência à saúde proporcionada aos trabalhadores. O acesso e confiança das empresas para obtenção dos ACTs se desenhou um processo lento, o que direcionou à procura dos Acordos no próprio sindicato. Porém, por mais que houvesse ACTs arquivados no Sindiquim, não existiam de forma que se pudesse construir um histórico dos acontecimentos relacionados à assistência à saúde dos trabalhadores nas empresas. Depois se percebeu que tampouco o conteúdo dos ACTs permitiriam uma análise mais refinada, uma vez que ali estão apenas as decisões já negociadas. Ou seja, o processo de negociação, a participação dos atores e a própria atenção à saúde destes, não estão contidos nos ACTs 28 . Para esse grau de informação seria preciso um estudo in locus, isto é, no próprio local em que se dá a organização dessa atenção à saúde. Por essa razão, foi realizada leitura dos Boletins do Sindiquim, publicados desde o início da década de 1980 até os dias atuais, de forma complementar ao preparo das entrevistas, já que contém parte dos acontecimentos relativos ao objeto da pesquisa, expostos com a emoção do dia-a-dia, geralmente em forma de denúncia. 2.1.1 – Seleção de Casos para o Estudo Para a pesquisa de campo foi feita uma seleção de casos. Apesar de não representar o universo estudado, permite que se façam suposições por haver sido elaborada a partir de empresas consideradas significantes, ou seja, que tivessem expressão no universo. Para tanto, foram escolhidas três empresas. O critério de escolha foi definido principalmente pela facilidade de acessar a informação, para o que, mais 54 uma vez, foi imprescindível a colaboração do Sindiquim29 . Além disso, a empresa deveria ser de grande porte já que a grande parte de trabalhadores que possuem planoempresa30 aí se localizam. As visitas às empresas selecionadas foram dirigidas diretamente aos responsáveis pelos respectivos setores de recursos humanos, que traduzem a política da empresa em ações de saúde do trabalhador; ações pela política orientadas e desenvolvidas. Para tanto, foi elaborado um roteiro de entrevista constituído por indicadores que permitissem a mensuração daquelas relações colocadas nos objetivos específicos (ver Anexo 1). Em apenas um dos casos o responsável pelo departamento de recursos humanos permitiu que se realizasse uma conversa, mesmo que informal, com o médico coordenador do serviço médico (empresa B). Tal fato é lamentável para a pesquisa porque é ele quem exerce grande parte da assistência dada ao trabalhador, é ele quem coordena o PCMSO, além de também ser ele quem faz as articulações com os profissionais do SESMT e do PPRA e, não menos importante, ser ele quem faz a “ponte” entre o dirigente de recursos humanos e a assistência à saúde proporcionada ao trabalhador. A partir das questões levantadas no primeiro capítulo e dos indicadores investigados em campo, foi realizada a análise dos resultados do campo, que, por sua vez, levaram a novas indagações e discussão (contempladas no Terceiro Capítulo). No próximo item será explicado o que se pode compreender a partir dos indicadores utilizados no trabalho de campo. 2.2 – Introdução às Dimensões, Categorias e Indicadores Utilizados Para analisar a assistência à saúde da população vinculada ao emprego formal – o trabalhador empregado, seus filhos, esposo(a) e seus pais –, foram selecionadas 28 Nos ACTs analisados, verificou-se apenas o registro de mudanças no financiamento e da definição de quem pode ser usuário (dependentes e agregados) do plano de saúde. 29 O acesso às informações referentes à estrutura do RH e à assistência à saúde foi moroso. O período de agendamento das entrevistas, a sua realização de fato e o que se obteve dos informantes foi graças à um processo de convencimento e de diminuição da resistência, com exceção do entrevistado da empresa C, que apresentou seus dados prontamente, inclusive sem fazer questão de sigilo do nome da empresa. 30 Para o presente trabalho, considerou-se Plano Empresa, bem como Plano Coletivo, a mesma conceituação de Plano Coletivo que está na Resolução do Conselho de Saúde Suplementar nº. 14, de 04.11.1998, independente de ser Plano Coletivo Empresarial ou Plano Coletivo por Adesão. Assim, nesta pesquisa, os planos coletivos, da mesma forma que os planos empresariais, são aqueles que oferecem cobertura de atenção prestada à população delimitada e vinculada a pessoa jurídica, cuja forma de adesão ao plano pode ser espontânea ou não (BRASIL, 1998c). 55 algumas categorias consideradas estratégicas para possibilitar o dimensionamento dessa assistência. Com esse propósito foram escolhidas as seguintes dimensões: • a provisão de serviços; • a estrutura dos provedores desses serviços e; • como é financiada essa estrutura. Dentre os serviços providos foram escolhidos pela sua relevância para os propósitos deste estudo, os seguintes: • exame pré-admissional e; • exames de saúde periódicos. O exame pré-admissional pode ser realizado pelo empregador no trabalhador antes de concluída sua admissão, ou seja, ainda no período probatório. Este exame permite o diagnóstico da condição de saúde do futuro empregado e, a partir do qual, pode-se estimar quais os custos que o empregador incorreria com o tratamento de saúde do empregado, e compará-los com o retorno que este lhe dará em termos de produção. Da mesma forma, os exames periódicos fornecem os elementos que comporão o histórico de empregado, aprimorando a estimativa realizada no exame pré-admissional. Por ser assunto discutido em capítulo posterior, não se entrará na questão das competências do SUS neste momento. Entretanto, supõe-se que com os diagnósticos acima referidos a empresa realize a assistência à saúde necessária para prevenir futuros riscos quanto à saúde do trabalhador. Como os agravos à saúde que o trabalhador sofre não necessariamente se originam no ambiente de trabalho, as ações preventivas envolvem a família do trabalhador e o meio em que este vive. Dando continuidade ao trabalho, a seguir é exposto um quadro onde se resgata parte das questões colocadas no capítulo anterior, organizadas em grandes dimensões: Ações Preventivas, Informações Sócio-epidemiológicas, Assistência à Saúde e Financiamento. Posteriormente, serão desagregadas em categorias de análise. Os Exames Pré-admissional e os Periódicos são tratados como dimensão por serem considerados significativos para o melhor entendimento da contextualização pretendida. As dimensões são brevemente comentadas nas colunas, com informações sobre quem é o seu responsável-legal, quem pode realizar os serviços relacionados e a importância e derivações de tais dimensões (ver Tabela 1). 56 TABELA 1: DIMENSÕES DA SAÚDE DO TRABALHADOR, RESPECTIVOS ÓRGÃOS RESPONSÁVEIS E IMPLICAÇÕES DIMENSÃO RESPON QUEM PODE REALIZAR SÁVEL E ADMINISTRAR IMPORTÂNCIA E DERIVAÇÕES Setor médico da Empresa empresa; Operadora de emprega plano e seguro de PRÉ dora saúde; Serviços diretamente ADMISSI contratados pela ONAL empresa empregadora; SESC/SESI Através desse exame a empresa tem um perfil primário das condições de saúde do pretendente ao emprego. A partir desse exame pode ser realizada estimativa dos futuros custos da empresa com a assistência à saúde do empregado e os relativos ao retorno em termos de produtividade do trabalhador. Estes dados serão somados às informações obtidas pelos exames periódicos. É instrumento de informações para as ações do setor de recursos humanos da empresa, bem como para as de defesa dos próprios trabalhadores por terem sua situação de saúde registrada. Com esses exames a empresa tem elementos para compor o histórico de saúde do empregado, aprimorando a estimativa realizada já no exame pré-admissional. A empresa terá também um diagnóstico da capacidade produtiva do trabalhador, que pode ser relacionada aos custos com a assistência à sua saúde. Muitos trabalhadores realizam exames periódicos também nos sindicatos e/ou nos CRSTs por desconfiança dos resultados apresentados pela empresa empregadora ou até mesmo por não ter acesso aos resultados de seus exames. Entretanto, estes casos não contribuem para a alimentação de um sistema de informações ou de um maior controle da qualidade dos serviços de saúde ligados à empresa empregadora; terminam sendo utilizados como denúncia da empresa empregadora que não exerce suas responsabilidades, resolvendo, em primeira instância, apenas casos individuais. Tanto os exames periódicos quanto o pré-admissional indicam a tendência de gastos com a assistência à saúde do trabalhador para quem administrará os serviços, que em grande parte dos casos é a operadora de plano e seguro de saúde. As ações preventivas são reconhecidamente úteis tanto para a população que garante seu bem estar ao evitar doenças e condições de saúde indesejáveis, como para quem for administrar os serviços curativos por eliminar gastos. Entretanto, no Brasil, a cultura de realização de ações preventivas por parte das operadoras de plano e seguro de saúde ainda é fraca, de modo que são realizadas, em sua grande maioria, ou pelo SUS ou pelos sindicatos. As empresas empregadoras são responsáveis pela prevenção no ambiente de trabalho. O ideal é um sistema de informações que contenha os dados epidemiológicos e de utilização de serviços de toda a população para que possam ser elaboradas políticas públicas com base no real conhecimento da situação das condições de saúde da população brasileira. Porém o SUS ainda não dispõe de tanto, embora se pretenda dar conta disto com a implementação do cartão-SUS. Supõe-se que as operadoras de plano e seguro de saúde tenham sistema de informações elaborado, já que almejam a diminuição de seus custos, todavia em função da dificuldade destas em responder à determinadas exigências básicas advindas com a regulamentação do setor, nota-se que tais suposições podem ser facilmente questionadas. O SESI do RJ tem um projeto de formação de banco de dados contendo o perfil sócio-econômico e as condições de saúde dos empregados da empresas participantes do programa, entretanto ainda em fase inicial e sem reconhecimento da sociedade ou do Estado. A relevância do financiamento se dá porque, na prática, todos os atores mencionados na coluna anterior (“quem pode realizar”), de fato contribuem financeiramente. A grande questão é que a esfera federal de governo não tem uma política estabelecida que contribua no esclarecimento das sobreposições de atores financiadores, e do EXAME EXAMES PERIÓDI COS Empresa Setor médico da emprega empresa; Operadora de dora plano e seguro de saúde ou Serviços diretamente contratados pela empresa empregadora; CRST/SUS; Sindicatos; SESC/SESI AÇÕES Estado e Empresa PREVENT s IVAS Emprega doras INFORMA Estado ÇÕES SUS; MTE; MPAS Setor médico da empresa; Sindicato; Operadora de plano e seguro de saúde; Serviços diretamente contratados pela empresa empregadora SÓCIO EPIDEMI OLÓ GICAS MS; MTE; MPAS; Empresa Empregadora; Operadora de plano e seguro de saúde; SESC/SESI FINANCI Estado AMENTO DA ASSISTÊN CIA Á Estado, Empresa empregadora; Trabalhadores; Cidadãos 57 CIA Á SAÚDE Estado; ASSISTÊN CIA À SAÚDE Setor Médico da empresa; Operadora de plano e seguro de saúde ou Serviços diretamente contratados pela empresa empregadora; SUS; Sindicatos; SESC/SESI; provedores particulares próprio financiamento. Estas sobreposições são intrínsecas àquelas de administração e responsabilidade nas ações de assistência à saúde. O resultado é uma proposta de Sistema Único de Saúde que não é único, ao contrário, permite a existência de outras formas de assistência sobre as quais não têm conhecimento pleno, tampouco conjugação de esforços na melhoria da situação de saúde da população brasileira. A dificuldade de acesso aos serviços do SUS sugere elementos para que o setor privado se justifique como imprescindível à sociedade brasileira, sem o qual esta estaria “à mercê” dos serviços do SUS, como os empresários costumam argumentar. Embora seja responsabilidade do Estado, nos estados mais industrializados e, portanto, com maior número de estabelecimentos industriais, a maior parte da população trabalhadora é “beneficiada” com alguma forma privada de assistência à sua saúde e de sua família. É comum pensar que esses trabalhadores sejam privilegiados por receber tantas formas de provimento, entretanto não se sabe ao certo que assistência à saúde é essa recebida pelo trabalhador e familiares que se beneficiam dos serviços providos pela empresa empregadora. Como pôde ser observado, a responsabilidade da atenção à saúde ao trabalhador, mesmo sendo do Estado, é compartilhada também pelas empresas empregadoras que tomam esta função para si. Não cabe retomar toda a discussão do primeiro capítulo neste momento, entretanto deve ser ressaltado que as formas de administração, financiamento e controle da qualidade dos serviços e ações realizados, sobrepõem-se, dificultando o retorno a qualquer planejamento e investimento econômico-políticosocial que venha a ser feito neste sentido. Não é por outro motivo que o presente trabalho propõe aprofundar o conhecimento sobre a atenção à saúde do trabalhador para refletir sobre a possibilidade de inverter esta situação, de modo que o estado venha a exercer o seu papel constitucionalmente reconhecido. Nos próximos itens serão desenvolvidas estas dimensões de forma mais adaptada à realidade da assistência à saúde recebida pelos trabalhadores. Para esta compreensão é necessário o conhecimento de outras características das empresas empregadoras, das relações por elas estabelecidas com os próprios trabalhadores, com as operadoras de plano e seguro de saúde e com a rede de serviços credenciada. As novas dimensões utilizadas em campo são: Características da Empresa; Relações estabelecidas entre Empresa e Empregado no que diz respeito ao Contrato de Trabalho e na Assistência à Saúde; Relações estabelecidas entre Empresa e Operadora de plano ou seguro de saúde e Rede credenciada e; Relações estabelecidas entre Empresa e Trabalhadores no que diz respeito à Assistência à Saúde. A discussão destas dimensões será objeto do presente capítulo. 58 Pela devida relevância, quando alguns elementos possam servir para o melhor entendimento do trabalho, serão apresentados ao longo da exposição, a seguir, que foi sistematizada de forma resumida. Nos casos das citações dos entrevistados, serão destacadas entre aspas. 2.3 – As Empresas- casos Para preservar sua integridade perante o mercado industrial, os casos estudados serão denominados como empresa A, empresa B e empresa C. Todas as empresas são de grande porte, localizadas na região do ABC paulista e do ramo químico-petroquímico. Embora não seja feito uso do peso significativo que as empresas estudadas têm no seu setor, este será enunciado a seguir devido à sua relevância na escolha dessas empresas. Anualmente são realizadas pesquisas classificatórias da posição das empresas que estão no país. Pelo ranking de 1999 da revista Gazeta Mercantil, a empresa A aparece entre os 15 primeiros colocados do setor (químico/petroquímico - produtos diversos) em termos de receita operacional líquida. Nesta mesma publicação, a empresa B está entre os 10 primeiros colocados em termos de receita operacional líquida no seu setor (químico/petroquímico - produtos petroquímicos), entre as 100 maiores empresas estrangeiras, e entre as 60 maiores empresas da região sudeste. Na revista Exame, aparece entre as 150 maiores empresas privadas, por vendas, tanto em 1998 como em 1999. A empresa C também está muito bem colocada nestes rankings, constando entre os 10 primeiras, em termos de receita operacional líquida por setor (químico/petroquímico - produtos petroquímicos) e entre as 100 maiores empresas do sudeste na publicação da Gazeta Mercantil. Pela da Exame, estava entre as 100 maiores empresas em termos de vendas no Brasil, em 1998 estava entre as 150 maiores. É colocada entre as 10 primeiras empresas no ranking no mercado em termos de porcentagem do mercado conquistado nas vendas das maiores, valor adicionado gerado por empregado, e liquidez corrente (reais realizáveis para cada real de dívida no curto prazo). Assim, as empresas estudadas, principalmente a B e a C, estão extremamente bem colocadas no mercado, região geográfica e setor: mais um motivo que reforça o quanto os casos estudados podem ser considerados uma amostra significativa das empresas brasileiras que têm relevância na configuração deste campo de reflexão. 59 Nas três empresas, a maior parte dos funcionários efetivos (80 a 95%) é do sexo masculino. A principal forma de representação dos trabalhadores se dá pelo Sindiquim. Outra característica em comum é que todas elas estão em atividade relativamente há bastante tempo se considerarmos o desenvolvimento industrial brasileiro: uma delas foi fundada na primeira década deste século, a segunda na década seguinte e a terceira na de 1960. Estas empresas proporcionam assistência médico-hospitalar para seus trabalhadores e a área geográfica da rede credenciada abrange quase que totalmente aquela da moradia dos trabalhadores. Não recebem tais benefícios aqueles trabalhadores que não possuem vínculo empregatício (temporários, estagiários e terceirizados) e, portanto, não participam dos contratos coletivos de trabalho realizados entre os sindicatos e as empresas. As três empresas são totalmente diferentes quanto à composição acionária; a empresa C era estatal e foi privatizada na década de 90. A empresa B, cujo controle acionário é de um grupo francês, é mista, brasileira, francesa e alemã. A empresa A era multinacional até a década de 1970 (EUA e Inglaterra), quando foi comprada por dois grupos privados nacionais. Do mesmo modo que a composição acionária das empresas, suas políticas de recursos humanos e a assistência médico-hospitalar proporcionada aos seus trabalhadores também são específicas. Um dos apontamentos que vai ser feito a partir da análise dos casos é justamente a peculiaridade com que cada empresa constrói seus mecanismos para o cumprimento de sua missão social, tanto quanto de sobrevivência e posicionamento no mercado de produção industrial. Mesmo assim, as formas como cada empresa estudada reage e elabora suas ações perante as possibilidades impostas pelo modelo social brasileiro apresentarão, também, semelhanças. 2.3.1 - Histórico da assistência à saúde nas empresas-casos 2.3.1.a - Empresa A Na visita à empresa foram entrevistados o chefe do setor de Recursos Humanos, que trabalha na empresa desde 196531 , e a sua assistente direta. É uma empresa com características “familiares”, o comportamento dos funcionários induz a suposição de que “vestem a camisa” da empresa. 60 Empresa fundada em 1926, em atividade desde então. São duas unidades (matriz e filial). Na década de 1990 possuía em torno de 2 mil empregados, tendo diminuído para 1.100 trabalhadores efetivos em 1999, a maior parte na matriz (750). Desde o início das suas atividades, a empresa administrava a assistência à saúde de seus empregados através da contratação direta de médicos que trabalhavam no interior da empresa. A partir de 1962, estrutura uma rede de assistência médico-hospitalar, configurando credenciada própria, que compreendia o que os entrevistados chamam de Plano Básico: exames laboratoriais, clínicas ambulatoriais especializadas, tratamento fisioterapêutico, extrações e cirurgias dentárias e terapia ocupacional. De acordo com os entrevistados, isso se deu pela forma de financiamento então vigente onde o INSS reembolsava as despesas com assistência à saúde de trabalhadores. Em 1998 decidiu-se mudar o desenho do plano. O setor de RH encomendou à uma corretora um estudo sobre preços, rede e cobertura, sendo que o próprio dirigente dos recursos humanos “projetou cenários” possíveis dentro das imposições da Lei nº. 9.656/98. Segundo o informante, definiu-se então pelo “managed care”32 que seria um plano de “autogestão administrado por terceiros”. Para poder utilizar a rede credenciada, o usuário deve ser encaminhado pelo setor médico da própria empresa. Nas palavras do entrevistado, há uma “rede fechada” que seria a porta de entrada que encaminha o paciente para a “rede aberta”. A empresa financia integralmente o convênio médico-hospitalar, e o ingresso no convênio é “obrigatório” para os 750 funcionários da sede, totalizando aproximadamente 2 mil usuários, entre titulares e dependentes. A empresa empregadora paga R$ 40,00 per capita fixos pelo plano. Há limite de utilização dos serviços ambulatoriais para algumas especialidades. A cobertura disponibilizada pelo plano é exatamente a mesma para todos os beneficiários. Como já estava em vigor a Lei n. 9.656/98 quando a empresa contratou uma operadora para administrar o plano, a cobertura teve de ser ampliada em relação à do formato anterior, acarretando aumento do custo do plano em R$ 10,00 por indivíduo coberto (trabalhador e dependentes). Esta ampliação da cobertura foi definida pelo 31 Corroborando o caráter familiar da empresa, antes do chefe de RH iniciar sua carreira na empresa, sua mãe já trabalhava neste mesmo local. 32 Vale lembrar que as aspas correspondem às citações dos entrevistados. Neste caso, o entrevistado faz alusão ao sistema estadunidense de atenção gerenciada à saúde. 61 informante como inclusão de aumento do tempo para internação, diminuição de carências, consulta psiquiátrica e inclusão de "grande eventos”, que é basicamente aquilo que representa maiores custos. Os problemas de cobertura e os administrativos, antes de responsabilidade da empresa empregadora, passaram a ser de responsabilidade da empresa contratada. Os motivos da mudança do modelo do plano são confusos para os entrevistados. Por um lado, foi dada uma explicação que é a falta de “poder de barganha” da empresa com a rede credenciada, o que seria resolvido com a contratação de uma administradora. Esta é uma interpretação clara e objetiva, inclusive pela transferência do risco financeiro do âmbito da empresa empregadora para a operadora. Por outro lado, com as informações obtidas, surge um outro processo, aparentemente resultante de outra racionalidade que a anterior, ou seja, a provável indicação de qual operadora seria contratada por uma pessoa que era acionista desta operadora na época da mudança do plano, o coordenador do setor médico da empresa. Estas informações levam à suposição de que a mudança do formato do plano, antes gerenciado pela própria empresa empregadora, pode ter se dado, portanto, em decorrência da interferência do médico coordenador do setor médico. De acordo com os entrevistados, os usuários da assistência ficaram satisfeitos com a mudança, tendo manifestado argumentos contrários quando da tentativa de cobrança de 2% do salário do trabalhador, de forma que “houve discussão” e que até o momento da entrevista esta forma de financiamento está em suspenso, permanecendo o plano não contributário. 2.3.1.b - Empresa B Esta empresa é composta por 12 (doze) unidades a primeira das quais foi fundada em 1919. Até 1997, as filiais eram subordinadas à matriz, inclusive em relação às questões relativas aos recursos humanos e à assistência à saúde. Em 1999, o conjunto de empregados formalmente contratados, totalizava 8.000 pessoas. De acordo com o entrevistado, o atual sistema de assistência à saúde dos trabalhadores da unidade visitada vem se modificando; teria sido a partir de 1959 que pela primeira vez foi feito convênio, então com a operadora SAMCIL. Segundo o informante, até então, os trabalhadores provavelmente utilizavam os serviços do INPS e INAMPS. 62 O convênio com a SAMCIL (1959-1997) operava com rede conveniada, era integralmente financiado pela parte empregadora e permitia a participação de agregados ao funcionário, como pai, mãe, sogro e sogra. Somente os funcionários que optassem pelo plano executivo, com internação em quarto individual, teriam que pagar um plus para tanto. Os entrevistados não souberam dizer de quem teria sido a iniciativa da implantação do convênio com a SAMCIL33 . Os funcionários não estavam satisfeitos com a SAMCIL e reivindicaram melhorias. Em função disso, em 1986 foi iniciado um contrato da empresa com outra operadora, uma seguradora, aqui chamada de operadora "Y". Porém, o funcionário teria que contribuir no caso de optar pela participação nesse plano, que é notadamente mais caro que o básico. O convênio com a SAMCIL foi finalizado, em 1997, e substituído por outra operadora, uma cooperativa médica, neste trabalho denominada "X". Esta mudança deve-se em grande parte à reestruturação da empresa; quando as 12 unidades deixaram de ser totalmente vinculadas à sede da empresa, nas palavras do entrevistado, se “tornando independentes”. Essa autonomia estendeu-se também à administração da assistência à saúde, que passa a ser diferenciada para cada unidade da empresa. Entretanto, esta autonomia das unidades não se estende à administração do plano da operadora Y, comentado no parágrafo anterior, que é feita pela unidade central da empresa. O mais utilizado laboratório, atualmente conveniado à empresa, pertencia à própria empresa empregadora até 1987, quando o então médico responsável pelo setor médico da empresa arrendou-o. De acordo com o atual médico responsável pelo setor médico, este laboratório oferece serviços para as unidades da região do ABC desta empresa. Também odontológicos, é realizado cujos custos convênio são com integralmente outra operadora, financiados pela para serviços empresa aos funcionários, significando R$ 6,50 per capita. Os trabalhadores que quiserem que seus dependentes participem no plano, devem contribuir com R$ 5,50 para cada novo inscrito. 33 De acordo com a Associação dos Aposentados Químicos do ABC, esta empresa teria sido uma das primeiras empresas a fazer convênio médico-hospitalar na região do ABC paulista. Médicos que eram funcionários da empresa, após serem demitidos, organizaram-se e ofereceram cobertura de serviços de saúde para os trabalhadores da empresa 63 O custo mensal do plano da operadora X é de R$ 27,29 per capita, financiado integralmente pela parte empregadora. Os beneficiários que prefiram cobertura de internação em quarto individual, devem pagar um adicional de R$ 10,69 mensais per capita. No financiamento da operadora Y, parte do custo é rateado entre as demais unidades da empresa. O montante a ser pago pela empresa à operadora vai ser calculado de acordo com o número de inscritos em cada unidade. Assim, no caso da unidade visitada, 60% do valor devido é pago pela parte empregadora e os 40% restantes são igualmente rateados entre os empregados, não importando o número de dependentes que estes possuam. No fim de 1999 o custo mensal do plano da operadora Y, por trabalhador, estava sendo de R$ 250,20, sendo que a parte empregadora pagou os R$ 151,00 per capita e cada funcionário contribuiu com aproximadamente R$ 101,00. Além disso, é realizada coibição ao uso, através do estabelecimento do pagamento, pelo funcionário, de 2/3 do valor de cada consulta ambulatorial realizada – o que pela tabela AMB significam mais R$ 16,20 de gasto adicional ao empregado, por consulta. O consumo de serviços dos trabalhadores vinculadas à este plano vem aumentando. Os serviços utilizados pelo sistema de livre-escolha são financiados por ambas as partes, empregadora e trabalhadores. No caso do plano destinado aos funcionários em geral, a empresa reembolsa 50% dos gastos com internação clínica e cirúrgica. Para os funcionários com cargo de gerência, o reembolso é de 80% dos gastos. Uma mudança importante é a diferença entre número de beneficiários na década de 1980 e na de 90: em 1986, a matriz gerenciava o plano para 15 mil beneficiários aproximadamente, enquanto que atualmente não são mais de 9 mil beneficiários. A unidade central administra o plano para 4.088 beneficiários da operadora Y e as demais unidades administram, de forma descentralizada, cobertura para 4.900 beneficiários da operadora X. Outra característica que vale salientar é que os planos, administrados por diferentes operadoras, não são tão diferentes em seus formatos, mas a operadora X é uma cooperativa médica e a Y, embora ofereça o mesmo molde de plano (o que muda é a hotelaria, amplitude e status da rede ofertada), é uma seguradora. Para cobrir o “alto a preços moderados. Os médicos eram do “Hospital Modelo” (localizado na capital de SP), na década de 60: “os médicos se associaram, assumiram o hospital e convênio” com a empresa. 64 custo”, não considerado nos planos das operadoras X e Y, é disponibilizada a opção do “plano livre-escolha”, onde opera-se diretamente com reembolso de recursos financeiros. Neste caso não há rede credenciada, apenas reembolso de parte de despesas realizadas. Este plano é contributário, cuja definição se dá pela hierarquia do beneficiário no quadro de funcionários da empresa. Da mesma forma que na empresa A, supõe-se que seja forte o poder de interferência do médico coordenador do setor médico na estrutura e, conseqüentemente, nas mudanças do convênio médico-hospitalar desta empresa B. Com todas as mudanças, não foram percebidas pelo entrevistado grandes diferenças na oferta de procedimentos, porém verifica-se a ampliação da rede credenciada com a introdução da operadora Y e a exclusão dos agregados como categoria beneficiada pelo sistema. Ainda se permite a participação de alguns agregados que já participaram do sistema anteriormente à mudança e que sejam considerados dependentes do funcionário, porém não há critérios para decisão de quais poderiam e quais não, ou seja, a decisão deve ser da alta hierarquia da empresa, para cada caso isolado. Segundo se apurou, existem pouquíssimos casos de agregados ao plano. De acordo com a entrevistada, a exclusão dos agregados teria se dado quando “Collor criou o SUS” e a partir da universalidade as empresas poderiam aliviar-se do custo dos agregados, o que foi feito por esta empresa a partir de 1996. Na época da visita à empresa B, estava em estudo a proposta de mudança do sistema da unidade visitada, onde a operadora Y passaria a ser a principal provedora de serviços de saúde a seus funcionários e dependentes. Seriam redefinidos os níveis hierárquicos ao formato atual do plano da operadora Y. A iniciativa da concepção deste plano partiu do setor de suprimentos da empresa, que administra os custos da assistência médico-hospitalar, mas os trabalhadores ainda não foram consultados quanto às possíveis mudanças, de modo que a sua posição não é conhecida. A principal alteração seria que os níveis passariam a ser 5 (cinco) e estariam vinculados aos níveis hierárquicos da empresa, mantendo as proporções para a amplitude e “fama” da rede credenciada. Para exemplificar, no plano intermediário seriam acrescidos o hospital São Luiz, INCOR, Neomater, Samaritano e Nove de Julho, 65 entre outros. Para os que forem inscritos no plano executivo entram os hospitais Einstein, Sírio Libanês, Oswaldo Cruz e Brasil. O que ainda não estava definido era o financiamento, uma vez que esta mudança implicaria num aumento em, aproximadamente, R$ 10,00 per capita. Quanto à cobertura, a empresa pretende operar com stop loss de R$ 5.000,00, de modo que os custos abaixo desse valor são cobertos pelo plano de assistência médica e aqueles acima do valor operarão com reembolso, englobando os casos de alto risco, na época da entrevista cobertos pelo sistema de livre-escolha. 2.3.1.c - Empresa C O entrevistado, chefe do setor de Recursos Humanos, trabalha na empresa desde 1974, 2 anos após esta ter começado a operar. Esta empresa foi fundada em 1966, estando em atividade desde 1972. Sua composição acionária sempre foi mista, 63% pública, mas após a venda de grande parte das ações públicas, tornou-se predominantemente privada. Antes da venda, eram contratados 1100 empregados. Atualmente são 550 empregados, a grande maioria do sexo masculino (95%) e idade média de 35 anos. Eles moram principalmente no ABC (60%) e o restante em São Paulo e Mauá. Até 1996, a empresa oferecia assistência à saúde aos seus trabalhadores, dependentes e agregados de forma diferente da atual. De acordo com o entrevistado, a grande diferença seria que era ela mesma quem administrava o plano, o que a impossibilitava de ter resultados satisfatórios na negociação com os estabelecimentos credenciados (“tínhamos baixo poder de barganha”), inclusive em relação aos custos do plano/seguro de saúde. Outro obstáculo é o “de gestão”, que se refere à incapacidade da empresa empregadora para analisar os custos e gastos das contas hospitalares por não haver uma equipe de especialistas no assunto34 e à falta de ferramentas, como um software que construísse indicadores a partir da utilização dos serviços. Atualmente, o plano/seguro de saúde, chamado pelo entrevistado de “Autogestão terceirizada”, é constituído por um pool de 15 (quinze) empresas e administrado por uma empresa bastante reconhecida no mercado de seguros, gerenciando em torno de 10 mil vidas. São 1.900 vidas da empresa C e 8.100 vidas das demais empresas, sendo que 66 uma das empresas tem 3 mil beneficiários. Assim, as demais 13 empresas do pool participam com aproximadamente 5 mil beneficiários. O contrato entre empresas e operadora de plano ou seguro de saúde é feito por uma das empresas. As demais fazem adesão a este contrato. O acesso aos serviços é feito diretamente pelo usuário aos estabelecimentos da rede credenciada. Assim, o “risco fica diluído por a massa ser grande”, ou seja, quando o plano era administrado pela própria empresa empregadora, a “negociação (junto ao prestador, mais especificamente, hospitais) era difícil”, enquanto que, ao administrar um plano para 10 mil vidas, a empresa faz tem poder de “barganha”, o que o entrevistado chama de “dificuldade operacional”. A responsabilidade sobre a assistência à saúde na empresa empregadora continua do setor de recursos humanos. Com a mudança de plano, quando acontece algum problema o usuário deve recorrer à operadora, mas se necessário, o setor de RH da empresa empregadora pode intermediar a relação do usuário com o prestador ou com a empresa administradora. Na prática, o usuário consegue resolver seus problemas diretamente com a empresa administradora do plano/seguro de saúde. Embora a participação no plano não seja obrigatória, a grande maioria dos funcionários integra a assistência médico-hospitalar da empresa. Há três modalidades de assistência disponibilizadas, definidas pelo vínculo que o indivíduo tem com a empresa e pelos custos da utilização dos serviços. Uma delas é o Plano Básico, destinado somente aos estagiários. Outra forma é o Plano Especial, para todos os funcionários (que seriam os titulares do plano), e seus dependentes diretos. A terceira modalidade é o plano destinado aos agregados. A diferença da assistência oferecida no plano Básico e o Especial se dá pelo conforto e hotelaria (na internação) e pelos serviços cobertos, pois o plano básico não contempla a cobertura odontológica. A cobertura da assistência odontológica do plano Especial não contempla eventos ortodônticos. O plano dos agregados é definido pelo alto custo que sua população beneficiária representa, ficando desvinculado dos demais. O plano dos estagiários é financiado integralmente pela parte empregadora. O plano Especial é financiado por empregadores e empregados: o empregadores arcam com o custo total do plano subtraído da contribuição dos usuários realizada no co34 Para ilustrar o caso, o entrevistado contou que tinha que perguntar para amigos da área médica se a utilização de 67 pagamento. O financiamento independe da faixa salarial do empregado, vai se diferenciar pelo tipo de serviço utilizado, que estabelecerá o limite de uso pecuniário: o usuário paga 15% de cada consulta ambulatorial e 10% para exames laboratoriais. No caso de internações hospitalares, o custo fica integralmente por conta da parte patronal. No plano odontológico, a participação do usuário é de 15%. De acordo com o entrevistado, os serviços cobertos são basicamente os mesmos de antes, quando administrados pela empresa empregadora (até 1996), e do plano administrado pela empresa administradora do plano/seguro de saúde (a partir de 1996). A única mudança que nota é quanto ao acesso aos serviços, que podia ser feito por livreescolha, o que não acontece mais e acaba gerando algum grau de insatisfação dos usuários, inclusive do próprio entrevistado. Como a empresa oferece assistência à saúde para seus funcionários desde que começou a operar, não houve movimento organizado no período que antecedeu à sua implantação, seja por parte dos trabalhadores, de sindicato ou de associação. A demanda para a elaboração de um plano parece ter partido da própria concepção da empresa, aliada à necessidade de garantir assistência médico-hospitalar para trabalhadores em uma região que, de acordo com a explicação do entrevistado, pouco tinha para ofertar na década de 70. Dessa forma, a pressão pela oferta dessa assistência não teria influído na quantidade ou qualidade de benefícios ofertados pela empresa. Não se pode deixar de levar em conta que esta era uma empresa predominantemente pública nas décadas de 70 e 80, quando predominava o modelo assistencialista de cobertura às necessidades do trabalhador nas grandes empresas estatais. É com a justificativa da necessidade de diminuição de custos, já na década de 90, que se explica o porquê desse modelo ser reformulado, o que sugere uma associação direta entre a mudança de modelo de administração do convênio médico-hospitalar (1996) e a venda da maioria da ações da empresa que eram públicas (ocorrida em 1994). 2.4 - Categorias Analisadas A verificação em campo das dimensões anteriormente expostas, permitiu que, a partir de sua desagregação, fossem selecionadas categorias consideradas relevantes como elementos que nortearão a análise da assistência à saúde proporcionada pelas determinada quantidade de esparadrapo em determinada cirurgia estava de acordo com os parâmetros. 68 empresas-casos aos seus trabalhadores e dependentes. A seguir é apresentado um quadro contendo as categorias (primeira coluna) e comentários com relação a possíveis formas de ocorrência (segunda coluna) – Tabela 2. O quadro não dará conta de todas as ações possíveis para as empresas-casos, tampouco é sua pretensão. A idéia é destacar algumas das possibilidades, justamente para depois serem complementadas em função dos resultados obtidos pela pesquisa realizada em campo que, vale lembrar, busca captar elementos da realidade que contribuirão para a reflexão sobre a atenção à saúde que o trabalhador da grande empresa recebe e o modelo de saúde brasileiro. TABELA 2: PRINCIPAIS CATEGORIAS INVESTIGADAS EM CAMPO E FORMAS DE OCORREREM Categorias Principais “Benefícios” Gama de Possibilidades Pode oferecer algumas ou todas das seguintes, em diversas combinações: Previdência privada, salário /apoio educação, medicamentos, convênio médico-hospitalar. Benefícios x contrato de Os trabalhadores não efetivados podem receber todos os benefícios ou, no limite, não recebem trabalho nenhum. Quem recebe o benefício Desde apenas os funcionários até esposas, dependentes e agregados. convênio médico-hospitalar Política de recursos humanos Impositiva, centralizadora/ vertical até Descentralizada / Negociada com os empregados/sindicato. (Forma e Caráter) Política de recursos humanos Predominantemente definida pelo atual dirigente até negociada entre alta hierarquia da empresa, (Definição e Decisores) dirigente de RH e trabalhadores e sindicato. Razões para ofertar o convênio posicionamento no mercado; manutenção da mão-de-obra; controle da mão-de-obra; protecionismo médico-hospitalar (“empresa-mãe”); reivindicação dos trabalhadores. Prevenção/ o que a empresa Em função das particularidades da empresa, esta pode cumprir ou não as diversas exigências. Por oferece exemplo, o entrevistado da empresa B explicou que a empresa não realiza prevenção ao tabagismo por ser uma ação contraditória a um dos artigos produzidos pela empresa, que é filtro de cigarro. Prevenção/ quem administra o Podem ser algumas ou todas das seguintes instituições, em diversas combinações: SUS; Serviço serviço Médico da empresa; Operadora de plano ou seguro de saúde; Sindicato. Exame pré-admissional/ quem Pode ser realizado, em diversas combinações, por: Médico do setor médico (interior da empresa), pode realizar SESI; serviço da rede credenciada do convênio médico-hospitalar; empresa diretamente contratada pela empresa empregadora. Exames periódicos/ quem pode Pode ser realizado, em diversas combinações, por: Médico no interior da empresa; serviço da rede realizar credenciada do convênio médico-hospitalar ou empresa diretamente contratada pela empresa empregadora; SUS/ CRST; Sindicato. Médico do interior da empresa Pode emitir CAT ou não, pode atender o acidentado, ou encaminhá-lo para o CRST mais próximo. Médico do interior da empresa Pode ser financiado pela operadora do convênio médico-hospitalar; Diretamente pela empresa; / quem financia Terceirizado (faz parte de uma empresa prestadora deste serviço). Responsabilidade do setor O médico pode responder desde mais diretamente à empresa, até em maior proporção ao convênio médico médico hospitalar. RH/setor médico/existência de Possui sistema de informações sócio-epidemiológicas até não possui. Pode utilizar os dados do informações sócio- convênio médico-hospitalar. Também pode elaborar o sistema de informações em conjunto com o epidemiológicas CRST. Porta de Entrada para os Pode ser pelo Setor Médico (interior da empresa) ou direto na rede credenciada. serviços do convênio Restrições/ fator moderador Pode haver ou não, os mais comuns são a oferta restrita de especialista/rede credenciada; copagamento; limite de utilização dos serviços. De que setor são os serviços Podem haver diversas combinações, desde o empregado utilizar apenas serviços do convênio utilizados: publico ou privado? médico-hospitalar até somente serviços do SUS, passando por algumas possibilidades: o empregado utiliza convênio e setor médico da empresa (para emergência); o empregado utiliza principalmente setor médico da empresa (é basicamente sua família quem utiliza o convênio); o empregado utiliza o setor médico da empresa, sua família utiliza serviços do convênio, mas os profissionais do setor médico da empresa são do convênio Finalidade da utilização A utilização dos serviços do SUS pode ser feita com diversas finalidades, dentre elas, prevenção em serviços do SUS saúde, serviços que representem alto custo; emissão de CAT/LEM. 69 Padrão de convênio Cobertura do A gama de serviços cobertos pode ser desde ampla até residual. Sua definição pode se dar tanto pelo financiamento, como pela hierarquia na empresa em que o beneficiário se encontra (se é plano básico, executivo, etc.). Padrão de rede credenciada A rede credenciada pode ser composta desde pelos estabelecimentos considerados "top" de linha até o campo oposto. Da mesma forma que a amplitude da cobertura de serviços, sua definição pode se dar tanto pelo financiamento, como pela hierarquia em que o beneficiário se encontra (se é plano básico, executivo, etc.). Existência de mais de uma A existência de mais de uma operadora conveniada pode se dar por diversos fatores, desde pela operadora conveniada imposição do mercado de oferta local, até por diferenciação de padrão de rede credenciada Padrões de Financiamento do Pode ser diferenciado pela segmentação do plano (odontológico, ambulatorial, hospitalar, plano/seguro de saúde obstetrícia, etc.); pela hotelaria (internação em apartamento individual, etc.), pela utilização; pelo nível hierárquico do funcionário (seja categoria profissional ou faixa salarial); pelo vínculo empregatício do funcionário (efetivo, terceirizado, estagiário); por o beneficiário representar alto custo (o desenho do plano não ser igual para agregados por exemplo); pela realização de copagamento. Critérios de análise dos Muitas podem ser as variáveis: qualidade da oferta dos serviços; dimensão e imagem da rede serviços oferecidos pela ofertada; custos para a empresa; capacidade administrativa da operadora (retorno de relatórios, etc.); operadora participação dos usuários. Transferência do Risco Desde o predomínio do mutualismo até o do securitarismo35. Interferência do Sistema “S” De forte até nula. Existência de CIPA na Pode haver CIPA formada e em funcionamento ou não. empresa Existência de Comissão de Pode ter comissão formada e em funcionamento ou não. Fábrica na empresa Membros da CIPA/ SESMT/ Podem desde se reunir freqüentemente e definir em conjunto as atividades a serem realizadas, PCMSO/ Comissão de Fábrica possuir uma integração informal, até atuarem de forma desintegradas, que é a situação mais comum. No seguinte item se examinará a assistência à saúde proporcionada pelas empresas estudadas aos seus trabalhadores e dependentes. 2.5 - Considerações Acerca da Pesquisa de Campo 2.5.1 – Benefícios oferecidos Nas visitas às empresas, buscou-se informações a respeito da política de recursos humanos vigente e dos fatores que influenciam esta política. Este tema é considerado estratégico, porque a política de recursos humanos de uma empresa determina em grande parte os benefícios que oferece aos empregados. Ademais, supõe-se que a oferta de benefícios é uma variável determinante do posicionamento da empresa no mercado, além de fazer parte da política social da empresa e das relações estabelecidas com os trabalhadores36 . Ao procurar saber quais benefícios são ofertados aos trabalhadores das empresas-casos, um dos objetivos era verificar se havia ocorrido mudanças, na quantidade ou conteúdo dos benefícios ofertados, antes e depois de se iniciar a oferta do 35 Neste trabalho é utilizado os conceitos de mutualismo e securitarismo desenvolvidos por BAHIA, L, 1999, diretamente associados à transferência do risco. 36 Para ilustrar a importância dos benefícios, é interessante analisar os resultados de pesquisa realizada pela consultoria Mercer M W, feita com 203 empresas, 135 delas multinacionais (Revista Exame em 13/01/1999). Dentre os benefícios freqüentemente oferecidos, a assistência médica com livre-escolha, considerada o nível mais sofisticado de assistência médica, o é para 89 presidentes das empresas, 90 diretores e 61 gerentes só ficando atrás da oferta de carro e manutenção de automóvel no ranking dos benefícios. Dentre os classificados como média freqüência de oferta, o plano de aposentadoria foi verificado para 56 presidentes, 58 diretores e 56 gerentes. Mais abaixo do ranking está a assistência odontológica, ofertada à 45 presidentes, 44 diretores e 35 gerentes. 70 plano de assistência médico-hospitalar na empresa. Por serem as três empresas-casos relativamente antigas e de grande porte, este tipo de serviço já é oferecido há décadas, como reflexo da política de RH e das negociações entre empregados e empregadores. Outro fator importante é como se dá o acesso a esses benefícios, isto é, se há diferenciação na gama de benefícios entre os trabalhadores da empresa, seja esta definida pela categoria do profissional, seja pelo contrato de trabalho (se o trabalhador é terceirizado, temporário, efetivo, etc.). Os benefícios oferecidos com maior freqüência são cooperativa de crédito, convênio farmácia, convênio papelaria, assistência à saúde através de contratação de serviços de terceiros ou não, restaurante, transporte, vale transporte, seguro de vida em grupo, cesta e brinquedos de natal e plano privado de previdência. Tanto a previdência privada como a assistência à saúde podem ter a participação (compulsória ou não) do empregado, o que deve ser entendido no contexto da política de recursos humanos exercida pela empresa. A Tabela 3, a seguir, contém a listagem dos principais benefícios oferecidos pelas empresas estudadas. TABELA 3: PRINCIPAIS BENEFÍCIOS OFERECIDOS PELAS EMPRESAS ESTUDADAS EMPRESA BENEFÍCIO Empresa A Vale transporte, aluguel de quadra de clube para atividades esportivas, cesta de natal e brinquedos ao final de cada ano, ticket alimentação, cesta básica, restaurante na empresa, convênio farmácia, seguro de vida e empréstimo financeiro para compra de casa própria, participação nos lucros e renda (desde 1995) e assistência à saúde. Na época da entrevista a empresa estava preparando previdência privada e auxílio educação. Empresa B Transporte, vale transporte, cooperativa de crédito, cesta de Natal, brinquedos, bolsa de estudo em caso de treinamento voltado às atividades do trabalho, restaurante, seguro de vida em grupo, salário educação (R$ 21,00/mensais/filho que estude em escola particular), convênio farmácia, assistência à saúde e plano de previdência através do Instituto de Seguridade Social próprio da empresa. A previdência privada é oferecida em duas modalidades, definidas em função da hierarquia salarial do funcionário. Uma delas, em vigor desde 1987, é chamada de Plano Básico e complementa para os funcionários que recebem até R$ 4.000,00 mensais. A outra, criada em 1997, opera com cotas e permite o funcionário retirar 25% no momento de se aposentar e o receber restante mensalmente Empresa C Transporte, vale transporte, bolsa parcial de estudo (analisadas caso a caso por critérios como o retorno do aprendizado para as atividades exercida pelo funcionário na empresa), restaurante, previdência privada (não obrigatória), seguro de vida, “alguma coisa” de cesta de Natal, participação nos lucros (desde 1998), clube (com piscina, salão e quadra de esportes) e assistência à saúde. Na empresa A, o responsável pelo setor de RH é nitidamente pouco interessado em ampliar a cobertura de benefícios oferecidos, apesar do discurso de a cultura de benefícios ser “importada” da matriz (empresa multinacional). Isto teria sido determinante na década de 1920, quando a principal concorrência quanto ao posicionamento no mercado era justamente a empresa-caso B. O entrevistado é um quadro antigo da empresa, sua mãe também foi funcionária. A empresa caracteriza-se 71 pelo clima familiar entre os dirigentes, que “vestem a camisa”. As políticas são centralizadas, verticais e impositivas. Uma das dificuldades em acessar o setor de RH nesta empresa, é que este fica disponível durante o turno diurno somente, de forma que os trabalhadores do turno noturno devem comparecer à empresa durante o dia caso o necessitem. Observando a gama de benefícios, pode-se afirmar que é restrita em relação àqueles comumente ofertados; esta empresa não oferece previdência privada e nem auxílio educação, por exemplo. Já a empresa B tem ampla gama de benefícios, modelo explicado pelo dirigente de RH como de uma política de “capacitação do funcionário”. As políticas da unidade visitada são descentralizadas e independentes em relação à matriz, isto é, esta não tem total domínio sob as políticas de RH de cada unidade. Entretanto, na unidade visitada o entrevistado cumpre suas funções de forma burocrática, parecendo mais preocupado com as atividades meio que com as finais, ou seja, parece ser um profissional pouco interessado, inclusive nas relações com os trabalhadores - não tem conhecimento do que vem a ser Comissão de Fábrica, por exemplo. Assim, a descentralização em relação à Matriz pode ter conseqüências tais como as ações do RH serem realizadas de forma centralizada e pessoal, quando o dirigente de RH da unidade visitada é o único responsável por toda e qualquer questão desta área. Totalmente diferente é a empresa C, cujo responsável pelo setor de RH entende os benefícios como parte de uma política de bem-estar. Essa empresa é o caso que oferece a maior gama de benefícios e, também, a mais aberta a negociar com os trabalhadores (na época da entrevista, por exemplo, estavam implantando Comissão de Fábrica); as decisões parecem, de fato, serem negociadas. Esta posição, contudo, não interfere na postura de controle deste setor sobre os acontecimentos relacionados ao comparecimento ao trabalho e, portanto, à produção, o que pode ser observado pelo seguinte exemplo: da mesma forma que nas demais empresas estudadas, somente são aceitos atestados médicos do setor médico ou da rede credenciada do plano/seguro de saúde, não sendo aceitos os do SUS portanto, pela empresa C. Na empresa C, aqui considerada a mais flexível em termos de controle do setor de RH para com os empregados37 , é permitida a apresentação de atestado médico de “qualquer proveniência”, porém o dirigente contou nunca ter “aparecido atestado do SUS devido ao alto grau de satisfação dos funcionários com a rede credenciada”. 72 2.5.1.a Contrato de Trabalho Verificando-se as relações estabelecidas entre as empresas empregadoras e os empregados, no que diz respeito ao contrato de trabalho, uma das características que se sobressai é a relação trabalhadores efetivos/trabalhadores terceirizados. Estes últimos, cujas atividades já foram exercidas por efetivos, não participam do rol de benefícios da empresa. Isto é dizer que o processo de enxugamento de quadro pelo qual as empresas vêm passando desde o início da década de 1990 faz com que, além dos funcionários demitidos e aposentados, haja uma quantidade enorme pessoas que não mais receberá os benefícios, dentre os quais a assistência à saúde, como é o caso dos terceirizados, que são aproximadamente metade do total de efetivos nas empresas B e C. O dirigente da empresa A nem sabe o número de terceirizados, contratação típica nos dias atuais, onde a empresa exime-se de toda e qualquer responsabilidade para com parte da sua mão-de-obra. De qualquer forma, em nenhuma dessas empresas os terceirizados e os temporários recebem os benefícios, apenas na empresa C o benefício assistência médico-hospitalar é estendido para, além dos dependentes diretos (esposas/os e filhos), os estagiários. Questão não menos relevante é que, em nenhum dos casos, a assistência médicohospitalar está no contrato de trabalho, sendo então considerada um benefício da empresa aos seus empregados. Sobressai daí uma questão fundamental para a compreensão do processo, referente a quem é o consumidor do produto. Nos casos do plano empresarial, a empresa é o consumidor. Entretanto, é diferente dos planos individuais (planos contratados diretamente por pessoa física). Quem utiliza o plano-empresa geralmente não recorre aos mesmos meios de defesa que nos planos individuais, ao invés de reclamar ao PROCON ou ao IDEC, o trabalhador conversará com os dirigentes de RH do local de trabalho quando acontecer algum problema com os serviços de saúde da operadora. É realizado um único contrato entre empresa empregadora e operadora de plano/seguro de saúde, a partir do que a empresa terá um “poder de barganha” que não se verifica nos casos dos planos individuais. A empresa vai buscar diferentes mecanismos para lidar com o mercado, de acordo com suas necessidades. Esta 37 Corrobora esta suposição a informação de que a empresa C é a única que possui ascensão de nível (4%), o que 73 característica permite que a amplitude da cobertura do plano-empresa seja maior que no plano individual38 . O plano empresa é tratado pelo dirigente de RH como um benefício da parte empregadora aos trabalhadores. Em todos os casos estudados, os entrevistados relataram que o “convênio cobre tudo”, o que seria motivo de orgulho para a empresa. Esse raciocínio subentende que o plano empresarial não deveria sofrer interferência externa, como regulamentação, por exemplo. A obrigatoriedade de participação no plano das empresas empregadoras está diretamente relacionada à discussão levantada sobre o plano empresa ser um benefício da empresa ou não. Este é um dos temas que vão ser aprofundados no próximo capítulo. No entanto, vale apontar que, a partir do momento em que o trabalhador é obrigado a participar do programa de assistência médico-hospitalar, em tese, deveria ter poder de decisão quanto à sua estrutura. Isto é, o trabalhador passaria da categoria “beneficiário puro” para “beneficiário consumidor”, protegido de alguma forma contratual. No presente trabalho, entende-se que não se trata de um benefício da empresa, e sim de salário indireto. E, sendo salário indireto, é complementação salarial, o que dá direito ao trabalhador de opinar sobre a forma como recebê-la. Assim, nos casos em que a compulsoriedade da participação do trabalhador no plano/seguro de saúde da empresa se estende à contribuição financeira, mesmo que parcial (como é o caso da empresa B), supõe-se que os beneficiários possam decidir e resolver sobre todos os aspectos do plano/seguro de saúde contratado, incluindo-se amplitude da cobertura do plano, financiamento, rede credenciada, qual a operadora a ser contratada, etc., e, inclusive, em que moeda deseja receber o salário. Já no caso da empresa A, em que o trabalhador é obrigado a participar do plano, mas não a contribuir financeiramente (o financiamento é realizado integralmente pela parte patronal), sugere-se ser mais compreensível o fato de a empresa oferecer uma única modalidade de assistência médico-hospitalar. Será? Na empresa C o trabalhador contribui, entretanto não é obrigado a participar do plano/seguro de saúde escolhido pela empresa. Mesmo assim, embora possa participar do processo consultivamente, da mesma forma que nas demais empresas, os compõe a idéia de que a A e a B têm suas estruturas mais fechadas, mais imóveis. 74 trabalhadores da empresa C também não pode deliberar acerca das dimensões do plano privado de assistência à saúde que utiliza. Ou seja, neste conceito de consumidor utilizado nos planos coletivos, o usuário participa mas não delibera sobre seu objeto de consumo, tampouco sobre as formas de consumi-lo. 2.5.2 – Prevenção à Saúde, Saúde Ocupacional e Assistência MédicoHospitalar Aqui são compreendidas, dentre outras mais, as características relacionadas à infra-estrutura da empresa para proporcionar a atenção à saúde. Um dos setores estratégicos neste campo é o de recursos humanos, comumente chamado de Departamento Pessoal, que administra e implanta as políticas de saúde na empresa, além de ser o locus de diálogo entre empregador e empregado. Uma abordagem conveniente para o entendimento da relação entre este setor e a assistência à saúde recebida pelo trabalhador é buscar saber seu horário de funcionamento, se coincide com o horário de trabalho dos trabalhadores do turno diurno e, caso positivo, qual o meio de comunicação com os do noturno. Também é o setor de recursos humanos que determina as funções e o funcionamento do setor médico da empresa. Todas as três empresas possuem setor médico, entretanto, com estrutura física variada. Ressalta-se que foi reconhecida a diferença de infra-estrutura disponibilizada para os trabalhadores dos diferentes turnos, invariavelmente, nas três empresas estudadas. Com exceção da empresa C, a infra-estrutura do setor médico somente está plenamente disposta à utilização no turno diurno, o mesmo valendo para os recursos humanos que lá trabalham. Como não é objetivo dessa pesquisa avaliar as condições físicas do setor médico para exercer as atividades relacionadas à saúde dos trabalhadores, buscou-se dar ênfase à compreensão das relações estabelecidas entre o setor médico e o plano/seguro de saúde, administradas em grande parte pelo setor de recursos humanos. Constatou-se que as empresas A, B e C administram e proporcionam assistência à saúde de seus trabalhadores de forma nitidamente diferenciada, o que será objeto da discussão a seguir. 38 Os eventos que representam alto custo podem ser cobertos por outro contrato que o do plano/seguro de saúde. Na empresa B, por exemplo, são realizadas complementações ao plano/seguro de saúde (convênio farmácia, etc.) que, em casos de não cobertura, a empresa pode analisar o histórico individual e conceder apoio financeiro, etc. 75 Na empresa A, as ações de saúde ocupacional são realizadas pela equipe do SESMT; entretanto, o dirigente do RH vem investindo na transferência da execução desses serviços para o setor médico, que é administrado e financiado pela operadora do convênio médico-hospitalar desta empresa. Mais uma função deste setor é ser a “porta de entrada” para que os trabalhadores possam vir a utilizar a rede credenciada. Também é o setor médico que realiza os exames pré-admissionais e periódicos. Em relação à prevenção em saúde, pela fala dos informantes supõe-se haver uma certa descrença: foi realizada campanha de esclarecimento de AIDS somente uma vez, além do que, praticamente não são citados programas preventivos, o que leva à hipótese de que sejam poucos. O fato de o setor médico da empresa A ser subordinado à operadora de plano e seguro de saúde e, ao mesmo tempo, responder às demandas do setor de recursos humanos, induz à idéia de que esta empresa procura maximizar o controle da mão-deobra ao unir os órgãos que proporcionam os serviços de saúde sob sua hierarquia num mesmo lugar físico – o Setor Médico – que vai gerar relatórios para o setor de RH. Na empresa B, o setor médico realiza, principalmente, os atendimentos de urgência e emergência, e parte dos relativos à saúde ocupacional (vacinação gripe, próstata, colesterol, audiometria e acidentes do trabalho). O restante das ações de saúde ocupacional é realizada diretamente pelo convênio médico-hospitalar (saúde bucal, exames periódicos e pré-admissional e eletrocardiograma), e depois analisada pelo médico coordenador do setor médico que dirá se o trabalhador está “apto ou inapto a trabalhar”. O setor de recursos humanos desta empresa vem se empenhando para que todas as ações preventivas passem a ser realizadas por uma das operadoras que proporciona planos e seguros de saúde aos trabalhadores desta empresa (e que já realiza a maior proporção de ações preventivas). É importante notar que o médico do setor médico queixa-se da não integração e cooperação do dirigente do RH quanto à prevenção, que por este motivo “praticamente não são realizados programas de prevenção (...) falta apoio da empresa e tem preguiça do funcionário e sobrecarga da produção”. Além do que, há exames obrigatórios pela legislação trabalhista, que não são realizados, como a prevenção ao tabagismo, porque a “empresa produz filtro de cigarro, né”. Nesta empresa, o médico coordenador do setor médico é diretamente contratado pela empresa, 76 e a enfermeira é recurso humano da operadora do plano/seguro de saúde, ou seja, há uma clara cooperação entre operadora e setor médico neste caso. Na empresa C, toda a prevenção em saúde é realizada pelo setor médico, que também responde pela saúde ocupacional. São feitas diversas campanhas (alcoolismo, câncer de mama e próstata, pré-natal, AIDS, acidente do trabalho, saúde da mulher, auditiva, diabetes e dependência química). Da mesma forma que ocorre com os beneficiários da empresa B, os da empresa C podem ir diretamente à rede credenciada quando o desejarem. A utilização dos serviços da operadora de plano/seguro de saúde da empresa C é totalmente desvinculada do setor médico. 2.5.2.a –Informações ; Utilização e Qualidade dos serviços Outra característica também pesquisada é sobre quem, de fato, utiliza os serviços do plano/seguro de saúde. Embora não tenham sido disponibilizados os dados da utilização por tipo de usuário em nenhuma das empresas, supõe-se que nos eventos simples, que não impliquem em internação hospitalar, os empregados – titulares do plano/seguro de saúde – geralmente são atendidos pelo próprio setor médico da empresa, ou seja, o atendimento se dá no interior da empresa (empresas A, B e C), isto é, no local de trabalho. Nesse raciocínio, é a família do trabalhador – seus dependentes – que vai utilizar a rede credenciada diretamente39 . Enfim, na empresa A, o empregado utiliza setor médico que é do convênio, e seus dependentes a rede credenciada. Na empresa B, os empregados utilizam principalmente o setor médico da empresa, provavelmente em menor quantidade que na empresa A, já que os trabalhadores do turno noturno não têm que passar pelo setor médico para serem referidos à rede credenciada. Na empresa C, os empregados utilizam o setor médico e a rede credenciada provavelmente da mesma forma que na empresa B. Quanto à posse e análise das informações sócio-epidemiológicas e de utilização dos serviços, as empresas também se mostram diferenciadas. No caso da empresa C, o setor médico responde diretamente ao de recursos humanos que, por sua vez, possui tanto os relatórios do setor médico, como os da 39 Em outros tempos, a empresa A, que estabelece o setor médico como sendo a porta de entrada para o funcionário utilizar a rede credenciada, o fazia também para os dependentes, que tinham que pegar o mesmo meio de transporte que o empregado (um ônibus que leva os funcionários à empresa, situada em local de difícil acesso), de madrugada, ser atendido pelo setor médico e, então, encaminhado – ou não – à rede credenciada. Sem o que não havia como ter acesso aos serviços da rede. 77 operadora do convênio médico-hospitalar, tendo, portanto, um sistema de informações sócio-epidemiológicas complexo, a partir do qual são elaborados indicadores de análise dos custos da assistência à saúde da empresa para cada empregado, bem como da situação de saúde do trabalhador. No caso da empresa A, também existe um sistema de informações, viabilizado pelo conhecimento, por parte da operadora do convênio médico-hospitalar, de todas as ações realizadas por acumular a função de administradora do setor médico que fica no interior da empresa. Entretanto, este sistema é menos complexo que o da empresa C; os indicadores não são previamente elaborados e a análise feita pelo setor de recursos humanos parece visar mais ao controle da produtividade dos funcionários que à real situação de saúde destes. Pode-se supor que a operadora do plano/seguro de saúde tenha um sistema de informações mais complexo que não atinge, contudo, o grau de especificidade que poderia, o conhecimento dos dirigentes de RH. Os relatórios da empresa B praticamente não são utilizados: como uma das operadoras (Y) responde à matriz da empresa e não à unidade visitada, esta não possui informações daqueles trabalhadores que utilizam os seus serviços. A unidade visitada também não consegue requisitar os relatórios à operadora por si diretamente contratada (X). Chama a atenção que, embora a empresa tenha diversas modalidades de plano/seguro de saúde, o dirigente de RH não tenha domínio sobre os dados obtidos, elaborando tabelas das quais não soube explicar grande parte do conteúdo durante a visita à empresa. Não são construídos indicadores a partir dos dados epidemiológicos nesta empresa. É curioso que o setor médico ainda está em fase inicial de informatização de seus dados, de modo que não são automaticamente cruzados com os da operadora. De acordo com o informante, no dia-a-dia o RH tem de mesclar informações manuscritas e orais com as informatizadas da operadora, o que não parece ser feito com êxito. Pode-se afirmar, portanto, que nenhuma das empresas realiza qualquer tipo de supervisão da qualidade do serviços utilizados por seus empregados. Isso, aliado à informação de que a grande parte das operadoras de plano/seguro de saúde não tem conhecimento do grau de atualização profissional de seus médicos credenciados, implica num alarmante desconhecimento da qualidade dos serviços utilizados pelos trabalhadores, ou seja, da atenção à saúde recebida por esta população. Ou seja, a argumentação de que o setor de planos e seguros de saúde no Brasil atenda à população 78 com mais qualidade do que os serviços públicos não pode ser provada. É fato que a sobrecarga da demanda em relação à capacidade de oferta de grande parte dos serviços públicos é assustadora, contudo o acesso ao serviço é diferente da qualidade da atenção à saúde como um todo. Quando acontece algum acidente do trabalho, a emissão do comunicado (CAT) é feita pelo próprio setor médico nas empresas A e B. O dirigente da empresa C disse que quando ocorre acidente do trabalho, o trabalhador é encaminhado ao Centro de Referência de Saúde do Trabalhador (CRST) da região, que emite o CAT. Este é o único momento de todas as entrevistas em empresas em que se falou na utilização de serviços públicos de saúde, mesmo que para emissão de CAT. 2.5.3 – Cobertura e Financiamento A cobertura e financiamento dos planos/seguros de saúde também são diferentes em cada empresa estudada. Na empresa A existe um único formato de convênio médico-hospitalar para os 2 mil usuários do plano, administrado por uma mesma operadora. Este sistema é destinado a todos os funcionários da empresa, independentemente de seu grau hierárquico, seja da categoria profissional ou da faixa salarial. Para utilizar a rede credenciada, os empregados são obrigados a passar pelo setor médico. É provável que este procedimento induza à maior utilização dos serviços ambulatoriais e laboratoriais pelos dependentes dos trabalhadores na assistência, o que poderia ser comprovado com a informação da utilização dos serviços pelos titulares e dependentes (que não foi disponibilizada pelo informante). Não são cobertos atendimentos odontológicos e, quanto à utilização dos serviços, há mecanismos de restrição, como o intervalo de, no mínimo, 6 meses entre uma consulta ginecológica e outra. Ainda é estabelecido fator moderador, pelo co-pagamento, para atendimentos psiquiátricos. Os custos desse plano são integralmente pagos pela empresa, significando R$ 40,00 per capita mensais que representam em torno de 2% do faturamento da empresa e 9 a 10% de sua folha nominal, que são classificados como custos operacionais, portanto integralmente deduzidos do IRPJ devido. Na empresa B, foram verificados três formatos diferentes de convênio médicohospitalar a serem escolhidos pelo trabalhador. Além desses, há outros dois, destinados aos eventos que representariam alto custo à empresa. Há, também, outro contrato, para serviços odontológicos. O modelo da assistência médico-hospitalar proporcionada por 79 esta empresa aos seus trabalhadores pode ser definido por diversos critérios: contributividade (funcionário tem que contribuir mais quanto mais incrementado for o plano); nível hierárquico (plano de cobertura de alto custo tem financiamento diferenciado para cargos de gerência e demais trabalhadores), rede credenciada (quanto maior for “nível” do plano/seguro, mais prestigiados e em maior quantidade são os estabelecimentos disponíveis para utilização) e, por último, utilização (co-pagamento para consultas ambulatoriais no caso da operadora Y, que oferece o plano executivo). Os custos desses formatos também são diferenciados de acordo com estes padrões. O plano básico da operadora X, destinado a 267 usuários, custa R$ 28,00 mensais per capita, pagos pela parte patronal. O plano intermediário, oferecido pela mesma operadora, custa R$ 10,00 a mais, pagos pelos 148 usuários que optaram por esta modalidade (o plano básico se diferencia do intermediário na possibilidade de internação em quarto individual). Já o plano executivo, que é administrado pela operadora Y, é destinado a 207 beneficiários, e custa mais que as opções da outra operadora (X). São R$ 250,00 mensais per capita, financiados por empregado e empregador (40% e 60% respectivamente), acrescidos do co-pagamento (2/3 do valor de cada consulta ambulatorial realizada, tabela AMB). O montante gasto com assistência médicohospitalar, por esta empresa, representa 14% de sua folha de pagamento e, da mesma forma que a empresa A, é declarado como custo operacional na dedução do IRPJ devido. Como a empresa A, a C também contratou apenas uma empresa para operar a assistência médico-hospitalar. Todavia, estrutura e financiamento são diferentes, havendo 3 modalidades de planos para diferentes usuários. O principal é o plano Especial, com 1850 beneficiários, utilizado pelos trabalhadores efetivos e seus dependentes (os titulares somam 550, os demais são dependentes). Este plano cobre todos os eventos. O plano é não contributário, mas realiza-se co-pagamento da cobertura utilizada: 15% consulta ambulatorial e odontológica, 10% exames laboratoriais, mas não é realizado nas internações hospitalares. O usuário realiza co-pagamento até o teto de R$ 78,00. Despesas acima desse valor são pagas pela empresa40 . 40 Para casos considerados excepcionais, quando o custo dos exames laboratoriais for elevado, a empresa estuda a possibilidade da não realização do co-pagamento. 80 Além deste, há o plano destinado aos estagiários da empresa (média de 10 estagiários/mês), que se distingue pela não cobertura de eventos odontológicos e de internação em quarto individual. O terceiro formato de plano é para os agregados (pai e mãe de trabalhadores), diferenciado pelo alto custo que a população usuária representa41 . O financiamento do convênio médico-hospitalar da empresa C é inovador na região, composto por um “pool” de quinze empresas, que permite a diluição do risco financeiro. Paga-se uma quantia previamente estabelecida por indivíduo inscrito no programa, referente aos gastos administrativos da operadora. Além desta taxa administrativa, paga-se por evento realizado: soma-se os valores dos gastos de todas as empresas do pool e, posteriormente, rateia-se os custos, de acordo com o número de inscritos por empresa. Os planos básico e especial custam à empresa R$ 37,00 mensais per capita. Os beneficiários realizar co-pagamento quanto utiliza os serviços. O entrevistado comparou o preço do plano com o que considera que seria equivalente a seu valor no mercado – “o mesmo plano custaria R$ 425,00 por usuário sem o pool de empresas”. Os gastos da empresa C significam 7% da folha de pagamento da empresa e, segundo o dirigente do setor de RH, podem ser deduzidos do valor do IRPJ devido até 25% dos gastos realizados com convênio médico-hospitalar. Nenhuma dessas empresas possui critérios de análise da qualidade dos serviços oferecidos pela rede credenciada. Mas a conceituação da operadora no mercado de planos/seguros saúde foi citada como determinante, quando da escolha, por todos os entrevistados. 2.5.3.a - Financiamento do plano, Transferência do risco Com a contratação de operadoras de plano/seguro de saúde, o risco quanto à possíveis perdas financeiras das empresas empregadoras com a atenção à saúde de seus empregados e dependentes pode ser mais ou menos transferido, dependendo do contrato realizado. Na empresa A, este risco é integralmente transferido para a operadora de plano/seguro ao serem estabelecidos os R$ 40,00 fixos mensais per capita pagos pela parte patronal. 41 Por dificuldades na obtenção de informações, não foi possível verificar a cobertura, preço e custo do plano dos agregados. 81 A empresa B contrata diversas operadoras. No caso das modalidades menos requintadas, o risco é totalmente transferido para a operadora – pré-pagamento de R$ 27,29 mensais per capita no plano básico, integralmente pagos pela empresa, acrescidos de R$ 10,00 pagos para internação apartamento individual, pagos pelo usuário no plano intermediário – como ocorre com a operadora X. Com a operadora Y, a empresa B retém o risco dos custos mas não integralmente; divide-os com os funcionários da unidade e seus dependentes (pós pagamento, 60% patronal e 40% do usuário 42 ) e rateia este risco com os demais usuários das outras unidades da empresa. O risco dos custos com a assistência odontológica são integralmente transferidos para a operadora (R$ 6,50 mensais per capita). No caso do sistema de livre-escolha para utilização da rede credenciada para aqueles eventos de alto custo, a empresa não transfere o risco à operadora, entretanto divide-o com o empregado, de acordo com sua posição hierárquica, ao reembolsar 50% dos gastos com internações clínicas e hospitalares feitos pelos funcionários em geral e 80% para os cargos de gerência e os superiores. A empresa C, contudo, retém o risco financeiro mas o divide com outras quatorze empresas, ou seja, foi definido um valor fixo mensal referente aos custos administrativos da operadora (R$ 37,00 mensais per capita), estabelecido co-pagamento de consultas ambulatoriais e exames laboratoriais como forma de contenção de sua utilização e é efetuado o pagamento após realizado o uso do serviço (no caso de internações hospitalares é integral). Assim, o risco não é transferido à operadora, mas retido e “diluído” entre as quinze empresas que constituem o pool – juntas totalizam 10 mil usuários. Dada a inflação dos gastos médico-hospitalares, juntamente com a contenção de custos das empresas na década de 1990, o fator moderador, concebido para a moderação da utilização de serviços de saúde tende a ser cada vez mais empregado, como é o caso das empresas B e C. Quando a empresa opta por um plano/seguro cujo caráter é mais securitário que mutualista, além de transferir o risco financeiro, também está se livrando da dificuldade de, para falar a linguagem dos entrevistados, barganhar com a rede credenciada, aspecto de caráter não apenas financeiro como também administrativo, como é o caso das 42 Ainda há o co-pagamento de 2/3 de cada consulta realizada para contenção da utilização que vinha aumentando em 1999. 82 empresa C e A, que administravam a assistência médico-hospitalar e passaram a contratar operadora para tanto. A dificuldade administrativa envolve outras questões como a análise dos gastos e custos apresentados pela rede credenciada. O dirigente de recursos humanos da empresa C relatou que havia momentos em que tinha que procurar amigos médicos para perguntar se para determinado evento se utilizava a quantidade de esparadrapo apresentada em conta hospitalar de estabelecimento credenciado. Ou seja, a administração do plano/seguro requer uma equipe diversificada de profissionais especializados. O outro problema decorrente da falta desses profissionais é que seriam eles as pessoas mais indicadas para elaborar um sistema de informações sócio-epidemiológicas e analisar tais informações de forma que permitisse orientações a ações preventivas em relação à saúde dos trabalhadores da empresa. Porém, a busca por um sistema de informações não necessariamente se resolve dessa forma. Esse mesmo entrevistado da empresa C, por exemplo, observou que a operadora de plano/seguro de saúde contratada vem passando por reestruturação interna, o que teria diminuído a sua eficiência em relação aos relatórios de utilização, a ponto de a empresa C estar analisando a possibilidade de mudança de operadora, já que a contratada “demora e não entrega os relatórios, inclusive de custos”. Desse modo, os motivos de mudança de operadora ou de modalidade do plano/seguro são basicamente os mesmos nestas empresas estudadas. Deve ser ressaltado o poder de interferência dos profissionais que trabalham no setor médico das empresas quanto à mudança do modelo de atenção à saúde destas. Na empresa A, a mudança parece ter se dado por dificuldades administrativas da empresa, aliada à saída do médico coordenador do setor médico, que passou a fazer parte do quadro da operadora atualmente contratada. A proximidade de relações do médico, coordenador da assistência à saúde provida no interior da empresa, com a operadora de plano/seguro de saúde, posteriormente contratada, não é exclusividade da empresa A. O médico da empresa B arrendou o laboratório que, até 1987, pertencia à empresa. Este laboratório, então posse do médico, passou a ser contratado por intermédio da operadora X, contratada para os planos básico e intermediário. Estes fatos indicam que há relação direta entre o médico coordenador da atenção à saúde no interior da empresa com a operadora contratada que, 83 visto pelo lado do mercado de planos/seguros saúde permite a suposição de que há operadoras com acionistas que já foram médicos no interior de empresas. 2.5.4 - Considerações acerca da estrutura do plano em função da administração, financiamento e utilização Na empresa B, as mudanças da estrutura do plano/seguro de saúde parecem sofrer influência das mudanças administrativas do quadro da empresa. O fato de a empresa ter delegado autonomia para as unidades administrarem seus próprios modelos fez com que a unidade visitada passasse por um processo de adaptação, estando em estudo novas mudanças para o formato. Além da opção de reembolso do chamado “livre-escolha”, administrado pela própria empresa empregadora, a assistência médicohospitalar que é administrada por 3 operadoras (X, Y, e operadora que administra o contrato do plano odontológico), que ofertam, ao todo, 4 modalidades, provavelmente passará a ser oferecida por uma única operadora43 . Entretanto, uma questão fundamental do modelo estará preservada, a hierarquização do plano, ou seja, haverá diversas modalidades de plano/seguro de saúde, com cobertura e financiamento diferenciados de acordo com a categoria do usuário (se o titular é gerente, operário, chefe de serviço, etc.). Assim, supõe-se que a rotatividade de modalidades de plano/seguro de saúde e/ou de operadoras que a administram é freqüente nas empresas, uma característica coerente com um mercado que visa, até mesmo para sua sobrevivência, antes da saúde em si, ao equilíbrio dos gastos e do faturamento que resulta em lucro. A mudança de plano da empresa A pode servir como exemplo de poder decisório do setor de recursos humanos da empresa (foi o setor de RH que encomendou a uma corretora um estudo sobre preços, rede e cobertura, e foi o próprio dirigente dos recursos humanos que “projetou cenários” possíveis dentro das imposições da Lei n. 9.656/98 e, posteriormente, definiu o novo formato). Ademais, o papel de mediador do usuário, do provedor e do administrador, exercido pelo RH, foi verificado em todas as empresas. Conforme sugerido no capítulo 1, nas empresas-casos constatou-se ser o setor de RH, que administra os custos da produtividade no que se refere à saúde do trabalhador, 43 Outro fator determinante na escolha da operadora é a imposição da oferta no mercado. O entrevistado contou que entre as mudanças de plano para o ano 2000, a exclusão da operadora X é uma das metas a serem atingidas já que sua escolha não teria sido feita pela empresa (demandante), e sim por “falta de opção”. 84 que expressa a política de recursos humanos que determina o modelo de atenção à saúde do trabalhador, que dialoga com a operadora de plano/seguro de saúde, que orienta os profissionais médicos nos exames pré-admissionais e no tempo limite de afastamento de o trabalhador adoentado/acidentado. É este setor que define o que fazer no caso do trabalhador que apresenta recuperação lenta ou m i provável, custosa para a empresa e para a operadora de plano/seguro de saúde. 2.5.4.a – Financiamento O financiamento da assistência médico-hospitalar pode ser definido de acordo com a categoria do empregado ou não. A empresa A financia integralmente a assistência para todos os trabalhadores efetivos, sem distinção. Entretanto, a empresa C diferencia o financiamento do plano destinado aos estagiários44 daquele aos empregados com vínculo empregatício. Da mesma forma que com a assistência médico-hospitalar, nesta empresa é feita diferenciação nos demais tipos de benefícios, como carro, combustível, etc., para cargos de gerência. As diferentes modalidades de assistência médico-hospitalar, disponibilizadas pela empresa B, podem ser caracterizadas pela contribuição realizada pelo participante e pelo nível hierárquico em que o trabalhador se situa na empresa. A modalidade de “livre-escolha”, nome do plano que cobre os eventos de alto custo, é diferenciada para a gerência, que paga menor porcentagem no valor de contribuição – conforme comentado nas Páginas 65 e 66, a empresa reembolsa 50% dos gastos com internação clínica e cirúrgica para os funcionários em geral, enquanto que, para aqueles que possuem cargo de gerência, o reembolso é de 80% dos gastos. Neste caso pode-se afirmar que, a partir do instante em que a empresa financia uma maior parte do plano para os gerentes, a alta hierarquia desta empresa é financiada pela baixa, isto é, o financiamento tem caráter regressivo. Além de terem sido verificados os casos de financiamento da modalidade da alta hierarquia de trabalhadores pela baixa, deve-se apontar a inexistência de financiamento intergeracional. No caso da empresa C, por exemplo, o plano dos agregados desvinculou-se do planão dos funcionários. Dessa maneira, o alto custo que antes era distribuído entre os usuários, passa a ser assumido somente por quem o representa, que é a população idosa (agregados). Supõe-se que o que move tal mudança é a idéia do “salve-se quem puder”, ou seja, ao invés da solidariedade entre os que gastam mais e o 85 que gastam menos, definiu-se que, por cada beneficiário, paga-se o que a faixa etária em que este se enquadra representa. É semelhante o que ocorre no caso da empresa B, que excluiu o plano para agregados de seu cardápio em função do alto custo que representavam. A sobreposição do setor público e do privado de saúde foi nitidamente expressa pelo dirigente de RH desta empresa, quando perguntado sobre que serviços os pais dos trabalhadores passariam a utilizar quando necessitassem: “Collor criou o SUS”. A partir da universalidade, as empresas poderiam se aliviar do custo dos agregados45 , que foi o que a empresa fez em 1996. 44 Estes usuários não realizam qualquer contribuição, nem mesmo co-pagamento. Vale notar que o dirigente não soube associar a data da implementação do SUS, tampouco o presidente na época em que a empresa mudou a estrutura da assistência médico-hospitalar oferecida. 45 86 CAPÍTULO III: O M ODELO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE E O M UNDO DO TRABALHO No início deste trabalho, falou-se acerca do modelo de seguridade social brasileiro, na efetividade de suas respostas às necessidades da população brasileira, em especial os trabalhadores. Defendeu-se a idéia de que o atual modelo permite a geração e difusão de propostas como a da privatização do seguro do acidente do trabalho, a da diminuição dos encargos sociais trabalhistas, etc., que não resolvem o problema fundamental que está na forma como se dá as articulações na estrutura desse modelo, não atingindo as questões de redistributividade e eqüidade deste sistema. Conforme dito no primeiro capítulo, o trabalhador acidentado ou adoentado em decorrência do trabalho, pode receber, no âmbito da Previdência, os benefícios que forem cabíveis, que teoricamente repararão o dano ocorrido. Assim, o Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS) se encarrega da administração, execução e pagamento dos benefícios para os formalmente empregados. Entretanto, a assistência à saúde, diz respeito a uma atenção diferente daquela dos benefícios relacionados ao acidente do trabalho, e fica no âmbito do setor Saúde, isto é, é o Ministério da Saúde que gerencia a prestação dos serviços. A assistência à saúde engloba outras coisas, e é legalmente amparada por vasta legislação no sentido de garantir a efetividade dos princípios básicos do Sistema Único de Saúde (Constituição Federal de 1988, Lei n.º 8.080 de 1990, Norma Operacional Básica de 1996, entre outras normatizações). Contudo, essas distintas formas de amparo social não se integram. Todo esse sistema, que engloba as questões da saúde, bem como as da seguridade, envolve também a área do Trabalho, representada no governo pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que é o órgão responsável pelo estabelecimento das Normas de Regulamentação e Fiscalização do Trabalho. Deve ser mais uma vez ressaltado, o fato do financiamento da assistência à saúde prestada pelo Sistema Único de Saúde não estar vinculado ao do seguro do acidente do trabalho. Ou seja, o atual modelo permite ao cidadão a assistência à saúde independente de sua contribuição ao sistema de seguridade social, graças a um dos princípios norteadores do SUS que é a universalidade. 87 Na segunda parte deste trabalho, foram mostrados os resultados obtidos com as empresas estudadas na pesquisa de campo, que dizem respeito principalmente à: ü especificidade dos setores de Recursos Humanos das empresas quanto ao poder de definição e execução das políticas de benefícios concedidos ao trabalhadores, entre elas a assistência à saúde; ü variedade de formas de acesso aos benefícios oferecidos pela empresa empregadora, particular a cada uma, e a conseqüente diferenciação dos benefícios oferecidos aos trabalhadores de uma mesma empresa, determinada pela categoria profissional, contrato de trabalho; ü mudança do quadro de empregados das empresas estudadas no decorrer da década de 1990, que passaram a contratar grande parte de seus trabalhadores de forma terceirizada, e o conseqüente desconhecimento por parte dos setores de recursos humanos da cobertura social destinada aos trabalhadores terceirizados já que estes não recebem os mesmos benefícios que a empresa dispõe aos seus trabalhadores diretamente contratados; ü dificuldade de atuação governamental em relação à grande parte da assistência ofertada pela empresa empregadora por planos privados de assistência à saúde, já que não consta do contrato de trabalho, sendo denominada de “benefício social”; ü incompatibilidade nas definições entre consumidor e usuário de plano de saúde empresarial, pois o contrato é celebrado entre a empresa empregadora e a empresa operadora de plano privado de assistência à saúde, enquanto que quem utiliza os serviços e, muitas vezes, co-financia o plano, é o trabalhador e seus dependentes (o usuário dos serviços é consumidor do serviço, mas não o é do plano?), o que dificulta, inclusive, os direitos do usuário nas definições do plano do qual participa, pois é o “consumidor oficial” que pode opinar, alterar, enfim, definir o produto a ser consumido; ü obrigatoriedade de participação do trabalhador no plano da empresa; ü papel exercido pelo Setor Médico de cada empresa, onde se mesclam diferentes atividades, ora relacionadas às questões concernentes ao Ministério do Trabalho e Emprego (o prescrito na normatização), ora relacionadas à assistência à saúde, ora de intermediação entre o funcionário e a empresa de plano de saúde, entre outras; 88 ü financiamento dos recursos humanos do setor médico (se são financiados pela empresa de plano de saúde, à que instituição devem estes profissionais responder: à empresa do plano ou à empresa empregadora?; ü ínfima existência de ações de prevenção em saúde; ü assistência dos planos de saúde se resumir às demandas médico-hospitalares; ü não elaboração de um sistema de informações nos órgãos envolvidos, tampouco um sistema integrado de informações entre esses órgãos (setor médico da empresa, empresa de plano de saúde, Centro de Referência de Saúde do Trabalhador do município, MS, MTE, MPAS, entre outros); ü provável utilização, dos serviços do plano empresarial, com maior peso pelos dependentes do trabalhador, pela quantidade de dependentes e pela dificuldade de o trabalhador utilizar a rede credenciada durante o horário de trabalho (geralmente utilizam o setor médico da empresa); ü hierarquização do plano, em algumas empresas, em diferentes formatos, definidos pela categoria profissional do usuário e/ou pela faixa etária e/ou pela utilização e/ou pela financiamento; ü diversidade de modelos de transferência do risco financeiro da assistência à saúde privada dos trabalhadores e seus dependentes, determinadas em grande parte pelo financiamento do plano (se é pré ou pós-pagamento e se há co-pagamento do usuário)46 ; ü infinidade de formas de acesso, utilização, cobertura e financiamento dos planos de saúde empresariais; ü dificuldade na negociação da empresa empregadora com a rede de estabelecimentos de saúde, aliada ao obstáculo que significava gerenciar o plano que, em alguma medida, levou empresas (comumente conhecidas como autogestão) à mudança do formato do plano, buscando intermediação da empresa operadora de plano de saúde; ü inexistência de critérios de aferição da qualidade da assistência à saúde proporcionada pelas empresas empregadoras aos seus trabalhadores, tampouco 46 Vale lembrar que os conceitos de securitarismo e mutualismo aqui utilizados são os desenvolvidos por BAHIA, 1999. 89 daqueles serviços oferecidos pela rede hospitalar credenciada47 e utilizados pelos trabalhadores e dependentes; ü aparente desconhecimento dos dirigentes das empresas empregadoras dos direitos de cidadão do trabalhador de utilização dos serviços públicos de saúde, junto à idéia negativa da qualidade destes; ü alta rotatividade de empresa de plano de saúde contratada pela empregadora ü freqüente existência de mais de uma de empresa de plano de saúde contratada pela mesma empresa empregadora e; ü proximidade de relações do médico coordenador da assistência à saúde provida no interior da empresa (setor médico) com a empresa de plano de saúde, sugerindo poder de determinação na escolha de qual empresa é contratada. Em vista das discussões do primeiro capítulo, que mostraram a complexidade da estrutura social do Estado brasileiro, onde o setor saúde é desvinculado da previdência social, de forma a dificultar as ações integradas dos órgãos competentes nas questões relativas à assistência ao trabalhador48 , e do trabalho realizado em campo (segundo capítulo) que, em apenas três empresas empregadoras estudadas foi verificada uma infinidade de formas de administração e provimento de assistência ao trabalhador, com sobreposição da assistência à saúde e da ao acidente e doença do trabalho, decidiu-se buscar o aprofundamento destas questões através da observação de aspectos do modelo político-econômico-social e institucionais da sociedade brasileira neste atual momento. Obviamente, os caminhos pelos quais o país “peregrina” estão inseridos num contexto maior que é relativo ao seu posicionamento perante a tendência dos acontecimentos internacionais. 3.1 – O modelo assistencial de saúde brasileiro e o papel do Estado A partir da década de 1920, a assistência à saúde feita aos trabalhadores do Brasil sempre esteve envolvida com a Previdência Social. A começar pelas Caixas de Aposentadorias e Pensões, organizada por categorias profissionais e financiadas por 47 Se as empresas de plano de saúde não têm critérios de acreditação hospitalar, o que dizer da (in) existência de critérios de conhecimento dos demais estabelecimentos de saúde (laboratórios, clínicas radiológicas, etc.). 48 É bom deixar claro que não está se defendendo a (re) vinculação da saúde à previdência, recompondo o “bolo” da seguridade, apenas está se comentando algumas mazelas do modelo deste sistema. 90 empregados e empregadores, que davam cobertura previdenciária e à saúde para os trabalhadores. Na década de 1930 começaram a ser criados os Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs), que proviam a assistência à saúde às diversas categorias de trabalhadores, então com financiamento também por parte do Estado – anterior aos IAPs, as CAPs tinham a obrigatoriedade de prover a assistência médico-hospitalar aos trabalhadores, porém sem a participação do Estado como mais um financiador. De acordo com MENDES (1993), este teria sido o modelo de assistência à saúde que vigorou até os anos 80. Mudanças teriam ocorrido com o período de desenvolvimento do país, marcado pelo processo de industrialização da década de 1950 do qual se estruturou um pólo industrial nos grandes centros urbanos, cujo peso na economia do país pode ser verificado até os dias atuais. Obviamente o modelo de saúde vigente não daria conta das necessidades do empresariado para com o estado de saúde de seus trabalhadores já que estes são determinantes na capacidade produtiva industrial. Unificados, na década de 1960 os IAPs são “transformados” no Instituto Nacional da Previdência Social (INPS, criado em 1966), que juntou a si a responsabilidade por todos os benefícios relativos à questão previdenciária. Essa centralização levou a conseqüências como a expansão da assistência à parcelas da população antes não atendidas (população rural, empregadas domésticas e autônomos), embora não assegurando a qualidade da assistência à saúde prestada (MENDES, 1993, OLIVEIRA et allii, 1986). Em 1974 foi implantado o Plano de Pronta Ação (PPA), que interferiu nas relações de compra entre a Previdência e seus prestadores, ao instituir os pagamento por serviços prestados ou por convênio subsidiado. Juntamente com os recursos do Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social (FAS), estes programas teriam influenciado fortemente na consolidação de um modelo definido por um Estado que, através da Previdência Social, foi o regulador/mediador da compra dos serviços, sendo estabelecido um modelo que permitiu incentivos estatais ao complexo médicoindustrial, inclusive o fortalecimento da prática médica curativa individualizada, assistencialista e especializada. É consenso dizer que esse modelo teria desembocado numa cultura da prática médico-hospitalar voltada ao lucro ao privilegiar o produtor privado dos serviços de saúde. Teria, inclusive, incentivado a forma de prestação de 91 serviços organizada em empresas médicas (LUZ, 1979, BAHIA, 1999, OLIVEIRA et allii, 1986, MENDES, 1993). Este modelo supriu, em alguma medida, da demanda do empresariado de garantir a assistência à saúde para seus trabalhadores – assistência já incipiente desde as CAPs, década de 20, e depois “empresas estatais (que) surgiram com esquemas de assistência à saúde privados acoplados a seus departamentos de recursos humanos (...) posteriormente multinacionais e empresas nacionais de grande e médio porte principalmente as localizadas em São Paulo adotaram convênios com empresas de medicina de grupo e cooperativas médicas (...)” (BAHIA, 1999:35). Entretanto, o modelo não dá conta da assistência integral à população brasileira. Assim, ao se ampliar o foco de análise, não se pode deixar de assinalar que o aumento da disponibilidade de acesso aos serviços de saúde à população brasileira após a unificação dos IAPs não foi acompanhada de uma disponibilização eqüânime do acesso à esses serviços. E essa diferenciação nas formas de acesso aos serviços de saúde teria se consolidado na década de 80, processo por FAVARET denominado de “universalização excludente” (FAVARET et allii, 1990). Posteriormente, é criado o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) que administrava a contratação de serviços privados. Na década de 1980, juntamente com o Conselho Nacional de Administração da Saúde Previdenciária (CONASP), o INAMPS começou implantar uma nova forma de administração dos serviços reestruturando-os em categorias, de forma progressivamente descentralizada, dividindo as responsabilidades com as Secretarias Estaduais de Saúde (SES). Na década de 80 também aparecem as Ações Integradas em Saúde (AIS) e é constituído o Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS, 1987) que a grosso modo enxuga a direção geral do INAMPS, fazendo parte de uma política descentralizadora de acordo com os preceitos da Reforma Sanitária Brasileira. Não aparecem na pauta das políticas da década questões como avaliação, controle e regulação do setor privado. De acordo com esse raciocínio, embora a Reforma Sanitária dos anos 80 tivesse a aparência e repercussão de um projeto hegemônico, teria sido um outro projeto o que realmente se firmaria como hegemônico; este baseado na privatização, descentralização e focalização, com ênfase no subsistema privado e exercido pela fraca regulação do 92 Estado, perda de qualidade e falta de financiamento do sistema público de saúde, aumento da demanda à assistência supletiva à saúde – hoje exercida pelo mercado representado pelas operadoras de planos e seguros de saúde. O INAMPS é extinto em 1990, sendo que suas ações passam a ser de responsabilidade da Secretaria de Assistência à Saúde (SAS) do Ministério da Saúde (MS). 3.1.1 – Do desenvolvimento do setor de planos privados de assistência à saúde Para a melhor compreensão do desenvolvimento do setor de planos privados de assistência à saúde, procurou-se entender o papel do Estado. Ao considerá-lo a instância reguladora do mercado de produção de serviços de saúde durante a segunda metade deste século, atribui-lhe importante função de incentivador da prática médico-hospitalar voltada ao lucro49 . Isto certamente contribuiu para o crescimento do setor privado, permitindo a sugestão de que o Estado garante o crescimento deste setor nas décadas de 60 e 70. É importante frisar que isso foi possível graças ao financiamento a hospitais privados através de recursos do FAS; pelo credenciamento de compra de serviços pela Previdência, induzindo à realização da assistência médica na rede credenciada e; pelos convênios entre INPS e empresas de modo que o INPS ficasse desobrigado de prestar assistência aos empregados da empresa contratante que, por sua vez, receberia subsídio para compra de serviços médicos de empresas especializadas, conhecidas por Medicina de Grupo, Grupo Médico e Empresa Médica (TEIXEIRA in: OLIVEIRA et allii, 1986). Nesse contexto, os grupos médicos têm seus custos diluídos e têm seu mercado ampliado graças ao financiamento da Previdência, ao mesmo tempo que podem se desobrigar de cobrir atendimentos de alto custo e alta complexidade. Tanto TEIXEIRA (TEIXEIRA in: OLIVEIRA et allii, 1986) como MENDES (1993) deixam claro que a prática médica se organizou de maneira a diferenciar o atendimento em função da clientela e das formas de organização da atenção médica – formas de empresariamento que correspondem ao que hoje chama-se medicinas de grupo e cooperativas médicas. Posteriormente, aparecem os seguros saúde, no Brasil associados ao setor bancário. 49 De acordo com DONNANGELO, pode-se afirmar que é a garantia de “(...) continuidade e expansão, sob controle privado, de uma rede de produção de serviços que incorpora progressivamente a tecnologia moderna; ao manter o produtor privado no controle direto dos processos de produção, conquanto limitado pela capacidade de custeio”, que confirma o papel de regulador do Estado (DONNANGELO, 1975, in: OLIVEIRA et allii, 1986:212). 93 Sintetizando, a remuneração dos serviços privados de saúde, baseada na complexidade dos serviços, teria sido determinante para o desenvolvimento do mercado privado de saúde, cuja sobrevivência teria sido possibilitada graças ao subsídio e à incorporação tecnológica. O crescimento desse setor foi desacompanhado de regulamentação específica do Estado ou da sociedade. 3.1.2 – Década de 1990 – Aspectos Legais do Modelo de Saúde Com a promulgação da Constituição Federal de 1988 (CF/88), o Brasil introduz legalmente o Sistema Único de Saúde (SUS), ainda em fase de implementação. Para tanto, a Lei Orgânica da Saúde (LOS) 8.080/1990 e 8.142/1990, e as Normas Operacionais Básicas (1991/1993/1996), definem com detalhamento o caminho legal da construção do modelo. Na legislação também estão definidos aspectos sobre a forma de atuação do setor privado, em especial o 1º parágrafo do Artigo 199 da CF/1988, e Artigos do Título III da LOS 8.080/1990. A seguir, os principais trechos da legislação diretamente relacionados a essa temática: Art. 197 São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado. Art. 199 A assistência à saúde é livre à iniciativa privada. §1º As instituições privadas poderão participar de forma complementar ao sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos. (CF/1988) Título III – Capítulo I – Art. 20. Os serviços privados de assistência à saúde caracterizam-se pela atuação, por iniciativa própria, de profissionais liberais, legalmente habilitados, e de pessoas jurídicas de direito privado na promoção, proteção e recuperação da saúde. Art. 22. Na prestação de serviços privados de assistência à saúde, serão observados os princípios éticos e as normas expedidas pelo órgão de direção do Sistema Único de Saúde (SUS) quanto às condições para seu funcionamento. Capítulo II – Art. 24. Quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área, o Sistema CF/Único de Saúde (SUS) poderá recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada. Art. 26. Os critérios e valores para a remuneração de serviços e os parâmetros de cobertura assistencial serão estabelecidos pela direção nacional do Sistema Único de Saúde (SUS), aprovados no Conselho Nacional de Saúde. § 2º Os serviços contratados submeter-se-ão às normas técnicas e administrativas e aos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), mantido o equilíbrio econômico e financeiro do contrato. (LOS 8.080) Embora a legislação seja muito ampla nas suas especificações quanto à atuação do mercado privado de saúde, está claro que esta pode ser complementar à do SUS 94 (Artigo 199, CF/88) e que são deste as diretrizes a serem respeitadas pela iniciativa privada já que "são de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao poder público (...) regulamentação, fiscalização e controle" (Artigo 197, CF/88). Assim, o SUS sofre interferência dos mais variados aspectos; uma diversidade de modelos assistenciais, de formas de financiamento e de prestação de serviços acabam se tornando um desafio ao SUS (BAHIA, BARBOSA e REIS, 1997). A assistência médica provida pelo mercado privado de saúde é realizada em grande parte pelas Operadoras de Planos e Seguros Privados de assistência à saúde. Estas podem ser caracterizadas de acordo com a clientela, a cobertura oferecida e a forma de financiamento do plano ou seguro de saúde. Estão convencionalmente definidas quatro modalidades de planos e seguros de saúde, com cobertura e faturamento diferenciados50 . Estimativa realizada através de publicações de entidades representantes das modalidades mostra que as empresas que se caracterizam como Medicina de Grupo operariam com uma fatura de US$ 4,6 bilhões. As empresas que oferecem plano próprio para seus empregados, aqui chamadas de Autogestão, teriam US$ 640,00 disponíveis por beneficiário, enquanto que as Cooperativas Médicas – que possuem uma clientela com tamanho semelhante à das Autogestões – trabalhariam com US$ 416,00 per capita. Já a população beneficiária de empresas que operam com seguro de saúde é comparativamente menor, porém geram tal fatura às seguradoras que estas teriam operado com US$ 681,00 per capita para 1997. Enquanto a esfera federal de governo dispôs de aproximadamente R$ 19 bilhões51 para a Saúde que, somados aos R$ 10 bilhões das esferas estadual e municipal, resultaram em R$ 29 bilhões para serem gastos com os 160 milhões de habitantes residentes no Brasil em 1997, ou seja, uma relação de R$ 180,00 per capita anuais, as operadoras de planos e seguros de saúde dispuseram de US$ 450,00 anuais por beneficiário (Tabela 4). 50 MENDES, 1993; ALMEIDA, 1998, REIS, 1998. De acordo com o site do MS, o valor do orçamento liberado em 1997 foi R$ 19.214.930.976. Orçamento do MS, 02/10/1998. 51 95 TABELA 4 DISTRIBUIÇÃO DO FINANCIAMENTO DAS M ODALIDADES PRIVADAS POSIÇÃO EM 1996 E ESTIMATIVA PARA 1997 Modalidade de Assistência Ano Auto Gestão Medicina de Grupo Cooperativa Médica Seguro de Saúde TOTAL Fatura (US$ bilhões) 1996 1997 4,6 6,4 3,7 4,6 3,5 4,0 3,0 3,0 14,8 18,0 Cobre (população em milhões) 1996 1997 9,0 10,0 17,3 16,0 10,0 9,6 6,0 4,4 42,3 40,0 Per capita / ano (US$) 1996 511,1 213,8 350,0 500,0 349,8 1997 640,0 287,5 416,6 681,8 450,0 Fonte: Dados de 1996: Célia ALMEIDA, A ASSISTÊNCIA MÉDICA SUPLEMENTAR NO BRASIL: PANORAMA ATUAL E TENDÊNCIAS, 1997; Dados de 1997: publicações CIEFAS, AMIL, FENESEG, SUSEP, ABRAMGE. A diferença dos valores per capita disponíveis para o SUS e para as operadoras de planos e seguros de saúde está relacionada às diferenças de conforto no acesso aos serviços de saúde que, por sua vez, supõe-se ser um dos fatores que estimula a procura pelos planos e seguros de saúde. A oferta do setor público e a do privado também é diferenciada quanto à extensão da cobertura dada aos pacientes SUS e a aos clientes das operadoras. Assim, pode-se dizer que é como se houvessem dois mercados, compostos por uma mesma oferta (sobreposição de oferta) e distinta clientela havendo, em determinados casos, sobreposição também da clientela, quando os beneficiários das operadoras também são usuários do SUS que oferece assistência integral e universal. 3.1.3 – Assuntos Fiscais Observando a bibliografia referente às questões fiscais relacionadas ao setor de saúde suplementar, supõe-se que parte das receitas das operadoras corresponda a incentivos ou isenções fiscais do governo sob forma de deduções no Imposto de Renda de Pessoa Física e de Jurídica (IRPF e IRPJ respectivamente) ou da dispensa, em alguns casos, do recolhimento da parte do empregador relativa à contribuição previdenciária incidente sobre a folha de pagamentos52 . Dessa forma, a suposição é que hajam mecanismos diversos que permitam a ocorrência de renúncia fiscal havendo, portanto, transferência indireta de recursos 96 públicos para o setor de saúde suplementar. De acordo com a definição constitucional, pode-se entender renúncia fiscal como: imunidade, isenções; anistias, remissões, incentivos e benefícios fiscais. Acrescenta-se a sonegação que, embora não signifique renúncia, é uma forma de evasão fiscal (BRASIL, 1998 b). Uma forma importante de benefício fiscal para o setor de saúde suplementar ocorre quando o governo passou a permitir, a partir de 198253 ,que as empresas declarassem como despesas operacionais os gastos que têm com planos de saúde de seus empregados no IRPJ, repassando-os, dessa forma, aos preços dos produtos. Há casos em que a empresa empregadora desconta, do salário do empregado, parte do valor referente ao plano de saúde. É importante dizer que muitas empresas também classificam como custos operacionais não somente os gastos com assistência a saúde com seus trabalhadores, como os valores descontados dos salários dos próprios empregados. É fundamental notar que, ao classificar as despesas realizadas com planos de saúde ao empregados como custo operacional, o montante de despesas a serem declaradas aumenta, diminuindo portanto a quantidade de imposto a pagar. Também ocorre benefício fiscal no caso do Imposto de Renda devido pelas Pessoas Físicas (IRPF) uma vez que é permitido abater pagamentos efetuados com serviços de saúde, inclusive planos e seguros de saúde privados, do cálculo do imposto devido54 . Uma hipótese plausível é que essa forma de benefício tenha inclusive estimulado os sindicatos a procurarem incluir nas negociações coletivas a cobertura à assistência médico-hospitalar aos trabalhadores, através de planos de saúde, como uma das formas dos empregados obterem um ganho salarial indireto, pois sendo o ganho adicionado aos salários, o montante a ser tributado sobre os rendimentos do trabalhador seria maior. Uma forma conhecida de isenção fiscal é a que acontecia com a isenção da parte do empregador da contribuição previdenciária concedida até recentemente às entidades classificadas como de caráter filantrópico. Isso ocorria até 1997, por exemplo, em relação à Golden Cross, na época uma das maiores operadoras de medicina de grupo. 52 Bibliografia sobre a temática pode ser encontrada principalmente em DAIM, S. (1996), MÉDICI, A. C. (1992) e BRASIL (1998 b). 53 Até 1980 as empresas podiam abater até o limite de 7% do gasto com saúde com seus funcionários, sobre os rendimentos da empresa, no IRPJ (MÉDICI, 1992). 54 É permitido o deduzir do imposto devido pagamentos realizados com, além de planos e seguros de saúde, aqueles efetuados com consulta médica, fisioterapia, fonoterapia, serviços de laboratório e visita domiciliar (enfermagem), não sendo permitido o abatimento daqueles gastos diretamente desembolsados na compra de remédios. Diferentemente das despesas relacionadas ao setor Educação, na Saúde não há limite de valor para que se realizem as deduções fiscais. 97 Os planos de saúde mantidos pelas Santas Casas continuam gozando desse mesmo tipo de isenção fiscal, em função do caráter filantrópico das mantenedoras. Em ambas situações, o Estado está renunciando a recursos que poderiam ser utilizados, entre outras coisas, para o financiamento do Sistema Único de Saúde. Os efeitos provocados pela renúncia são agravado pela sonegação do IRPF e do IRPJ (BRASIL, 1998 b). 3.2 – A Reforma do Estado e a Regulamentação do Setor de Saúde Suplementar Na década de 1990, o regime regulatório brasileiro vem passando por profundas mudanças, conhecidas por Reforma do Estado. Uma das grandes mudanças é o mecanismo de atuação da presidência da república sem dependência direta do Legislativo, que é a utilização da edição e reedição de Medida Provisória (MP). Se, por um lado, este artifício permite ao Estado a agilidade da implementação de determinadas políticas, por outro, acirra a disputa das competências do poder Executivo com as do Legislativo 55 . Para dimensionar o uso desse mecanismo, selecionou-se dados publicados na Revista Veja, em 24/11/1999 (Sessão “Contexto”). Deve ser notado o alto grau de crescimento do número de MPs no final do governo de José Sarney até o atual. Após outubro de 1988, durante o governo Sarney foram editadas 8 MPs por mês, em média. Esta média caiu, na gestão de Fernando Collor, para 5 MPs mensais, aumentando para 19 MPs por mês na de Itamar Franco. Já no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso (FHC, 1995 – 1998), foi editada uma média de 54 MPs por mês, passando para 84 no segundo mandato (iniciado em 1999), Tabela 5. 55 A Medida Provisória tem o poder de alterar o teor de uma Lei sancionada. Sua edição tem validade mensal, devendo ser reeditada, caso contrário volta a valer o teor original da Lei. Mais referências sobre este tema podem ser encontradas em ALMEIDA, M. H. T. & MOYA, M.; LIMONGE, F.; FIGUEIREDO, A. C.; VALENTE, A. L. 98 TABELA 5: M ÉDIA MENSAL DO NÚMERO DE M EDIDAS PROVISÓRIAS EDITADAS E REEDITADAS NOS GOVERNOS JOSÉ SARNEY, FERNANDO COLLOR DE M ELLO, ITAMAR FRANCO E FERNANDO HENRIQUE CARDOSO Período analisado Sarney Collor Itamar 1988-9 1990-3 1993-4 FHC 1995-8 1999- Média mensal 08 05 19 54 84 Total 138 160 505 2609 927 Nota: Elaborada a partir da Revista Veja de 24/11/1999 Concomitante a essa mudança estrutural de governabilidade, outra vem ocorrendo. Após o Plano Diretor de 1995, em 1996, a responsabilidade institucional da reforma do Estado ficou no âmbito do extinto Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (MARE), da Câmara de Reforma do Estado (órgão colegiado do Conselho de Governo, deliberativo, criado em 1995) e do Conselho de Reforma do Estado (CRE, órgão consultivo, desvinculado de qualquer outro órgão no governo, composto por membros oficialmente não vinculados à administração pública, e criado em 1996). Contou, também, como o apoio do então ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, autor de grande produção intelectual acerca deste tema, que exerceu papel peculiar na concepção da reforma. Tal como NUNES (1999), que defende que com a reforma do Estado se objetiva, principalmente, a diminuição do tamanho do quadro de pessoal do Estado, a redefinição de seu papel regulador, a recuperação da governança e o aumento da governabilidade, a presente pesquisa entende a proposta de criação de agências regulatórias como uma possibilidade de mudanças para o Estado. Neste sentido, é fundamentalmente nas articulações entre propósitos e forças políticas, que a mudança das diretrizes das políticas públicas vão ser constituídas e implementadas. A concepção da agência regulatória foi gerada no contexto de reforma do Estado acima colocada. Propunha-se uma estrutura colegiada composta por teto preferencial de 5 diretorias, com autonomia financeira e decisória, dente outras características mais (NUNES, 1999). Como bem anotou o autor, “a proposta de desenho da rede de instituições regulatórias e de sua relação com as demais instâncias e esferas de decisão do governo” não foi realizada (NUNES, 1999:18). 99 Assim, as relações intra e interministerial, e aquelas existentes entre os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, não foram claramente preestabelecidas quando concebido o modelo. Tampouco o estão nos dias atuais. Este é o pano de fundo do set onde se deu a criação de diversas agências regulatórias, entre elas, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), Agência Nacional de Petróleo (ANP), Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) e, na área da saúde, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). 3.2.1 –Reconfiguração do Setor de Planos Privados de Assistência à Saúde A normatização do setor de saúde suplementar se inicia com o Decreto-Lei n.º 73 de 21 de novembro de 1966, quando é constituído um grupo de trabalho na Superintendência de Seguros Privados do Ministério da Fazenda (SUSEP/MF), em 1967, específico para regulamentar a operação em sistema de pré-pagamento de serviços médico-hospitalares. Essa forma de regulamentação, dizia respeito apenas às questões econômicofinanceiras das operações referentes ao setor suplementar. Não se discutia o caráter, a efetividade e, muito menos, a eficácia das atividades realizadas pelas empresas do setor. Tal modelo se perpetuou até a década de 1990, quando as preocupações da área econômica ainda eram concernentes ao aumento abusivo de preços, falta de clareza contratual e à evasão fiscal56 (BAHIA, 1998). Observando este setor de saúde suplementar, nota-se que, no final da década de 1980, e na década de 1990, ocorreu um acelerado crescimento do mercado de planos privados de assistência à saúde, tanto em termos de faturamento das operadoras como do tamanho da clientela. Uma das grandes dificuldades em dimensionar tal evolução está na falta de um sistema de informações que proporcione transparência para controle e avaliação. Mesmo assim, de acordo com estudo realizado, estimando o crescimento das diferentes modalidades de operadoras (ALMEIDA, 1998), o número total de beneficiários aumentou em 73,4%, de 1987 à 1996. Entretanto, o faturamento apresentou um aumento de 700% (ver Tabela 6, em Anexo), o que permite inferir que o crescimento da população coberta em relação ao total da população brasileira não foi proporcional ao crescimento do faturamento das empresas que administram os planos privados de assistência à saúde, embora esta 56 O que implica em redução do Imposto sobre Operações Financeiras (I.O.F.) 100 informação possa estar superestimada por ser gerada pelas próprias operadoras, o que leva à suposição de que possa se constituir em uma forma de posicionamento no mercado. É nessa conjuntura que a ausência de regulamentação deste setor, pelo Ministério da Saúde, trouxe implicações, como o aumento abusivo do preço de planos e seguros de saúde para os consumidores, restrições de carência e de cobertura de doenças, exclusão de idosos, havendo também aquelas relacionadas aos prestadores de serviços, onde se ressalta a classe médica pressionada a trabalhar com casos de baixo risco e baixo custo, em detrimento a aqueles tratamentos que representem alto custo, sendo estes comumente transferidos aos cuidados da assistência médico-hospitalar oferecida pelo SUS. Em 1992, amplia-se o processo de regulamentação com, entre outras características, a inclusão de novos atores na discussão oficial. Mais especificamente, a participação de entidades médicas, órgãos representantes de consumidores e, além de representações das operadoras de planos e seguros de saúde, instâncias governamentais como os Ministérios da Fazenda, da Saúde (que antes não estava presente no processo), da Justiça, e pelo poder Legislativo – que é o órgão responsável pela apresentação do projeto de regulamentação, contando, para tanto, com Comissão Especial na Câmara dos Deputados e, posteriormente, no Senado Federal, com função de apresentar e debater o projeto de regulamentação que resultou na promulgação da Lei nº 9.656/98. No presente trabalho, a regulamentação é entendida como a política pública que reconhece e incorpora o espaço e a missão das instituições envolvidas – em especial, o do MS e o do SUS – e que visa impor regras ao funcionamento das empresas do segmento de assistência médico-hospitalar suplementar, a começar pelo aclaramento da relação entre ofertante e consumidor. É um processo em andamento, complexo e instável, em fase de adaptação das empresas à normatização que vem sendo estabelecida. Para trabalhar diretamente com o tema, em meados de 1998 foi criado o Departamento de Saúde Suplementar (DESAS), no âmbito da Secretaria de Assistência à Saúde do Ministério da Saúde (SAS/MS), com o objetivo de implantar e avaliar as 101 diretrizes legais concernentes57 . Em junho de 1998, foi promulgada a Lei n.º 9.656 e, posteriormente, editadas diversas Medidas Provisórias alterando a concepção original da Lei58 . A idéia de transformar o órgão regulador do setor em Agência Regulatória não surgiu descontextualizada. Como afirmado anteriormente, é coerente com o desenho de reforma do Estado desenvolvido na década de 1990. Realizadas as articulações necessárias59 , em 25 novembro de 1999 foi editada a Medida Provisória n.º 1.928, criando a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)60 e, posteriormente, em 28 de janeiro de 2000, promulgada a Lei n.º 9.961. Em acordo com a proposta inicial feita pelo Conselho de Reforma do Estado em 1996, a ANS é uma autarquia sob regime especial, vinculada ao Ministério da Saúde, com autonomia jurídica e financeira. A ANS possui em organograma, além da Presidência, cinco Diretorias (Fiscalização, Normas e Habilitações de Produtos, Normas e Habilitações de Operadoras, Desenvolvimento Setorial e Gestão), sendo que dois membros devem passar pela aprovação do Senado Federal para efetivar sua admissão no cargo de diretor. A ANS, órgão regulador do setor suplementar, dispõe de diversos mecanismos legais para fazer valer suas decisões, como as Resoluções da Diretoria Colegiada (RDC), as Resoluções específicas de cada diretoria (RE) e as Resoluções do Conselho de Saúde Suplementar (Resoluções CONSU)61 . Ainda há, a mensal atualização das mudanças realizadas na Lei n.º 9.656/98, pela edição e reedição de Medida Provisória. Deve ser ressaltado que tais mudanças são discutidas e negociadas nas arenas decisórias da ANS (reuniões da Diretoria Colegiada da ANS, CSS e CONSU), do governo (Casa Civil, ministérios interessados, etc.) e dos 57 Para o ano de 1997, foi colocada como meta do MS a participação “da regulamentação e da fiscalização dos planos e seguros de saúde”, com fins a mudar um quadro onde o SUS paga “R$ 1,3 bilhão por diagnósticos e tratamentos de doenças não cobertos por planos” (SAA Informa, 1998). 58 As medidas provisórias devem ser publicadas com freqüência mensal, sem o quê, perdem a validade, voltando a Lei ao seu teor original. Em função disso, até julho de 2000, foram publicadas 29 MPs que alteram a Lei n.º 9.656. 59 Não faz parte do presente trabalho desenvolver como se deu tais articulações. Trabalhos mais específicos podem ser encontrados em “Considerações Sobre a Regulamentação do Setor Suplementar de Saúde”, SANTOS, I.S. & GAMA, A. (site do NUPES/ENSP/FIOCRUZ, 1999). Também devem ser observados BAHIA, L., SANTOS, I. e GAMA, A.M. nos Anais do 2o Congresso Brasileiro de Ciências Sociais em Saúde (realizado em dezembro de 1999) e nos Anais do XI Congresso da Associação Internacional de Políticas de Saúde e do VIII Congresso Latino Americano de Medicina Social, da IAHP (International Association of Health Policy) e ALAMES (Associación Latinoamericana e Medicina Social), realizado em julho de 2000, no prelo. 60 MP n.º 2.003-1 de 14 de dezembro de 1999 e MP n.º 2.012-2 de 30 de dezembro de 1999. 61 Ao todo, já são 30 RDCs, 4 RE da Diretoria de Desenvolvimento Setorial, 1 da Diretoria de Fiscalização e 1 da Diretoria de Normas e Habilitação dos Produtos. Do CONSU foram publicadas 23 resoluções no biênio 1998 –99 e mais 1 em 2000. 102 demais atores do mercado que se expressem fora do locus da CSS e do CONSU, ou seja, antes da edição de cada MP, é realizada a articulação entre os atores envolvidos. É fundamental esclarecer o ganho que a sociedade tem com a criação da Câmara de Saúde Suplementar. Embora tenha caráter consultivo, permite a representação de diversos setores da sociedade civil, o que significa a introdução de mais uma novidade na área da assistência à saúde suplementar: além de o Estado tomar assumir sua regulação como fundamental, introduziu-se alguma forma de controle social. Certamente aquém do necessário para que a atuação pública fosse mais representativa, entretanto já é um bom começo62 . Com a regulamentação do setor suplementar de saúde, inicia-se um processo de interferência governamental sem precedentes. Além da disputa realizada entre o Ministério da Saúde e o da Fazenda (via SUSEP) pelo controle do processo, da qual o MS se sobressai como “vitorioso” por conseguir manter-se o principal locus regulatório, há outra questão capital, registrada por Maria Helena OLIVA AUGUSTO & Olavo Viana COSTA. Diz respeito à introdução de novas práticas de regulação do mercado como, por exemplo, o ressarcimento dos atendimentos realizados à beneficiários de planos provados de assistência à saúde pelo SUS. O mercado de saúde suplementar se constituiu de forma a não desenvolver os serviços de alta complexidade, geralmente os mesmos que representam alto custo. Com o Ressarcimento, a cobertura contratualmente garantida ao beneficiário de um plano de saúde vai ter seu financiamento administrado pela operadora, seja pela realização do serviço, seja pelo ressarcimento aos cofres públicos do gasto realizado do SUS, quando for o caso. Neste sentido (e não apenas neste), a regulamentação “põe em xeque a suposta autonomia de financiamento do setor 62 A CSS já existe desde 1998. Aos poucos vão sendo incorporados membros representantes de setores que estivessem fora do processo. Em julho de 1998, é composta pelos seguintes: I - pelo Diretor-Presidente da ANS, ou seu substituto, na qualidade de Presidente; II - por um diretor da ANS, na qualidade de Secretário; III - por um representante de cada Ministério a seguir indicado: a) da Fazenda; b) da Previdência e Assistência Social; c) do Trabalho e Emprego; d) da Justiça; e) da Saúde; IV - por um representante de cada órgão e entidade a seguir indicados: a) Conselho Nacional de Saúde; b) Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Saúde; c) Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde; d) Conselho Federal de Medicina; e) Conselho Federal de Odontologia; f) Conselho Federal de Enfermagem; g) Federação Brasileira de Hospitais; h) Confederação Nacional de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços; i) Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas; j) Confederação Nacional da Indústria; l) Confederação Nacional do Comércio; m) Central Única dos Trabalhadores; n) Força Sindical; o) Social Democracia Sindical; V - por um representante de cada entidade a seguir indicada: a) de defesa do consumidor; b) de associações de consumidores de planos privados de assistência à saúde; c) do segmento de autogestão de assistência à saúde; d) das empresas de medicina de grupo; e) das cooperativas de serviços médicos que atuem na saúde suplementar; f) das empresas de odontologia de grupo; g) das cooperativas de serviços odontológicos que atuem na área de saúde suplementar; h) das entidades de portadores de deficiência e de patologias especiais. 103 privado de assistência médica supletiva, um dos pilares da universalização excludente” (OLIVA-AUGUSTO & COSTA, 2000). 3.3 – Mundo do Trabalho Para entender as mudanças ocorridas nesta década de 1990, na área da saúde, é necessário analisá-las em conjunto com as que se deram no mundo do Trabalho. É mais que conhecido o aumento do trabalho informal no mercado de trabalho, que tem, entre suas origens, desenvolvimento do setor de serviços e, portanto, diminuição da capacidade industrial do país, excedente de mão-de-obra, enfim, altas taxas de desemprego 63 e mudanças do perfil produtivo. O fator preocupante, entretanto, é que este aumento é acompanhado pela diminuição dos trabalhadores que possuem vínculo empregatício. Trabalho realizado pela CUT (2000) com dados da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED, convênio Fundação SEADE e DIEESE), com a população ocupada da População Economicamente Ativa (PEA) que mora ou trabalha na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), região que congrega os 30 municípios conurbados, inclusive os da região do ABC. Os dados mostram a evolução da distribuição dos que encontravam-se em atividades informais e formais. A participação em 36,3% da população que encontravase em atividades consideradas informais64 em 1990, na PEA, sofreu um crescimento, passando a 48,8 % em 1999. Enquanto isso, a participação da população ocupada com atividades formais na PEA, diminuiu de 63,7 % em 1990 para 51,2% no ano de 1999. Ao comparar as condições de vida das famílias com pelo menos um membro no setor informal e das famílias sem membro no setor informal, no município de São Paulo em 1998, esta pesquisa chegou à conclusão de que as primeiras “encontram-se em moradias mais precárias, (...) têm menos acesso aos serviços de saúde e aos convênios médicos, (...) média de anos de escolaridade inferior, um número maior de analfabetos” (CUT, 2000:50). O vínculo empregatício representa para o indivíduo a posse de benefícios e, portanto, o desemprego e o trabalho informal representam o menor acesso a esses 63 De acordo com a pesquisa referida, 18,2 % da PEA na RMSP estaria desempregada em 1998, isto é, apenas 81,8% da PEA estaria ocupada. 64 A pesquisa utilizou a conceituação de unidade econômica da Organização Internacional do Trabalho (OIT) para caracterizar as atividades informais. O critério baseia-se na escala da produção, nível da organização e associação entre capital e trabalho (CUT, 2000:5). 104 benefícios. O raciocínio que surge como solução para este problema social é que o governo deveria investir na geração de empregos. Contudo, quando é aberta a discussão da geração de empregos, argumenta-se pela diminuição dos encargos sociais, já que “pesariam no bolso” do empregador. Não são apresentadas, entretanto, formas alternativas de financiamento para o vácuo que ficariam os salários sem os benefícios já adquiridos. São utilizadas diferentes formas de definir a composição do salário, o que influencia no conceito de encargo social65 . Concordando com defensores da corrente metodológica de interpretação do conceito de encargos sociais no Brasil que considera os benefícios sociais um fundo público de financiamento da previdência social, do seguro-desemprego, do seguro de acidente do trabalho entre outros, isto é, os benefícios sociais como parte das obrigações trabalhistas66 , os encargos sociais representam “30,89% do salário contratual, (...) ou 25,1% da remuneração total recebida pelo trabalhador, ou, ainda, 20,07% do custo total do trabalho para a empresa” (DIEESE: 1997). A partir desse raciocínio, pode-se afirmar que crescimento do emprego informal não tem, em sua origem, o alto custo dos adicionais legais, pois a participação dos encargos sociais no custo da mão-de-obra não tem esse poder. Por conseqüência, as propostas de reestruturação do mercado que utilizem aquele caminho têm baixa eficácia e eficiência (SANTOS & POCHMANN, 1998). A discussão que, neste momento, está sendo colocada, é em relação ao modelo de sociedade que os países vêm adotando. É pertinente perguntar-se se o que a sociedade quer é a precarização das relações do trabalho ou justamente o contrário desta situação. A partir do conhecimento das transformações nas estruturas sociais em diversos países, é pertinente sugerir as palavras de Paul SINGER (2000) para posterior reflexão: “(...) o processo de transformação vem ocorrendo dentro da grande empresa, daquela que vive um verdadeiro reboliço no caminho da descentralização. A crise da multinacional, da multiempresa, é uma 65 A composição do desembolso do empregador com o trabalho é assim: salário contratual (mensal, inclui as férias); salário diferido (13o salário e 1/3 de férias); salário recebido eventualmente (FGTS e verbas rescisórias); INSS; Seguro de acidentes de trabalho; Salário educação; INCRA; SESI ou SESC; SENAI ou SENAC; SEBRAE. 66 DIEESE, 1995, AZEREDO, 1993, AMADEO, 1994, BALTAR & HENRIQUE, 1994, MATOSO & POCHMANN, 1995. 105 crise básica. Não é conjuntural apenas. Imensos aparelhos burocráticos foram constituídos para controlar centenas de milhares de trabalhadores (...) essas empresas estão encontrando um espaço crescente também na economia brasileira . É o processo de globalização (...) todas essas histórias de reengenharia, qualidade total, desburocratização e descentralização são responsáveis pelo processo de precarização das relações de trabalho. Cada vez mais essas gigantescas empresas só empregarão regularmente, quem sabe, 10% dos seus trabalhadores, procurando colocar os outros 90% na posição de subcontratados, que é o modelo japonês”. Aliadas a essas questões, estão as que dizem respeito ao mundo dos trabalhadores: da mesma forma que o mundo do trabalho, na década de 1990 o dos trabalhadores vem sofrendo profundas mudanças em sua estrutura. Com as altas taxas de desemprego, a agenda sindical passa a dispensar compromissos, que a preenchiam na década de 1980, para defender o emprego, tornando-se o tema central entre os atuais interesses do sindicalismo (MARTINS, 1999). Deve ser notado que a importância dos movimentos sindicais é suprema, pois são a principal forma de representação dos trabalhadores no Brasil. Entretanto, quando as negociações tornam-se fortemente associadas ao desemprego, como vem ocorrendo, deixa-se de trabalhar as demais demandas dos trabalhadores, como a questão da saúde, tão em pauta na década de 1980, quando havia inúmeros movimentos, greves, discussões, articulações, etc., em defesa do setor público de saúde e da posse e ampliação de cobertura do convênio médico-hospitalar para os trabalhadores. Durante a pesquisa de campo, foram realizadas diversas conversas informais com dirigentes do Sindiquim67 , que é o sindicato ao qual os trabalhadores das empresas estudadas são filiados (ver mais referências no início do Capítulo 2). A fala dos dirigentes reflete esta questão para o dia-a-dia dos sindicatos. Assim, embora o discurso sindical ainda gire em torno da defesa dos serviços de saúde do setor público, os dirigentes contatados informaram que, na prática, como o Sindiquim se posiciona um defensor dos trabalhadores, deve proteger estes interesses, 67 Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Químicas, Petroquímicas, Farmacêuticas, Tintas e Vernizes, Plásticos, Resinas Sintéticas, Explosivos e Similares do ABC, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra. 106 que são relativos à melhorias nos convênios médico-hospitalares que os trabalhadores com vínculo empregatício, e seus dependentes, possuem e utilizam. Esta nova configuração pode ser analisada como uma perda para o setor público de saúde, que não tem mais a aliança de interesses com os sindicatos quando esses retiram a defesa do setor público da agenda de prioridades sindicais. Em função disto, é difícil não concordar com POCHMANN (2000): “o sindicalismo brasileiro deveria procurar reunir forças, sacudir a poeira e dar a volta por cima, denunciando dez anos de desconstrução do trabalho e os riscos de sua continuidade. Será possível?”. 3.3.1 – O mundo do trabalho e a assistência à saúde Ao analisar os resultados do trabalho elaborado pelo DIEESE com dados da Pesquisa de Condições de Vida da Fundação SEADE (CUT, 2000), acerca das condições de vida das famílias em 1998, verificou-se que a posse de plano privado de assistência à saúde entre as famílias com pelo menos um membro no setor informal (49,8%) é menor que em relação às que não possuem membros no setor informal (65,7%). A utilização de serviços de saúde nos 30 dias anteriores à realização da pesquisa é diferenciada por tipo de família e pelo financiamento do serviço, isto é, se é reembolso direto, plano de saúde (chamado de “pré pago”) ou serviço público de saúde. A grande parte da utilização dos serviços de saúde foi realizada no setor público. Porém, nas famílias onde ninguém trabalha no setor informal, 34,2 % utilizou serviços públicos e 59,3% pré-pagos, enquanto que, nas famílias com pelo menos algum membro trabalhando no setor informal, ocorre uma inversão desses dados: nestes casos, a maior parte das utilizações se deu em serviços públicos (51,1%), e não nos planos de saúde (43%). Esses resultados mostram que a posse de plano privado de assistência à saúde, bem como a utilização de seus serviços, está diretamente relacionada à posse de vínculo empregatício. Outra pesquisa, realizada em 1998 pelo IBOPE, em conjunto com o Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (CONASS) e a Fundação Nacional de Saúde (FNS), já mostrava que isso. A grande maioria dos entrevistados, ou seja, 66% dos entrevistados, possuem plano devido ao vínculo empregatício, sendo que mais da 107 metade destes são dependentes, grande parte, a família do trabalhador (RODRIGUES, 1998). Tais resultados devem ser analisados em conjunto com a informação de que, entre os entrevistados que já foram beneficiários de plano privado de assistência à saúde, mas que não o eram quando realizada a entrevista, praticamente a metade desta população deixou de ter o plano devido à perda do emprego (48%), nas palavras da pesquisa: “por que saiu da empresa” (ver Figura 3). FIGURA 3 POR QUE SAIU DO PLANO? Por que saiu da empresa Por causa do preço, aumentou muito Cobria poucas especialidades médicas 48% Outros motivos 31% 16% 5% Fonte: Rodrigues, 1998 A informação de que a perda da posse de plano de saúde está fortemente associada à perda do emprego (RODRIGUES, 1998), aliada à associação da posse de plano de saúde e da utilização de seus serviços com a existência de algum membro da família estar ligado ao setor informal de trabalho sugerem a associação direta do plano de saúde com o vínculo empregatício. Estes dados não são novidade para a pesquisa. A relação do vínculo empregatício com a posse de benefícios foi, inclusive, um dos pressupostos deste trabalho. Entretanto, quando esta informação é analisada em conjunto com os dados da PEA, que mostram a tendência ao aumento da população que compõe o mercado informal de trabalho em detrimento da que compõe o formal, fica uma pergunta no ar: qual o modelo de sociedade que a população brasileira quer para si e para as gerações posteriores? 108 Se a tendência é, comprovadamente, o aumento do trabalho informal e a conseqüente perda de benefícios, deve estar acordado, entre os cidadãos e seus representantes, qual modelo social que se quer investir. Ora, não precisa de muita imaginação para supor que a maioria dos indivíduos que já tenham passado pela perda do vínculo empregatício, bem como de seus respectivos benefícios, vai preferir o investimento dos esforços do Estado no setor público, permanecendo e aperfeiçoando as diretrizes de universalidade e eqüidade do SUS, do que o investimento num setor ao qual não tem acesso. Mesmo porque a população que utiliza os serviços do SUS está satisfeita (RODRIGUES, 1998 e PNAD/1998 - IBGE, 2000). 3.4 – Considerações Refletindo sobre as constatações acima realizadas, que dizem respeito à necessidade do investimento social no sentido de melhorar e adaptar o SUS às constantes transformações da sociedade brasileira, à luz dos Capítulos 1 e 2, reforça-se que o modelo mais desejável é aquele que responda com dignidade, eficácia e eficiência de forma acessível a todos os que o necessitem. Assim, a forma com que têm sido pensadas as necessidades dos trabalhadores, deve ser revista. Constatou-se que a cobertura de serviços do setor suplementar de saúde está aquém das reais demandas por abrangerem apenas os serviços médico-hospitalares, não contemplando, portanto, a assistência integral à saúde. Outro ponto relevante foi a verificação, no trabalho de campo, da impossibilidade de se estabelecer uma tipologia que oriente a análise das relações estabelecidas entre empregado, empregador e entidades sindicais quanto ao contrato de trabalho e benefícios, conseqüência da diversidade e peculiaridade da assistência à saúde recebida por trabalhadores de diferentes empresas (Capítulo 2). Não menos importante, é o perfil único e singular das relações estabelecidas entre a operadora de plano de assistência privada à saúde e a empresa empregadora, que faz com que cada caso seja um caso, ou seja, cada plano vai ter rede credenciada, cobertura, utilização e financiamento diferente. Isso tudo, aliado à sobreposição das ações e competências dos órgãos envolvidos com a assistência à saúde do trabalhador, devido à impossibilidade de sua desvinculação da questão do acidente e da doença do trabalho (que inclui os Ministérios da Previdência e Assistência Social e do Trabalho e Emprego nas ações de saúde), Capítulo 1, incita ao desenvolvimento de um “clima social” de que “nada funciona”. 109 Esse contexto de falta de diretrizes políticas (ou incapacidade de implantá-las) que revertam o atual modelo de atenção de saúde do trabalhador, propicia o desenvolvimento de outras formas de atenção contraditórias ao modelo formal do sistema de saúde brasileiro, como propostas de reprivatização do acidente do trabalho, estas, coerentes com a Reforma do Estado. Na mesma linha, é estimulado o mercado de saúde suplementar como o “salvador do SUS”. Entretanto, na legislação relativa ao setor suplementar de saúde, não estão incluídos no rol de procedimentos dos planos coletivos, os serviços para atendimento de acidente do trabalho (Resolução CONSU n.º 10), o que traz inúmeras conseqüências, por exemplo, a não preocupação das operadoras com a prevenção ao acidente e às doenças do trabalho, desagregando assistência à saúde de assistência à saúde, isto é, desconjuntando o inseparável 68 . Pode-se afirmar, contudo, que, além da situação dos trabalhadores empregados ser questionável já que não está livre das mazelas do sistema de saúde brasileiro como um todo, a regulamentação do setor supletivo de saúde que vem sendo realizada desde 1998 também está muito aquém de qualquer interferência na estrutura desse modelo. Até mesmo pela inexistência de critérios de avaliação da qualidade dos serviços prestados por este setor. Enfim, é pertinente afirmar que há duas situações paradoxais. Uma, a idealização de que os trabalhadores formais componham a elite do país por, além de estarem empregados, terem, na maior parte, plano privado de assistência à saúde. Esta suposição é colocada em xeque a partir do momento em que, qualquer um que se aproxime da realidade do dia-a-dia dos trabalhadores, vai se deparar com a de um mundo do trabalho onde a insalubridade e periculosidade, aliados aos exames préadmissionais e periódicos e ao tempo limite de afastamento para adoecidos e acidentados em que o estado de saúde de trabalhador e sua capacidade produtiva podem ser constantemente questionados (temas discutidos nos Capítulos 1 e 2). Ademais, de acordo com o colocado neste Terceiro Capítulo, constatou-se que tais características se aplicam para apenas uma parcela da população trabalhadora, que significa menos da metade do trabalhadores da PEA – aqueles que se encontram no mercado formal. 68 Outra conseqüência decorrente desta legislação é a subnotificação dos casos de doença e acidente do trabalho. Como as operadoras não atendem estes casos, supõe-se que, nos casos em que o trabalhador não venha a receber benefício do INSS, muitas vezes os trabalhadores deixariam de notificar o ocorrido para ser atendido pelos serviços da operadora. 110 A outra situação, é referente às linhas da macroeconomia e da política, no sentido de a tendência dos acontecimentos econômicos prevalecerem sobre os sociais. Fatos como a permissão de serem integralmente deduzidos do IRPF e do IRPJ os gastos com saúde suplementar (Capítulo 3, item 3.1.3), significam que a sociedade está financiando um sistema que não responde às suas necessidades. Isto é, a sociedade financia e produz um sistema que não é resoluto. Assim, a sociedade brasileira deve ponderar diante do dilema individualidade versus coletividade. Isto não se aplica apenas ao setor saúde, e sim ao modelo de sociedade como um todo. A seguir, é feito um paralelo para instigar a reflexão: desejase a possibilidade de os pedestres andarem na rua sem a preocupação de ser atropelado (como as famosas ruas do Distrito Federal, Brasília, onde os carros páram quando o pedestre coloca o pé na rua) ou a opção é pelas regras do mundo dos negócios, onde as necessidades individuais, como o atraso para uma reunião que permite um indivíduo tirar uma vida humana com acidente de carro (evitável), prevalecem? Em quais valores se pretende investir: num sistema de saúde ditado pelas regras da preservação do lucro em detrimento do atendimento, da ação em si (medicina de caráter individualizante, onde o que vale é o velho ditado “cada um por si”), ou num sistema em que prevaleçam os valores humanos? São aceitáveis os altos valores dos planos de assistência privada à saúde para a população idosa? É isso que se deseja para o nosso futuro? 111 IV – CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÕES Este estudo teve como principal objetivo contribuir no aprimoramento do conhecimento do sistema de saúde brasileiro, sob um de seus aspectos, que é as políticas de atenção à saúde do trabalhador, com enfoque à assistência ofertada e à recebida por aqueles que possuem vínculo formal de trabalho. Como vimos, mudanças ocorridas na estrutura do sistema de saúde brasileiro, como a descentralização e universalização dos serviços de saúde – desde o Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), culminando na implementação do Sistema Único de Saúde (SUS) durante década de 1990 – não bastaram para que os princípios norteadores do SUS fossem efetivamente incorporados no Sistema Nacional de Saúde do Brasil. Os representantes sindicais, “figura” fundamental na defesa das políticas que privilegiam o sistema público de saúde nas décadas de 1970 e 80, também reivindicavam o “convênio médico” (como costumam chamar aos planos privados de assistência à saúde) para os trabalhadores filiados à entidade. Assim, o movimento sindical, principal forma de representação dos trabalhadores no Brasil, se constituiu num ator determinante na configuração do setor público de saúde, bem como do setor suplementar: um exemplo que fala por si mesmo é a fala do então presidente do Sindiquim (entrevista realizada em maio de 1999), em relação à postura do sindicato: “a gente pedia plano, mas não queria”, ou seja, embora os dirigentes do sindicato fossem interessados em investir no setor público de saúde, tinham que fazer o que a categoria pedia69 . Esta fragmentação dos interesses – na década de 1990 temos de incluir o redirecionamento do empenho sindical à questão do desemprego, conforme discutido no Capítulo 3 – se traduz numa determinante da postura do movimento sindical. É evidente a refutação que fazem às propostas de privatização da Previdência, entretanto, não é tão claro assim seu posicionamento em relação às da Saúde. Não seriam estes, ainda, um ator fundamental na defesa de um novo sistema nacional de saúde? Não são os trabalhadores que participam do processo de negociação, junto aos diretores de recursos humanos das empresas empregadoras, a cobertura do plano de saúde para si e seus 69 Houveram movimentos como o encontro realizado 1985, previamente à VIII Conferência Nacional de Saúde, para debater e pensar caminhos para o setor público, em especial formas de incentivo ao Programa de Saúde do Trabalhador. Por outro lado, 3 dos dirigentes do SINDIQUIM entrevistados informaram que na década de 1980 havia 112 dependentes, não são estes mesmos trabalhadores que defendem o fortalecimento de formas de prevenção aos acidentes e doenças do trabalho? Atualmente, também existem outros atores envolvidos no tecer dos fios desta teia. O Ministério da Saúde, por exemplo, trouxe à pauta de sua agenda de prioridades a questão da assistência suplementar à saúde a partir de 1998, tornando-se mais um ator de “peso” neste mundo dos planos e seguros de saúde ao criar um departamento em seu organograma70 e, posteriormente, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), agência regulatória desenhada conforme os moldes do Plano Diretor de 1995 do desenho de Reforma do Estado, criada pela Lei n.º 9.961/2000. Estes órgãos têm como primeira missão regular o setor suplementar, o que, não fosse pela Superintendência de Seguros Privados do Ministério da Fazenda (SUSEP / MF), praticamente inexistia até 1998, conforme discutido no Item 3.2.1 do Capítulo 3. Entretanto, a regulamentação é um processo ainda em construção, instável e complexo. Da mesma forma, o Ministério do Trabalho e do Emprego (MTE), bem o como o da Previdência e Assistência Social (MPAS), vêm se organizando na reestruturação do Seguro de Acidentes do Trabalho. Já foram elaboradas ao menos 4 versões de Projeto de Lei (3 de autoria do MPAS e 1, a que está em discussão nos dias atuais, do MTE) onde passaria a existir uma agência regulatória para cuidar das questões envolvidas no seguro do acidente do trabalho. No tocante à esta dissertação, o que deve ser destacado neste Projetos de Lei é que o Seguro de Acidente do Trabalho, obrigatório para os que têm vínculo empregatício, passaria a ser administrado por uma empresa seguradora que prestaria a assistência integral à saúde dos trabalhadores, o que tornaria oficial a já existente diferenciação da atenção à saúde entre os brasileiros que possuem vínculo empregatício e os que não o possuem. Como colocamos em debate no Capítulo 1, os Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT), os Programas de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), os Programas de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), organizações como a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), todo o setor de serviços médicos no interior das empresas, e os convênios médico-hospitalares firmados com as operadoras de planos privados de um estabelecimento médico-hospitalar que financiava a organização de diversos grupos de trabalhadores da região do ABC para que estes reivindicassem aos patrões plano de saúde como benefício. 70 Departamento Suplementar de Saúde, Secretaria de Assistência à Saúde (DESAS / SAS / MS), durante 1998 e 1999. 113 assistência à saúde, têm suas ações e financiamento sobrepostos de forma particular a cada empresa empregadora, com resultados dependentes da política local de recursos humanos de cada empregador, sem a existência de mecanismos que estimulem um planejamento integrado. Também vimos, no Capítulo 2, como a formulação localizada da política de assistência à saúde do trabalhador gera uma situação em que os dirigentes de recursos humanos das empresas têm poucos parâmetros que auxiliem nas suas decisões. Todos os diretores de recursos humanos entrevistados manifestaram dificuldades em lidar com diversos aspectos da assistência à saúde proporcionada aos funcionários, principalmente naqueles casos em que a empresa era a administradora do plano de saúde (empresa A e C), quando se sentiam com “baixo poder de barganha” frente a rede credenciada – para os entrevistados este problema foi solucionado com a contratação de um terceiro, que é a operadora de plano privado de assistência à de saúde, que é quem intermedia as negociações com os estabelecimentos de saúde. Por outro lado, esta forma restrita de concepção da atenção à saúde consente no desenvolvimento de formas que atendam à interesses questionáveis, como a elaboração de uma assistência cujo financiamento é regressivo – na empresa B, os funcionários com cargo em nível de gerência pagam menores preços que os demais funcionários por uma mesma assistência. Ou mesmo, que se conceba um plano de saúde diferenciado para os agregados71 dos trabalhadores, que apresentam a maior probabilidade de gerarem altos gastos com serviços de saúde, dado a sua faixa etária, que demais usuários do plano (empresa C). Além disso, discutimos como o plano da empresa A para seus trabalhadores, que é integralmente financiado pela empresa, também não assegura que seus serviços apresentem maior resolutividade para as necessidades da população trabalhadora. Outra constatação deste trabalho, é acerca de como a não integração das políticas de assistência social gera situações questionáveis. Um exemplo disso, é a pela qual os trabalhadores das empresas estudadas no trabalho de campo desta dissertação vêm passando. Com o processo de enxugamento do quadro de funcionários das empresas B e C, durante o decorrer da década de 1990, o tamanho deste quadro foi drasticamente reduzido. Por outro lado, o número de trabalhadores terceirizados contratados era 71 Geralmente o agregado é o pai e a mãe do titular do plano e é população idosa. 114 praticamente a metade da quantidade de trabalhadores efetivos quando realizada a entrevista. Assim, os trabalhadores demitidos não recebem mais os benefícios que recebiam quando empregados nas empresas, tampouco os terceirizados, que nestes casos não recebem os benefícios da empresa em que trabalham. Ou seja, é uma nova classe de trabalhadores dentro da uma mesma empresa, com salários e benefícios diferenciados dos trabalhadores efetivos. Advindo desta, tem a questão do que é benefício social. Conforme discutido nos Capítulos 2 e 3, os planos de saúde são considerados um benefício da empresa aos trabalhadores. Ou seja, não é um salário indireto ou complementação salarial, e sim um benefício. A partir deste raciocínio, os trabalhadores não têm mecanismos que garantam sua participação no processo decisório da definição do plano, seja no seu financiamento, na escolha da rede de estabelecimentos de saúde credenciada, na amplitude de serviços cobertos, nas definições de acesso, ou de utilização dos serviços que compõem a atenção à saúde que recebem. A outra questão que não podemos deixar de mencionar é a importância do papel que o Setor Médico, de cada empresa empregadora, exerce. Este setor é definidor da assistência à saúde provida pela empresa, e tem como coordenador um Médico. Verificou-se, na pesquisa de campo, que a proximidade das relações do médico, coordenador da assistência à saúde provida no interior da empresa, com a operadora de plano de saúde contratada pela empresa é, antes de tudo, questionável. Em duas das empresas estudadas, o médico coordenador do Setor Médico passou a fazer parte do quadro ou da operadora de plano de saúde, ou de algum estabelecimento da rede credenciada. Ademais, muitas vezes este profissional é financiado pela operadora, e não pela empresa empregadora. Além da controvérsia gerada pelo fato de o profissional responsável pelos exames admissionais e demissionais estar comprometido com a operadora do plano – que, dado a lógica de mercado, visa antes ao lucro que à situação de saúde do trabalhador – surge daí a suposição de que o número de operadoras com acionistas que já foram médico coordenador de Setor Médico pode ser expressivo. O que fazer diante de uma situação em as ações de reabilitação, assistência, vigilância e prevenção em saúde são desintegradas, não por mero descaso de um ou outro dirigente de alguma das diversas instituições envolvidas, mas porque o sistema de 115 seguridade social vem assim se constituindo, de acordo com a correlação de interesses de todos os atores possíveis, nesta área relacionados? O que fazer com o fato de os objetivos do SUS não estarem sendo alcançados na sua totalidade por, dentre outros motivos, suas imbricações com outras formas de provimento e consumo de serviços de saúde, como as do setor supletivo de saúde, que geram sobreposição e interdependência nas relações entre esses setores? O que fazer diante do desconhecimento do provimento de serviços de saúde aos trabalhadores que possuem plano de saúde, onde não se sabe se estes têm acesso à melhores serviços de saúde, sabendo-se, apenas, que devido à posse do plano de saúde, que têm mais fácil acesso aos serviços que os demais brasileiros72 ? Enfim, o que fazer com as distintas formas de amparo social relacionadas à assistência à saúde que não se integram, constituindo-se num obstáculo à promoção à saúde? É premente o fortalecimento do espaço de atuação, e participação, da categoria dos trabalhadores no órgão de regulação do setor supletivo, que é a Agência Nacional de Saúde Suplementar, juntamente à abertura de um espaço similar nas instâncias reguladoras das demais instituições envolvidas. Somente assim poder-se-á imaginar futuras políticas de saúde, bem como políticas relativas ao processo produtivo, que dêem conta das necessidades da população brasileira. Também contribuiria no trilhar desta carruagem, a reestruturação do modelo dos Centros de Referência de Saúde do Trabalhador (CRSTs), que fazem parte dos Programas de Saúde do Trabalhador no SUS, mas cujos serviços não atingem todos o trabalhadores, de forma a aperfeiçoar os resultados de suas ações. De qualquer forma, quando considerado (Capítulo 3), o Estado, a instância reguladora do mercado de produção de serviços de saúde, infere-se que não estamos falando apenas de modelo de sistema de saúde, e sim de modelo de Estado. De um Estado que incentivou a prática médico-hospitalar voltada ao lucro (Capítulo 3, Item 3.1.1) e que ainda estimula o desenvolvimento dos serviços privados ao permitir a dedução dos gastos com saúde no imposto devido à Receita Federal, tanto para as Pessoas Físicas como para as Jurídicas. 72 Deve ser lembrado que a tendência do aumento do número de trabalhadores no mercado informal certamente vai redesenhar o mercado suplementar de saúde dado que a grande parte dos beneficiários o são devido ao vínculo empregatício do titular do plano, conforme discutido no Capítulo 3. 116 Uma sugestão pertinente neste trabalho, é que se desenvolvam novos estudos investigadores, que proporcionem uma compreensão esclarecida das políticas de assistência social, em especial aquelas relacionadas à atenção à saúde do trabalhador, bem como daqueles pontos ainda não elucidados acerca do financiamento dos planos de saúde (como se dão os subsídios, quanto e porquê gastam as empresas empregadoras com assistência à saúde), da diferença e semelhança entre cada modalidade de plano, em uma mesma empresa empregadora, e entre empresas, e das relações entre o Setor Médico da empresa empregadora com a operadoras de plano de saúde por esta contratada para proporcionar a assistência à saúde de seus trabalhadores. 117 V – BIBLIOGRAFIA ALMEIDA, C., 1998. 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Dimensão das Relações Empresa /Empregado – Contrato de Trabalho 3.1 Níveis Salariais a) quantidade de trabalhadores por níveis b) % de ascensão de nível c) escolaridade d) habilidades e capacitações 3.2 Rotatividade/estabilidade no emprego a) quantidade de terceirizado trabalhadores com vínculo temporário/ permanente / b) índice de rotatividade c) média de anos na empresa 3.3 Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) a) quantas categorias integram o acordo coletivo de trabalho b) se existe organização dos trabalhadores na empresa, de que tipo 3.4 Convenção Coletiva a) participam? b) Qual sua relação com o ACT, se está além ou aquém, se depende do tipo de benefício/cláusula negociada 4. Dimensão das Relações Empresa/Empregado – Assistência à Saúde 4.1 Prevenção e assistência no interior da empresa a) Horário de funcionamento do Departamento Pessoal/setor de recursos humanos b) Cumprimento das Normas Regulamentadoras c) Setor médico (quantas especialidades, salas, triagem, enfermaria, segurança do trabalho, equipamentos, etc.). Se há médico responsável pelo PCMSO. 124 d) Se há programas de prevenção (alcoolismo, tabagismo, dependência química, acidente do trabalho, pré-natal, DST, câncer, etc.) , quem é o responsável pelos programas e quem oferece/administra os serviços dos programas e) Tem ambulância, como é o plantão (fica na empresa o tempo inteiro?) f) Se o atendimento do setor médico é realizado em todos os turnos, ou somente diurno/noturno g) Outras formas assistenciais 4.2 Assistência Médico-Hospitalar e Odontológica a) tem convênio médico? É obrigatório? b) Quantos níveis (correspondem aos níveis hierárquicos da empresa?) c) Quais as coberturas por tipo de convênio médico d) Quem pode ingressar no convênio (temporário, permanente depois de quanto tempo) e) Quem pode ser dependente (filho adotado, companheiro(a), mãe viúva, agregados) f) Número de titulares e dependentes por tipo de convênio médico Responsabilidade a) quem é o responsável pela saúde ocupacional b) quais os atestados médicos aceitos pela empresa c) quem realiza o exame médico obrigatório (se é o setor médico da empresa, convênio médico, SUS, etc.) d) apoio ao trabalhador: quando acontece algum problema, a quem o funcionário ou dependente deve recorrer e) se o responsável consegue resolver problemas de cobertura, como f) se existe controle da qualidade dos serviços, quem é o responsável por ele e quem o realiza 5. Dimensão das Relações Empresa/Operadora ou Administradora de plano ou seguro de saúde/ Rede Credenciada 5.1 Dimensão: Cobertura, Utilização dos Serviços e Financiamento 5.1.1 Acesso aos Provedores a) número de hospitais, quais os mais utilizados, quantos médicos, existem preferenciais (se a empresa recomenda a utilização de determinados provedores) b) distribuição geográfica da cobertura c) porta de entrada (é necessária indicação do serviço médico da empresa por exemplo?) 5.1.2 Restrições / Complementações a) quais as restrições para o acesso aos provedores 125 b) se há fator moderador c) se a empresa auxilia o empregado no pagamento de medicamentos, cadeira de rodas, etc. 5.1.3 Utilização dos Serviços a) se a empresa sabe se sua sinistralidade73 vem aumentando 5.1.4 Financiamento a) quem financia (atualmente e quando foi instituído) b) se é diferenciado por tipo de plano (quantas modalidades de convênio existem na empresa e em quê – odontologia, internação e hotelaria, exames laboratoriais, ambulatório, etc.) c) se a diferenciação de financiamento por tipo de plano está amarrada ao nível hierárquico da empresa. Se sim, se é pela categoria profissional ou por faixa de salário d) se é realizado co-pagamento. Se sim, por quais beneficiários e) quanto o gasto com essa assistência representa na folha de pagamento da empresa 5.1.5 Permanência / Rotatividade do convênio médico/operadora a) quantos convênio houveram e quantos há 5.2 Dimensão: Estrutura e Mudanças no Convênio médico-hospitalar da empresa Tipo de Operadora/administradora do plano/seguro de saúde a) quem é a operadora e qual sua classificação na tipologia tradicional (cooperativa médica, seguradora, medicina de grupo, autogestão) O plano mudou? O quê? a) oferta dos serviços cobertos b) financiamento c) administração 5.3 Dimensão: Relações Empresa / Trabalhadores /Assistência à Saúde 5.3.1 Iniciativa para implantar o plano a) Quando foi instituído, quem participou da negociação e com que peso b) Quantos funcionários havia na empresa c) Que benefícios eram oferecidos antes da implantação do convênio médicohospitalar 73 Sinistralidade = taxa de sinistro. Sinistro: acontecimento de evento previsto e coberto no contrato de seguro. Concretização do risco, cujas conseqüências são cobertas financeiramente pela apólice contratada (o conjunto de danos corporais e materiais resultantes de um mesmo acontecimento constitui um único sinistro, para efeito de cobertura e indenização). Realização do risco previsto no contrato de seguro causando danos materiais ou pessoais ao segurado ou a seus beneficiários. Ocorrência do risco, cujas conseqüências economicamente danosas estejam cobertas pela apólice (referência: www. seguros.com). 126 5.3.2 Quem mais esteve envolvido de lá para cá a) já se sabia qual operadora de plano/seguro seria a provável escolhida (quando surgiu o nome da operadora, antes, durante ou depois da negociação) b) instituições envolvidas na negociação (Sindicatos, Associações, Federações, Departamento de RH, etc.) 5.3.3 Participação dos trabalhadores a) queixas b) propostas de mudança c) acordos coletivos 5.3.4 Conflitos a) quais as principais demandas dos usuários b) Programa de Demissão Voluntária (PDV) (se há ou houve, quais os pontos da pauta de nogociação) 6. Dimensão das Relações Empresa / Trabalhadores / Assistência à Saúde / Movimento Sindical a) boletins do sindicato b) ACTs c) Entrevista informal com dirigentes e consultores do sindicato 127 ANEXO 2 – TABELA 6: DISTRIBUIÇÃO DA COBERTURA E DO FINANCIAMENTO DO SISTEMA DE ASSISTÊNCIA MÉDICA SUPLEMENTAR NO BRASIL, 1987 – 1996 Modalidade Assistencial Medicina de Grupo Cooperativa Médica Planos Próprios das Empresas Seguro de Saúde TOTAL Faturamento Estimado Anual (US$ bilhões) População Coberta Estimada (milhões de pessoas) 1996 ∆ 1987- ∆ 1994- ∆ 19871987 1994 1996 ∆ 1987- ∆ 1994- ∆ 19871994 1996 1996 1994 1996 1996(%) (%) (%) (%) (%) (%) 3,70 165,00 39,60 270,00 15,10 16,00 17,30 6,00 8,10 14,60 1987 1994 1,00 2,65(1) 0,35 1,75 3,50 400,00 100,00 900,00 3,60 8,50 10,00 136,10 17,60 177,70 0,42 2,00 4,60 376,20 130,00 995,20 5,00 8,00 9,00(2) 60,00 12,50 80,00 0,08 0,78 3,00 875,00 284,60 3650,00 0,70 5,00 6,00 614,30 20,00 757,10 1,85 7,18 14,80 288,10 106,12 24,40 37,50 42,30 53,70 12,80 73,40 700,00 Fonte: Almeida, Célia, A ASSISTÊNCIA MÉDICA SUPLEMENTAR NO BRASIL: PANORAMA ATUAL E TENDÊNCIAS, 1997; Médici, A.C. & Czapski, C. A. (1995:51); para os dados de Towers, Terrin & Crosby (1987 e 1994); ABRAMGE (Associação Brasileira de Medicina de Grupo); e Folha de São Paulo, 14/setembro/1997, para os dados de 1996. (1) Este dado foi retirado do Informe de Imprensa, da Abramge (set. 1997:3). O dado que consta em Médici & Czapski (1995:51) é US$ 2,10 bilhões. Isto significa que também o total para o ano de 1994 foi recalculado. (2) Segundo dados do CIEFAS, destes 9 milhões, cerca de 5,6 milhões são beneficiários e dependentes de 117 empresas filiadas ao CIEFAS (Acompanhamento e Desenvolvimento dos Planos de Assistência à Saúde, Pesquisa CIEFAS,1996). 128 ANEXO 3 – LISTA DE TABELAS , QUADROS E FIGURAS Ø Figura 1 – Proporção de Beneficiários de Planos / Seguros de Saúde por Intensidade de Utilização dos Serviços do SUS. Brasil – 1998. (P. 17) Ø Figura 2 – De que forma possui o plano? (P. 17) Ø Tabela 1 – Dimensões da saúde do trabalhador, respectivos órgãos responsáveis e implicações. (P.56) Ø Tabela 2 – Principais Categorias investigadas em campo e Formas de ocorrerem (P. 68) Ø Tabela 3 – Principais Benefícios oferecidos pelas empresas estudadas (P.70) Ø Tabela 4 – Distribuição do Financiamento das Modalidades Privadas – posição em 1996 e estimativa 1997 (P. 95) Ø Tabela 5 – Média mensal do número de Medidas Provisórias editadas e reeditadas nos governos José Sarney, Fernando Collor de Mello, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso (P. 98) Ø Figura 3 – Por que saiu do Plano? (P. 107) Ø Tabela 6 – Distribuição da cobertura e do financiamento do sistema de assistência médica suplementar no Brasil, 1987 - 1996 (referência na P. 99, disponível no Anexo 3, P. 127)