Ciclo Debates Economia Brasileira: onde estamos e para onde vamos? Plano Larida: da hiperinflação à estabilização André F. Z. de Azevedo PPG em Economia [email protected] Tópicos Analisados • Introdução – Diagnóstico e Combate – Plano Larida x Choque Heterodoxo • Sucessão de planos de estabilização • Plano Larida – Etapas – Plano Larida e Plano Real • Similaridades e Diferenças – Plano Real • Benefícios e Críticas • Paralelo entre situação atual e o início dos anos 1990 Referências • BRESSER-PEREIRA, L. C.; NAKANO, Y. Fatores aceleradores, mantenedores e sancionadores da inflação. Revista de Economia Política, v.4, p.5-21, 1984. • LOPES, F. Inflação inercial, hiperinflação e desinflação: Nota e conjeturas. Revista da Anpec, v.7, p. 55-71, 1984. • RESENDE, A. L.; ARIDA, P. Inertial inflation and monetary reform. In: WILLIAMSON, J. (Org.). Inflation and Indexation: Argentina, Brazil and Israel. Cambridge: MIT Press, 1985. • RESENDE, A. L. A moeda indexada: Uma proposta para eliminar a inflação inercial. Revista de Economia Política, v.5, p.130-134, 1985. 3 3 Introdução Diagnóstico • Fatores Aceleradores da Inflação (Causas) – Monetaristas: a inflação era causada (acelerada) pelo aumento da quantidade nominal de moeda acima do aumento da renda; – Keynesianos: atribuíam ao excesso de demanda em relação à oferta agregada • Ocorre geralmente quando a economia está próxima do pleno emprego dos recursos. – Estruturalistas: causada pelos estrangulamentos na oferta e aos efeitos propagadores dos aumentos setoriais de preços • Quanto menos concorrencial for a estrutura de mercado (oligopólio e, no limite, monopólio), maior a margem de repasse dos custos aos preços. Introdução Diagnóstico • Havia no Brasil, no início dos anos 1980, a percepção de que a inflação era predominantemente inercial – Havia um processo automático de realimentação dos preços, com a inflação presente sendo igual à inflação passada, provocado principalmente pelos mecanismos de indexação • A inflação inercial torna-se, assim, o resultado do conflito distributivo entre empresas, burocratas e trabalhadores para manter sua participação na renda (recompor o pico prévio de renda real). – Choques de oferta e demanda apenas alteravam o patamar inflacionário, que se mantinha mais elevado devido à inércia. Introdução Combate • Neste cenário, choques ortodoxos não seriam uma boa estratégia de combate à inflação – Com a economia plenamente indexada e taxas de inflação elevadas, essas políticas causariam grande perda de produto e emprego e também seriam incapazes de reduzir a inflação significativamente • Fracasso do ajuste ortodoxo de Delfim em 1981. – Somente com políticas de rendas (controles de preços e salários) seria possível um combate racional à inflação. Introdução Combate • Na época, surgiram duas propostas para combater este tipo de inflação: – a moeda indexada, de André Lara Resende e Pérsio Arida, também conhecido como Plano Larida (PUCRJ); – o choque heterodoxo, baseado no congelamento de preços, de Francisco Lopes (PUC-RJ) e Bresser Pereira e Yoshiaki Nakano (FGV-SP). Introdução Plano Larida x Choque Heterodoxo • Plano Larida • Choque Heterodoxo – Criação de uma moeda indexada, – Congelamento de preços em ancorada indiretamente ao dólar; uma data específica surpresa; – Adesão voluntária garante a – Congelamento de preços gera manutenção dos preços relativos; distorções nos preços relativos; –Demandaria um período de – Teria impacto imediato sobre a transição para reduzir a inflação; inflação; –Grande complexidade. – De fácil compreensão pelos políticos e pela população. 8 Sucessão de Planos de estabilização • Todos os cinco planos anteriores ao Real somente reduziram a inflação por alguns meses, que voltou a acelerar em seguida – Plano Cruzado (março/1986) – 77,7% em 12 meses – Plano Bresser (junho de 1987) – 398,5% em 12 meses – Plano Verão (janeiro de 1989) – 2.426,1% em 12 meses – Planos Collor I (março de 1990) – 422,8% em 12 meses – Collor II (janeiro de 1991) – 497,3% em 12 meses • Somente após o quase esgotamento das alternativas de tratamento da inflação crônica brasileira, as principais propostas do Plano Larida foram incorporadas ao Plano Real. Sucessão de Planos de estabilização • Razões dos fracassos dos planos de estabilização baseados no congelamento de preços – Congelamento levou a grande desequilíbrio de preços relativos devido à assincronia dos reajustes. Essa situação, por sua vez, levou: • Ao desabastecimento de produtos com preços reais defasados e/ou; • A pressões setoriais para romper o congelamento de preços. “A desindexação com congelamento de preços esbarra em dificuldades intransponíveis. Como congelar preços em uma economia onde a cada momento alguns preços estão à vespera de ser reajustados, portanto muito baixos, e outros acabaram de ser reajustados, portanto muito altos? A sua cristalização provocará ganhos e perdas de renda real insustentáveis” (RESENDE, A.L., 1985, p.130-31) 0,00 1980.01 1980.05 1980.09 1981.01 1981.05 1981.09 1982.01 1982.05 1982.09 1983.01 1983.05 1983.09 1984.01 1984.05 1984.09 1985.01 1985.05 1985.09 1986.01 1986.05 1986.09 1987.01 1987.05 1987.09 1988.01 1988.05 1988.09 1989.01 1989.05 1989.09 1990.01 1990.05 1990.09 1991.01 1991.05 1991.09 1992.01 1992.05 1992.09 1993.01 1993.05 1993.09 1994.01 1994.05 1994.09 Inflação Mensal (IPCA) 90,00 Collor I 80,00 82,4 70,00 60,00 Real 50,00 Verão 40,00 30,00 Bresser 20,00 Fonte: IBGE. Collor II Cruzado 10,00 Inflação Anual (IPCA) 3.000 Equivale a uma taxa mensal de 91,8% ao mês, ou 2,2% ao dia! 2.477% 2.500 2.000 1.500 1.000 500 Inflação acumulada no real: 441,1% equivale a uma taxa de 8% ao ano! Real 0 2015 2014 2013 2012 2011 2010 2009 2008 2007 2006 2005 2004 2003 2002 2001 2000 1999 1998 1997 1996 1995 1994 1993 1992 1991 1990 1989 1988 1987 1986 1985 1984 1983 1982 1981 1980 Fonte: IBGE. Sucessão de Planos de estabilização • Por que Plano Larida demorou tanto para ser adotado? – Maior complexidade em comparação aos planos anteriores, que se baseavam principalmente no congelamento de preços, que são mais facilmente compreendidos pelos políticos e pela população; – O congelamento de preços tem um impacto imediato sobre a inflação, enquanto o Plano Larida demandaria uma fase de transição, que duraria alguns meses • Essa maior demora para os resultados surgirem parece ter sido um aspecto crucial para a escolha do governo Sarney, em fevereiro de 1986, do chamado choque heterodoxo; – Mesmo após o fracasso inicial do Plano Cruzado, em 1986, a percepção majoritária entre os economistas era que um plano de estabilização deveria incluir um congelamento de preços. Etapas do Plano Larida – 1ª Fase: • Criação de uma moeda indexada, com o objetivo de eliminar a inércia inflacionária – Nova moeda seria um referencial de preços (unidade de conta) em relação a qual os preços da economia seriam fixados; – Seu valor seria determinado em ORTNs (indicador oficial da correção monetária) > 1 novo cruzeiro = 1 ORTN; – Como a correção monetária e cambial eram idênticas naquele período, o uso da nova moeda estabeleceria uma paridade fixa entre o dólar e a nova moeda. – 2ª Fase: • A adesão voluntária à nova moeda, prevendo-se a existência de duas moedas por certo período de tempo; – 3ª Fase: • Quando o uso da nova moeda fosse generalizado, o governo extinguiria “o cruzeiro” e a economia teria apenas a nova moeda em circulação, livre da inflação. Plano Larida e Plano Real Similaridades • O Plano Larida serviu de base ao Plano Real – A Unidade Real de Valor (URV) desempenhou o papel da ORTN, servindo como um referencial de preços • evitou que houvesse uma distorção dos preços relativos da economia e permitiu que a introdução do Real fosse realizada sem pressões para recomposição de preços. – Outra similaridade é o uso da âncora cambial, dando mais credibilidade à nova moeda • A banda informal de flutuação do real em relação ao dólar ajudou a manter a inflação sob controle nos primeiros anos do processo de estabilização. Plano Larida e Plano Real Diferenças • Plano Real teve maior preocupação com o equilíbrio fiscal e com a abertura da economia – Do lado fiscal, uma série de medidas para reduzir despesas e elevar receitas foi adotada: • Criação do Fundo Social de Emergência (FSE), que desvinculou parcialmente as receitas da União; • Programa de Ação Imediata (PAI), que propôs o corte emergencial de gastos e maior controle sobre os bancos estatais e início do saneamento dos bancos federais. – Relevância da abertura comercial • Ela serviu como um elemento importante para conter as pressões inflacionárias em um ambiente de elevado crescimento econômico, resultante do plano de estabilização. Plano Real Benefícios • O maior legado do Plano Real foi a estabilização monetária que o país apresenta desde 1994 – Com a inflação mais baixa, praticamente extinguiu-se o nefasto imposto inflacionário • Incide sobre os mais pobres, que não tem acesso ao sistema bancário para proteger a sua renda; • Portanto, a queda abrupta da inflação acaba gerando uma melhor distribuição de renda, pois beneficia principalmente os mais pobres. – Também eliminou-se o efeito Tanzi, aumentando a arrecadação do governo federal • Efeito Tanzi corresponde à corrosão inflacionária dos impostos entre o fato gerador e o efetivo recolhimento. Plano Real Críticas • Valorização cambial – Bacen estabeleceu teto de R$ 1 por dólar, mas não o piso no 2º semestre de 1994 • O real chegou a ser cotado a R$ 0,82 por dólar em setembro/1994. – Banda cambial e mini-desvalorizações, a partir de 1995, não impediram déficits comerciais recorrentes entre 1995 e 2000. • Abertura unilateral da economia – Redução generalizada de tarifas de importação, no 2º semestre de 1994, não proporcionou contrapartidas de parceiros comerciais • Liberalização foi parcialmente revertida em 1995 com a crise do México. Paralelo entre situação atual e o início dos anos 1990 (Estruturais) • Indexação de preços – Ainda mantemos a indexação formal em muitos setores da economia, um dos pilares do processo inflacionário crônico; – Esse mecanismo, ao atrelar os preços do presente à inflação passada, limita uma queda mais acentuada em períodos recessivos (ex: aluguel de imóveis e contas de luz). Paralelo entre situação atual e o início dos anos 1990 (Estruturais) • Elevado protecionismo – Após o processo de abertura comercial brasileiro, no início dos anos 1990, pouco se fez para ampliar o grau de integração com o mundo • Atualmente, o Brasil é uma das economias mais fechadas do mundo (relação exp+imp/PIB é de apenas 27%). – O elevado protecionismo acaba reduzindo a competição e, consequentemente, leva a preços mais altos para o consumidor. Paralelo entre situação atual e o início dos anos 1990 (Conjunturais) • Maior leniência com a inflação – Centro da meta no Brasil é um dos mais elevados dos países que adotam o sistema de metas de inflação • Somente a Turquia tem um centro da meta superior ao brasileiro de 4,5% ao ano. • Política fiscal expansionista – Déficit nominal é recorde na era do real, chegou a 10,3% do PIB, em 2015, refletindo aumento do déficit primário (1,9% do PIB) e do pagamento de juros (8,4% do PIB). Inflação em Países com Meta de Inflação PAÍS Centro da meta Inflação Diferença * atual BRASIL 4,5 9,3 4,8 TURQUIA 5,0 6,6 1,6 CHILE 3,0 4,2 1,2 MÉXICO 3,0 2,5 -0,5 CANADÁ 2,0 1,3 -0,7 INDONÉSIA 4,5 3,6 -0,9 SUÉCIA 2,0 0,8 -1,2 AUSTRÁLIA 3,0 1,3 -1,7 REINO UNIDO 2,0 0,3 -1,7 COREIA DO SUL 3,0 1,0 -2,0 SUIÇA TAILÂNDIA 2,0 -0,4 -2,4 3,5 0,1 -3,4 Fonte: The Economist. Evolução do IPCA e Juros 16,0 14,25% 14,0 12,0 9,3% 10,0 8,0 6,0 4,0 2,0 0,0 2016.03 2016.01 2015.11 2015.09 2015.07 2015.05 2015.03 2015.01 2014.11 2014.09 2014.07 2014.05 2014.03 2014.01 2013.11 2013.09 2013.07 2013.05 2013.03 2013.01 2012.11 2012.09 2012.07 2012.05 2012.03 2012.01 2011.11 2011.09 2011.07 2011.05 2011.03 2011.01 2010.11 2010.09 2010.07 2010.05 2010.03 2010.01 Fonte: IBGE. Selic IPCA PIB e inflação dos países do G20 em 2015 (em %) Posição Países PIB 15º 16º 17º China Estados Unidos Índia Reino Unido Coreia do Sul Alemanha União Europeia França Austrália Itália Arábia Saudita Canadá Japão México Indonésia África do Sul Turquia 6,9 2,5 7,3 2,2 2,7 1,5 1,5 1,1 2,4 0,8 3,4 1,2 0,6 2,5 4,7 1,3 3,0 18º Brasil -3,8 19º 20º Rússia Argentina -3,7 0,4 1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 9º 10º 11º 12o 13o 14º Diferença Inflação (em pontos percentuais)* 1,5 5,4 0,2 2,3 5,0 2,3 0,1 2,1 0,7 2,0 0,2 1,3 0,2 1,3 0,1 1,0 1,6 0,8 0,1 0,7 2,7 0,7 1,2 0,0 0,7 -0,1 2,7 -0,2 6,2 -1,5 4,7 -3,4 7,6 -4,6 -14,5 10,7 15,3 -19,0 41,6 -41,2 Fonte: FMI. Nota: (*) mede a diferença entre o crescimento do PIB e a inflação. Brasil foi o 20º em termos de crescimento do PIB e apresentou a 3ª maior taxa de inflação do G20 Muito Obrigado! [email protected]