Tratamento Percutâneo de Úlcera Penetrante de Aorta: Relato de

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Rev Bras Cardiol Invas 2005; 13(4): 307-310.
Gonçalves R, et al. Tratamento Percutâneo de Úlcera Penetrante de Aorta: Relato de Caso. Rev Bras Cardiol Invas 2005; 13(4): 307-310.
Relato de Caso
Tratamento Percutâneo de Úlcera Penetrante de Aorta:
Relato de Caso
Rosaly Gonçalves1, Marcelo José de Carvalho Cantarelli1, Hélio José Castello Júnior1, Silvio Giopatto1,
Evandro Karlo Pracchia Ribeiro1, Ednelson Navarro1, Mário Lúcio Baptista Alves1, Renato Bauab Dauar1,
João Gualberto Diniz1, Márcia Tosi1
RESUMO
SUMMARY
A úlcera penetrante de aorta (UPA) é uma entidade rara
e de prognóstico desfavorável, podendo evoluir para ruptura transmural da aorta, com freqüência maior que as
dissecções aórticas. Ainda mais raros são os relatos na
literatura de casos nos quais foram possíveis não apenas o
diagnóstico angiográfico, mas sobretudo o tratamento
endovascular com sucesso. Relatamos o caso de uma paciente
com diagnóstico de UPA complicada por ruptura tamponada
da aorta e associada à coronariopatia multiarterial grave,
admitida em nosso serviço em franca instabilidade hemodinâmica e tratada com sucesso com o implante de duas
endopróteses de aorta. A cirurgia de revascularização miocárdica pôde, então, ser realizada sob condições mais estáveis.
DESCRITORES: Úlcera, cirurgia. Aortopatias. Aorta torácica,
patologia, cirurgia. Contenedores.
A
úlcera penetrante de aorta (UPA) é definida como
a ulceração de uma lesão aterosclerótica da parede da aorta, que invade a lâmina elástica e acaba
por levar à formação de um hematoma na camada média1.
Embora a revisão da literatura atribua a sua primeira
descrição a Shennan, em 19342, foram Stanson et al.3
que posteriormente ampliaram os conhecimentos sobre o assunto, tendo sido os primeiros a descreverem
a incidência, história natural, tratamento cirúrgico da
lesão e quatro potenciais desfechos, a saber:
• Ulceração da camada íntima;
• Hematoma intramural;
1
Hospital Bandeirantes, São Paulo, SP.
Correspondência: Rosaly Gonçalves. Av. Professor Rubens Gomes
de Souza, 167 - Jardim Cordeiro - São Paulo - SP - CEP 04640-230.
Tel.: (11) 9132-9597/(11) 3345-2199 • Fax: (11) 3277-3390
e-mail: [email protected]
Recebido em: 08/12/2005 • Aceito em: 24/01/2006
Endoluminal Treatment of Penetrating Atherosclerotic
Aortic Ulcer: Case Report
A penetrating atherosclerotic aortic ulcer (PAU) is a rare
entity with unfavorable prognosis, which may progress towards
aortic transmural rupture, most times larger than aortic
dissections. Even rarer in the literature are case reports of
PAU with angiographic diagnostic confirmation and successful
endovascular treatment. We report on a case of a patient
with a PAU, complicated by a sealed rupture associated to
serious multivessel coronary disease, and admitted at our
Cath Lab with hemodynamic instability. Emergency endoluminal treatment was successful, with the use of two stents,
which allowed surgical myocardial revascularization to be
carried out under more stable conditions.
DESCRIPTORS: Ulcer, surgery. Aortic diseases. Aorta, thoracic, pathology, surgery. Stents.
• Formação de pseudo-aneurisma;
• Ruptura transmural.
O hematoma pode se manter localizado ou se
estender, porém, habitualmente, não se desenvolve o
quadro típico de “falsa-luz”.
Em cerca de 8% dos casos, o hematoma pode avançar através da adventícia e causar uma ruptura transmural ou pode progredir para uma dissecção aórtica típica.
Os pacientes acometidos costumam ser idosos,
com história pregressa de hipertensão arterial sistêmica
(HAS) e doença aterosclerótica avançada.
Conseqüentemente, a UPA está em geral associada a uma alta incidência de co-morbidades, tais como
coronariopatia e obstruções do sistema carotídeo.
Os sinais e sintomas podem incluir dor torácica
(com ou sem irradiação para dorso), hemotórax, derrame
pleural, sangramento gastrointestinal e embolização
distal3-5.
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No seu amplo estudo, Coady et al.6 enfatizaram
que o aspecto fisiopatológico da UPA é singular e
distinto da dissecção aórtica. O prognóstico em pacientes sintomáticos hospitalizados devido ao quadro de
UPA mostrou-se pior que o daqueles com dissecção
aórtica clássica, devido a maior incidência de ruptura.
Contrastando com esses resultados, estão os dados
de pacientes assintomáticos relatados por Harris et al.7
e Quint et al.8, onde a incidência de complicações
com risco de vida foi significativamente menor.
Some-se a isso a evidência aparente de que UPAs
localizadas na aorta ascendente, arco aórtico ou aorta
descendente proximal costumam ter uma evolução
pior, comparando-se com as observadas nos terços
médio e distal da aorta descendente. As explicações
fisiopatológicas para tal diferença evolutiva podem ser
o maior estresse hemodinâmico ou o predomínio de
elastina sobre colágeno na camada média das porções
proximais da aorta9.
em outro hospital devido a quadro de forte dor torácica,
de início súbito, localizada em hemitórax esquerdo
com irradiação para dorso.
A radiografia de tórax (RX) evidenciava nítido alargamento do mediastino e ela foi, então, encaminhada ao
nosso serviço para estudo da árvore coronariana e
aortografia.
O eletrocardiograma evidenciou ondas R “amputadas” nas derivações D3, aVF, V1 e V2.
Foi realizada uma TC de tórax que revelou alargamento da aorta torácica descendente e a presença de
um hematoma intramural e de derrame pleural (Figura
1). Levantou-se a hipótese diagnóstica de ruptura tamponada da aorta.
A presença de uma úlcera da aorta torácica descendente foi evidenciada através da aortografia (Figura 2),
que também evidenciou:
Embora ainda haja controvérsias, as ferramentas
diagnósticas e os métodos de imagem de escolha para
a avaliação pré-operatória são: tomografia computadorizada (TC), ressonância nuclear magnética (RNM) e
angiografia. Cumpre enfatizar, entretanto, que um alto
grau de suspeita clínica é fundamental para o diagnóstico.
O achado típico da UPA, o deslocamento da calcificação da íntima, pode ser bem visualizado na TC.
Alguns autores têm sugerido reservar a utilização de
RNM e angiografia para os casos com dúvidas diagnósticas.
Recomenda-se intervenção terapêutica rápida para
os pacientes sintomáticos. A correção cirúrgica com
colocação de enxerto é uma opção. Esses pacientes,
entretanto, não são usualmente bons candidatos à
cirurgia a céu aberto, pois têm altos índices de morbimortalidade operatória.
Figura 1 - Tomografia computadorizada inicial, evidenciando alargamento da aorta torácica descendente, hematoma intramural e derrame pleural.
A correção endovascular com o implante de stent
surgiu mais recentemente como uma opção terapêutica menos invasiva e envolvendo menores taxas de
complicações e mortalidade.
Essa técnica foi inicialmente relatada com sucesso
pelo grupo de Stanford10,11 e relatos subseqüentes foram
publicados 8,12-15.
Um caso de implante endovascular em um paciente
com UPA rota foi relatado por Pitton et al.16.
De modo semelhante, Schoder et al. 17 também
publicaram uma série de oito casos de UPA complicada da aorta descendente tratados com o uso de stents.
RELATO DO CASO
Paciente do sexo feminino, 76 anos, com HAS e
diabetes mellitus como fatores de risco, foi admitida
Figura 2 - Aortografia pré-procedimento, evidenciando presença de
úlcera da aorta torácica descendente.
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• Ausência de dupla luz ou flap;
• Dilatação leve da aorta ascendente e da porção
abdominal da descendente.
À coronariografia, detectamos:
súbita, dez meses após a intervenção. A real causa
não pôde ser estabelecida, podendo ter sido de origem
cardíaca ou cerebrovascular.
DISCUSSÃO
• Obstruções graves na artéria descendente anterior (DA), primeiro diagonal (DG 1) e artéria coronária
direita (CD);
Essa é uma rara oportunidade de diagnóstico angiográfico de uma UPA com ruptura tamponada - complicação essa encontrada apenas em 8% das UPAs.
• Obstruções moderadamente obstrutivas na artéria
circunflexa (CX).
O tratamento endoluminal em caráter de emergência
foi realizado com sucesso, utilizando-se dois stents, o
que permitiu que a cirurgia de revascularização miocárdica fosse realizada sob condições mais estáveis.
Devido ao quadro clínico grave da paciente, com
instabilidade hemodinâmica e os elevados índices de
mortalidade associados com a cirurgia a céu aberto,
nossa opção terapêutica foi a imediata correção endovascular da UPA complicada. A cirurgia de revascularização miocárdica poderia, então, ser realizada sob
condições mais estáveis.
O procedimento foi realizado no laboratório de
Hemodinâmica, sob anestesia geral, usando acesso
femoral padrão, com arteriotomia à direita para progressão do stent e punção à esquerda para posicionamento
do cateter angiográfico tipo Pigtail.
A opção cirúrgica para o tratamento da coronariopatia deveu-se à presença de doença multiarterial
difusa e grave em paciente diabética e sem disponibilidade para uso de stents com eluição de drogas.
Apesar do sucesso do procedimento e da ótima
evolução no seguimento a médio prazo, a paciente
apresentou morte súbita.
Foi realizado o implante transluminal do Sistema
Braile (Rx) de endoprótese aórtica. As angiografias de
controle evidenciaram, no entanto, um deslocamento
da borda proximal da endoprótese (stent) dentro do
hematoma intramural (Figura 3). Um segundo stent,
posicionado distalmente ao primeiro, foi liberado, permitindo total cobertura do defeito. A tomografia pósprocedimento mostra exclusão da úlcera e hematoma
intramural (Figura 4).
Apesar da rápida e franca melhora hemodinâmica,
a paciente persistiu com precordialgia, a qual foi atribuída à presença de doença multiarterial coronariana
grave.
A paciente foi, então, submetida à cirurgia de
revascularização miocárdica, três dias após, sem circulação extracorpórea.
Figura 3 - Angiografia de controle, onde se observa deslocamento
da borda proximal da endoprótese (stent) dentro do hematoma intramural.
Foram realizados um enxerto de veia safena para
DG1 e uma anastomose de artéria torácica interna
para DA. A CD não recebeu enxerto devido à extensa
calcificação.
A permanência hospitalar foi mais prolongada em
decorrência de uma infecção pulmonar.
O restante da sua internação transcorreu sem anormalidades.
Durante o acompanhamento clínico de até 9 meses
após o procedimento, por meio de contato telefônico,
a paciente encontrava-se assintomática. Seu seguimento
clínico-cardiológico estava sendo realizado em outro
serviço com seu médico privado.
Entretanto, a referida paciente apresentou morte
Figura 4 - Tomografia pós-procedimento exibindo exclusão da úlcera e hematoma intramural.
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Especulamos se as causas podem ter sido a revascularização miocárdica incompleta (CD muito calcificada) ou mesmo a progressão da doença da aorta, já
que a paciente apresentava outras dilatações da aorta
abdominal que não foram tratadas.
9.
10.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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