Resiliência: um processo ativado em situações adversas? Autores: Amanda Assad Rezende Anna Carolina T. A. Estefan Curso Psicologia Universidade Estácio de Sá Orientadora: Angela Utchitel Resumo O presente trabalho aborda brevemente o Transtorno de Estresse Pós-Traumático e discute o conceito de Resiliência associado a fatores de risco/proteção e estresse/trauma. Ao longo do artigo é apresentada uma pesquisa de campo que teve como objetivo verificar se o conceito de Resiliência atua, de fato, como um fator de proteção e adaptação contra o desenvolvimento do Transtorno de Estresse Pós-Traumático em situações de catástrofe. Para isso, a pesquisa contou com uma população de trinta e três participantes. A avaliação da Resiliência foi realizada através da Escala de Resiliência e a avaliação dos sintomas do Transtorno do Estresse Pós-Traumático foi realizada a partir da aplicação do Post-Traumatic Stress Disorder Checklist - Civilian Version (PCL-C). Palavras-chave: Psicologia; Resiliência; Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT); Situações de Catástrofe. Introdução Fenômenos da natureza como enchentes, tsunamis, furacões, deslizamentos de terra e terremotos são situações experienciadas por milhões de pessoas em todo o mundo e podem se configurar como situações traumáticas. Como conseqüência, o Transtorno de Estresse PósTraumático (TEPT) é um dos quadros psiquiátricos mais presentes em indivíduos que sobreviveram a uma catástrofe natural. Porém, não são todas as vítimas de um desastre natural que desenvolvem o Transtorno de Estresse Pós-Traumático. O que leva, então, uma pessoa a se adaptar a uma situação traumática? Professora Doutora da Universidade Estácio de Sá-Campus Nova Friburgo 1 Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012 O termo “resiliência” (do latim re, “para trás” e salire, “voltar) passou para o léxico psicológico a partir das ciências físicas. Originalmente, denota a capacidade de um corpo se deformar por obra de agentes externos e, depois, recuperar a forma natural. No sentido psicológico, segundo Christopher M. Layne (2011), pesquisador de resiliência da University of California em Los Angeles, “basicamente significa que a pessoa volta a funcionar como antes dentro de um breve período” (p.32). A expressão já foi utilizada como sinônimo de fator de proteção intrínseco ao indivíduo (HOGE et al, 2007), como uma característica positiva da personalidade que facilita a adaptação individual (WAGNILD & YOUNG, 1993) e como sinônimo do conjunto de fatores de proteção individuais, familiares e sociais (LAM & GROSSMAN, 1997). Embora já tenha sido utilizada como sinônimo de desfecho positivo, freqüentemente, o termo Resiliência é usado para descrever o processo dinâmico que leva à adaptação positiva no contexto de uma adversidade (LUTHAR et al, 2000). A maior tragédia natural do Brasil aconteceu na madrugada do dia 12 de janeiro de 2011 na Região Serrana do estado do Rio de Janeiro, sendo a cidade de Nova Friburgo a mais afetada. De acordo com a Defesa Civil do município, o número de desabrigados e desalojados ultrapassou cinco mil. Será que indivíduos mais resilientes apresentam um quadro sintomatológico do TEPT mais brando? A pesquisa desenvolvida teve como objetivo relacionar a Resiliência e o Transtorno de Estresse Pós-Traumático nas vítimas da catástrofe de Nova Friburgo. Transtorno do Estresse Pós-Traumático A Psiquiatria buscou, desde as primeiras descrições de casos clínicos de histeria, entender a relação entre os fenômenos traumáticos vividos pelo paciente e os sintomas psicológicos apresentados por ele. Primeiramente, a ênfase recaía sobre a experiência subjetivamente experienciada. Já num segundo momento, houve o reconhecimento da importância dos estressores traumáticos presentes, por exemplo, nas Grandes Guerras Mundiais. Foi Abram Kardiner que publicou em 1941 um livro sobre “As Neuroses Traumáticas de Guerra”, que passou a ser considerada a obra que viria a definir, pelo resto século XX, o que é hoje conhecido como Transtorno de Estresse Pós- Traumático. O TEPT, segundo Ito e Roso (1998), é uma reação a uma situação de perigo que pode se tornar patológica quando o indivíduo permanece em um estado de desconforto resultante da lembrança do evento estressor vivido. Define-se por uma série de sintomas físicos e psicológicos que podem ser diretamente observados, diagnosticados e tratados. O transtorno do estresse pós-traumático é a psicopatologia que melhor representa a relação entre eventos externos e suas conseqüências psicológicas. 22 Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012 Diagnóstico O TEPT é um transtorno de ansiedade que se desenvolve após um evento traumático de natureza extrema que causa intenso sofrimento emocional e comprometimento social e ocupacional. De acordo com a última edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, DSM IV, são duas as características centrais do TEPT: o evento traumático e a tríade psicopatológica. Um evento para se configurar como traumático deve preencher os critérios de tipo A do DSM- IV transcritos a seguir: 1. A pessoa vivenciou, testemunhou ou foi confrontada com um ou mais eventos que envolvem morte ou grave ferimento, reais ou ameaçadores, ou uma ameaça à integridade física própria ou a de outros; 2. A resposta da pessoa envolveu intenso medo, impotência ou horror. Apesar de alguns eventos, como desastres naturais, acidentes, estupros, combate militar, abuso sexual e abuso físico serem classificados como precipitadores de traumas mais comuns na literatura especializada, qualquer situação pode ser caracterizada como traumática, desde que a pessoa experimente altos níveis de medo, horror ou impotência. O evento pode ser externo (assalto) à pessoa ou interno (doença). Porém, sem a ocorrência de um evento traumático não é possível o desenvolvimento e o diagnóstico do Transtorno de Estresse PósTraumático. Para completar o diagnóstico do TEPT, o indivíduo que experimentou uma situação traumática deve desenvolver três grupos de sintomas, chamada de tríade psicopatológica: a revivência do trauma, a esquiva e o entorpecimento emocional e a hiperestimulação autonômica. Neste sentido, o primeiro grupo (critério B do DSM-IV) é caracterizado por revivências da experiência através de sonhos vívidos, pesadelos, pensamentos intrusivos, sentimentos incontroláveis, flashbacks e pelo indivíduo se comportar como se o evento traumático estivesse ainda ocorrendo. Esses sintomas, além de serem extremamente dolorosos e dominarem a atenção da pessoa, são exclusivos do TEPT não sendo encontrados em nenhum outro transtorno psiquiátrico. A esquiva e o entorpecimento emocional constituem o critério C do DSM-IV. O primeiro corresponde a uma tentativa de evitar contato com tudo que relembre o trauma (pensamentos, sentimentos, atividades, locais e pessoas que ativem recordações) e, muitas vezes, é acompanhado pela incapacidade de relembrar algum aspecto importante do evento. Já o entorpecimento emocional (anestesia emocional ou numbing) é caracterizado pela sensação de distanciamento em relação às outras pessoas, sentimento de um futuro abreviado e incapacidade de ter afeto por pessoas próximas como antes. As características descritas nesse grupo podem ser consideradas estratégias emocionais, cognitivas e comportamentais utilizadas 33 Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012 pelos indivíduos para minimizar o sofrimento causado pelos sintomas de revivência e de hiperestimulação autonômica. Por último, é citada pelo DSM IV em seu critério D, a hiperexcitabilidade, que representa um estado de hiper-reação do corpo a estímulos externos, como se esse estivesse em permanente perigo, expressando-se através de sintomas como insônia, sobressalto, coração acelerado, irritabilidade, baixa concentração e hipervigilância. A hiperestimulação pode, também, se apresentar na forma de queixas somáticas, como fadiga e cefaléia. Ainda segundo o DSM IV, os sintomas devem persistir por, pelo menos, quatro semanas após o trauma para que se possa diagnosticar o Transtorno de Estresse PósTraumático. Este pode ser classificado como agudo, quando os sintomas começam nos primeiros três meses após o trauma; como crônico, quando a duração é superior a três meses; e de início tardio, quando os sintomas se instalam após seis meses da ocorrência do trauma. Vale ressaltar que os critérios diagnósticos utilizados pela Classificação Internacional de Doenças (CID-10) equiparam-se aos do DSM-IV, diferenciando-se apenas na menor ênfase dada aos sintomas de esquiva/entorpecimento emocional e hiperestimulação autonômica. Resiliência Ao longo da vida, em algum momento, todos iremos passar por pelo menos uma situação adversa. Como alguns indivíduos, então, superam essas situações? O que faz uns se adaptarem e outros não a um contexto de intenso estresse? São todas as pessoas que se recuperam de grandes perdas materiais e afetivas? A psicologia vem buscando responder a essas perguntas através do estudo do fenômeno Resiliência. Este, gera uma nova possibilidade de compreensão acerca de como o ser humano lida com condições potencialmente traumáticas. O conceito O termo Resiliência, segundo o dicionário da língua portuguesa Houaiss (2001), no sentindo físico é a propriedade que alguns corpos apresentam de retornar à forma original após terem sido submetidos a uma deformação elástica; no que diz respeito ao ser humano, é a capacidade de se recobrar facilmente ou se adaptar à má sorte ou às mudanças. O dicionário da língua inglesa Longman Dictionary of Contenporary English (1995) traz a definição do verbete no sentido psicológico: a resiliência como a habilidade de voltar rapidamente para o seu usual estado de saúde ou de espírito, depois de passar por doenças e dificuldades. A conceituação do termo na psicologia não é tão precisa como na física devido à diversidade e complexidade de variáveis no estudo de fenômenos humanos. Para um dos principais precursores do estudo da Resiliência na psicologia, o psiquiatra Michael Rutter (1987), este conceito se refere a uma 44 Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012 “variação individual em resposta ao risco e os mesmo eventos estressores podem ser experenciados de maneira diferente por diferente pessoas. (...) A resiliência não pode ser vista como um atributo fixo do indivíduo, e se as circunstâncias mudam a resiliência se altera”. (RUTTER, 1987, p.317) Anos mais tarde, o referido autor define a resiliência como “um fenômeno em que se supera o estresse e as adversidades” (RUTTER, 1999, p.119). Ralha Simões (2001) define o termo como a possibilidade de flexibilidade interna que permitiria a adaptação positiva frente às adversidades externas. Para Garmezey (1993), o conceito está relacionado com a capacidade de voltar ao funcionamento padrão após vivenciar um evento adverso, não deixando de ser transformado por este. Já para Cyrulink (2001), a Resiliência diz respeito a um conjunto de fatores interligados que, ao longo da vida, se desenvolvem nos aspectos afetivos, sociais e culturais e é comparado metaforicamente à arte de navegar em meio à tempestade. Ainda Zimmerman e Arunkmar (1994) destacam que o termo Resiliência está ligado aos fatores e ao processo que interrompem uma trajetória de risco tendo como conseqüência respostas positivas mesmo frente às adversidades. Em suma, a Resiliência refere-se à capacidade do ser humano de agir de forma favorável diante as adversidades encontradas ao longo do seu desenvolvimento. Porém, o termo ainda é impregnado de incertezas e controvérsias entre os autores que discutem o tema. Enquanto uns destacam a flexibilidade e versatilidade como características de pessoas resilientes, outros salientam o conceito como um traço de personalidade (FLANCH, 1991; GARMEZY, 1985; WOLIN, 1993). Há também discussões acerca da Resiliência ser uma característica individual ou resultado da interação com o ambiente (FLANCH, 1991; RUTTER, 1993; TAVARES, 2001; TROMBETA e GUZZO, 2002). Resiliência e fatores de risco e proteção Para entender a Resiliência é preciso explicitar os chamados fatores de risco e proteção. Os fatores de risco estão relacionados a eventos negativos que, quando presentes, aumentam a probabilidade do indivíduo desenvolver problemas físicos, psicológicos e sociais. Em contrapartida, os fatores de proteção referem-se às influências que atenuam ou neutralizam os efeitos negativos dos riscos, tornando possível a construção da Resiliência. Rutter (1987) ressalta que a Resiliência é o processo final de mecanismos de proteção que possibilita ao indivíduo lidar com a situação de risco de maneira positiva, não eliminando, portanto, o risco em si. Ainda, Cowan, Cowan e Schulz (1996) ligam Resiliência e fator de risco da seguinte forma: “resiliência refere-se aos processos que operam na presença de risco para produzir conseqüências boas ou melhores do que aquelas obtidas na ausência de risco” (p.14). 55 Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012 Risco, então, se caracteriza como qualquer obstáculo que se impõe ao desenvolvimento positivo do indivíduo, sendo atualmente entendido como um processo e não de maneira estática. De acordo com Yunes & Szymanski (2001), um evento para ser considerado fator de risco dependerá da atribuição subjetiva do indivíduo; o que é risco para uns não será para outros. Além disso, dentro de uma situação, qualquer variável poderá estar agindo com indicadora de risco. Na área da saúde mental, o termo risco tem sido descrito como estressor ou fator que predispõe um resultado negativo. Esse poderá desencadear uma conseqüência indesejada, como um distúrbio psicológico de acordo com sua severidade, duração, freqüência e intensidade. É importante destacar que Masten e Garmezy (1985) indicam que os fatores de risco associados ao desenvolvimento de distúrbios envolvem características individuais (sexo, habilidades sociais e intelectuais, aspectos psicológicos, variáveis demográficas e história genética) e ambientais (apoio social, eventos estressantes de vida e características familiares e culturais). Devido à capacidade de proteger o indivíduo diante da adversidade, os fatores de proteção são tidos como características individuais (traços de personalidade) ou ambientais (rede de apoio social) que amenizam os efeitos negativos do meio. Logo, os mecanismos de proteção conduzirão o indivíduo para uma resposta mais adaptada. Proteção é definida por Deslandes e Junqueira (2003) como o grupo de influências que modificam e melhoram a resposta do indivíduo frente a uma situação de risco que predispõe a um resultado não adaptativo. Além disso, a proteção não elimina os aspectos psicológicos promovidos por uma situação adversa. Vale ressaltar que proteção não é sinônimo de invulnerabilidade, pois esta significa resistência absoluta ao estresse, uma característica não passível de mudança. Zimmerman e Arunkumar (1994) concluem que Resiliência e invulnerabilidade não podem ser considerados conceitos equivalentes, uma vez que, invulnerabilidade está associada a idéia de que o indivíduo não seria atingido de nenhuma forma pela situação de estresse. Enfim, para Trombeta e Guzzo (2002), de um lado, encontram-se os eventos estressores, as situações adversas, os perigos e o sofrimento e, do outro lado, respostas de enfretamento positivas, competências pessoais, apoio social e familiar. O binômio risco x proteção propiciará o desenvolvimento da Resiliência como um processo psicológico. Resiliência e evento estressor/trauma De acordo com Masten e Garmezy (1985), qualquer mudança no meio externo que interfira nos padrões normais de enfrentamento do indivíduo e que, conseqüentemente, leve a um alto grau de tensão são considerados eventos estressores. 66 Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012 “Numa visão subjetiva do fenômeno, pode-se dizer que, dependendo da percepção que o indivíduo tem da situação, da sua interpretação do evento estressor e do sentido a ele atribuído, teremos ou não a condição de estresse” (YUNES, SZYMANSKI, 2001, p.30). Trauma, na origem do conceito, significa lesão causada por um agente externo. No campo da Psicologia, o termo está freqüentemente associado com a transgressão das defesas psicológicas. Logo, o modo como a pessoa processa o evento estressor é fundamental para a configuração ou não de um trauma. A Resiliência promoveria a capacidade de enfrentar, resignificar e se adaptar a situações de estresse de maneira que o estressor deixe de ser visto como tal. Conseqüentemente, a Resiliência age de forma protetora na não formação de um trauma. Pesquisa de Campo A pesquisa descrita a seguir teve o intuito de averiguar se a Resiliência estaria ativada em indivíduos que passaram por um evento estressor de alta intensidade como a catástrofe natural ocorrida no dia 12 de janeiro de 2011 na cidade de Nova Friburgo, RJ. Amostra A seleção da amostra foi realizada dentro dos seguintes critérios: escolaridade (primeiro grau completo), idade (adultos de ambos os sexos entre 20 e 60 anos) e os participantes terem obrigatoriamente vivenciado a tragédia e estarem na condição de desalojados ou desabrigados. Foram selecionadas 33 pessoas, sendo 11 homens e 22 mulheres. Instrumentos de avaliação A Escala de Resiliência (anexo A) utilizada nessa pesquisa foi desenvolvida por Wagnild e Young (1993). Possui 25 itens descritos em forma de afirmações com respostas auto-aplicáveis tipo Likert de sete pontos: 1 (discordo totalmente) e 7 (concordo totalmente) e os escores variam entre 25 (baixa resiliência) e 175 (alta resiliência). A partir de 111 (ponto de corte aproximado a 110.6) a pessoa poderá ser considerada resiliente. O estudo da “Adaptação transcultural, confiabilidade e validade da escala de resiliência” foi realizado por Pesce, Assis, Avanci, Malaquias e Oliveira (2005) e apresentou equivalência conceitual entre os itens, determinando que a escala é pertinente à cultura brasileira. A avaliação dos sintomas do Transtorno do Estresse Pós-Traumático foi realizada através do Post-Traumatic Stress Disorder Checklist - Civilian Version (PCL-C – anexo B) desenvolvido por Weathers, Litz, Huska e Keane, do National Center for PTSD (EUA). É uma escala auto-aplicável que possui duas versões: a PCLC-M (para militares) e a PCL-C (para civis) que é amplamente utilizada em todo o mundo para rastreamento do Transtorno do Estresse Pós-Traumático. Possui 17 itens que avaliam a intensidade dos sintomas do TEPT com cinco possibilidades de resposta. Estas variam entre “nada” (o sintoma não está presente) 77 Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012 e “muito” (o sintoma está presente em alta intensidade) e os escores estão no intervalo de 17 (ausência total do quadro sintomatológico do TEPT) a 85 (quadro sintomatológico importante), no qual a linha é 50 pontos. Resultados A tabela abaixo ilustra os resultados obtidos através da pesquisa. Participante Sexo PCL-C Escala de Resiliência 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 M F F F F F F F M F M 33 49 52 25 29 38 65 50 36 51 29 136 130 121 126 138 136 88 126 125 97 116 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 F F F M M F M M F F F F M F M F F F M F F M 28 69 20 20 22 20 30 32 33 60 70 34 20 25 50 59 48 54 35 23 19 22 128 107 136 135 139 157 104 141 148 56 113 152 143 145 120 113 116 114 112 141 145 146 88 Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012 Discussão dos resultados Pode-se observar que, dos trinta e três participantes, dez indivíduos (identificados pelos números 3, 7, 8,10, 13, 21, 22, 26, 27 e 29) apresentaram escores para possível TEPT. Dentre esses, quatro apresentaram baixa Resiliência (indivíduos: 7, 10, 13 e 21) e, outros três, Resiliência pouco acima da linha de corte (indivíduos 22, 27 e 29). Segundo os critérios estabelecidos, os sujeitos que tiveram menores escores no PCL-C (indivíduos: 14, 15, 17, 24 e 32) apresentaram alta resiliência. Entre os dez participantes com os maiores índices de resiliência (escores que variam de 139 a 157), nenhum apresentou probabilidade de TEPT e três desses encontram-se dentre os menores índices verificados no PCL-C (indivíduos: 17,24 e 32). Já dos cinco indivíduos (7, 10, 13, 18 e 21) que apresentam resiliência abaixo da linha de corte (111), quatro obtiveram altos escores no PCL-C indicando provável TEPT. Logo, podemos observar que a maioria dos mais resilientes realmente mostrou um quadro sintomatológico do TEPT brando ou nulo, enquanto a maior parte da população que se apresentou como a menos resiliente desenvolveu um importante quadro de sintomas do transtorno. A partir de análise acima, verificou-se que a Resiliência é um processo ativado a favor do indivíduo na proteção e adaptação em situações adversas que podem levar a conseqüências negativas, como o desenvolvimento do transtorno de estresse pós-traumático. Limitações Ao longo da pesquisa encontramos algumas dificuldades no tocante à seleção da amostra, em função de algumas limitações observadas, então, na referência à utilização dos instrumentos escolhidos e adotados. A ideia inicial era realizar a pesquisa com os desalojados e desabrigados que estivessem nos abrigos. Porém, nos deparamos com a limitação da escolaridade dessas pessoas que não conseguiam compreender, por conta de insuficiência de vocabulário, os termos utilizados na escala de Resiliência de forma satisfatória. Diante desta dificuldade, não julgamos válida a modificação de instrumento, uma vez que esse já possui tradução transcultural publicada em artigo científico. A partir disso, exigimos escolaridade mínima (primeiro grau completo) como critério para a seleção da amostra. A nova população foi composta, então, por indivíduos que vivenciaram a tragédia, tendo como atual moradia casas de parentes, amigos ou em aluguel. Vale ressaltar que todas as pessoas que participaram da pesquisa estavam necessariamente presentes no momento da catástrofe em suas residências atingidas. Considerações Finais 99 Volume 2º. – nº 02 – 2º. semestre 2012 É importante ressaltar as dificuldades geralmente encontradas em pesquisas das ciências humanas que possuem uma complexa rede de variáveis incontroláveis, como a história desenvolvimental de cada um, a rede de apoio social, os traços de personalidade e a genética. É sabido que essas variáveis influenciam diretamente nos resultados obtidos. Sendo assim, esses podem não ser totalmente fidedignos. Além disso, o próprio conceito de Resiliência apresenta limitações devido a poucos estudos realizados no Brasil, onde o meio acadêmico apresenta inexpressivas publicações sobre o tema em livros didáticos e técnicos. Podemos citar, ainda, que há divergências entre os principais autores, no sentido de interrogarem se a Resiliência seria um processo de adaptação ou de superação, se fator inato ou adquirido, ou se referido a algo circunstancial ou permanente. Para explicitar tamanha dificuldade, Slap (2001) ressalta que “é mais fácil concordar sobre o que resiliência não significa do que sobre o que palavra significa” (p.173). Porém, a resiliência possui inúmeras possibilidades de aplicação, já que contribui para compreensão do processo de produção de saúde em meio às adversidades encontradas pelo ser humano ao longo da vida. Então, o potencial contido nesse conceito pode contribuir para a instrumentalização de profissionais que trabalham com indivíduos e grupos em situação de risco. Referências BERGER, William. et. al. Equivalência semântica da versão em português da Post-Traumatic Stress Disorder Checklist - Civilian Version (PCL-C) para rastreamento do transtorno de estresse pós-traumático. 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