1 LIMA, LARISSA ASSIS BATTISTETTI BIBLIOTECA CENTRAL DA USP DE RIBEIRÃO PRETO FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO E CONTABILIDADE DE RIBEIRÃO PRETO ‐ USP TOMBO: ___________ SYSNO.: _______________ MONOGRAFIA 2014 “ESTUDO DA CADEIA PRODUTIVA DA MÚSICA: OS PAPÉIS DE CADA UM DOS SEUS ATORES E O CAMINHO PERCORRIDO PELAS BANDAS, DO SEU SURGIMENTO ATÉ A CONSOLIDAÇÃO PROFISSIONAL.” ALUNO: LARISSA ASSIS BATTISTETTI LIMA ORIENTADOR: PROFA. DRA. GECIANE SILVEIRA PORTO 2 LARISSA ASSIS BATTISTETTI LIMA ESTUDO DA CADEIA PRODUTIVA DA MÚSICA: os papéis de cada um dos seus atores e o caminho percorrido pelas bandas, do seu surgimento até a consolidação profissional. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto para obtenção do título de Bacharel em Administração. Orientadora: Profa. Dra. Geciane Silveira Porto Ribeirão Preto 2014 LARISSA ASSIS BATTISTETTI LIMA 3 ESTUDO DA CADEIA PRODUTIVA DA MÚSICA: os papéis de cada um dos seus atores e o caminho percorrido pelas bandas, do seu surgimento até a consolidação profissional. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto para obtenção do título de Bacharel em Administração. Aprovado em 02 de Julho de 2014 Banca Examinadora Profa. Dra Geciane Silveira Porto Instituição: FEARP-USP Hideki Yoshimoto Instituição: SESC- RP Prof. Dr. Lara Liboni Instituição: FEARP-USP 4 Dedico esse trabalho aos meus amigos e à minha família. 5 AGRADECIMENTOS Agradeço à minha família, aos meus pais, Leopoldo da Silva Lima e Marilda das Dores de Assis, além da minha irmã, Nádia Assis Battistetti Lima, pelo apoio durante a realização do trabalho. Agradeço aos professores da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto, em especial à professora e amiga Dra. Geciane Silveira Porto, por todo o suporte que sempre dedicou ao meu trabalho e por ter me apresentado à Administração Cultural. Agradeço aos meus amigos, por toda a ajuda e apoio. Por último, agradeço, também, aos entrevistados Dedé Cruz, Duda Lazarini, Ricardo Gama, Bruno Araújo, Vinícius Calderoni, Horácio Silveira, Cauby Peixoto e Nancy Lara, por disponibilizarem seu tempo e por contribuírem com seus conhecimentos para a realização do presente trabalho. 6 RESUMO LIMA, L. A. B. ESTUDO DA CADEIA PRODUTIVA DA MÚSICA: os papéis de cada um dos seus atores e o caminho percorrido pelas bandas, do seu surgimento até a consolidação profissional. 2014. 117f. Monografia (Graduação em Administração) Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2014. A indústria da fonográfica passa por um momento de crise, devido ao advento da pirataria e da internet como forma de distribuição do fonograma. As vendas do suporte físico CD, principal produto dessa indústria até então, vem caindo fortemente. Assim, o presente trabalho tem como objetivo estudar a cadeia produtiva da música de forma a entender o atual cenário dessa indústria e os caminhos trilhados pelas bandas, desde a criação, produção e distribuição até a divulgação. Este trabalho utiliza de pesquisa qualitativa, por meio de entrevistas em profundidade com diversos atores desse cenário. Os resultados levaram à conclusão de que existem oportunidades a serem aproveitadas. Palavras- chave: Indústria fonográfica, crise, internet, cadeia produtiva, atores 7 ABSTRACT LIMA, L. A. B. STUDY OF THE MUSIC SUPPLY CHAIN: the roles of each of its actors and the path traversed by bands since its appearance to professional consolidation. 2014. 117f. Monograph (Bachelor in Business Administration) – Faculty of Economics, Business Administration and Accounting of Ribeirão Preto, University of São Paulo, Ribeirão Preto, 2014. The recording industry is going through a time of crisis, with the advent of piracy and the internet as a mean of distribution of the phonogram. The physical support CD, the main product of this industry up to now, strongly decreases its sales. Therefore, the present work aims to study the music production chain in order to understand the current scenario of the industry and the paths taken by bands since the creation, production and distribution to the divulgation. This paper uses qualitative research through interviews with various actors in this scenario. The results led to the conclusion that there are opportunities to be explored. Keywords: music industry, crisis, internet, supply chain, actors 8 SÚMARIO 1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 13 1.1 Objetivos ............................................................................................................... 14 2. REFERENCIAL TEÓRICO ................................................................................ 15 2.1 A Evolução Histórica ........................................................................................... 15 2.1.1 Cenário Internacional ...................................................................................... 16 a. Antes do surgimento da Indústria Fonográfica .................................................. 16 b. Surgimento da Indústria Fonográfica ................................................................. 16 2.1.2 Brasil .................................................................................................................. 18 2.1.3 O mercado brasileiro hoje ............................................................................... 20 2.2 Fases da cadeia produtiva da música................................................................. 21 2.2.1 Criação............................................................................................................... 21 2.2.2 Produção ............................................................................................................ 21 a) Estúdios .................................................................................................................. 22 b) Home-Studio .......................................................................................................... 22 c) Tempo de estúdio ................................................................................................... 22 d) Suporte ................................................................................................................... 22 2.2.3 Distribuição ....................................................................................................... 23 a) Aprovação do Marco Civil da Internet ............................................................... 25 b) Concorrência com o produto estrangeiro ........................................................... 26 2.2.4 Divulgação ......................................................................................................... 26 a) O papel das gravadoras majors na divulgação ................................................... 26 b) Outros meios de divulgação ................................................................................. 26 2.3 Gravadoras ........................................................................................................... 27 2.4 As gravadoras independentes (indies) ............................................................... 27 2.5 As majors .............................................................................................................. 28 2.5.1 As vantagens e desvantagens de contratar com uma gravadora major hoje .. ..................................................................................................................................... 30 9 2.6 As bandas que se administram ........................................................................... 31 2.7 Editoras ................................................................................................................ 32 2.8 Ecad, Sociedades Autorais e ISRC..................................................................... 32 2.9 Shows e editais ..................................................................................................... 33 2.10 O incentivo público à música ............................................................................ 34 2.11 Pirataria .............................................................................................................. 36 3. METODOLOGIA.................................................................................................. 40 3.1 Tipo de Pesquisa .................................................................................................. 40 3.2 Protocolo da Pesquisa.......................................................................................... 41 3.2.1 Descrição dos Entrevistados ............................................................................ 42 3.3 Etapas da Pesquisa .............................................................................................. 43 4. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS ........................................................... 44 4.1. Em relação à escolha do que tocar .................................................................... 44 4.2 O músico visto como um profissional ................................................................ 45 4.3 Perfil de músico que interessa às gravadoras ................................................... 46 4.4 Em relação ao enfoque em mais de uma banda ................................................ 48 4.5 A música como indústria do entretenimento .................................................... 49 4.6 O “sucesso” profissional...................................................................................... 53 4.7 Mudanças geradas pela internet ........................................................................ 54 4.8 Pirataria ............................................................................................................... 57 4.9 Sobre a falta de espaço no mercado atual ........................................................ 58 4.10 A dificuldade de se sustentar com a música ................................................... 59 4.11 Em relação ao constante aperfeiçoamento profissional ................................ 60 4.12 Bandas que se Administram ............................................................................ 60 4.13 Editoras ............................................................................................................. 64 4.14 Trajetória dos músicos/bandas entrevistadas ................................................ 64 4.15 Programas Governamentais ............................................................................ 67 4.16 O circuito Sesc, editais de empresas privadas e outros circuitos não comerciais .................................................................................................................. 68 4.17 Diferenças entre a major e as demais gravadoras.......................................... 69 4.18 As vantagens e desvantagens em se contratar com uma gravadora major . 69 4.19 Gravadoras independentes .............................................................................. 75 4.20 Diferenças entre o atual mercado brasileiro e o paulista .............................. 78 4.21 O suporte físico hoje ......................................................................................... 79 10 4.22 Características do mercado fonográfico brasileiro ....................................... 79 4.23 Estúdios ............................................................................................................. 84 4.24 Home- studios ................................................................................................... 86 4.25 O show ............................................................................................................... 86 4.26 Imprensa Especializada ................................................................................... 87 4.27 Características para conseguir se manter em um mercado tão competitivo88 4.28 Poder de divulgação das mídias tradicionais ................................................. 90 4.29 Parcerias com outros músicos ......................................................................... 91 4.30 Distribuição do Fonograma pelas bandas entrevistadas ............................. 92 4.31 Preocupação com fãs fora do Brasil............................................................... 93 4.32 O cantor que toca em bares ............................................................................. 94 4.33 Bandas cover ..................................................................................................... 94 4.34 Sugestões para uma produtora musical ......................................................... 95 4.35 Erros cometidos pelas casas noturnas ............................................................ 95 4.36 Erros cometidos por músicos ........................................................................... 96 4.37 Ensaio................................................................................................................. 98 4.38 Como promover projetos que fogem à Indústria Cultural ........................... 98 5.ANÁLISE DOS RESULTADOS ........................................................................ 100 5.1 A Cadeia Produtiva da Música e seus atores ................................................. 100 5.2 As vantagens e desvantagens em se contratar com uma grande gravadora102 5.3 Oportunidades para as bandas........................................................................ 103 5.4 Estratégias a serem adotadas pelas bandas.................................................... 104 5.5 Caminhos trilhados pelas bandas entrevistadas ............................................ 107 5.6 Possibilidades de produção .............................................................................. 107 5.7 Modelo de negócios que melhor se adaptará à crise dessa indústria ........... 108 5.8 Pirataria ............................................................................................................. 108 5.9 Sucesso do sertanejo ......................................................................................... 109 5.10 Análise do Ambiente Fonográfico segundo Porter.......................................109 6- CONSIDERAÇÕES FINAIS E LIMITAÇÕES DO ESTUDO ..................... 111 7.REFERÊNCIAS .................................................................................................. 113 11 LISTA DE FIGURAS E QUADROS Quadro 1: Editais e propostas de patrocínios por empresas públicas e privadas ................... 33 Quadro 2: Projetos Aprovados pelo ProAC ...................................................... .................... 35 Quadro 3: Protocolo da Pesquisa ................................................................................. 41 Quadro 4: Cronograma ................................................................................................ 43 Quadro 5: Vantagens e desvantagens em se contratar com uma major .. ................. 102 Quadro 6: Oportunidades e ameaças geradas pela internet ..................... ................. 104 Quadro 7: Trajetória dos músicos/bandas entrevistados ......................... ................. 107 Quadro 8: Ameaças e oportunidades e criadas pela pirataria .................. ................. 109 Figura 1: Cadeia Produtiva da Música ................................................... ................. 101 Figura 2: Análise do Ambiente Fonográfico segundo Porter ..................................109 12 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABMI Associação Brasileira dos Músicos Independentes ABPD Associação Brasileira dos Produtores de Discos ABRAMUS Associação Brasileira de Música e Artes ADDAF Associação Defensora de Direitos Autorais APCM Associação Antipirataria de Cinema e Música ARAC Associação Brasileira de Autores, Compositores, Intérpretes e Músicos BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social CD Compact Disc DRM Digital Rights Management E- Rec Eletronic Recording Ecad Escritório Central de Arrecadação e Distribuição ISRC International Standard Recording Code MP3 MPEG 1 Layer-3 MPEG Moving Picture Experts Group PRoAC Programa de Ação Cultural PRONAC Programa Nacional de Apoio à Cultura SMD Disco Semimetalizado SOPA Stop Online Piracy Act WAV Waveform Audio File Format 13 1. INTRODUÇÃO A indústria fonográfica está passando por um momento de transformação, onde surgem novos atores e alguns atores já existentes assumem novos papéis. Esta transformação é resultado da crise gerada pelo advento da internet atuando como ferramenta de divulgação e distribuição do fonograma, aliado ao advento da pirataria. Dessa maneira, o suporte físico, aquele que armazena um fonograma, podendo ser o LP, CD, etc., o principal produto dessa indústria até então, teve suas vendas reduzidas de forma significativa. Por isso, as grandes indústrias fonográficas, entre outros atores desse mercado, estão trabalhando na busca por novos produtos a serem comercializados, de forma a substituir a queda nas vendas do suporte físico. Neste novo cenário, existe uma grande oportunidade para as bandas: elas podem se auto- administrar, rompendo o vínculo que sempre existiu com as gravadoras, em especial com a major (grande gravadora). Por tudo isso, é fundamental estudar esse novo momento do mercado musical, de forma a entendê-lo e identificar oportunidades de atuação para bandas que estão surgindo. Assim, o músico é o foco de interesse. Ele se constitui naquele que utiliza a música como forma de trabalho produtivo, ou seja, aquele que faz da música a sua profissão, mesmo que não em período integral, mas como atividade produtiva principal. Este trabalho visa, por meio de uma pesquisa qualitativa, analisar a cadeia produtiva da música, com enfoque na produção musical, seus atores e papéis, de forma a entender por que algumas bandas se tornam conhecidas e outras não, embora tenham também esse objetivo. A análise será qualitativa, uma vez que se trata de um trabalho exploratório onde se busca um maior conhecimento das variáveis em questão. O presente trabalho visa contribuir para o estudo do ambiente fonográfico de produção de uma banda, tendo em vista a lacuna existente na literatura referente a este tema. Este trabalho busca, ainda, ajudar os músicos a planejarem suas carreiras, ajudando-os a entender os diferentes fatores que influenciam na produção de seu trabalho. Este trabalho é composto pelos seguintes capítulos: Introdução, onde são apresentados o problema de pesquisa e os objetivos gerais e específicos do mesmo; Referencial Teórico, onde se faz um estudo do histórico da indústria fonográfica e das etapas de produção de uma obra; Metodologia, o qual apresenta o método de estudo utilizado; a Apresentação dos Resultados traz as informações obtidas por meio das entrevistas realizadas; a Análise dos Resultados, por sua vez, traz uma comparação entre as informações obtidas do Referencial Teórico àquelas adquiridas por meio das entrevistas. Por último, nas Considerações Finais e 14 Limitações do Estudo são apresentados uma avaliação crítica dos resultados e as conclusões desse estudo. 1.1 Objetivos Busca-se como objetivo geral dessa pesquisa, um entendimento da atual cadeia produtiva da música, com enfoque na produção musical e dos papéis de cada um de seus atores, de forma a encontrar oportunidades para músicos atuantes nesse mercado, aqueles que fazem da música a sua profissão. Como objetivos específicos, têm-se: a) Entender quais são os fatores do mercado fonográfico que influenciam na produção de uma banda. b) Entender o que leva uma banda a se tornar conhecida do grande público enquanto outras não atingem esse tipo de resultado; c) Verificar a existência de fatores associados ao grau de conhecimento do grande público; d) Levantar fatores que limitam às bandas atingirem esse objetivo. e) Mapear os caminhos trilhados por bandas que atualmente podem ser classificadas como conhecidas do grande público; f) Verificar quais modelos de negócios da indústria fonográfica apresentam características de que estão melhor preparados para enfrentar a atual crise da indústria; g) Analisar as oportunidades ou nichos não explorados, para atuação de novas bandas; h) Estudar as oportunidades que surgem por meio de programas de governo que incentivam a cultura. 15 2. REFERENCIAL TEÓRICO Discute-se, nesta etapa do trabalho, o histórico da indústria fonográfica, desde seu surgimento até o presente cenário, de forma a entender os caminhos trilhados até então. Posteriormente, se estudam as fases da cadeia produtiva da música, a criação, a produção, a distribuição e a divulgação. Serão estudados, ainda, outros aspectos da indústria fonográfica: a pirataria e seus aspectos positivos e negativos, os programas governamentais de incentivo à cultura e os shows e editais de promoção da cultura. Estudar-se, também, as diferenças entre as grandes gravadoras (majors), as quais detêm maior participação no mercado fonográfico e as indies, aquelas que não estão atreladas às gravadoras majors (ABMI, 2014, p.1). 2.1 A Evolução Histórica A indústria fonográfica passa por um momento de crise, uma vez que o advento da pirataria e da internet fizeram com que o suporte físico CD sofresse uma queda em suas vendas. Dessa maneira, esta indústria deve buscar novos produtos que substituam o CD. Esta crise é, então, resultado da introdução de novas tecnologias no mercado, tecnologias que permitiram que o artista pudesse se desvincular da major, a grande gravadora, aquela com maior poder de mercado, e administrar suas próprias carreiras. É necessário, portanto, estudar o histórico da indústria fonográfica, de forma a entender o atual cenário dessa indústria e os caminhos que foram trilhados por este mercado ao longo de sua história. Diante da atual crise desta indústria, um olhar para o passado permite identificar modelos de negócio e oportunidades que podem ser utilizados no cenário atual, e este conhecimento pode resultar em uma diminuição dos custos, o que será benéfico para o artista independente (aquele que produz seu trabalho de forma independente, conceito que será melhor definido ao longo do presente trabalho). Por isso, pode-se pensar em novos caminhos que os artistas podem trilhar na sua busca pelo sucesso profissional, outro conceito que é discutido posteriormente neste trabalho. Cabe dizer, ainda, que a indústria fonográfica se insere na indústria cultural, definida por Adorno como aquela que determina o consumo das massas, trata os seres humanos como consumidores ou empregados, além de possuir o papel de transmitir a ideologia dominante (ADORNO, 1999). Ela se insere, ainda, na economia criativa, que são “atividades que resultam em indivíduos exercitando a sua imaginação e explorando seu valor econômico. Pode ser definida como processos que envolvam criação, produção e distribuição de 16 produtos e serviços, usando o conhecimento, a criatividade e o capital intelectual como principais recursos produtivos” (Wikipedia, 2014, p.1). 2.1.1 Cenário internacional a- Antes do surgimento da Indústria Fonográfica : Antes do surgimento da indústria fonográfica existia o negócio das partituras e de derivados, como o comércio de instrumentos musicais, mercado bem desenvolvido no século XIX (PINTO.; JOSÉ PAULO GUEDES, 2011 apud FRITH, SIMON.; 2006, p.57). O consumo de música e sua produção se restringiam às editoras e publicadoras de partituras, aos grupos musicais e às casas de espetáculos onde esses se apresentavam. As partituras somente viriam a ser melhor disseminadas com a evolução dos meios de transporte (NAKANO, DAVI; 2010 apud ANAND; PETERSON, 2000). Pode-se perceber que no século XIX, embora a indústria fonográfica ainda não tivesse surgido, havia um comércio de partituras, no quais era importante o suporte do Direito, de forma a manter os direitos autorais e o próprio comércio. b- Surgimento da Indústria Fonográfica: A indústria fonográfica, conjunto de empresas que gravam e distribuem a mídia sonora, surgiu com o advento do gramofone, criado por funcionários da Bell Telephone Company, e de suportes sonoros como o fonograma (fixação de uma obra em um suporte material, é a obra gravada) e o disco. O marco inicial de seu surgimento é o ano de 1877, com a invenção do fonógrafo por Thomas Edison, um aparelho que servia para registrar e reproduzir o som. A invenção do fonógrafo e do gramofone permitiu que os suportes sonoros atingissem uma produção industrial (PINTO.; JOSÉ PAULO GUEDES, 2011). Segundo Guedes (2011), nesta fase da indústria fonográfica a maior preocupação do consumidor não era restrita ao o que tocar no aparelho do gramofone, uma vez que sua tecnologia consistia em uma novidade, assim, qualquer som reproduzido por ele era de interesse desse público. Com o surgimento dessas novas tecnologias o consumidor passou a comprar não apenas a partitura, mas também a música desenvolvida e gravada pelo intérprete. Existia, nesse momento, a figura do industrial do disco, precursor da figura do produtor musical (que substituiu o industrial do disco e administrava a empresa fonográfica), sua função consistia em captar e reproduzir o som. Por isso, ele não interferia no processo criativo do músico, como o produtor faria, o aumento do trabalho técnico do produtor reduzia 17 o trabalho criativo do músico. Posteriormente, por volta da década de 1920, a indústria começou a controlar o que chegava aos ouvidos do público, uma vez que não conseguia abarcar toda a variedade sonora existente no mercado, e a produzir por meio da gravação elétrica, o que resultou numa queda no preço do disco (suporte físico) e um aumento do mercado consumidor. Havia, ainda, uma maior preocupação com o tempo gasto em estúdio (PINTO.; JOSÉ PAULO GUEDES, 2011). A questão da preocupação com o tempo ocioso de estúdio é muito importante. Ao limitar o tempo de estúdio acaba-se limitando o trabalho criativo do músico. Exemplo da importância do trabalho criativo em estúdio é o caso dos Beatles, que possuíam tempo ilimitado de estúdio, o que resultou em um trabalho inovador. Na década de 1950, a maior responsável por inovações nesse setor é a gravadora independente. Pelo fato de possuir menos recursos que a major, a gravadora independente buscava se adaptar: (...) por exemplo, o guitarrista Willie Kizart, da banda de Ike Turner, gravou a música Rocket 88, em 1951, utilizando um amplificador danificado durante o transporte, o que modificou o sinal enviado pela guitarra, gerando um som distorcido. Alguns guitarristas começaram a procurar intencionalmente, então, esta sonoridade. Willie Johnson (nos estúdios da independente Chess Records), guitarrista de Howlin’ Wolf, começou a utilizar os amplificadores em volume e ganho máximo, fazendo-os entrar em operação crítica, também gerando assim um som “sujo”. Com o mesmo propósito, em 1958, na gravação de Rumble (pela gravadora indie Cadence Records), o guitarrista Link Wray decidiu furar os cones do alto-falante de seus amplificadores com um lápis, o que também lhes conferiu um timbre distorcido (LUERSEN, EDUARDO HARRY; 2012, p. 68). Deve-se, então, considerar a importância de gravadoras independentes (indies) como a Chess Records, as quais foram as responsáveis pela divulgação do Jazz, com promoção de artistas como Etta James, o qual não era interesse das majors na época. Nos anos 1960, as majors finalmente adotaram o método de gravação via fita eletromagnética (uma mídia de armazenamento da obra musical) o que levou a novas experiências com este novo dispositivo. Os exemplos mais citados de experimentos em estúdio, no meio acadêmico, certamente são aqueles utilizados pelo produtor George Martin no álbum Sargent Pepper’s Lonely Hearts Club Band (1967), dos Beatles, entre eles, o uso criativo do recurso de overdub (técnica de adicionar novos sons a uma gravação anterior) através da gravação multi-pista, de compressores, entre outros “truques” de estúdio. Os Beatles eram, naquela época, a banda de maior reputação no cast da gravadora EMI, o que lhes conferiu maior liberdade para fazer experimentações dentro do estúdio Abbey Road. Além disso, a gravadora britânica lhes concedeu carta branca para utilizar o estúdio sem a cobrança das taxas por hora de estúdio (LUERSEN, EDUARDO HARRY; 2012, p. 68 apud Lewisohn, 1988, p.100). No final da década de 1970 as vendas de suporte físico caíram consideravelmente. A crise, porém, poderia ter sido pior se a fita cassete, um suporte físico barato, não tivesse sido 18 introduzido no mercado. Porém, a introdução da fita cassete inaugurou a pirataria, o que acabaria por remodelar essa indústria (PINTO.; JOSÉ PAULO GUEDES, 2011). Posteriormente, “o CD foi lançado em 1982 pela Philips e pela Sony, no ano de 1983 nos Estados Unidos”. (SALLABERRY, 2008 pp. 73-74) O surgimento das cópias piratas, devido à facilidade de se copiar a fita cassete pode, então, ser visto como um dos fatores que geraria a crise da indústria fonográfica, juntamente com o advento da internet. A pirataria, porém, não é negativa para todos os atores da indústria fonográfica, como é o caso dos artistas independentes, que querem dar um maior alcance para a sua obra. Nos anos 2000 as majors têm investido em uma série de ações de forma a tentar reduzir os efeitos negativos da pirataria na venda de seu produto, como utilizar de mecanismos legais, promovendo ações para impedir a pirataria, tentando estabelecer novos modelos de negócios de distribuição virtual, o que não tem sido uma estratégia bem sucedida e, por último, têm terceirizado as atividades de manufatura de suportes (NAKANO, DAVI; 2010). A crise financeira mundial de 2008 não afetou fortemente a indústria fonográfica, uma vez que esta acabou se adaptando a momentos de crise (MENEZES, THIAGO ANDRADE DE, 2010 apud ABPD, 2009). 2.1.2 Brasil O primeiro fonógrafo veio para o Brasil em 1878, para demonstrações experimentais em uma conferência no Rio de Janeiro. No entanto, nessa época as pessoas ainda não podiam adquirir estes equipamentos para reprodução e posse definitiva da música, uma vez que ainda era muito caro (PINTO.; JOSÉ PAULO GUEDES, 2011). Em 1889 o imperador D. Pedro II, a Princesa Isabel e o Conde D’Eu assistiram a uma sessão de gravação no Brasil (MENEZES, THIAGO ANDRADE DE; 2010 apud SILVA, 2001). Pode-se pensar que, devido às novas tecnologias desenvolvidas atualmente e à facilidade que a internet criou para a distribuição das obras musicais, essa indústria estaria retornando ao modelo de negócio citado acima, onde não se é dono se tem a posse da obra, mas apenas o direito de uso. Esses modelos de negócio que conferem o acesso temporário já existem, por exemplo, algumas bandas disponibilizam suas músicas para se ouvir por meio da internet, mas não possibilitam o download, a posse definitiva do mesmo, etc. Este é um 19 exemplo da importância de se entender o histórico desta indústria, de forma a compreender seu posicionamento atual e a busca por novas oportunidades. Em 1891, Frederico Figner de origem tcheca, que mais tarde se torna o primeiro empresário da indústria fonográfica no país, vem dos E.U.A desembarcando na cidade de Belém iniciando um longo caminho de divulgação do fonógrafo através de feiras e festas de feitio popular passando pelo Amazonas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Bahia e Minas Gerais durante o período de um ano até que segue para o Rio de Janeiro (MENEZES, THIAGO ANDRADE DE; 2010, p. 19 apud SILVA, 2001). Além de contratar cantores e músicos, Figner também se apropriava gratuitamente de composições alheias, originando, no Brasil, o desrespeito aos direitos autorais dos compositores (PINTO.; JOSÉ PAULO GUEDES, 2011 apud TINHORÃO, pp. 24 e 25). A partir da década de 50, o Brasil começou a receber gravadoras majors, sendo que algumas delas acabaram por dominar o mercado até hoje: em 1960, depois de adquirir a CBD (Companhia Brasileira do Disco) chegou ao país a PhillipsPhonogram, que se tornou a PolyGram e, posteriormente, filiou-se à Universal Music; a CBS em 1953, que hoje é a Sony Music; a EMI, que se instalou no país em 1969, depois de adquirir a Odeon; em 1976, a subsidiária brasileira da WEA, suporte fonográfico principal do grupo Warner, foi fundada; e, finalmente, a Ariola – pertencente ao conglomerado alemão Bertellsman (BMG) – surgiu em 1979, porém esta já tinha certa atuação no Brasil desde 1925 (MENEZES, THIAGO ANDRADE DE; 2010, pp. 20-21 apud VICENT, 2006). Com o início da Ditadura Militar em 1964, teve início a censura à música brasileira, aumentando a importação do produto internacional para o país. Na década de 1970 se adotou no Brasil o “sistema aberto”, terceirizando parte da produção para as gravadoras menores e com a possibilidade das indies explorarem nichos musicais não atacados pelas majors. Nessa época, as receitas advinham da comercialização de obras lítero-musicais, dos fonogramas e da emissão ou execução pública das músicas. Fontes que ainda existem hoje, mas que se complementam com outras, como a venda de shows (PINTO.; JOSÉ PAULO GUEDES, 2011 apud VICENTE, 2001). Porém, a partir da década de 1960 a televisão comercial, o surgimento de movimentos como a MPB, entre outros fatores, contribuíram para que o mercado brasileiro de discos aumentasse sua importância no mercado externo (DE MARCHI, LEONARDO; ALBORNOZ, LUIS ALFONSO; HERSCHMANN, MICAEL, 2011, apud NAPOLITANO, 2001). No ano de 1979 o mercado fonográfico brasileiro era um dos mais rentáveis do mundo, devido aos grandes investimentos feitos pelas multinacionais que aqui estavam (DE MARCHI, LEONARDO; ALBORNOZ, LUIS ALFONSO; HERSCHMANN, MICAEL, 2011). Já no final da década de 1990, até os dias de hoje houve um crescimento do mercado pirata no Brasil (MENEZES, THIAGO ANDRADE DE, 2010). Ainda, na década de 1990 20 surgiram novas gravadoras independentes no país, como a Trama e a Biscoito Fino e surgiram também, nesse período, novas formas de distribuição da obra musical, como a compra de músicas via internet ou aparelhos celulares (DE MARCHI, LEONARDO; ALBORNOZ, LUIS ALFONSO; HERSCHMANN, MICAEL, 2011). A descentralização da indústria na década de 1990 possibilitou, então, o surgimento de gravadoras independentes e, posteriormente, de artistas que administram suas próprias carreiras musicais (DE MARCHI, LEONARDO, 2012). Exemplos dessas bandas hoje são algumas das entrevistadas para este trabalho. Este tópico será visto com mais detalhes no capítulo sobre bandas que se administram. 2.1.3 O mercado brasileiro hoje O maior consenso hoje entre os estudiosos da música, como José Paulo Guedes Pinto e Thiago Andrade de Menezes é de que a indústria fonográfica enfrenta uma grave crise. Porém, alguns estudiosos da área pensam de forma diferente. Segundo Hershmann (2013), é possível que a indústria fonográfica não esteja passando por um momento de crise, mas sim de transição. Não existem dados estatísticos suficientes para realizar essa análise atualmente. Surge em pauta, então, uma das grandes dificuldades em se estudar a indústria fonográfica, que é a carência de dados. Outra questão importante a se tratar, ressaltada por Nakano (2010), é que ao se considerar a finalidade de lazer que essa indústria apresenta hoje, pode-se chamá-la de indústria do entretenimento. Um grande contingente de figuras atuam no mercado fonográfico atual: a editora, o intérprete, o compositor, o empresário, o produtor, o engenheiro de som, técnicos de áudio, o staff de assessoria ao desenvolvimento artístico das gravadoras, profissionais dos estúdios de gravação, o distribuidor (LUERSEN, EDUARDO HARRY; 2012), gravadoras, selos, executivos, diretores, produtores e apresentadores de TV, locutores e programas de rádio, repórteres e editores de revistas que auxiliam na parte de divulgação e marketing no setor (MENEZES, THIAGO ANDRADE DE, 2010). Outras características dessa indústria hoje, além da desvalorização do suporte físico o CD, são o aumento da importância dos shows ao vivo e a constante busca por novos negócios, em especial na internet (HERSCHMANN, MICAEL; 2013). Além disso, outro fator que se apresenta diferente no mercado hoje é a existência de várias empresas que buscam o mercado 21 de shows ao vivo, como a Time for Fun no Brasil, e a Fêniz y Pop Art na Argentina e, também, concertos e eventos informais que têm sido realizados sem contrato, como o tecnobrega, a cumbia villera e o funk carioca (HERSCHMANN, MICAEL; 2013). Outro fato a ser apontado é a rotatividade dos músicos, que apresentam contratos de duração cada vez mais curtos com as grandes gravadoras. Deve-se ressaltar ainda, a presença no mercado brasileiro, desde o final dos anos 1990, dos padres cantores, como o Padre Marcelo Rossi, que gravou pela PolyGram (Universal) (VICENTE, EDUARDO; 2008). Outro fato importante a ser considerado no cenário atual são as características do público brasileiro, com alto índice de uso de telefones celulares, baixo acesso à internet de banda larga, alta frequência nos shows ao vivo e uso constante de redes sociais (DE MARCHI, LEONARDO; ALBORNOZ, LUIS ALFONSO; HERSCHMANN, MICAEL, 2011). Esse cenário mostra que o consumidor tem buscado cada vez mais a música atrelada ao entretenimento, além de um fonograma que seja de fácil acesso, como ocorre por meio dos celulares. 2.2 Fases da cadeia produtiva da música 2.2.1 Criação Não cabe nesse trabalho entrar em detalhes a respeito da etapa criativa, uma vez que ela se refere primordialmente ao trabalho do músico. Cabe dizer, porém, que a substituição da figura do industrial do disco, o qual não interferia na produção, reproduzia o som pronto pela do produtor, na década de 1950, diminuiu substancialmente a importância do músico. Ainda, o tempo de estúdio é algo que influencia na qualidade do som final e no processo criativo, tópico que é melhor discutido na análise dos resultados. 2.2.2 Produção Figuras importantes na etapa de produção são o produtor e o engenheiro de som. Cabe ao produtor musical a escolha do estúdio, dos equipamentos, engenheiros de som, dos arranjos e do prazo para o projeto, além da responsabilidade pelos assuntos burocráticos na produção de um disco. Já o engenheiro de som é o principal responsável pela qualidade do que será produzido. É importante ressaltar que a produção pode se dar, hoje em dia, via web 22 por meio de E- Rec (Eletronic Recording), possibilitando que músicos que se encontrem em diferentes localidades realizem um trabalho em conjunto (SALLABERRY, 2008). a) Estúdios: como apresentado anteriormente, o estúdio de gravação se caracteriza como um laboratório estético, principalmente a partir da década de 1950 (LUERSEN, EDUARDO HARRY; 2012). As gravadoras independentes, nesse período, possuíam menos recursos que as majors, e, por isso, usavam da inovação em sua produção. Isso levou a um produto diferenciado. É interessante que o músico use de criatividade não somente no processo de criação, mas também na produção. Como visto no histórico, artistas inovaram a partir dessas deficiências e criaram um som de qualidade. b) Home- Studio: antes do final dos anos 1960 somente as grandes gravadoras possuíam estúdios de gravação, devido aos seus altos custos (LUERSEN, EDUARDO HARRY; 2012). Porém, com o barateamento dos equipamentos de gravação se tornou possível que as pessoas produzissem seus discos em casa, sem depender de estúdios profissionais. Segundo Luersen (2012), porém, esse processo pode resultar em perda de qualidade técnica e artística das obras. Segundo Sallaberry (2008), home- studio é definido como um “estúdio dentro de casa” e ele não é mais sinônimo de um estúdio precário, mas pode ter todos os requisitos para uma boa produção. Ele acaba, porém, sendo restrito aos proprietários, não possui uso comercial. Pode ocorrer ainda um processo misto, iniciando a produção em um home-studio e continuando em um estúdio profissional. c) Tempo de estúdio: o tempo de estúdio é um importante aspecto que influencia na qualidade sonora do que será produzido. Como já mencionado, os Beatles possuíam tempo de estúdio ilimitado, o que impactou em seu produto. Eles tiveram permissão de sua gravadora para utilizar o estúdio sem que houvesse o pagamento por horas de estúdio (LUERSEN, EDUARDO HARRY; 2012). Esta possibilidade de espaço criativo poderá interferir diretamente na qualidade e perfil da obra. d) Suporte: embora as vendas do suporte físico CD tenham caído vertiginosamente, ele ainda serve como forma de divulgar um trabalho artístico (SALLABERRY, 2008). Além do CD é produzido hoje o disco semimetalizado, SMD, uma iniciativa brasileira que possibilita manter a qualidade de gravação em relação ao CD, mas com um custo de 23 produção menor em relação a este e que toca em qualquer CD player (DE MARCHI, LEONARDO; ALBORNOZ, LUIS ALFONSO; HERSCHMANN, MICAEL, 2011). Essa tecnologia proporcionou uma parceria inédita entre artistas e camelôs, os quais passam a distribuir o SMD original, e não mais o CD pirata, uma vez que o SMD é mais barato (SALLABERRY, 2008). O SMD é um concorrente do CD, juntamente com os dispositivos móveis tocadores de áudio, como iPhones, MP3, entre outros. O MP3, um fonograma digital, é uma evolução do sistema WAV de armazenamento, modelo usado pela Microsoft e IBM, que possibilitou o armazenamento de músicas em um menor espaço que o WAV. Com o MP3 surgiu o DRM, que são travas de segurança para sua difusão (MENEZES, THIAGO ANDRADE DE, 2010 apud FRANCESCO, 2007). Uma das críticas a esses tipo de dispositivos móveis é que eles diminuem a necessidade de qualidade sonora da música (LUERSEN, EDUARDO HARRY; 2012). Outro modelo de suporte físico que tem sido comercializado hoje, além do CD e do SMD é o disco de vinil, como a Bolacha Discos tem feito em busca de diversificação (DE MARCHI, LEONARDO; ALBORNOZ, LUIS ALFONSO; HERSCHMANN, MICAEL, 2011). Dessa forma, algumas empresas têm buscado vender o fonograma também no formato de LP, o disco de vinil, como forma de diversificar e atender a nichos diferentes, como o dos colecionadores. 2.2.3 Distribuição O Napster surge em 1999 e foi o primeiro serviço popular de troca de música via internet, reunindo 25 milhões de usuários (NOGUEIRA, DARIO DE AZEVEDO, JÚNIOR; 2013). Após um processo judicial o Napster encerrou suas atividades em 2001 (MENEZES, THIAGO ANDRADE DE, 2010). No entanto, o Napster existe hoje como um sitio que cobra pelo acesso à música (Napster, 2014. p.1). Segundo o sitio Terra (2014, p.1), o “Napster é uma coleção instantânea com milhões de músicas, álbuns e hits de artistas de diversas épocas”. Ainda: Streaming” significa a “permissão para acesso, em caráter pessoal para fins privados e não-comerciais, ao acervo de fonogramas e/ou videofonogramas do Napster de maneira que não é permitido ao assinante fazer o download de arquivos musicais para quaisquer dispositivos, tais como, mas não se limitando, a computadores, CDs e/ou MP3 player (TERRA, 2014, p.1). Nesse sentido é possível que a atual indústria da música tenha sua distribuição cada vez menos por meio do suporte físico e cada vez mais por meio da internet. Segundo Herschmann (2013), os fonogramas digitais devem ultrapassar as vendas de suportes físicos. 24 As pequenas empresas têm sabido aproveitar muito melhor a distribuição digital que as grandes empresas, inclusive criando novos modelos de negócios (NAKANO, DAVI; 2010). Conforme relata Menezes (2010), em 2006 foram criadas as plataformas UOL e Terra, as quais vendem músicas por meio da plataforma iMusica, pioneira no Brasil. O catálogo era inicialmente formado por gravadoras independentes, mas hoje já conta com grandes gravadoras como BMG e EMI. Dalmazo (2010) ressalta que a Terra criou, com o Sonora, um novo modelo de negócio contra a pirataria, com músicas que podem custar dez centavos e planos que permitem que se ouçam músicas sem limite. O serviço também é oferecido via iPad e tablets. Nesse sentido, a Som Livre buscou criar o Escute em 2011, que no momento está fora do ar devido a problemas técnicos (por tempo indeterminado). Esse fato demonstra que as grandes gravadoras não têm aproveitado de forma eficiente às oportunidades que a internet tem para oferecer e não têm se posicionado de forma eficiente no meio digital. Em acesso ao website da Terra (2014, p.1), pode-se perceber que existem 4 pacotes de assinatura: o Napster Web, para escutar música de forma ilimitada no seu computador por R$8,90 por mês. Existe o Napster Premium, com todas as características do Napster Web, acrescidos de download ilimitado de músicas em três aparelhos, smartphones ou tablets com sistema android e IOS, por R$14,90 por mês. Existe também o pacote Terra Música Light, com todas as características do anterior, acrescidos de e-mail Terra, por R$19,90 ao mês. Por último, existe o pacote Terra Música, com todas as características anteriores e ainda um suporte telefônico 24h, por R$29,90 o mês. Além do Napster, existem outras novas formas de distribuição das obras musicais, por exemplo, via parcerias com empresas de telefone celular, para a venda de produtos junto com o celular, e no mercado de jogos como o Guitar Hero. Portanto, as músicas estão cada vez mais endereçadas a companhias de telecomunicações e informática (LUERSEN, EDUARDO HARRY, 2012). Outro modelo de distribuição que surgiu é o da Fun Station, que possui parceria com a Warner Music e fornece estrutura para a venda de conteúdos digitais para as grandes gravadoras, gravadoras independentes e artistas autônomos. Essa empresa desenvolveu a tecnologia "posto de abastecimento digital", um computador que se encontra em lojas ou locais públicos para que se possibilite o acesso da música pelo consumidor. Este é um diferencial, uma vez que possibilita que se acesse o sistema sem necessidade de conexão com nenhuma rede digital. Por tudo isso, percebe-se que tem surgido, nesse mercado, novas formas de intermediação até o consumidor final. Nesse sentido, o catálogo que essas empresas possuem é um elemento fundamental. Enquanto algumas possuem recursos para realizar um 25 trabalho de mediação entre artistas e gravadoras multinacionais e consumidores finais, por exemplo, outras possuem menos recursos e oferecem apenas as obras de artistas locais. Essas são, porém, as empresas que inovam no meio digital (DE MARCHI, LEONARDO; ALBORNOZ, LUIS ALFONSO; HERSCHMANN, MICAEL, 2011). Existem, ainda, outros novos entrantes, como a francesa Airtist, criada em 2005, que oferece aos consumidores produtos musicais on-line sem nenhum custo, de forma legal e ética, com a condição de que os consumidores aceitem ver uma propaganda antes de baixar as faixas que pretendem. Neste processo, o artista é remunerado com as receitas obtidas das propagandas (MENEZES, THIAGO ANDRADE DE; 2010, p. 55 apud FRANCESCO, 2007). Por último, a Trama Musical, que em 500 produtos de seu selo indie criou uma distribuidora independente que atende, além da própria Trama, outros selos independentes (SALLABERRY, 2008). Em relação à distribuição da música religiosa, esta também é distribuída por meio de feiras de produtos e serviços voltadas ao setor evangélico (VICENTE, EDUARDO; 2008). É interessante notar que, no mercado evangélico, os consumidores preferem o CD à música pirata. a- Aprovação do Marco Civil da Internet: foi sancionado no dia 23 de abril de 2014, pela presidenta Dilma Rousseff, o Marco Civil da Internet. Uma vez que a internet consiste em uma das principais formas de distribuição da indústria fonográfica hoje, considera-se importante entender em que consiste a Lei nº 12. 965/14, sobre o Marco Civil da Internet. Não são, porém, todos os aspectos da referida lei que interessam a este trabalho. Art. 1o Esta Lei estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil e determina as diretrizes para atuação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em relação à matéria (Lei nº 12. 965/14). Segundo a Presidenta Dilma Roussef, em fala ao Blog do Planalto (2014): “A neutralidade na rede, proíbe o traffic shaping, que a operadora priorize um conteúdo em detrimento do outro. Esta é uma das principais disposições do Marco Civil (…) é importante destacar que a neutralidade torna inadmissível qualquer restrição da rede por motivos comerciais ou de qualquer outra natureza. Assim, o responsável pela transmissão, comutação ou roteamento, de acordo com o art. 9, tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados sem restrição por conteúdo, origem, destino, serviço, terminal ou aplicação. De outra parte, o governo brasileiro está desenvolvendo um programa nacional de banda larga para assegurar a um custo justo o aumento da capacidade da internet e a melhoria na sua qualidade. Gostaria de destacar que o regulamento de qualidade, copiado por vários outros países, estabelece que o provedor é obrigado a assegurar no mínimo 70% da média da capacidade contratada. A partir de novembro desse ano a média irá para 80%”. 26 O Marco Civil da internet pode, então, afetar na distribuição da música: a neutralidade da rede pode favorecer empresas menores, que desejem competir com as majors. A partir de novembro será garantida uma velocidade maior de conexão a custos menores, o que facilita a venda de pacotes de música online, entre outros negócios que dependem da velocidade de conexão com a internet. b- A concorrência com o produto estrangeiro: o produto estrangeiro tem ocupado 40% dos espaços físicos das lojas. Segundo a ABPD (Associação Brasileira dos Produtores de Discos), em 2007 77% dos CDs e DVDs vendidos foram de artistas nacionais. Este dado demonstra que a música brasileira possui menos prestígio para o público brasileiro, uma vez que ele associa a música internacional a um produto diferenciado (TROTTA, FELIPE; 2005). 2.2.4 Divulgação Segundo Sallaberry (2008), não se pode confundir divulgação com promoção, uma vez que cada uma delas tem uma função específica. Ele relata que a promoção do produto é recomendada mesmo a artistas com orçamentos pequenos, e que revistas, rádios e websites são os principais canais disponíveis para realizar o serviço promocional, o qual consiste em formas para se promover um produto. Não cabe, porém, entrar em detalhes sobre este aspecto, uma vez que este não consiste em um dos objetivos do presente trabalho. a) O papel das gravadoras majors na divulgação: no cenário brasileiro atual da indústria fonográfica as majors estão cada vez mais abandonando as etapas de criação, produção e distribuição e focando na etapa de divulgação, investindo ai seus maiores recursos e, como resultado, controlando o tipo de música que chegará aos ouvidos do consumidor. Para isso faz parcerias com canais de divulgação, como a Sony e a Rede Globo. Segundo Luersen (2012), as bandas que se auto- produzem dificilmente atingirão audiências massivas por meio de canais tradicionais, uma vez que estes são controlados pelas majors. b) Outros meios de divulgação: existem, porém, outros meios de divulgação que fogem aos meios tradicionais, controlados pelas majors. Estes meios podem ser utilizados pelas bandas que se administram, como forma de promoverem seu trabalho. Um desses meios é o blog, que consiste em um site que permite a atualização rápida de artigos (Wikipedia, 2014, p.1), muito utilizado no mundo da moda, com blogueiras como Camila Coelho e Kristina Bazan, as quais, por meio dos “looks” do dia divulgam produtos de 27 grandes marcas. Na publicidade, antes de se lançar um livro a editora envia um brinde para os blogs junto com o livro. Há, porém, a preocupação com a pirataria que esse tipo de atitude pode gerar. Alguns exemplos de blogs na área musical são: Noize, o qual apresenta notícias do cenário musical, além de entrevistas e lançamentos; Monkey Buzz, Fita Bruta, o qual apresenta notícias, álbuns, faixas e matérias, o blog Rock Beats da MTV, o Na Mira do Groove, de um jornalista, o Miojo Indie, o Soma, da Terra, o Collectors Room, A Musicoteca, entre outros. Menezes (2010) relata ainda, que as próprias gravadoras independentes têm criado blogs como forma de ter um feedback de seus produtos e serviços. 2.3 Gravadoras Deve-se ressaltar a diferença que existe em relação à gravadora e o selo. Segundo o sitio da Associação Brasileira dos Músicos Independentes (ABMI, 2014, p.1), o selo definia as divisões internas das majors. Com o passar do tempo, porém, surgiram selos independentes. É importante ressaltar que os selos são diferentes de gravadoras, pois em geral contam com equipes e cast de artistas menores, além de não possuírem estrutura de produção completa, muitas vezes dependendo de outros parceiros para gravar, divulgar, comercializar ou distribuir. Dois atores importantes no mercado fonográfico são as majors e as indies. Existem, então, outras possibilidades dos músicos produzirem e divulgarem seu trabalho fora do circuito das gravadoras, como por meio das indies, gravadoras independentes. 2.4 As gravadoras independentes (indies) As gravadoras independentes surgiram principalmente na década de 1990, como um modo de descentralização da produção das grandes gravadoras, as quais, buscando aperfeiçoar sua produção, terceirizaram parte de sua cadeia produtiva para as gravadoras independentes, terceirizando equipamentos de estúdio, etc. Ainda, outro fato que contribuiu para seu surgimento foi o fim da produção de LPs e fitas cassete pelas grandes gravadoras e a adoção do CD como suporte físico, com custos de produção mais baratos (DE MARCHI, LEONARDO, 2012). Segundo a ABMI (2014, p.1), Associação Brasileira da música independente, gravadoras independentes são aquelas que “detém seu controle, ou seja, não estão vinculadas 28 aos grandes grupos multinacionais da música”. A ABMI define seus sócios como "empresas brasileiras, dirigidas por brasileiros ou estrangeiros residentes no Brasil", o que exclui as empresas multinacionais da música. Dessa forma, a gravadora independente é aquela que não está associada às gravadoras majors. Existem definições divergentes. Segundo Rodrigo Lariú, jornalista da gravadora Midsummer Madness: “As majors são as quatro multinacionais. As grandes gravadoras brasileiras são aquelas que não estão vinculadas às majors, têm certa independência na parte artística e financeira, mas 'dependem' de contratos financeiros ou que trabalham com verbas anuais altas, como a Trama, Deck Disc, St2, entre outras. E, por fim, as independentes, que são aquelas micro-gravadoras com verbas baixíssimas e que trabalham dentro de um esquema quase cooperativista com as bandas e o mercado, como a Midsummer Madness, a Monstro Discos, a Highlight Sounds, etc” (CARBONATO, 2006 p.1 em entrevista para Tramavirtual disponível em Portal UOL, acesso em 2014 ). Segundo Menezes (2010), a indie é a empresa que investe em novos talentos com capital próprio, dificilmente recorrendo a terceiros, atendendo a nichos específicos, não visados pelas grandes gravadoras. Dessa forma, a indie é a gravadora que, com recursos próprios, produz de forma independente à grande gravadora. As indies ainda executam todas as fases da cadeia produtiva (MENEZES, THIAGO ANDRADE DE; 2010 apud VICENTE, 2001). Deve-se observar, porém, que, embora independente, muitas vezes a indie faz parcerias com a major de forma a terceirizar sua produção, atendendo a nichos não buscados pela grande gravadora. Um exemplo de gravadora independente atuando hoje no mercado fonográfico brasileiro é a MZA Music, chefiada por Marco Mazzola. Ela também atua no mercado internacional organizando, por exemplo, a Noite Brasileira no festival de Montreux, na Suiça. (MZA, 2014, p.1) Vicente (2008) ressalta que a pirataria não foi negativa para todos os segmentos do mercado. Para as independentes, como será discutido posteriormente nos resultados, foi positiva. A pirataria amplia as possibilidades de atuação das gravadoras independentes, que atendem quase que de forma exclusiva determinados nichos, como o rap, a música instrumental, a música religiosa e a música infantil. Segundo Menezes (2010), ainda, as indies têm se adaptado frente à crise. Penso que é mais do que isso, as gravadoras independentes têm se aproveitado da crise de forma a conquistar mercados. 2.5 As majors 29 O mercado brasileiro é dividido entre as majors EMI, Sony, Universal e Warner, além de empresas nacionais como a Som Livre, gravadoras de música gospel e gravadoras independentes, as quais têm sido associadas, no Brasil e no mundo, à inovação e qualidade (NAKANO, DAVI; 2010). As majors possuem uma maior dificuldade de se adequarem às novas mudanças que têm ocorrido na indústria fonográfica, com o advento da internet e da pirataria, pois estão praticamente estáticas há cerca de 20 anos. As grandes gravadoras possuem uma cadeia produtiva praticamente toda terceirizada, com atividades como produção e prospecção de novos artistas. A venda de seu fonograma se dá majoritariamente por meios da forma física, por meio de redes de varejistas. Menezes (2010) relata que as majors controlam as principais formas de distribuição pelo varejo e o acesso aos meios de comunicação. As majors, como a Sony, Universal e Som Livre têm buscado se adequar às recentes mudanças, por terem perdido parte do poder que sempre detiveram. Com esse objetivo, essas gravadoras têm expandido suas atividades para além da venda de suportes físicos, participando da venda de shows, promovendo eventos musicais, entre outros (MENEZES, THIAGO ANDRADE DE; 2010). Elas não têm, porém, atuado de forma eficiente no meio digital. As grandes gravadoras têm se reposicionado de forma a atuar como intermediária na venda de músicas via internet, comprando sites como o Last.fm. A Live Nation Entreteinment é uma empresa do ramo de shows que tem acordo com os principais artistas pop das majors e faz a intermediação dos shows de grupos como U2, Coldplay, Red Hot Chili Peppers, Metallica, etc. (HERSCHMANN, MICAEL; 2013). Outra mudança de posicionamento das grandes gravadoras é o enfoque, cada vez maior, na divulgação do produto final, e não mais em todas as fases da cadeia da música: criação, produção, distribuição e divulgação. Ela tem, portanto, buscado o produto acabado. Por isso, uma de suas estratégias consiste em fazer parcerias com gravadoras menores e buscar o produto pronto que estas oferecem (PINTO, JOSÉ PAULO GUEDES, 2011). Em relação à distribuição, sua maior estratégia tem sido realizar parcerias com empresas distribuidoras. Ficam em suas mãos, então, o trabalho com artistas e repertórios, marketing e difusão. As majors são, hoje, escritórios de gerenciamento de produtos e elaboração de estratégias de mercado. Portanto, as grandes gravadoras estão passando a se autodenominar como “empresas de músicas” (PINTO, JOSÉ PAULO GUEDES, 2011 apud DIAS, 2005). Estas empresas têm deixado a tarefa de descobrir novos talentos para as empresas independentes (MENEZES, THIAGO ANDRADE DE; 2010). Uma consequência dessa estratégia é que atualmente o músico que a grande gravadora visa é aquele que já tem um 30 produto desenvolvido, daí a parceria das bandas que se administram e indies com as grandes gravadoras. Outra estratégia das majors tem sido realizar parcerias com empresas de telefonia, de forma a vincular seus produtos ao celular, com os chamados ringtones. A venda de jogos como o Guitar Hero é outro tipo de parceria que tem rendido lucro para as majors. Elas têm, portanto, buscado adequar o seu negócio à atual indústria fonográfica, onde a venda de suportes físicos caiu vertiginosamente. As majors têm, ainda, consolidado parcerias com outros setores, como o caso da parceria Hanna Montana entre a indústria de música, televisão e cinema (MENEZES, THIAGO ANDRADE DE, 2010). As grandes gravadoras têm, também, atuado cada vez menos em nichos específicos de mercado, como já descrito. Isso porque esse nicho de mercado pode ser muito pequeno, ou porque seus consumidores podem não ter poder aquisitivo, como o funk carioca. Outras vezes, porém, as multinacionais atuam nesses nichos, mas por meio de gravadoras independentes (HERSCHMANN, MICAEL; 2013). Essa estratégia surgiu a partir da década de 1990, visando explorar nichos de mercado não atendidos. Devido, porém, à pirataria, à crise e a outros fatores, as indústrias têm buscado se ater a segmentos específicos. Um exemplo disso é que, embora crescente, estas indústrias não tem atuado fortemente no segmento religioso. Isso pode se dever, ainda, à falta de know-how das empresas tradicionais para atuar num segmento com espaços de divulgação e exibição tão diferenciados. (VICENTE, EDUARDO; 2008). 2.5.1 As vantagens e desvantagens de contratar com uma gravadora major hoje Segundo Herschmann (2013) existem nichos musicais, como o choro na Lapa e o tecnobrega em Belém do Pará que não passam pelas grandes gravadoras, pois existe, nesses nichos, uma economia da cultura com a qual as grandes gravadoras não saberiam lidar. Esta é, portanto, uma das vantagens em não se contratar com uma major, ela não saberia atuar no mercado descrito acima. Isto, por que ela busca lucro e, dessa forma, acaba por não atender determinados nichos do mercado. Inserir uma grande gravadora nesse contexto poderia desestruturar essa economia da cultura criada. Outra desvantagem, descrita por Luersen (2012), é que a maioria dos artistas contratados por uma grande gravadora são figuras transitórias, as quais, além de sofrerem o risco de engavetamento se surgir outro artista mais interessante do ponto de vista de investimento, podem ter seus contratos encerrados caso não atendam aos interesses da grande 31 gravadora. Segundo Pinto (2011), o risco de engavetamento se dá porque a empresa contrata uma enorme gama de artistas com o potencial desejado, mas se um “estoura” a gravadora passa a investir todos os seus recursos nesse determinado artista, esquecendo-se dos demais. O artista deve, então, contratar com uma grande gravadora somente quando acredita que conseguirá atingir um grande público em um curto período de tempo. Um ponto positivo, porém, é que as gravadoras fornecem ao artista possibilidade de desenvolvimento artístico, marketing, distribuição e promoção (LUERSEN, EDUARDO HARRY; 2012). 2.6 As bandas que se administram O desenvolvimento dos circuitos autônomos foi possível, segundo Vicente (2008), devido à pulverização da produção musical e à redução dos custos das tecnologias digitais, além do surgimento de redes locais de comunicação e da possibilidade de divulgar via internet. Outro fator que favorece a promoção dessas bandas é o fato de que a indústria fonográfica brasileira está concentrada nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, o que faz com que surjam diversos nichos não atendidos pelo Brasil (LUERSEN, EDUARDO HARRY; 2012). Tem crescido, assim, o número de artistas que produzem e divulgam seu próprio trabalho, o que só é possível se eles forem capazes de se inserirem em redes sociais, entre outros fatores, os quais serão discutidos nos resultados (HERSCHMANN, MICAEL; 2013). Esses artistas produzem um grande volume de material, que é colocado em circulação por meio de mecanismos como Facebook, entre outros. Esse modelo de negócios, porém, não substitui o da grande gravadora, visto que esse artista não possui a capacidade de divulgação que a major possui. Como retrata Marchi (2012), essas bandas apresentam algumas características que rompem com as gravadoras e outras que mostram uma perpetuidade nesse sentido. Pode-se observar que ser uma banda que se auto- administra não quer dizer que ela não possui contrato com uma grande gravadora. Segundo Marchi (2012) essas bandas utilizam técnicas de administração de empresas para se promoverem. Porém, não são todas as bandas que se administram que aplicam essas técnicas com maestria, muitas vezes devido à falta de conhecimento de gestão do músico. Existem, ainda, outros problemas nesse cenário, os músicos não são explorados pelas gravadoras, mas podem ser explorados pelos donos de casas noturnas, etc. Isso fez com que muitos músicos passassem a atuar também como empresários e produtores (HERSCHMANN, 32 MICAEL; 2013), o que ressalta a importância do músico saber se administrar no cenário atual. Outro modelo de negócios na produção independente, por bandas independentes é o da música religiosa. É comum que artistas e bandas estimulados pelas suas igrejas, acabem produzindo seus trabalhos. Normalmente seu circuito de exibição é o dos templos, com a venda de fonogramas feita em especial para os membros da congregação. Normalmente eles não recebem cache, são remunerados por meio da venda do suporte físico (VICENTE, EDUARDO; 2008). 2.7 Editoras É a empresa que administra os direitos autorais de compositores e intérpretes, assegurando sua remuneração. Ela se torna responsável por administrar esses direitos em utilizações como comercialização de CDs, gravações, cinema, etc. Dessa forma, são as editoras que lidam com as dificuldades referentes aos direitos autorais (HERCULANO, MÔNICA, 2014). Em troca da administração desses direitos a editora retém um percentual do valor arrecadado. A arrecadação é feita pelo ECAD e repassada para as sociedades autorais. Se a banda não possuir registro em uma sociedade autoral este valor fica no ECAD até que o grupo musical se cadastre. Se a música está em uma editora, esse valor é repassado das sociedades autorais para as editoras (SALLABERRY, 2008). Quando uma determinada banda deseja tocar uma música de outro autor, ela deve entrar em contato com as editoras- se deseja modificar apenas o fundo sonoro, mas não a letra. Exemplos de editoras são: Tonga Editora Musical Ltda (Universal MGB), Marola, Gege Editora. A Marola é responsável, por exemplo, pelas obras do Chico Buarque. Já a Gege, é responsável, por exemplo, pelas obras do Gilberto Gil. A Tonga, por sua vez, é responsável, por exemplo, pelo autor Vinícius de Morais. Uma dificuldade nessa etapa é encontrar o autor da música, uma vez que algumas músicas foram regravadas tantas vezes que se torna difícil diferenciar o seu autor de outros intérpretes. Uma maneira de se encontrar o autor é entrar em contato com a ABRAMUS, uma sociedade autoral que pode ajudar a fornecer essas informações, seja por meio de seus funcionários, seja por meio do site, o qual possui um canal de busca. 2.8 Ecad, Sociedades Autorais e ISRC 33 Conforme relata Sallaberry (2008), as sociedades autorais defendem os direitos dos autores, mesmo que de forma judicial, além de reter os valores arrecadados pelo ECAD, que somente podem ser retirados se a banda estiver filiada a uma sociedade autoral. Já o ECAD, Escritório Central de Arrecadação e Distribuição, é um órgão que arrecada e distribui os direitos autorais. Exemplos de sociedades autorais: ARAC (Associação Brasileira de Autores, Compositores, Intérpretes e Músicos), ABRAMUS/SP (Associação Brasileira Música e Artes), ABRAMUS/RJ (Associação Brasileira de Música e Artes), ADDAF (Associação Defensora de Direitos Autorais), entre outras. O ISRC, International Standard Recording Code, é um código de gravação internacional que identifica as gravações. É um código eletrônico alfanumérico de 12 caracteres, dividido em quatro elementos, representando, respectivamente: país (dois dígitos), o primeiro proprietário da gravação(três dígitos), ano de gravação(dois dígitos), e um sequencial (cinco dígitos) (SALLABERRY, 2008). 2.9 Shows e editais A atual indústria fonográfica está voltada principalmente para o mercado do entretenimento. Este fato, aliado à vertiginosa queda nas vendas de suporte físico, resultaram em uma preocupação maior com os shows, os quais acabam por arrecadar mais recursos que a venda de suportes físicos. Dessa forma, outras empresas que não atuam no ramo da música têm buscado aliar suas campanhas de marketing à promoção de artistas e shows, como forma de agregar valor à sua marca. Isto é favorecido por meio de incentivos governamentais como o ProAC, o qual é estudado a seguir. Herschmann (2013) relata que os shows são um produto de alto valor para seus consumidores. Ainda conforme relata Herschmann (2013), estão surgindo novos negócios sustentáveis de música ao vivo, que promovem a música local de forma bem sucedida. Exemplos são o huayno pop no Peru, o samba e choro no Brasil e cumbia villera, na Argentina ou Colômbia. O fonograma (fixação de uma obra em um suporte material, é a obra gravada) comercializado nesses circuitos é vendido a custos muito baixos, ou, ainda, distribuído de forma pirata. Diversas empresas possuem editais com propostas de patrocínios para shows, festivais, criação de obras, etc., entre elas: Organização Natura Nome do Edital e/ou Programa Natura Musical Detalhamento Realização de shows/ Periodicidade Anual 34 Vale Eclética e Zumque Patrocínio Cultural FAM- Festival da Alta Mogiana Banco do Brasil Programa Banco do Brasil de Patrocínios Oi Futuro Patrocínio Oi Santander Organização Poiesis Social de Cultura Itaú Cultural Sesc DF Chamamento para propostas de atividade nas Fábricas de Cultura Edital Rumos Música Coletivo Premio Sesc de Música Tom Jobim Correios Ocupação dos Correios Som na Cidade Sesc da EsquinaParaná Sesc LondrinaParaná Petrobrás Espaços gravação de CD Programa Música Patrocínio para a produção de CD Não pode ser utilizado para produzir obras musicais Editais de Cultura Patrocínio de Atividades Culturais Ocupar as Fábricas de Cultura Incentivar a produção musical, revelar compositores e Intérpretes. dos O ano todo 2013 2013 Anual O ano todo 2013 Anual 2013 2013 Realização de Espetáculos 2013 Edital de Música Realização de Espetáculos 2013 Petrobrás CUltural Apoio a artistas, grupos ou redes musicais 2012 BNDES Quintas no BNDES e Apoio a Eventos Culturais CAIXA Editais de Ocupação dos Espaços Caixa, entre outros. Quadro 1: Editais e propostas de patrocínios por empresas públicas e privadas 2011/2012, respectivamente É importante destacar que não cabe, neste trabalho, entrar em detalhes sobre o conteúdo de cada edital, uma vez que este não é o foco do trabalho e sim indicar que o patrocínio de eventos musicais já se tornou uma ação praticada por diversas organizações. Haja vista que todos os editais descritos se referem à área musical, seja para a produção de shows, de músicas originais, CDs, etc. Os shows são importantes, então, pois consistem no enfoque do novo modelo de negócios adotado pela indústria fonográfica. Uma vez que as vendas de suporte físico despencam vertiginosamente, as gravadoras têm concentrado suas atividades na venda de shows, como uma das principais fontes de recursos para a empresa, atividade que, anteriormente à crise fonográfica não era o foco da gravadora. Ainda, surgem nesse cenário, empresas privadas que utilizam dos shows como forma de divulgar sua marca, promovendo shows por meio de editais. Surgem, também, empresas especializadas na venda de shows, como descrito acima. 2.10 O incentivo público à música 35 O governo tem incentivado a promoção da música no Brasil. Neste quesito existem dois principais programas a serem mencionados em relação à destinação de imposto, o ProAC e a Lei Rouanet. A Lei Federal de Incentivo à Cultura, Lei Rouanet (Lei nº 8.313/91), institui politicas públicas para valorizar a cultura no Brasil, como o PRONAC - Programa Nacional de Apoio à Cultura. Ela busca valorizar a cultura, com dispositivos como a política de incentivos fiscais, que possibilita a destinação de 6% do imposto de renda de pessoa física e 4% do imposto de renda de pessoa jurídica para ações culturais. Um ponto positivo da referida lei é que esta incentiva os cidadãos e as empresas a investirem em cultura. Ela é negativa, porém, por que o governo delega esse incentivo à iniciativa privada, que ainda pode investir na cultura como forma de divulgar sua marca (Wikipedia, 2014). Outro ponto negativo da referida Lei, é que ela incentiva ações culturais no território nacional, mas essas ações não precisam ser propostas nacionais, a exemplo do Circo de Soleil como ação cultural. O ProAC, Programa de Ação Cultural é um programa da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, que foi instituído pela Lei nº 12.268/06 e possui dois mecanismos de atuação. Um deles é por meio de editais destinados à promoção da cultura, os quais serão divulgados no Diário Oficial do Estado de São Paulo e no site da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo. O outro mecanismo é de destinação de impostos, similar à Lei Rouanet. O imposto destinado aqui é o ICMS, sendo a destinação de 0,2% do total arrecadado pelo ICMS. Para participar do programa os artistas devem enviar seus projetos para a Comissão de Avaliação de Projetos (CAP) que, em caso de aprovação, autoriza a destinação. Já as empresas interessadas em fazer a destinação devem se habilitar junto à Secretaria da Fazenda e escolher os projetos que desejam ajudar. Podem ser inscritos projetos de literatura, cinema, artes visuais, design, circo, teatro, cultura popular, dança, música, patrimônio histórico e programas de rádio e televisão. Pessoas físicas e jurídicas podem apresentar projetos (Secretaria da Cultura de São Paulo, 2014). Esses programas surgiriam como consequência de que a iniciativa privada, por ter sua indústria concentrada em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, não consegue lidar com toda a demanda nacional. Surge, porém, uma questão: essa ação do governo em permitir a destinação de imposto, terceirizada, e deixar nas mãos de empresas privadas a seleção e promoção da cultura nacional, cabendo a estas empresas escolher o tipo de projeto que desejam patrocinar, poderia acabar por não promover músicas atreladas a nichos específicos, uma vez que as empresas podem buscar os projetos que serão positivos em relação à imagem e ao marketing das mesmas? Assim, a própria empresa pode ficar sujeita a escolher projetos 36 que estão atrelados à indústria cultural, uma vez que é isso que seus clientes desejam ouvir. Essa dificuldade poderia, porém, ser parcialmente suprida, uma vez que há uma seleção dos projetos que poderão receber essa destinação. Tal questão merece, porém, ser discutida mais profundamente em outro trabalho. Exemplos de projetos no segmento de música com status de aprovados pelo ProAC, em consulta ao site da Secretaria da Cultura de São Paulo em 12/05/2014, os quais demonstram a diversidade e o escopo dos projetos aprovados pelo ProAC: Projeto Data Início - Data Fim Resumo do Projeto PALAVRA DE PAULISTA III Nome do Responsável Legal João Fernando Cardoso de Sá Orquestra Arte Pela Vida Nome do Responsável Legal Fabiano Martos de Araujo Caminhos Sonoros Nome do Responsável Legal Alvise Migotto 08/02/201228/05/2012 “(...) realização da terceira edição do projeto musical PALAVRA DE PAULISTA com apresentações gratuitas no teatro Cleyde Yáconis. As apresentações estão programadas da seguinte forma: Antônio Marcos por Aretha Marcos Geraldo por Virgínia Rosa Toquinho por Vânia Bastos Vadico por Claudia”. 01/08/201231/08/2013 “(...) aperfeiçoamento de orquestra ja existente e para isso será realizada oficinas musicais, ensaios e apresentaçoes programadas”. 20/03/201220/12/2012 Espetáculo O tico-tico cá, o liro-liro lá Nome do Responsável Legal Luiz Augusto Righi 03/07/201203/10/2012 “(...) projeto de difusão da música de concerto através de recitais comentados e dinâmicas de musicalização para um público leigo. (...) atividades em 2012: • 80 recitais comentados (...) • 6 Palestras Musicais (...) • Produção de 1 CD duplo (...) • 2 Apresentações abertas ao público (...). 16 Encontros de formação de Coro Infantil para as crianças das escolas públicas”. “O projeto visa uma temporada composta por 16 apresentações, a serem realizadas duas vezes por semana, do Espetáculo “O tico tico cá, o liro liro lá”. (...) é um espetáculo musical humorístico. (...) O grande diferencial do espetáculo, é a forma como o humor, integra-se com a boa música e a dança, de maneira inteligente”. Quadro 2: Projetos Aprovados pelo ProAC 2.11 Pirataria Conforme disposto na Constituição Federal Brasileira de 1988: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindose aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar; 37 A proteção à propriedade intelectual é, dessa forma, direito garantido constitucionalmente. Esse mecanismo legal não impede, porém, que ela seja exercida em larga escala. Segundo a APCM, (2014, p1): Pirataria é a apropriação, reprodução e utilização de obras (escritas, musicais ou audiovisuais) protegidas por direitos autorais, sem devida autorização. Ela pode acontecer de diferentes formas, desde a compra de CDs e DVDs falsificados, até o download de arquivos pela internet. Independente dos meios, a pirataria é qualificada como crime, e é punida como tal. Por ser um fenômeno que cresce bastante atualmente, principalmente por conta da expansão da internet de banda larga, é necessário saber identificar e combater a pirataria. O sitio da Associação Brasileira dos Produtores de Discos (ABPD, 2014, p.1) define pirataria virtual como: “a violação dos direitos autorais pela utilização, venda ou distribuição de obras musicais sem autorização”. A pirataria pode se dar, então, por meio do suporte físico ou por meio da pirataria virtual. A ABPD surgiu em 1958. É uma entidade representante das gravadoras, e, entre seus objetivos, se encontra o combate à pirataria na indústria fonográfica (ABPD, 2014, p.1). Já a APCM (Associação Antipirataria de Cinema e Música) foi criada em 2007 com o objetivo de proteger os direitos autorais de seus titulares, com ações que combatam a pirataria (APCM, 2014). Segundo dados da APCM (2014, p.1), 65% do mercado fonográfico em 2011 era de produtos piratas, em 2010 esse mercado era de 48%. A pirataria, porém, embora crescente e negativa para a maioria dos atores dessa cadeia, pode não ser negativa para todos, uma vez que acaba por se transformar em meio de divulgação de artistas e gravadoras independentes. Conforme relata Menezes (2010), um dos impactos para o advento da pirataria virtual foram as inovações tecnológicas como o MP3 e o MPEG. Uma questão que deve ser abordada é se a pressão que está sendo exercida contra a pirataria está no lugar correto. Segundo o Digital Music Report de 2014 da ABPD, consumidores e os detentores de direitos autorais acreditam que intermediários também devem se responsabilizar pela pirataria. Assim, os mecanismos de busca deveriam priorizar produtos com licença ou mesmo nem anunciar os produtos sem licença. Essa questão também em outras pesquisas, como no artigo Download, Pirataria e Resistência. Os autores desse artigo realizaram grupos focais com consumidores, foi relatado: “A pressão está no lugar errado. O controle é errado. Baixar música não é errado porque eu consigo fazer. Se fosse errado, teria algum empecilho. Eu compro o iPod, que é compatível com meu computador. Eu baixo a música e o iTunes aceita de forma mágica [com ironia]. O arquivo é passado para o meu equipamento e isso tudo funciona. A gravadora tem contrato com o 38 iTunes. Logo, a gravadora deveria exercer pressão sobre a Apple para não deixar arquivo baixado tocar no iTunes. O iTunes deveria bloquear arquivos de origem desconhecida.” Uma forma de impedir que isso aconteça é por meio das travas tecnológicas, já descritas no presente trabalho. Existem outros fatores que influenciam o comportamento de compra pirata. Segundo Dalmazo (2010), o Brasil é um dos países que mais sofre com a pirataria. Um aspecto que deve ser observado, porém, segundo a autora é que a pirataria cresce no Brasil devido a negócios mal planejados das grandes gravadoras, as quais têm falhado em entrar no comércio via internet. Um exemplo de negócio mal planejado é a comercialização do CD com diversas músicas, sem levar em consideração o que o consumidor quer ouvir. Pode existir no CD apenas uma música que ele deseja. Dessa forma, ele prefere fazer o download da música pirata (BARROS, DENISE FRANCA et al., 2010). Assim, o modelo de negócios do futuro é aquele já adotado pelo Google, onde se permite o acesso gratuito e, para se ter acesso a melhores recursos se pagaria determinado valor (NOGUEIRA, DARIO DE AZEVEDO, JÚNIOR; 2013). É importante observar que têm sido implementados Projetos de Lei visando combater a pirataria, ações que não têm trazido resultados concretos. Exemplo de Projeto de Lei proposto é o Nº 5.361/09 - do Sr. Bispo Gê Tenuta que "cria penalidades civis para a baixa, download ou compartilhamento de arquivos eletrônicos na Internet, que contenham obras artísticas ou técnicas protegidas por direitos de propriedade intelectual, sem autorização dos legítimos titulares das obras". Essa proposição se encontra em Fase de Recebimento de Emendas (CÂMARA, 2014). Essa medida de restringir o acesso de usuários a downloads e compartilhamentos não seria precedida de ordem judicial, dando grande autonomia para os provedores (NOGUEIRA, DARIO DE AZEVEDO JÚNIOR; 2013). Nos EUA um Projeto de Lei de bastante repercussão é o SOPA, Stop Online Piracy Act, apresentado em 2011, que contou com o apoio de grandes empresas de entretenimento nos EUA, como: The Walt Disney Company, Universal Music Group, Motion Picture Association of America, Recording Industry Association of America, Wal-Mart, Toshiba, Time Warner, CBS entre outras. E autorizaria a obtenção de ordens judiciais contra sites que distribuem ou facilitam o compartilhamento de obras sem o pagamento de direitos autorais (AZEVEDO, DÁRIO DE, 2013). O SOPA foi suspenso em 2012 (WASHINGTON POST, 2014). Cabe observar, ainda em relação à pirataria, que compartilhar uma obra regida por direitos autorais não consome esse direito, nem faz com que este seja perdido (NOGUEIRA, 39 DARIO DE AZEVEDO, JÚNIOR; 2013). Esta declaração mostra como as grandes gravadoras não têm sabido como se posicionar nesse novo cenário, muitas vezes empreendendo em ações inúteis contra a pirataria. O autor supracitado relata, ainda, que o iTunes abandonou as travas tecnológias, DRM (digital rights management) em 2009. O fato de o iTunes ter removido as travas contra cópias ilustra, mais uma vez, que a pressão talvez esteja no lugar errado, muito focada nos consumidores. Em 2012 houve o fechamento do Megaupload, o que gera grande insatisfação no meio digital. Segundo Menezes (2010), outro modo de combater a pirataria virtual é a poluição de arquivos na rede, distribuindo arquivos com o nome do autor e faixa mais corrompido, de forma que ele não possa ser escutado. Com a invenção da imprensa os soberanos se sentiram ameaçados pelas possibilidades geradas e concederam os direitos autorais aos criadores das obras, à fim de que eles cuidassem para que seus trabalhos não fossem transmitidos sem o pagamento de direitos autorais. Essa foi, então, a única finalidade da criação dos direitos autorais àquela época. Deve-se ressalvar que o autor não perde com a difusão de sua obra, uma vez que quanto mais ela se difunde mais o autor se torna conhecido. Dessa maneira, a quem interessaria a restrição à liberdade de transmitir as obras, aos autores ou às grandes gravadoras? (NOGUEIRA, DARIO DE AZEVEDO, JÚNIOR; 2013). A pirataria física é, ainda, um modo de subsistência para pessoas de baixa renda, segundo Menezes (2010). Cabe observar que o público que consome músicas evangélicas é extremamente fiel e não costuma comprar produtos piratas (VICENTE, EDUARDO; 2008). 40 3. METODOLOGIA 3.1 Tipo de Pesquisa O tipo de pesquisa utilizado é uma análise qualitativa exploratória, a qual foi escolhida em razão de se buscar aprender mais sobre o mercado e suas oportunidades. Malhotra (2012) relata que a pesquisa qualitativa visa compreender a natureza do problema, ela trabalha com amostras menores que a pesquisa quantitativa, a coleta de dados é não estruturada e não estatística. Ela visa à compreensão do contexto do problema, por meio de uma metodologia exploratória e não estruturada. A pesquisa qualitativa é, então, mais positiva que a pesquisa quantitativa no sentido em que busca compreender o contexto do problema, enquanto a pesquisa quantitativa busca a quantificação de dados, algo que é o foco do presente trabalho, uma vez se busca entender os sentimentos dos entrevistados a respeito da indústria fonográfica, além de realizar uma pesquisa exploratória, com a finalidade de aprender mais sobre o cenário atual da indústria fonográfica. Ainda segundo Malhotra (2012), a pesquisa exploratória é aquela com processo de pesquisa flexível e não estruturado, com amostras pequenas e análise dos dados de base qualitativa. Ela busca compreender determinado problema ou situação. Menezes (2010) relata, ainda, que a pesquisa exploratória visa conhecer as características de um determinado fenômeno. Portela (2004) diz que a pesquisa qualitativa é positiva em relação à quantitativa uma vez que não é positivista em seu estudo. Ela relata, ainda, que a pesquisa qualitativa não se submete à prova de fatos, uma vez que os dados abordados são não métricos. Utilizamos roteiros semi-estruturados para a realização das entrevistas em profundidade e o método de pesquisa foi estudos de caso múltiplos. Malhotra (2012) relata que a entrevista em profundidade é não estruturada, dura de meia hora a mais de uma hora, ela é direta e pessoal e busca entender os sentimentos do entrevistado. A pesquisa quantitativa se refere, então, àquela abordagem utilizada quando já se possui algum conhecimento do universo estudado. No caso, porém, o presente trabalho visa entender o atual cenário da indústria fonográfica e os papéis de seus diferentes atores. Não cabe, então, uma pesquisa quantitativa como abordagem inicial, mas talvez em uma pesquisa posterior. Escolhemos uma amostra de entrevistados que representasse os diferentes pontos de vista, dos diferentes atores dessa indústria. 41 3.2 Protocolo da Pesquisa Foram realizadas entrevistas por meio de roteiros de entrevista semi-estruturados, com diversos atores da indústria fonográfica, músicos de diversos estilos, produtores, proprietários de gravadoras, etc., de forma a observar fenômenos importantes de comportamentos, mas não se sabe, inicialmente, quais fenômenos são esses. Esse tipo de questionário possibilita debate de outros temas relevantes à pesquisa, não previstos inicialmente, mas que surgiram durante a entrevista. Objetivos da Pesquisa a- Fatores do mercado fonográfico que influenciam na produção de uma banda. b- O que leva uma banda a se tornar conhecida do grande público; c- Fatores associados ao grau de conhecimento do grande público; d- Fatores que limitam às bandas atingirem esse objetivo. e- Mapear os caminhos trilhados por bandas que atualmente podem ser classificadas como conhecidas do grande público; fVerificar quais modelos de negócios da indústria fonográfica apresentam características de que estão melhor preparados Perguntas do Roteiro de Entrevistas Existem diferenças significativas entre o mercado brasileiro e o paulista? - Quais as diferenças entre as majors e as indies? - Como é feita a divulgação de sua banda? - Como sua banda conseguiu se manter em um mercado tão competitivo? - Bandas que tocam sertanejo tem maior possibilidade de conhecimento do grande público? - Como se diferenciar de outras bandas que tocam um estilo similar? - Quais os maiores erros cometidos por músicos? - Recomendações para novas bandas; - Falta espaço para o músico no mercado fonográfico? Conceito a ser Esclarecido Contratar com grandes gravadoras ainda é algo importante para as bandas que estão iniciando suas carreiras? - Como as bandas podem se diferenciar por meio da internet? - Como a banda se formou? - A banda possui contrato com grandes gravadoras? - Há preocupação com fãs fora do Brasil? - Como são distribuídos os fonogramas da banda e qual sua principal atividade? - As gravadoras estão sabendo se adaptar a esse cenário fonográfico de bandas que se autoproduzem? - A música é vista hoje como entretenimento? - Definir bandas que se administram e sua diferença com as bandas indies. Fonte - Entrevistado Horácio, Nova Digital; - Duda Lazarini; - 5 a Seco; - Cauby Peixoto e Nancy Lara. - Entrevistado Horácio, Nova Digital; - Vinícius Calderoni; - Duda Lazarini; - Bruno Araújo. - Cauby Peixoto e Nancy Lara - Entrevistado Horácio, Nova Digital; - Vinícius Calderoni, 5 a Seco; - Duda Lazarini. - Cauby Peixoto e Nancy Lara - Entrevistado Horácio, Nova Digital; - Vinícius Calderoni, 5 a Seco; - Duda Lazarini; - Ricardo Gama; - Dedé Cruz; - Bruno Araújo. - Entrevistado Horácio, Nova Digital; - Duda Lazarini; - Dedé Cruz; - Ricardo Gama. Fonte secundária: 42 para enfrentar a atual crise da indústria; gAnalisar as oportunidades ou nichos não explorados, para atuação de novas bandas; h - Estudar as oportunidades que surgem por meio de programas de governo que incentivam a cultura. Adorno, 1999. - Até onde se considera que existe um viés do público para certas músicas? - Existem nichos a serem explorados? - Quais as vantagens e desvantagens em trabalhar com projetos governamentais de incentivo à cultura? - Entrevistado Horácio, Nova Digital; - Duda Lazarini; - Vinícius Calderoni, 5 a Seco; - Bruno Araújo; - Ricardo Gama; - Horácio Silveira. Quadro 3: Protocolo da Pesquisa 3.2.1 Descrição dos Entrevistados As pesquisas foram realizadas de forma presencial, quando possível, como no caso dos entrevistados Ricardo Gama, Horácio Silveira, Dedé Cruz, Duda Lazarini, Cauby Peixoto e Nancy Lara. Devido à distância, porém, e a limitação de recursos da pesquisadora, as entrevistas com Vinícius Calderoni e com o Bruno Araújo foram realizadas via Skype. Os entrevistados foram: a) Bruno César Araujo “BC”, ex- guitarrista da banda Móveis Coloniais de Acaju, saiu da banda em abril de 2013. Faz doutorado em engenharia de produção na USP. Entrevista realizada por Skype no dia 20/12/2013. b) Ricardo Gama, tecladista e vocal de apoio do grupo Sambô, tem formação em odontologia. A entrevista foi realizada dia 23/12/2013, no seu escritório. c) Vinícius Calderoni, integrante do grupo 5 a Seco. Entrevista realizada por Skype dia 26/01/2014. d) Horácio Silveira, gestor da gravadora Nova Digital, uma gravadora que está no mercado há seis anos. Entrevista realizada na gravadora no dia 14/03/2014. e) Angelo Lazarini Filho, o Duda Lazarini é músico baterista com trinta anos de carreira, participa de bandas como Pó de Café Quarteto, Banda Balaco, entre outros projetos. Entrevista realizada na FEARP- USP, dia 14/05/2014. f) Delbaudino Raimundo da Cruz- Dedé Cruz, produtor, cantor, compositor, etc. A entrevista foi realizada dia 17/05/2014 em seu escritório. g) Cauby Peixoto- cantor, com mais de 60 anos de carreira e grande importância para o cenário fonográfico nacional e Nancy Lara, sua empresária. A entrevista foi realizada dia 43 14/07/2014 no Teatro Pedro II, em Ribeirão Preto, antes do show de Cauby, para o qual fui convidada por Dedé Cruz, agradecimentos especiais por essa grande oportunidade. 3.3 Etapas da pesquisa Este trabalho foi realizado seguindo as etapas: desenvolvimento da fundamentação teórica, onde se buscou estudar a bibliografia existente a respeito da atual cadeia produtiva da música; coleta dos dados (entrevistas), transcrição das entrevistas, a qual reúne as informações mais relevantes obtidas nas mesmas, análise dos resultados, etapa que reúne as informações coletadas do referencial teórico e das entrevistas; avaliação dos resultados e conclusões obtidas com este estudo. 44 4. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS 4.1. Em relação à escolha do que tocar Conforme relata Dedé Cruz: “(a pessoa nasce para tocar determinado estilo ou pode tocar mais de um estilo) eu acho que ele tem que obedecer aos sinais. Então, por exemplo, se a sua vocação é uma menina, branca, com um pandeiro na mão (...), se esse é o lance que você acredita vai com esse projeto (...), mas se você é um músico que está no mercado e que vai viver disso, você tem que abrir os tentáculos, estar pronta para tudo e ai sim você é obrigada a atender tudo (...). Mas quando eu falo que eu não canto sertanejo é por que eu não tenho competência para cantar sertanejo, o agudo que eles têm (...). (então, devemos saber as suas limitações). (...) minha onde é MPB e samba raiz e dai sei que faço o meu melhor (...), então eu acho que você tem que estar pronto para atender a todo mundo se a sua proposta for comercial de viver disso (...) (ou então canalizar todo o seu dom para algo que você acredita)”. Duda Lazarini também acredita na necessidade que existe de não restringir o estilo a ser tocado: “Se você pensar na minha trajetória musical (...), eu tive que tocar todos os estilos, eu fui um músico de baile durante muito tempo, eu acho importante eu tocar em um grupo de samba e acho importante eu tocar jazz também, para a minha formação. (...) Então não dá para falar: vou fazer isso. No caso pra mim não dá (...)”. A esse respeito Ricardo Gama, do grupo Sambô relata que: “O músico, às vezes ele fica sem trabalhar, por que ele fala: não, esse tipo de música eu não toco. Tudo bem é uma opção de vida, mas não reclama. A partir do momento em que você encarar aquilo como seu trabalho, é trabalho. Tudo bem, você pode não gostar de determinada música e até às vezes dá pra você dar uma peneirada, uma filtrada, mas não dá pra você filtrar tanto, é a mesma coisa que um cara que quer trabalhar em uma multinacional (...) ah não, não concordo com esse tipo de produto não vou trabalhar, esse ai também não quero, não adianta, não vai arrumar emprego”. Por outro lado, Horácio Silveira, da Nova Digital, acredita que o músico deve tocar o estilo com o qual ele mais de identifica: “não adianta uma banda de rock n’roll tocar sertanejo, ele toca bem o rock’n’roll, ele não vai tocar bem o sertanejo (...). Para mim isso é muito claro, cada um tem a sua vertente e isso se constrói com a carreira artística, com a história da pessoa (...) o maior exemplo disso é o Paulo Ricardo (...) ele fez um monte de tentativas (...) nada deu certo (...) a imagem dele do RPM não teria ficado em um pedestal? 45 (...) isso por que ele tentou ser o que não era. E eu acho assim, o público não compra uma mentira (...) a música pode ser ruim, mas tem que ser verdadeira”. Cauby Peixoto acha, ainda, que a banda deve se aperfeiçoar em um estilo e permanecer nesse estilo, procurar um estilo próprio. Nancy diz: “por que até rock o Cauby já cantou, ele é o precursor do rock no Brasil, mas ele foi procurando o seu gênero, que hoje é o romântico”. Essa alienação do músico, essa falta de reconhecimento dele mesmo naquilo que toca, poderia diminuir sua produtividade, diminuindo o lucro da major. Assim, faz-se mister achar um novo modelo de negócio, onde o músico possa exercer sua criatividade e se identificar com aquilo que toca. Contudo, para que consiga se sustentar com seu trabalho, o músico tem que estar aberto a todas as oportunidades do mercado. Outro ponto a ser observado, como citado por Dedé, é o fato de o músico ter a consciência de que não pode tocar determinados estilos. Assim, concluo que a satisfação musical com aquilo que se toca é importante para que o trabalho desenvolvido seja criativo, porém, o músico não pode se restringir a um determinado estilo, pois isso poderia deixá-lo sem trabalho. Chega-se, porém, a outro dilema, do músico se enxergar como um profissional como qualquer outra categoria. 4.2. O músico visto como um profissional Segundo Ricardo Gama: “é diferente, por exemplo, o cara vai trabalhar de caixa no banco, ele não vai escolher quem que ele atende na fila, ele vai atender todo mundo e vai ter que atender todo mundo sorrindo (...). O músico, às vezes ele fica sem trabalhar, por que ele fala: não, esse tipo de música eu não toco”. Horácio, dono da Gravadora Nova Digital, afirma que: “ele quer ser profissional na hora de ser respeitado, sempre falei isso, mas na hora dos deveres dele ele é artista. (...) então o pai e mãe não quer que namore músico por que é quebrado, mas Ivete Sangalo não é nenhuma quebrada (...) então a música tem o músico pobre e tem o músico milionário, nós temos médicos pobres, ganhando 2 mil reais por mês para tar no SUS ali no bairro e tem o médico milionário, tem o advogado pobre e tem o advogado milionário. Eu acho que é mais uma profissão, como qualquer outra, entendeu? E eu acho que enquanto o músico não olhar isso com essa realidade ele não se valoriza. Então esse estigma que tem como músico ser desvalorizado, todo mundo falar muito esse papinho, essa brincadeira que existe de: ah, você é músico, você trabalha também ou só toca? (...) mas às vezes a impressão que eu tenho é que 46 o músico pode ser culpado dessa reação da sociedade entendeu talvez ele não tenha se ligado que é a postura dele que o faz que a sociedade o enxergue dessa maneira (...) quando eu falo de músicos estou sendo genérico, é lógico que existem exceções, mas o músico achar normal acordar meio dia, por exemplo, entendeu? (...) se ele trabalhou até a noite, tocou até de madrugada não interessa, então quer dizer, será que ele está dando uma postura para a sociedade que remete a essa visão (...) Só que existe um pouquinho dessa confusão, eu sou profissional ou sou artista? (...) começa em beber em serviço né, começa em se permitir colocar uma cervejinha do lado e tocar, eu acho isso uma lástima para a profissão entendeu? Quer dizer, você vai no banco, chega na fila e o cara está com uma cervejinha do lado? (...) eu acho isso uma falta de respeito com a sua profissão, por isso tem esse ciclo vicioso de achar que músico não trabalha que músico é vagabundo, não é nada disso. Mas a imagem que o músico acaba passando para a sociedade é essa (...) enxergar a profissão como profissão, com seriedade (...)”. Dessa forma, entendo que falta ao músico, em determinados momentos, a postura de profissional. Muitas vezes ele acaba se posicionando como artista e não entende que o seu trabalho é uma profissão como qualquer outra. O músico às vezes acha que pode acordar tarde, faltar a ensaios, chegar tarde a shows e justificar tudo com base em ser um artista. Porém, foi visto que as gravadoras, tanto as menores quanto as majors, têm buscado cada vez mais músicos com uma postura profissional e, inclusive, músicos que tenham uma visão administrativa. Como resultado, músicos que justificam tudo com base no “sou artista” podem acabar sendo jogados à margem do mercado. 4.3. Perfil de músico que interessa às gravadoras Como descrito acima, tanto as pequenas gravadoras quanto as majors têm buscado cada vez mais, segundo opinião de nossos entrevistados, aquele músico que sabe se administrar, que tem visão de futuro. Segundo Ricardo Gama: “hoje em dia a gravadora deixou de ser o que era há 20 anos, que a gravadora via o artista, se interessava ou não, pegava o artista e bancava tudo aquilo, apostava naquele artista. Não existe mais isso, hoje você faz o seu trabalho (...). O que a gravadora é hoje, é um escritório que ela vai fazer distribuição ou ela tem um esquema de distribuição”. Segundo alguns autores a gravadora é ainda menos que um escritório de distribuição, com foco na divulgação, controlando o que chega aos ouvidos do público. 47 Como resultado das mudanças que têm ocorrido no atual mercado fonográfico, onde a grande gravadora perde o controle que sempre teve da produção, devido à internet, a mesma acaba por contratar o “músico pronto”, aquele que por si só já desenvolveu seu trabalho. Sua função fica, então, restrita à função de divulgar. Dessa forma, entendo que o músico que chega tarde a shows, etc., que não tem uma postura profissional, não terá muitas chances de fechar um contrato com uma grande gravadora, ou mesmo com uma gravadora pequena. Segundo Horácio, uma banda deve saber se administrar, “de outra forma ela será explorada, e se não quem vai ganhar dinheiro é o empresário, quem vai ganhar dinheiro é o dono do bar e não adianta ela reclamar”. Ele relata, ainda, que têm buscado contratar cada vez mais com bandas que possuem essa visão administrativa: “ah eu hoje vejo cada vez mais, assim por que eu percebo que se ela não tiver essa visão eu não consigo administrá-la, quando ela vai ter uma ansiedade pelos resultados que não tem haver com a expectativa do mercado. Como eu falei, eu comecei a entrar a dois anos, nós temos um projeto que pode ser que demore sete, oito anos para atingir nosso objetivo, e eu sei que eles vão ter paciência para esperar esses sete, oito anos e muitas coisas a gente fez nesses sete, oito anos, algumas vão ser acertadas, ou a gente considera muito acertadas, assim já é um sucesso absoluto de onde ele saiu para onde ele chegou, mas pode ser que daqui a um ano a gente deu um passo tão errado que a gente volte para trás e vamos ter que começar de novo (...) mas o importante daqui a sete, oito anos de quando começou é a gente chegar ao lugar onde a gente queria (...)”. Então, outro problema da banda que não sabe se administrar é que a mesma se torna passível de ser explorada por diversos atores do mercado musical. Por tudo isso, concluo que é fundamental, principalmente no atual mercado fonográfico, que uma banda possua alguma noção de gestão, para que possa ser contratada por uma gravadora pequena ou grande e para evitar ser explorada. As gravadoras buscam a banda que sabe se administrar por diferentes motivos, a major quer um trabalho pronto, e a pequena gravadora quer alguém que tenha visão de futuro e converse com ela na mesma linguagem. De qualquer forma, o músico que não possui uma postura profissional se encontra à margem desse mercado. Considerando todos estes aspectos as faculdades de música devem se preocupar em formar não somente músicos mas músicos-gestores:“Esses caras (que vão à uma faculdade estudar música) merecem o apoio da administração (do curso de administração da USP), por que geralmente (...) os mais apaixonados são os que menos tem conhecimento administrativo”. (Ricardo Gama, do Grupo Sambô). Deve, então, haver uma maior comunicação entre as faculdades de gestão e de música. 48 Horácio, da Nova Digital, comentou que o músico normalmente possui pouco ou nenhum conhecimento de administração: “Não sei se é uma falha da faculdade de música ou tal, mas eu acho que essa parte executiva é muito pouco explorada, muito pouco desenvolvida, entendeu? E ai sai o músico e ele pensa muito na música e ai ele fica reclamando muito que o mercado não atende ele, que a música ruim impera e tal, mas ao mesmo tempo a música, o que os músicos publicitários chamam de música ruim, eles são muito mais competentes do lado empresarial (...) então assim, eu acho que o sertanejo, eles são muito profissionais, as ferramentas que eles trabalham de comunicação, com a mídia é pensado igual uma GN pensa, igual uma Ford (...) lógico que eles têm um braço empresarial do lado conduzindo, mas eu acho que isso é muito falho na MPB, no jazz, no blues, eu acho que é muito falho, muito sem organização (...) e eu acho que o sertanejo faz isso com maestria, eles fazem isso, além de eles terem mais dinheiro, eles aprenderam como fazer isso. Então o sertanejo, ele vai lançar um CD novo, um sucesso, eles fazem um evento no Vila Mix em São Paulo e pegam os contratantes do Brasil inteiro, das grandes casas de sertanejo paga avião, hotel, e leva os caras pra conhecer o show novo do Fernando e Sorocaba, entendeu? Tudo bem, você tem dinheiro e a MPB não tem dinheiro, eu exemplifiquei algo que você precisa (...) mas tem como você ser criativo e criar essas coisas alternativas...”. Entra em foco aqui, novamente, a questão do músico que não sabe se administrar porque está muito focado, apaixonado pela música, pode acabar ficando para trás, mesmo que seja um profissional mais completo que, por exemplo, o sertanejo. Segundo Duda Lazarini: “Os (músicos) que são mais administradores deixam o lado musical, eu toco isso e está bom, eu vou administrar isso que eu faço. Estes estão bem, (...) vamos produzir aquilo que a gente faz”. Ou seja, os que se preocupam mais em administrar sua banda do que com o som que produzem têm maiores chances de fazer “sucesso” midiático, uma vez que a música é vista nesse mercado como um produto. Duda pensa, então, que relativo ao sucesso (de mídia) é mais importante saber se administrar que investir na música em si. 4.4. Em relação ao enfoque em mais de uma banda Pode ser interessante, dependendo do objetivo de sua banda, possuir mais de um projeto em andamento: “(...) todos nós já tínhamos uma carreira individual. Então a ideia de fazer um show, esse show, era a ideia de consolidar a chance para um projeto paralelo pra aumentar o espectro né, do nosso alcance, pra aumentar o assunto. Porque isso é uma coisa muito usada pelos artistas há muito tempo, que é a ideia do projeto paralelo justamente para 49 poder criar uma variação de assunto pra sua carreira individual, quer dizer, é difícil ficar dando o tempo inteiro notícias a partir de coisas só do meu disco individual. (...) Eu me formei em cinema e tal, e trabalho com teatro também então eu fui pra outros lugares. Mas mesmo só dentro do âmbito da música né, é, isso é muito interessante, esse formato assim. E muita gente tem isso, não é uma novidade, uma exclusividade nossa. Muita gente tem projetos paralelos né, tem carreira solo e carreira em um grupo. É isso é muito comum, muito recorrente. Então assim a gente planeja, assim, na ocasião da reunião do 5 a Seco, dois de nós, eu e o Tó já tínhamos lançado o nosso primeiro disco, nossos respectivos primeiros discos. O Dani estava num processo de pré-produção do primeiro disco dele, é, de fechar repertorio e tal, gravando, etc. e os Pedros já tinham feito bastante show e ainda não tinham um disco, mas enfim, todos nós já tínhamos feito shows individuais, se apresentado, já tinha uma carreira individual de cada um, então já algum tinha um público de cada um”. (Vinícius Calderoni, Grupo 5 a Seco). Em entrevista com Ricardo Gama, do grupo Sambô foi relatado que: “Eu nunca passei dificuldades quando eu resolvi ser só músico, sabe quando que eu passei dificuldades mesmo? Quando eu era músico e dentista ao mesmo tempo, não tinha foco (...)”. Ricardo relata, ainda, que focar em uma determinada banda “ajuda, se a intenção é fazer aquela banda ficar famosa (...). Às vezes a pessoa não pode se dar ao luxo de ter foco, essa é a questão, ela precisa (...). Nem todo mundo pode arriscar, eu podia por que eu já tinha o meu estúdio (...)”. Entende-se, então, que para a promoção do artista individual é interessante trabalhar em mais de um projeto, de forma a divulgar mais esse artista. Porém, se o interesse é divulgar determinado projeto, seria interessante focar no mesmo. Em relação ao foco em outras profissões, existe divergência entre os entrevistados. 4.5 A música como indústria do entretenimento Segundo Ricardo Gama, do Grupo Sambô, o mercado musical hoje está voltado para o entretenimento: “Por que o que acontece, é uma bola de neve né, se você faz festas hoje pra universitários e toca o sertanejo e a preocupação de quem vai à festa é encher a cara e cantar músicas de letra fácil e ficar na pegação na festa, então o que acontece: você gera um mercado de música que é o tal do sertanejo universitário. (...) Eu vou investir em um cara de MPB, com músicas maravilhosas, mas ele não vai encher nem o anfiteatro do Sesc, então não vou investir (...). (sertanejo universitário) Por que o cara está preocupado em fazer um refrão 50 fácil, sem letra inclusive, como o Tchê Tche Rere, que é o que há de mais fácil pra uma pessoa aprender, colocar as mãos pra cima e ficar olhando pras menininhas em volta dele (...)”. Complementarmente ao que foi relatado por Ricardo, Horácio diz: “(...) por que a música ficou muito atrelada ao mercado do entretenimento né, e a música pela música ficou muito atrelada hoje a prédios culturais como Sesc e Sesi ou Leis de Incentivo. Então por isso o mercado fonográfico principalmente, de todos os seguimentos, está sem saber um pouco para onde ir, né, por que o entretenimento vende a música, mas não é o lugar da música na verdade, é lugar de namorar, paquerar, beber cerveja e tal e se divertir, e a música pode ser boa ou não. E os eventos do Sesc, Sesi e tal também são vazios, não conseguem fazer público suficiente para ter um movimento sustentável financeiramente. Parece que a música alternativa, que eu hoje chamaria de música mais elaborada, parece estar sempre mendigando espaço e fica uma briga sempre pelos mesmos lugares e não se consegue ter um mercado sustentável”. Cabe ressaltar, porém, que o objetivo do Sesc, descrito por seu gerente Hideki Yoshimoto, é dar oportunidade para as bandas independentes, e não formar grandes públicos e concorrer com as grandes gravadoras. Horácio relata, então, que “o tema da música hoje é diversão entendeu, a música como uma ferramenta de contestação, de consciência política, cultural, social, manifestação, eu acho que acabou entendeu, acho que ela hoje... Acabou não, lógico, exagerei né (...) a música como diversão e não tanto como cultura, da pessoa sentar no teatro e ouvir uma banda, apreciar a música, tanto é que você não vê mais shows (...) (a pessoa) saia de casa para ver um show. Hoje não, ele vai em uma balada, ele vai em uma festa (...) hoje existe (esses shows) no Pedro II, mas normalmente para um público de idade mais avançada. Você não vê um show no Teatro Pedro II que vai ser sustentável financeiramente de algum artista pop, seja ele sertanejo, pagode, seja o que for, não tem. Então você vê lá um João Rock com oito bandas, mas você não vê o show daquelas oito bandas sozinhas em Ribeirão (...) ele vai para namorar, para beber, e ver as bandas é uma atração legal (...) muitas vezes nem é roqueiro, está no João Rock, pois é onde a galera está indo”. Segundo Horácio, em relação à posição do sertanejo universitário nesse mercado do entretenimento: “(...) você pode colocar lá do começo do forró universitário. Que faz quinze anos isso, eu acho que lá foi o começo, da música da faculdade que está mais ligada ao entretenimento do que à cultura. Né está cada vez mais ficando a festa, que isso tem haver com a própria geração atual né, que a geração atual é um pouquinho perdida nesse sentido né, a festa ficou mais importante que o desenvolvimento intelectual (...) uma geração ai que 51 está pouco preocupada com política, pouco preocupada com economia (...). Sinto falta dessa fomentação não só cultural, que na verdade é política (...)”. O sertanejo universitário se encontra, então, em destaque em um mercado onde se vende a música como entretenimento. Não há mais um grande interesse pela letra da música, nem pela composição, mas por uma letra que seja fácil de decorar e que se adeque a esse ambiente. Pode-se concluir que esse fator, aliado ao fato descrito pelo entrevistado Horácio, de que o sertanejo universitário sabe se administrar muito bem, contribuam muito para que o sertanejo tenha consolidado essa posição central que tem hoje no mercado fonográfico, segundo Ricardo Gama: “(...) Eu vou investir em um cara de MPB, com músicas maravilhosas, mas ele não vai encher nem o anfiteatro do Sesc, então não vou investir. O sertanejo tem gerado maior retorno para os investidores, pois o público tem se interessado mais por este tipo de música. Porém, será que a busca do público por esse estilo é resultado do que a grande mídia mais tem divulgado e comercializado? “(...) é uma bola de neve né”. Outro fato importante relatado por Horácio é que a situação política atual influencia para a promoção de uma indústria do entretenimento: “Eu acho que o sofrimento na arte tem muito haver com a qualidade. E essa geração nova não sofreu, entendeu?”. Pode-se observar, ainda, que as gerações que produziram os artigos culturais mais belos foram aquelas que passavam por períodos turbulentos, a exemplo da MPB no Brasil durante a Ditadura Militar, em que a música era um instrumento de contestação. Assim, o cenário político atual não contribuiria para a produção de fonogramas mais elaborados: “Dessa forma, entendo que outro fator que influencia muito no mercado musical é o cenário político atual, que talvez deseje produzir consumidores de música alienados. Assim, a música não fala mais sobre política, sobre a sociedade, sobre temas mais complexos”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). A música faz parte da indústria cultural. Pode-se pensar, dessa forma, que o sertanejo universitário possui um papel alienante na sociedade, e seria isso proposital? Afinal, um dos motivos do sucesso do sertanejo universitário é sua letra “vazia”. Segundo Horácio, a juventude de hoje é alienada. Mas a que se deve isso, à indústria cultural? Adorno (1999, p.8) relata que a indústria cultural “impede a formação de indivíduos autônomos, independentes, capazes de julgar e de decidir conscientemente”. Por outro lado, ele complementa dizendo que “as queixas acerca da decadência do gosto musical são, na prática, tão antigas quanto esta experiência ambivalente que o gênero humano fez no limiar da época histórica” (ADORNO, 1999; p. 65). A questão da indústria da música como indústria do entretenimento é bastante antiga: 52 Aldous Huxley levantou em um de seus ensaios a seguinte pergunta: quem ainda se diverte realmente hoje num lugar de diversão? Com o mesmo direito poder-se-ia perguntar: para quem a música de entretenimento serve ainda como entretenimento? Ao invés de entreter, parece que tal música contribui ainda mais para o emudecimento dos homens, para a morte da linguagem como expressão, para a incapacidade de comunicação. A música de entretenimento preenche os vazios do silêncio que se instalam entre as pessoas deformadas pelo medo, pelo cansaço e pela docilidade de escravos sem exigências. Assume ela, em toda parte, e sem que se perceba, o trágico papel que lhe competia ao tempo e na situação específica do cinema mudo. A música como entretenimento serve ainda- e apenas- como fundo. Se ninguém é capaz de falar realmente, é obvio também que já ninguém é capaz de ouvir. (ADORNO, 1999, p.67). Vê-se, então, que já no século XX se questionava a música como entretenimento e a decadência do gosto musical. Em relação ao entretenimento, porém, existe hoje uma grande problemática. Uma vez que a música se deslocou para a indústria do entretenimento, onde “ninguém é capaz de falar realmente, é obvio também que já ninguém é capaz de ouvir” (Adorno, p.67), e, segundo Horácio, “você pode colocar (esse sucesso do sertanejo universitário) lá do começo do forró universitário. Que faz quinze anos isso, eu acho que lá foi o começo, da música da faculdade que está mais ligada ao entretenimento do que à cultura”. Esse fator contribui ainda mais para um consumidor de música alienado, o que reforça o interesse da indústria em promover o sertanejo universitário, uma música de letra vazia. Horácio relata que “se você não estiver dentro de um sertanejo ou de um samba, pagode, vamos dizer assim, você não consegue falar com a grande massa e os números não fecham” (...). Existe, porém, outro aspecto a ser ressaltado: existiriam nichos de mercados que procuram produtos que fogem à indústria do entretenimento? Dedé Cruz relata que “(existe a indústria do entretenimento), mas não acabou com aquele espaço onde a música é mais cultura, menos entretenimento e mais o conjunto da obra. Esses dias eu fui ao show de um amigo nosso que só cantou Chico, eu vi ali 80% de um público que não costuma ir para a noite, que está em casa esperando propostas (...). A minha casa era uma casa para isso, a gente fazia muitos projetos assim. Por exemplo, Cauby Peixoto (...) que pela amizade e tal eu consegui trazer para a minha casa, que é uma casa modesta, pequena, para 200 pessoas, mas eu tinha o Cauby lá, três dias cantando. Que público é esse? É o público que não quer saber quanto custa a garrafa de uísque de 24 anos (...). (e ele vive disso, de buscar nichos não explorados, da música que foge à indústria cultural). Nancy transmite, ainda, o pensamento de Cauby de que “existe música para dançar e existe música para se ouvir, quando a pessoa quer ouvir uma boa música ela vai, no caso dele, graças a Deus, está sempre tudo cheio, lotado, entendeu, e não só o Cauby, também a Angela (Maria), Ney e até jovens, quando querem ouvir uma boa música, vão ouvir quem 53 sabe”. Assistindo ao show de Cauby dia 14/07/2014, no Teatro Pedro II em Ribeirão Preto, pude comprovar que o Teatro realmente estava lotado, o que mostra que existem nichos que buscam músicas que fogem à indústria do entretenimento. Nancy complementa: “a gente que é produtora vê a diferença entre o bom, o mais ou menos e o ruim, é o que você falou, que os jovens (...) querem ver o espetáculo de dança, de luz, de coreografia e tal, mas quando ele começa a entender de música e em um bom ouvido, ele vai para ouvir a boa música”. 4.6 O “sucesso” profissional Cabe ressaltar que, a busca exclusiva pelo sucesso midiático, é apontado pelos entrevistados como um dos maiores erros que as novas bandas cometem. Segundo Horácio: “mas eu acho que assim, o artista está cada vez mais pensando no sucesso ir à televisão, ir à academia... E não como eu falei, em criar um produto bem sucedido (...)”. Dessa maneira, o sucesso de mídia é importante, mas não deve consistir no único objetivo das bandas. Horácio ainda complementa: “(...) o que é o sucesso? Eu sempre falo que um projeto tem que ser bem sucedido, tem que buscar o sucesso. É mais válido ter um projeto bem sucedido de 30 anos do que um sucesso de um ano, a meu ver. Como profissional é melhor ter uma carreira mais estável, mais duradoura do que um sucesso meteórico que a pessoa aparece, faz um disco, estoura, vende um milhão (...), mas passa cinco anos e ninguém sabe quem é aquele artista né. Então acho que isso é uma coisa que os artistas confundem um pouquinho eu sempre tento falar isso para eles, o projeto tem que ser bem-sucedido, tem que te sustentar como profissional (...) normalmente o sucesso de mídia não rentabiliza”. Ricardo Gama partilha da seguinte opinião a respeito desse tema, a respeito da confusão que existe entre os termos sucesso profissional e sucesso de mídia: “(...) não fazer sucesso não significa que o projeto não deu certo ainda, isso é uma confusão que existe na música, por que a maioria, não são todos, mas a maioria tanto dos músicos como principalmente quem vê de fora, se aquela banda ou aquele compositor ele não fez sucesso nacional tipo: não sei por que ainda não deu certo com ele, coitado, ele está há 20 anos ai tocando nos bares e não deu certo. Não, deu certo, mas ele tem outra realidade, ele toca nos bares, ele trabalha com isso. É a mesma coisa que você falar que um cara que é (...) você pega quantos consultórios (de odontologia) tem nas esquinas e as todo mundo trabalhando e atendendo as pessoas, é um ou outro nome que ele vai se destacar e todo mundo conhecer 54 (...) e não foi só a carreira dele que deu certo (...). Então assim, o problema que eu vejo muito na arte mesmo é que parece que só dá certo quem fica conhecido pela mídia (...)”. As bandas Sambô e 5 a Seco relataram que conseguiram ocupar seu espaço de forma gradual, que isso não ocorreu de forma repentina, segundo Ricardo Gama: “(a banda) foi crescendo, degrau a degrau. Muita gente que vê de fora, e isso também é natural, a gente entende, acha que a gente estourou de uma vez (...)”. Conclui-se, então, que o sucesso de mídia é importante, mas não deve consistir no único objetivo da banda, a qual deve buscar também, uma carreira sustentável. 4.7 Mudanças geradas pela internet Entre as diversas mudanças geradas pela internet pode ser citado o fato das bandas possuirem um ciclo de vida menor: “É, hoje em dia você percebe que não tem mais grandes ícones, como você tinha antigamente. Você tinha a Madonna, tinha o Michael Jackson, eram ícones que duravam 15, 20 anos. Hoje aparece a Beyoncé, ela toca e fica dois anos e aí já vem a Kate Perry e já toma o lugar dela, fica mais dois anos e vai embora e assim vai, não fica ninguém como referência em 15 anos (...) eu acho que isso se deve muito à internet também né, a internet ela fez com que as coisas sejam muito rápidas então automaticamente aqueles artistas que consigam ter grandes públicos e por muito tempo também está mais difícil”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). A internet aproxima as pessoas, conforme relatado por Vinícius Calderoni, além de aumentar a concorrência entre os artistas do mercado fonográfico: “(...) tudo é tão rápido, tão volátil, que pras pessoas fixarem a atenção em você é muito mais difícil (...). Então você se sente muito íntimo de alguém que você nunca viu e que está tocando no quarto dele, na Malásia (...)”. A internet também é um meio de divulgação importante, em especial para as bandas independentes: “Então nesse meio termo a gente trabalhou muito a questão de imprensa especializada né, vai reforçando, vai divulgando, isso foi aparecendo na internet né, hoje você tem essas plataformas de iCloud etc. mas antigamente a gente já colocava no site para baixar, My Space, teve tudo isso.” (Bruno, Móveis Coloniais de Acaju). A importância da internet como meio de divulgação tem crescido tanto que as bandas já designam funcionários para lidarem especificamente com o marketing via web: “(...) até eu sair a gente tinha um funcionário que cuidava só dessa parte, de gestão de redes sociais e tudo o mais e a parte de 55 criação, de novos produtos, de novas ações, esse tipo de coisa, sempre foi responsabilidade nossa”. (Bruno, Móveis Coloniais de Acaju) Não se pode, porém, relegar toda a atividade de divulgação para as redes sociais: “(...) não, não, de jeito nenhum, inclusive assim, por exemplo, no caso do Móveis Convida, você sabe que nos colégios de segundo grau você tem um público gigantesco e na universidade também (...) você sabe onde seu público está e você vai lá fazer isso, as pessoas tem a oportunidade de conversar com os artistas e tal, você vai fidelizar muito mais (...)”.(Bruno, Móveis Coloniais de Acaju). Porém, alguns entrevistados, como Dedé Cruz, ressaltam que o meio de divulgação via panfletos está cada vez mais ultrapassado e não é mais necessário. Dedé ressalta que divulga seus trabalhos via Facebook, outdoor e via rádio USP. Em relação aos panfletos Duda relata: “internet, hoje é só isso, não existe mais panfleto, cartaz, não precisa”. Embora a internet seja um meio de comunicação eficiente, carece do uso de técnicas para a divulgação em seu meio, de forma a diferenciar seu produto dos demais: “(...) pra todos (os shows) no começo da nossa trajetória a gente sempre fazia isso que a gente chama de vídeo convite, que e fazer um videozinho ou de uma musica, ou bem humorado, meio como uma piada... Todos estão no Youtube, (...) a melhor de todas as series que foi a primeira vez que a gente fez no Auditório Ibirapuera em 2010 dai um ano depois, a gente fez uma serie de três vídeos convites assim, que é uma mini historinha em torno dessa ideia da gente fazer um show em um lugar tão grande que é o Auditório, etc. (...) e esse vídeo (o primeiro vídeo, Gargalhadas) circulou bastante e foi bastante visto e ajudou na divulgação, e a gente fez todos os dias show lotado e no último dia a gente fez uma sessão extra também, teve mais público e isso ficou no ar.” (Vinícius Calderoni, 5 a Seco). Reconhece-se, portanto, a importância da internet, uma vez que “(...), essas plataformas virtuais sempre foram muito importante, por que são interfaces que colocam a gente em contato direto com o público (...)”. (Vinícius Calderoni, 5 a Seco) Devido à importância das mídias digitais, devem-se ter alguns cuidados em sua divulgação: “A gente tem preocupação com o que a gente faz de música e lógico que uma preocupação, por que assim, é muita responsabilidade você postar na uma página do Facebook que tem um milhão e oitocentas mil pessoas que podem ver, então a gente sempre pensa muito no que colocar naquela página (...), a gente esses dias têm dado algumas dicas de música, do que a gente gosta (...).Tinha uma equipe que fazia (gerenciamento do Facebook), que a gente está trocando agora, inclusive (...) e a gente passou a comandar por enquanto (...)” (Ricardo Gama, Sambô). Ricardo relata, ainda, que outra técnica a ser 56 utilizada é “falar mais diretamente com as pessoas, então hoje os nossos vídeos, que a gente tem feito, são produzidos no iPhone mesmo na hora, e a gente posta, a gente mesmo se filmando, assim, e a gente tem um resultado maior por que a pessoa vê que a gente está falando com ela mesmo (...)”. Ainda, ele diz que o site está fora do ar pois está desatualizado “pra você ter uma ferramenta ela tem que funcionar, a partir do momento em que as pessoas entram e a agenda está desatualizada, e vai ver a foto e não tem foto nova, e não sei o que, é melhor não ter (...)”. Outro diferencial que a internet trouxe foi a liberdade: “Mas certamente a gente é muito entusiasta de maneiras diferentes de difundir, e a gente é muito feliz de viver essa liberdade de um tempo em que o artista e o público estão muito próximos, muito sem interposição, por que você perguntou sobre vínculo com gravadora, até hoje a gente não teve nenhum vínculo com gravadora, nenhum né. (...) Hoje em dia tem mais de 90 mil pessoas na nossa comunidade lá do Facebook, na fanpage, a gente já teve música na abertura da novela sabe, aconteceram um monte de coisas.” (Vinícius Calderoni, 5 a Seco). Esse aspecto da liberdade, inclusive, é um dos fatores que contribuiu fortemente para a crise das grandes gravadoras. Outro ponto a ser observado no discurso do Vinícius é o número de “curtirs” que sua página no Facebook possui: na data da entrevista, em janeiro, o grupo possuía 90 mil “curtirs”. Já no dia 14/04/2014 aumentou o número para 105.708, o que mostra o poder de divulgação que a internet possui hoje. Ricardo Gama relata também a importância das mídias tradicionais para a divulgação de páginas da internet: após participar do programa do Faustão o número de acessos à página aumentou muito de um dia para o outro. O Facebook tem dispensado cada vez mais a necessidade das bandas criarem seus próprios sites: “Ele é legal ter (site), apesar de que o mais usado é o Face (...). O que você tem que fazer com o site hoje, que o nosso já era assim há alguns anos é que ele não pode depender de você carregar o site com conteúdo, você não vai conseguir, você não vai conseguir atualizar na mesma velocidade do Facebook. Então o que o site tem que ser no nosso modo de ver, você coloca para ver os vídeos no site, na verdade você está assistindo através do site o nosso canal do Youtube, você coloca pra ver as fotos, você está vendo as fotos do seu canal do Flickr (...) a única vantagem de a pessoa ir para o site em vez de ir para o Face ou para outro, é que ele vai para todos ao mesmo tempo (...). Mas na verdade o conteúdo do site é o conteúdo das redes sociais, ele é só uma porta de entrada para as redes sociais (...), ninguém fica mais lá interagindo com o site (...). Mas você não ter talvez não seja muito bom (...) mas tem gente já não tendo (...)”. (Ricardo Gama, Sambô) 57 Por último, cabe ressaltar dois aspectos fundamentais da internet: o primeiro é o fato dessa ferramenta ter possibilitado a divulgação para além das fronteiras do território nacional: “O PlayVinil é um projeto desses exemplos, ele está em todas as ferramentas, com isso ele pode ser vendido no mundo inteiro (...) ai na venda desse fonograma via internet, lógico, existe o percentual que é da banda, o percentual que é da editora, o percentual que é da gravadora, cada um tem o percentual disso, que o iTunes remete para o representante e o representante distribui essa receita. Eu acho que esse é o grande barato hoje, o mais legal é isso, é você ter ferramentas e eu com uma ferramenta simples eu consegui colocar a música em uma prateleira que em qualquer lugar do mundo a pessoa pode entrar, pode acessar e aí eu posso fazer um vídeo e divulgar via Youtube, redes sociais e uma pessoa dos Estados Unidos ver esse vídeo, gostar e comprar um CD da PlayVinil, por exemplo”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) O segundo aspecto fundamental da internet hoje, é que a mesma foi uma das responsáveis pela crise que as grandes gravadoras enfrentam hoje, fato associado à liberdade já relatada por Vinícius. Segundo Horácio: “Ah eu acho que a internet veio como uma concorrente da gravadora já que traz ferramentas para o artista independente criar seu espaço mesmo sem a gravadora (...). Para a pequena gravadora ela é fantástica. Ela resolveu o meu problema. Eu como gravadora pequenininha o meu grande problema era não ter distribuição. (...) Hoje eu também tenho, é o que eu te falei, no último dia tá lá, eu coloco iTunes, Amazon, coloco o vídeo para divulgar no Youtube e pronto, tenho um projeto sendo colocado em prática. Antigamente não tinha como eu fazer isso. A grande gravadora antigamente tinha quase que um monopólio disso tudo já que não tinha internet e a única ferramenta que você tinha era a TV e rádio e quem tinha isso na mão era a gravadora com o lance do jabá ela tinha monopólio desse mercado. Então antigamente você podia ter o melhor CD do mundo, podia ter a melhor produtora do mundo, podia ser criativo, ou você estava com a gravadora ou não tinha jeito. Hoje tem como, tanto a gravadora independente como a gravadora pequena, criar produtos que podem ser bem sucedidos, independente de eu estar na Globo, independente de estar em um grande projeto. Então isso eu acho que pra pequena gravadora e pro artista a internet é fantástica e hoje é essencial, por que foi ela que fez a gravadora quebrar né, e a gravadora quebrando não tem mais dinheiro para investir no artista e esse ciclo foi quebrado né (...)”. 4.8 Pirataria 58 A pirataria pode não ser negativa para todos os atores da cadeia produtiva da música, uma vez que pode ajudar a divulgar trabalhos independentes:“(...) eu lembro que meu último disco eu levei ao camelô, entreguei 150 discos e falei: tudo que vender é seu (...), passei depois de uma semana e não tinha mais, e esse é o dinheiro que eu gastaria pra jabá, vamos dizer assim (...), não tem mais loja de discos, de CD, se tiver é dentro do shopping, uma ou duas. Então olha o que aconteceu comigo, que sou compositor, vivo de direitos autorais (...), eu tenho que achar que a pirataria é o caminho para divulgar a minha música, perder tudo que eu ganharia de direitos pra a partir dali divulgar o meu trabalho, para eu poder a partir dali fazer um show. Por isso o mercado hoje, de vendas de disco é quase zero. O cara tem que ter um contrato com a gravadora, tem que mostrar na TV, que é o caminho inverso, o caminho natural das coisas é rádio e TV, e não TV e rua, o caminho natural é rádio, depois TV e ai rua (...)”. (Dedé Cruz) Complementando esse dado, Horácio relata que a pirataria pode mostrar o quão bem sucedido é o seu produto: “Não, não sofrem (as pequenas gravadoras com a pirataria). Pelo contrário, para a independente ela torce para aquilo ser pirateado, por que aquilo... uma vez saiu a matéria do Rod Hanna na revista da TAM né e eu trabalho com eles há muito tempo né e na época eu cuidava da parte de marketing e ai me ligou o editor da revista, tal fez umas perguntinhas, o Rod Hanna estava viajando e eu respondi pra ele né. Assim o que aconteceu alguém viu a banda e comentou com ele, ele não sabia muito bem o que era a banda. E ele me ligou e a primeira pergunta que ele me fez na época foi (...)se o Rod Hanna tinha CDs pirata nas bancas, na região, isso era pra ele, como ele não conhecia, o que podia dizer para ele se a banda realmente tinha um sucesso independente ou não é se tinha CD pirata. E o Hanna tinha CD pirata, já estava pirateado na região inteira. Então assim, pro artista médio e pequeno isso é um crédito né, por que o pirata não vai duplicar e colocar na prateleira se ele não tá vendendo, só vai colocar aquilo que vende.” 4.9 Sobre a falta de espaço no mercado atual Ricardo Gama pensa que “(...) a música, a arte tem uma vantagem sobre as profissões ditas comuns (...), que às vezes você precisa de espaço no mercado, espaço nas empresas, não sei o que lá. A gente não, a gente faz e divulga o que a gente quer e se as pessoas gostarem isso pode virar a sua profissão (...). Não tem muito segredo, você pode fazer isso na sua casa (...). Se ela quer ir pro Faustão é lógico que é fechado, não tem espaço pra todo mundo, é um programa por domingo (...). Se ela acha que espaço é ali, é restrito mesmo (...) 59 então o músico às vezes reclama muito, ele seleciona muito, tal, e fica sem trabalhar e depois reclama que não tem espaço. Tem espaço, hoje todo mundo tem espaço a partir do momento que a internet virou uma realidade, não existe mais você falar que você não tem espaço. (...) Isso é uma comodidade, é meio de vida em alguns casos. (...) (a dificuldade que existe) A dificuldade de qualquer profissão (...). (mas) O músico acha que tem que existir vagas disponíveis”. Vinícius Calderoni, por outro lado, acredita que “(...) existe muita dificuldade sim, sem dúvida. Hoje em dia a gente vive em uma situação onde é mais fácil gravar, por que hoje em dia você pode ter um Home Studio na sua casa, é muito mais fácil ter equipamentos razoáveis pra gravar na sua própria casa (...). E hoje em dia é muito mais acessível difundir, por que você pode ter seu site (...). Por outro lado, isso cria uma série de outras dificuldades por que muita gente faz e ai a dificuldade de se destacar hoje em dia eu acho que é muito maior do que era (...). É que eram outros tipos de dificuldade, você tinha que atrair o interesse de uma gravadora, de um selo (...). Mas eu acho que hoje em dia você tem uma grande facilidade de um lado e uma enorme dificuldade de outro por que de fato, muito mais gente lança disco, o volume de coisas que se produz é muito maior, não tem nem comparação. (...) Eu acho que tem muitas dificuldades, é um caminho muito complicado (...) eu acho que não é fácil nunca, você tem sempre que ir se reinventando e fazendo novas coisas. Eu acho que a única questão (...) é que o importante é fazer seu trabalho bem feito, com constância e com muito esforço, isso é o grande diferencial. Por que ai eu acho que pode demorar um pouco mais ou um pouco menos, mas eu acho que se o seu trabalho for realmente bom, consistente e tal, eu acho que ele vai achar caminhos pra firmar um público (...)”. Há, então, uma divergência entre os entrevistados a respeito da dificuldade em se conquistar um mercado hoje. 4.10 A dificuldade de se sustentar com a música Bruno conta, em relação à dificuldade de se viver de música no Brasil: “olha, em teoria não (existe essa dificuldade), mas depende do seu esquema então, por exemplo, no caso, o Móveis é uma banda com dez pessoas e assim, o nosso cachê não é dez vezes maior que o da média. Entendeu? Então ai a conta acaba não fechando né, o que sobre no final do mês não tem condições de competir com o IPEA, por exemplo”. Ricardo relata que, embora músico, quando prestou o vestibular optou pela odontologia, o que demonstra a dificuldade de ser um músico no Brasil hoje: “chegou o momento em que eu tinha que prestar o vestibular, 60 eu nem pensei em música, sendo que eu já era músico (...) inconscientemente pensei: preciso de uma profissão, quando eu já tinha (...)”. 4.11 Em relação ao constante aperfeiçoamento profissional O constante estudo e aperfeiçoamento profissional é fundamental para se diferenciar no mercado. Bruno relata que fez dois cursos no ano passado e que está voltando a estudar. A importância do estudo é tão significativa que Duda, depois de diversos anos atuando como músico, matriculou-se e concluiu uma faculdade de música. Ricardo ressalta, a respeito desse assunto: “a partir do momento que a pessoa vai estudar música (...), aquela pessoa tem que ser privilegiada, por que são poucos os que entendem que tem que estudar de verdade. O médico ele lê livros a vida inteira dele, (...) o músico aprende a tocar um instrumento e às vezes acha que já está bom, então tem que tirar o chapéu para o cara que fala: eu vou lá estudar música (...)”. 4.12 Bandas que se Administram Ao longo desse estudo pode-se observar que uma banda se administrar não significa necessariamente que a mesma não terá um contrato com uma gravadora indie ou com uma major. Neste trabalho bandas que se administram são definidas como aquelas que possuem o controle administrativo da maior parte de sua produção, mesmo ligada a uma major, mantendo, ainda, sua autonomia administrativa, como no caso da banda Móveis Coloniais de Acaju. A esse respeito se posiciona o entrevistado Bruno: “eu posso falar bastante desses oito anos que passei com o Móveis, que foram ótimos, experiências, assim... Eu vivi diversas fases da banda, né, uma transição de algo completamente informal para o que você tem hoje, que é uma estrutura já, enfim, empresarial mesmo né (...)”. Ressalta-se, ainda, a diferença que existe entre o conceito aqui criado de banda que se administra e de bandas independentes. Bandas independentes são aquelas que realizam por conta própria todas as fases da cadeia produtiva da música, sem relacionamento algum com gravadoras. As bandas independentes ainda não tem maturidade no que se refere ao uso das ferramentas administrativas. Dessa maneira, encontramos três tipos de bandas: as bandas independentes, as bandas que se administram, as quais já apresentam algum vínculo com gravadoras e as bandas comerciais. Nessa ordem, cada uma das bandas descritas apresenta um estágio de desenvolvimento, sendo a banda comercial aquela mais desenvolvida em termos administrativos, uma vez que possui a 61 gravadora, com uma estrutura empresarial, departamentos de marketing, RH, finanças, entre outros, administrando sua produção. A banda comercial atinge um público maior, uma vez que possui parceiros importantes no mercado fonográfico nacional. Cabe ressaltar, porém, que nem sempre ser uma banda comercial é mais positivo que ser uma banda independente. Devese analisar, para tanto, o estilo sonoro da mesma e qual seu objetivo principal. Deve-se levar em conta também os aspectos negativos de se transformar em uma banda comercial, como a relativa perda de autonomia, entre outros. A banda que se administra, por sua vez, possui a grande gravadora como parceira, mas não utiliza de todo seu aparato administrativo, por isso é menos desenvolvida nesse sentido. Esse conceito de banda que se administra apresenta, então, diferenças em relação ao conceito apresentado por Marchi (2012). O grupo musical Móveis Coloniais de Acaju é, então, um exemplo de banda que se administra. Nela o empresário é um integrante da banda, o qual divide a receita com os demais integrantes: “ele sempre fez parte de agenciamento e também de assessoria de imprensa né, ele é formado em comunicação e com respeito à formalização, a esse tipo de coisa em 2009 quando a gente teve a mudança do baterista, teve o lançamento do Complete, e tudo, a gente precisou estruturar um CNPJ né por que com CNPJ você consegue melhores contratos, você consegue negociar diretamente com as prefeituras, participar de alguns editais específicos, (...) a atividade permitiu organizar eventos, inclusive ele hoje possibilita assim a gente editorar as próprias músicas né, então o Móveis tem CNPJ também de editora o que é ótimo né, por que nessa daí já não deixa uma parcela com o editor, por exemplo, ou você faz acordo entre editoras e não entre artista e editora, então já em condições um pouco mais favoráveis. Isso vem em 2009, para fazer esse processo a gente fez uma consultoria com a Empresa Júnior da Administração aqui, fizemos o planejamento estratégico (...) e eu passei a cuidar, não só da parte musical, claro, mas também da parte das finanças. Então, assim, a gente tinha um controle financeiro mesmo, usava QuickBooks na época e tinha tudo, tinha apresentação trimestral para os sócios, prestação de contas, esse tipo de coisa. Mas isso foi uma organização de algo que já existia né por que o Móveis sempre foi muito pró- ativo em fazer as coisas, em organizar os shows, o Móveis Convida já teve o que, umas 14 edições né e que enfim, a gente fazia tudo mesmo (...) o merchandising é todo nosso, a gente que desenha as camisetas, as artes, os discos e tudo, então na verdade foi uma forma de formalizar isso né (...).” Constata-se, então, que o Móveis é uma banda com atividade empresarial extremamente organizada, talvez como resultado da formação universitária de todos os membros do grupo. Outras bandas que se administram, porém, não são tão organizadas e pró- 62 ativas quanto o Móveis, mas ainda podem ser consideradas nesta categoria. Constata-se ainda, a necessidade de CNPJ, uma vez que muitos editais para promoção musical são abertos somente para pessoas jurídicas. Duda relata que as verbas destinadas pelo ProAC- ICMS para pessoas jurídicas são bem maiores que para pessoas físicas, o que ilustra a importância para as bandas em possuir um CNPJ. Outros aspectos empresariais interessantes a respeito da banda Móveis Coloniais de Acaju são: a banda divide as funções papeis administrativos entre seus integrantes “(...) tinha um pessoal que era mais a parte de design e de novas mídias e tudo mais e tem o pessoal que era administrativo e financeiro” (Bruno, Móveis Coloniais de Acaju). Bruno relata, porém, que as decisões estratégicas e a promoção de campanhas por Facebook, etc. passavam por todos os integrantes. A banda busca, também, parcerias, como àquelas com a Sadia e com o Canal Brasil: “(...) a gente precisa de parceiros importantes, são parceiros que (...) estão no mesmo nível de relação, não são chefes e também não são subordinados, são agentes que iam cobrir uma lacuna que a gente não tinha perna para fazer (...). No caso da Sadia, a parceria veio por meio do diretor do clip Dois Sorrisos (...) e a gente achou a ideia muito legal (...). E o Canal Brasil foi por que os filhos do Outback gostavam muito da banda e ele foi conhecer e gostou também e se propôs a dirigir.” (Bruno, Móveis Coloniais de Acaju). O grupo também possui uma loja virtual para venda de produtos. Já o 5 a Seco é uma banda independente, o que é positivo no sentido de gerar uma maior autonomia de produção “(...) nada do que a gente fez foi (...) com nenhum vínculo com gravadora (...). E isso é muito legal, a gente perceber que só por nossa conta, com essas ferramentas de hoje em dia consegue estar em contato com um público tão grande assim e ter conseguido consolidar um público bem significativo a ponto de ter conseguido fazer shows lotados em vários lugares e tal (...), eu acho que isso é (...) um motivo de orgulho pra todos nós e acho que um sinal (...) interessante dos tempos, por que eu acho que isso há vinte anos seria muito difícil (...) Na mídia na década de 90, as gravadoras ainda tinham um poder (...). Um artista independente poderia se destacar pra ser contratado por uma gravadora e a partir dai ganhar um alcance maior (...). Eu acho que tem uma satisfação muito grande ao você perceber que está inteiramente (...) no controle das decisões artísticas e estéticas e você tem um público grande . (...) E ai a gente não é nem é o maior expoente disso, tem (...) o Teatro Mágico, o Emicida, sabe assim, são trajetórias muito (...)independentes, muito na base do ir fazendo, ir consolidando, ir construindo uma rede e de repente a coisa ganhar um alcance gigantesco com total controle”. (Vinícius Calderoni, 5 a Seco) Algumas outras características do 5 a Seco são: o grupo nunca teve um investimento 63 externo, o mesmo possui uma produtora desde 2010, a Isabel da Euphoria Produções e a divulgação é de responsabilidade dos cinco integrantes da banda e da Isabel. Em relação à figura do produtor, Ricardo Gama ressalta que estão em transição: “tem o escritório de dois anos pra cá só, a gente nunca tinha tido (...), escritório que cuida da agenda de shows, da agenda de imprensa, dessas coisas. Tem que ter, não dá pra gente cuidar, você tem que ter uma equipe né, não sei como vai ser agora. (...)uma maneira é você ter o escritório que tem toda essa equipe e você faz uma parceria com esse escritório que tem uma equipe já pronta que cuida às vezes não só de você, mas de vários artistas, tal, que era o que a gente tinha. A outra é você fazer diretamente as parcerias (...) você contrata uma empresa de imprensa, de assessoria de imprensa, você contrata uma empresa que cuida de mídias sociais, a gente não sabe o que fazer ainda na verdade. (Isso traria) mais liberdade, não só de agenda, mas da parte artística mesmo, principalmente. A gente nunca teve um produtor artístico musical fora, sem ser a gente, eu sou produtor musical dentro do grupo. (...) Quando você está com um escritório grande como a gente estava, até por falta de tempo e seu e por você ter delegado aquilo, você respeita aquelas ideias e traça o caminho que o escritório traçar, por que se não, se você vai ficar discutindo com eles não tem por que você ter parceria com eles. (...). A partir do momento em que você entra em um escritório grande e tudo, você querendo ou não, cai de certa maneira no sistema. E ai a gente tem ideias que o sistema acha que são malucas, artísticas, e a gente não, eles acham: não, por que isso ai não vende, a gente não está preocupado (...).” O Grupo Sambô relata que sempre foi uma banda que se administrou, mas que talvez, se fecharem novamente com um grande escritório possam perder um pouco dessa autonomia. Ricardo diz, ainda, sobre outros grupos independentes: “O Teatro Mágico não está na mídia, não se vendeu ao sistema, não se vende ao sistema, faz música de qualidade (...), é sucesso (...). Eles apresentaram o trabalho deles por meio da internet, de shows muito bem feitos, ideias muito boas (...). Hoje você tem um grupo em São Paulo, chama 5 a Seco, (...) se a pessoa fala que só existia música boa na época do Caetano, do Chico e tal é por que não conhece o 5 a Seco (...), é uma coisa linda, linda e estão ai, só que não se vendem ao sistema também eu sei de recusas de alguns deles ali, de recusas que assim, qualquer um sonharia em receber determinado convite, e recusa por que: não, não sei, não acredito nisso (...). E não vai entrar na mídia (...). Então assim, você tem caminhos, entendeu? (...)”. Em relação a esses novos caminhos Horácio se posiciona: “Não, acho que fundamental não (que uma banda contrate uma gravadora hoje, major ou não), eu acho que pode ter artistas que consigam gravar em casa, distribuir em casa, fazer show em casa, divulgar a ideia... pode, pode 64 conseguir, agora o que eu percebo é que é assim, são ferramentas que elas não se combinam muito né, a parte executiva é uma parte matemática, uma parte comercial, o que eu falei, o coração tem que estar em 50%, mas tem que ter 50% de razão dentro desse negócio, e muitas vezes o artista, ele, a parte criativa envolve 100% do ser, vamos dizer assim (...) não digo por incapacidade, mas é mesmo do perfil (...)”. Esse é, então, um empecilho às bandas que se administram. 4.13 Editoras Segundo Horácio: “(...) hoje é essencial (contratar com uma editora), por que é um mercado que existe que gera receita. Muitas pessoas nem sabem disso, mas ele gera receita sim, eu acho que se você tiver uma coisa editada, pôs na internet, registra a música e coloca no editor (...), por que você pode ter retorno (...) a rádio toca, ele tem um programa de computador que já vai emitir relatório de quantas vezes a música toca e já vai para o Ecad, que o Ecad já ele vai distribuir para as associações de cada músico (...) é um negócio muito amarrado, quase que instantâneo as informações, entendeu? Antigamente era muito fácil desviar dinheiro (...) eu acho que (hoje) é um negócio que as pessoas enxergaram como possibilidade de ganhar dinheiro (...) eu acho que tem que compor, tem que gravar e tem que colocar para rodar (...)”. Bruno relata que o grupo Móveis Coloniais de Acaju possui CNPJ de editora, o que reduz esses custos. De qualquer forma, possuir a música editada é fundamental para que haja a devida arrecadação de direitos autorais. 4.14 Trajetória dos músicos/bandas entrevistadas Dedé Cruz desenvolve sua carreira musical desde pequeno: “Eu sou mineiro de uma família de cantores, de tocador de violão e tal e (...), depois me mudei para São Paulo e toquei acordeão de 5 anos de idade até 11 e sustentava a minha família com isso (...), e ai eu tocava na estação do trem em Barra Bonita (...) e dizem todos que eu tocava muito bem (...) (aprendi) sozinho (...). Ai eu comecei a frequentar as rádios na época, levado pela minha mãe (...), virava um furor (...). (depois) virei cantor, por que todo mundo me pedia para tocar e eu não tinha instrumento (...). Depois que eu virei cantor comecei a buscar o compositor, por que eu precisava atender o cantor e eu não me conformava de cantar somente músicas dos outros. Ai isso aconteceu, fiz meu primeiro disco pela Som Livre em 1981 (...). (posteriormente) Fui tendo notícias que a minha música começou a tocar nesses países (Peru, Costa Rica, etc. por influência de amigos, que divulgavam seu trabalho) e eu comecei a viajar 65 para esses países (...) (isso no começo da década de 1980). (...) eu comecei a ser convidado para participar de shows, de movimentos, principalmente representando a música brasileira (...), e o artista de sucesso não tinha essa oportunidade, era dada aos independentes (...). Eu cantei na noite do Rio, onde era tudo muito difícil, impenetrável, eu cantava com Emílio Santiago, com Alcione (...),e eu canto na noite até hoje (...) eu criei meus filhos com a música”. Bruno, da banda Móveis Coloniais de Acaju, relata que: “eu acho que, enfim, começou como todo mundo começa, algo informal né, no caso do Móveis tem uma peculiaridade que, assim, à exceção dos caras que foram rodando né, por exemplo eu, o baterista, basicamente esses dois que não estão desde o começo, assim, vamos dizer, eram os caras da escola, do segundo grau que foram crescendo né, tecnicamente todo mundo teve a primeira banda com o Móveis, praticamente (...). Nesse processo todo eu entrei substituindo o Léo, que foi para Harvard, né, era meu colega da economia (...). Ai eu entrei em 2005 nessas circunstâncias, em 2008 trocamos o baterista também, né, então assim, tirando isso, todo mundo era dessa pegada sabe, de banda de colégio que vai crescendo, e era uma proposta artística muito divertida, muito irreverente, enfim, algo diferente né no Brasil, na época; e ai as coisas foram crescendo né, (a banda) foi tendo destaque em festivais, nesse tipo de coisa, e ai veio o primeiro CD em 2005, eu não gravei o primeiro CD, eu já entrei na turnê do primeiro CD ai enfim, foi lançado de forma independente (...) dai em 2008 veio o segundo disco, nisso a turnê de 2005/2008 rodou o Brasil na época enfim, circuito Sesc (...) funcionou muito bem para o Móveis, sabe”. Vemos, aqui, a importância do circuito Sesc para bandas que querem propor algo diferente. Ressalta-se ainda que, embora a banda Móveis Coloniais tenha surgido e crescido no cenário fonográfico nacional por meio de um caminho comumente trilhado pelas bandas independentes, ela se diferenciou no sentido de se tornar uma banda que se administra, inclusive com divisão de papéis administrativos entre os membros da banda. O 5 a Seco, por sua vez, “surgiu em 2009, é, inicialmente sem uma pretensão clara de ser um projeto permanente ou de ser uma banda na verdade. Ele nasceu pra ser um show que reunisse nós cinco, que já éramos que éramos na ocasião eu, o Tó Brandileone, o Pedro Viáfora, o Pedro Altério e o Dani Black, que depois saiu e (...) o Léo Bianchini entrou no lugar. Bom, daí nós já éramos amigos entre nós há bastante tempo e todos nós já tínhamos uma carreira individual. Então a ideia de fazer um show, esse show, era a ideia de consolidar a chance para um projeto paralelo pra aumentar o espectro né, assim do nosso alcance, pra aumentar o assunto”. (...) (Então) surgiu com essa vontade unicamente de fazer uma 66 temporada na sala Crinsantempo que é um espaço na Vila Madalena em São Paulo, pequeno, de 100 lugares, e a ideia era fazer uma temporada de 4 shows. (...) pra divulgar essa temporada a gente fez um primeiro vídeo convite que assim a gente chamou, um vídeo de uma música gravada na casa do Tó, que é o vídeo do Gargalhadas”. O Sambô surgiu, também, de maneira informal: “(...) liguei para esses caras (amigos talentosos) (...). Então a gente fazia mesinha, assim, dentro da festa para 30 pessoas (...) e ai a gente ficava 4 horas lá tocando, (...) batia um papo e tal (...). Ai o que aconteceu, em uma dessas intimidades (...) um cara brincando falou assim (...) vocês são roqueiros né, (...) então toca um rock (...) ai a gente pegou resolveu tocar uma música da Janis Joplin, que é Mercedes Benz, só que a gente estava em uma rodinha de samba (...), e tocamos daquela maneira né (...). Ai era engraçado, quando a gente ia pras festas, principalmente em Ribeirão (...) os caras já vinham com uma lista de desafios (...), e ai a gente viu que era uma maneira (...) de se divertir mais com isso aqui, dava pra ter uma liberdade (...). Ai a gente começou a entrar em um circuito muito interessante né, que é de um poder aquisitivo bem alto, então a gente começou a tocar em umas ilhas em Angra (...), umas coisas surreais (...). Eu lembro que uma vez recebi uma ligação de um cara que a gente conheceu em uma fábrica de lanchas de Floripa, ele me ligou e falou assim: olha, estou aqui, (...), apresentando uma lancha pro Zezé di Camargo e estou mostrando e ele achou demais... sabe, começaram a acontecer umas coisas assim, começou a se espalhar dessa maneira. (...) e esse público acha muito legal ter as coisas que ninguém tem (...)”. Duda Lazarini conta: “nasci em Barretos, uma cidade que (...) tinha dez conjuntos de baile. Então tinha uma cena muito forte de bailes, o mercado era esse. (...) eu na verdade comecei a tocar quando eu vi o Queen tocando em São Paulo (...) eu era profissional do skate (...). Ai eu vendi o meu skate e comprei uma bateria (...) e comecei a tocar em casa e logo a fazer baile, por que meus amigos eram músicos (...). Não fiz aulas, aprendi tocando. (...) Com dezoito anos eu me casei (...) mas nessa época eu tive que parar de tocar para trabalhar, por que eu tocava em uma banda de baile e ganhava 80 alguma coisa por mês, cruzados ou cruzeiros por mês (...) e fui alugar uma casa e o aluguel era 70 (...). Ai eu fui trabalhar com vendas (...) ai eu fiquei maluco, queria tocar, queria tocar, ai um dos meus amigos músicos veio morar em Ribeirão e me trouxe. Três meses depois que ele estava aqui ele me chamou e eu comecei a tocar na noite aqui em Ribeirão. (...) Eu com quarenta anos terminei o meu segundo grau (...) e fiz uma faculdade de música, de licenciatura, por que já fazia mais de 20 anos que eu estava tocando e comecei a sentir que as coisas vão mudando e a gente acaba conseguindo não acompanhar (...). O músico no Brasil tem que estar sempre jovem, sempre 67 com energia para poder tocar, fazer muito trabalho, ai você começa a perder um pouco da energia né e você começa a dar aula (...)”. Pode-se observar, portanto, que, embora as trajetórias dos músicos em questão sejam bastante diferentes, suas carreiras musicais foram se consolidando aos poucos. 4.15 Programas Governamentais Os programas governamentais têm sido importantes para ajudar a promover bandas independentes. Duda Lazarini ressalta, porém, que se “eu tenho uma empresa consolidada há dois anos eu posso escrever e posso pleitear o dobro do dinheiro que eu pleiteei. É 250 mil reais para pessoa física e 500 para pessoa jurídica (...)”. Aqui se mostra, mais uma vez, a importância da administração na carreira dos músicos. Duda diz, ainda, que “Pó de Café sobrevive por causa disso, de edital, a gente conseguiu um dinheiro para gravar um bom disco (edital da Prefeitura de Ribeirão Preto), gravamos um disco e ele é bastante aceito pelas pessoas, já tivemos convite para participar de três ou quatro festivais de jazz (...) também tocamos (em barzinhos)”. Bruno, do grupo Móveis Coloniais de Acaju conta que o grupo sempre utilizou Leis de Incentivo: “sim, isso ai o pessoal é muito ativo, inclusive a gente fez (...) no final de 2011 um projeto com a Rouanet da Petrobrás que era rotas musicas, uma turnê de 12 cidades (...) funcionou muito bem (...) vale muito a pena, é oportunidade de fazer coisas fantásticas (...) e essas grandes estatais tem propostas para projetos menos ambiciosos (...). Então enquanto o Chico Buarque chega e conversa direto com a diretoria dessas empresas estatais e faz o projeto já o Rouanet específico, a gente na verdade precisa ficar atento aos editais (...)”. Ricardo Gama do Sambô relata que ainda não participaram de festivais ou programas governamentais, e que “a gente pensa (em participar de festivais ou outros programas), nesse projeto novo (...). O que eu acho é que ainda tem muita gente usando isso errado. Pra se beneficiar de um projeto que existe, quando na verdade isso ai é pra divulgar a cultura né, pra dar oportunidade para projetos culturais (...). Tem pessoa que cobra uma grana pra aprovar, que ela tem um esquema pra aprovar, e ela cobra tantos por cento, isso tem muito (...). Tem o atravessador (...). Vira uma profissão (...)”. Esse é, portanto, um dos defeitos de programas como ProAC e Lei Rouanet, o surgimento da figura do atravessador. Horácio faz outra crítica a esse tipo de sistema: “(...) mas assim, Sesc, Sesi, o que eu sinto falta, muita falta, e Lei de Incentivo também é que acaba criando um vício do artista, que ele vira uma fonte de receita né, então depois que o artista entrou no circuito, é mais 68 fácil em termos de receita, mas eu acho que isso é um círculo vicioso e não faz com que o artista busque novos mercados e aí ele fica o que, satisfeito com um teatro com 150 pessoas e com uma conta bancária razoável, por que vendeu 10 shows para o Sesc, Sesi e Leis de Incentivo e está se sustentando a partir da arte dele, mas no entanto aquilo atinge 150 pessoas por cidade, se faz 50 shows no ano e vai atingir 3 mil pessoas (...). Enquanto que ele tinha que fazer um jeito que fazer com que atingisse 50 mil (...) (então) beleza, sustentou o artista, sustentou os técnicos, sustentou a locadora, a gravadora mas não sustentou o elo do artista com seu público”. Horácio diz, ainda, que trabalha com Leis de Incentivo mais voltadas para eventos. Ele acredita, também que, quando o artista trabalha com leis de incentivo, se dedica menos à divulgação do trabalho ou comete erros estratégicos na divulgação do mesmo, mas a qualidade do show não é comprometida. Nota-se, então, que a Lei de Incentivo ajuda o artista independente a divulgar seu trabalho, porém cria vícios de dependência com a mesma, segundo os entrevistados. 4.16 O circuito Sesc, editais de empresas privadas e outros circuitos não comerciais Esses tipos de circuito são muito importantes para promover nichos musicais não atendidos pela indústria cultural. Duda relata que “o Pó de Café surgiu (aconteceu) devido a um projeto que chamava Jazz na Coisa (...), a gente criou esse espaço, o espaço estava lá a criamos o evento que chama Jazz na Coisa e esse evento deu certo (...), por que a gente envolveu um jornalista, o Caconde, os eventos eram muito bem divulgados, ia uma média de 200 a 400 pessoas em cada sexta- feira (...). E a gente sabe que se fizer isso hoje, em um espaço legal, com esse tipo de ação, vamos fazer junto com um DJ que só toca coisas legais, o lugar é legal, funciona. O que confirma que existe um público que busca músicas que fogem à indústria do entretenimento, como o mesmo Dedé afirmou. Um ponto negativo dos circuitos acima, como relatado por Horácio, é que, embora exista espaço para esse tipo de produto, esse espaço não consegue alcançar o mesmo público que a indústria cultural: “(...) os eventos do Sesc, Sesi e tal também são vazios, não conseguem fazer público suficiente para ter um movimento sustentável financeiramente. Parece que a música alternativa, que eu hoje chamaria de música mais elaborada, parece estar sempre mendigando espaço e fica uma briga sempre pelos mesmos lugares e não se consegue ter um mercado sustentável (...) eu vejo que a música brasileira, da MPB por exemplo não tem espaço, não existe”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) 69 Por outro lado, Vinícius Calderoni diz que o 5 a Seco sempre toca em festivais e circuito Sesc “ gente sempre adora tocar”, além de circuitos independentes como o Itaú Cultural e como o edital Natura Musical, com o qual eles produzirão um disco. Bruno, do Móveis Coloniais também considera que esses circuitos são muito importantes, em especial porque os festivais independentes atraem a imprensa especializada: “foi totalmente (importante), alias, assim, eu digo que seria o único jeito de divulgar, por que o que acontece, assim, o Móveis nunca ia conseguir ser uma banda em um modelo tradicional Brasil por que assim, você vai, você bomba aqui em Brasília, isso até os anos 90 era assim né, você bomba aqui e assina um bom contrato com uma gravadora e muda para o Rio ou para São Paulo enfim, ai as coisas começam a acontecer, você tecnicamente não vai nem ser uma banda de Brasília mais né. No nosso caso, com dez pessoas, acaba que isso não era tão viável assim de saída em primeiro lugar, e em segundo lugar que a gente não tinha contrato com nenhuma gravadora, entendeu, que fosse bancar isso né e em terceiro lugar, diante disso a gente não vai ficar parado, vamos ter que correr atrás de fazer shows”. Assim, o Móveis tocou em vários festivais em Brasília, o que abriu as portas para tocar fora e posteriormente no Sesc. Um exemplo é o festival Porão do Rock. 4.17 Diferenças entre a major e as demais gravadoras Horácio confirma algumas das diferenças entre as indies e as majors já abordadas no referencial teórico do presente trabalho: “as (gravadoras) tradicionais continuam com as ferramentas mais convencionais, por que elas tem a grande mídia na mão, elas tem a Globo, tem a Jovem Pan em rede nacional, então acho que a base deles ainda é essa e tal só que como não tem mais a venda de CDs, DVDs e tudo o mais, eles entraram com tudo no departamento de shows. Eles comercializam os artistas ou tem participação na venda do show e tal e o lucros deles está muito mais lá na ponta do show”. Já “as pequenas gravadoras, que não tem a grande mídia na mão, que não tem a Globo ou as mídias nacionais, elas estão indo cada vez mais para a internet, a internet é o caminho para conversar com nichos pequenos”. Ressalta-se, ainda, que a internet é um canal de comunicação para atingir nichos menores aliada a circuitos independentes como Sesc e Sesi, conforme visto anteriormente. 4.18 As vantagens e desvantagens em se contratar com uma gravadora major 70 Primeiramente, deve-se observar que existem hoje diversos modelos de contratos ou mesmo de parcerias com uma gravadora, o que pode possibilitar que a banda mantenha seu controle e sua liberdade artística, mesmo contratando com uma major. Um exemplo de parceria diferenciada é a do Dedé Cruz, que gravou dois discos nos estúdios da Som Livre como artista independente, pagando pelas horas de estúdio, sem contrato com a gravadora. Ele relata que isso só foi possível por já possuir contatos dentro da Rede Globo. Ainda hoje é possível realizar esse tipo de parceria, mas para isso é importante ter os contatos nesse meio: “eu gravava na Som Livre e na Globo como vocalista, o back vocal dos artistas famosos (...) então eu estava muito lá dentro e ai eu cheguei com o meu demo, (...) e imediatamente eu comecei a gravar, eles gostaram e eu comecei a gravar, mas eu tinha um transito muito grande pelas gravadoras por conta de eu ser vocalista, (...) eu entrei por que tinha essa facilidade (...). Por que o cara que só canta tem que esperar o momento dele fazer sucesso (...), o vocalista está com todo mundo e, estando com todo mundo, o caminho encurta (...)”. (Dedé Cruz) Dedé relata, porém, que embora seja positivo gravar um disco com a marca Som Livre, o que lhe abriu portas, existiram dificuldades: “ao mesmo tempo é muito difícil por que é uma produção independente, abre caminhos e tal, mas a produção independente você tem um outro caminho a percorrer que é o da revelação desse artista para o mercado de uma forma independente, e ai é uma luta, mesmo estando dentro da Globo, da Som Livre, do Rio de Janeiro, meu disco chegou com mais facilidade ao mercado no Peru, Costa Rica, México que no Brasil (...) (então) A minha carreira acabou sendo muito mais internacional que nacional, pelas dificuldades do mercado, eu estava dentro da Som Livre, dentro do mercado das portas mais largas e mesmo assim eu sentia que aquilo era comandado pelas gravadoras e tal (...)”. Destaca-se, aqui, um ponto negativo e um positivo em se contratar com uma grande gravadora: ao mesmo tempo em que a gravadora facilita a promoção, a divulgação de um trabalho, a mesma também dificulta, uma vez que controla grande parte dos meios de comunicação: “Quem naquela época fazia boa música eram os independentes, eu me lembro que comigo saiu o Boca Livre (...), então esse pessoal gravava independente e conseguia colocar gente dentro dos teatros, mas ao mesmo tempo o que a gravadora fazia com quem estourava, ia lá e comprava todos os seus LPs no mercado (...), mas as rádios tocavam (...), as da Globo não, mas as outras tocavam, então eles faziam festivais, um monte de coisas, para que o independente se mantivesse em pé e começou a crescer (...)”. Dedé ilustra, nessa fala, uma 71 estratégia perversa adotada pelas grandes gravadoras, como forma de manter seu controle de mercado. Outros aspectos podem ser destacados a respeito desse tema, como apontados por Dedé: as grandes gravadoras ainda detêm grande poder de divulgação, pois falta organização dos artistas independentes, “é por isso que eles ainda estão em pé, por que eles conseguem fechar, eles têm as rádios (...), o jabá ainda existe. (...) eles fazem contrato com 100 artistas, (...) e prende por sei lá, cinco anos (...) e o resto fica preso para não virar concorrente (...). Se o contrato for bom, se a ideia de que me interessa, você está fazendo falta no mercado, você é a bola da vez, ai sim a gravadora passa a ser mais interessante, mas se ela não coloca você no mercado isso só vai te prejudicar, por que você fica preso, e vai ainda ditar as ordens, dizer o que você deve ou não tocar. Duda relata que alguns artistas sumiram do mercado, pois eles “bateram o pé (a disse gravadora): Você vai gravar tal coisa e não aceitaram (e essas gravadoras contratam outro)”, o que ilustra a grande perda de autonomia ao se contratar com uma grande gravadora. Para isso, você deve transformar sua música em produto, o que não é pretensão de sua banda Balaco. Duda pensa, também, que é positivo contratar com uma grande gravadora, pois a mesma será um parceiro importante que ajudará a aumentar seu público: “Existe a vantagem de a gravadora te colocar pro mundo né, na televisão por exemplo. depois que você assina com uma Som Livre, a Som Livre é da Globo, então você vai em todos os programas. (...) Uma semana em que você aparece no Faustão, no Altas Horas (...) o telefone começa a tocar muito né. (...) Claro que vale (a pena fechar com uma grande gravadora), você tem um parceiro que vai andar com você (...). (mas) É muito óbvio que uma gravadora vai te explorar, até pelo seu tamanho (...)”. A banda Móveis Coloniais de Acaju, assim como a maioria dos artistas entrevistados, também possui contrato com a Som Livre, depois de ter passado pela Gravadora independente Trama, “a Trama é uma gravadora que trabalha de uma forma bem mais livre, então assim, na prática a gente era independente também e enfim, também ai o mesmo modelo né, mais shows, condições melhores, esse tipo de coisa, e agora o De Lá Até Aqui que foi já com a Som Livre (major)”. (Bruno, Móveis Coloniais de Acaju). Ele relata, ainda, que “(...) a proposta (da Som Livre) já veio tranquila (...), por exemplo, tem artistas que vendem um pacote de shows para a gravadora né, do tipo, você tem que fazer para mim 40 shows por ano e eu que agencio, sabe, esse tipo de coisa, e isso não aconteceu com a gente, mas por outro lado também a gente tem noção de que na prática mudou pouco a nossa vida né, assim (...) um dia desses o Móveis estava no Fátima Bernardes, mas foi a primeira coisa que 72 aconteceu desde abril né por que a vantagem de estar na Som Livre é o acesso aos canais da Globo né, mas assim, “pero no mucho”, e também, a gente não se iludiu não, de que ia mudar fundamentalmente a vida. Então assim, foi um contrato não muito diferente dos padrões que a gente tinha com a Trama né, por que os caras, assim, quando eles não ganham dinheiro com a venda de discos né, o que hoje já está bem complicado, eles estão partindo para um modelo que a gravadora pode agenciar também, que não foi o nosso caso”. (Bruno, Móveis Coloniais de Acaju) A parceria do Móveis Coloniais com a Som Livre segue, então, um modelo diferente daquela com o Dedé Cruz. O Móveis continua sendo uma banda que se administra e o contrato com a Som Livre não teve cláusulas extorsivas: “eu acho que é mais por causa de som mesmo (o motivo pelo qual o contrato com a Som Livre não teve cláusulas extorsivas) (...) eu acho que todo mundo ali sabia que não era um negocio tipo Luan Santana, entendeu, então assim, já que não era assim, e também não ia dar muito esse patamar de inserção e tudo mais então também não cabia você ficar extorquindo o que gera pouco né, por que ai pra nós não ia valer a pena mesmo”. Este é um exemplo de caso em que a gravadora buscou algo pronto e de bandas que sabem se administrar, o que talvez tenha evitado que se deixassem explorar. No entanto, Bruno ressalta que a questão se deve mais ao tipo de som. (...) acho que o pesa mais ali com respeito a isso digamos, a intenção da gravadora né, o espectro que ela quer trabalhar naquele período né e como o artista está dentro dessa classificação de gênero, vamos dizer assim. Hoje a Som Livre claramente está trabalhando mais o segmento religioso e o sertanejo, então, assim, pra nós não ia sobrar muita coisa não, tanto que assim, eles não entraram com nada no disco em termos de dinheiro (...)”.(Bruno, Móveis Coloniais de Acaju). Bruno relata, ainda, que o contrato de exclusividade com a Som Livre é menor, como um contrato de prestação de serviços, dura cinco anos. Um aspecto positivo desse contrato é, também, a distribuição: “a Som Livre distribui para as lojas, então a distribuição em lojas melhorou muito, era difícil você achar em loja né, agora não”. (Bruno, Móveis Coloniais de Acaju). Bruno comenta, ainda, que assinar um contrato com uma grande gravadora não é mais um sinal de sucesso: “(...) antigamente assinar com a Som Livre era sinal de sucesso, acho que hoje já é uma coisa que significa bem menos, é apenas mais uma parceria e tal. Eu acho que as gravadoras não estão sabendo como trabalhar com essas novas mídias, novos mercados. Eu acho que na verdade o que está pesando mais para fazer o artista virar, pelo menos esse som fugindo do sertanejo, do religioso, o que está fazendo virar são as redes sociais e pra isso eu acho que é muito mais importante um trabalho de assessoria de 73 imprensa que um trabalho de gravadora (...). Então a própria estrutura das gravadoras não permite a flexibilidade que é necessária para lidar com esse público, entendeu? Por que o que acontece hoje, divagando um pouco, (...) esse corpo a corpo junto ao rádio e a televisão a gravadora sabe fazer isso muito bem, agora quando você já começa em um outro, segmento e as redes sociais se tornam importantes acontece um paradoxo, o acesso ao conteúdo ele não tem barreiras, você cria um canal no YouTube, um canal no Facebook, um canal no SoundCloud, esse tipo de coisa e você já está lá, mas como é que você vai fazer isso sem divulgar, ai você tem que trabalhar muito bem a própria rede, os jornalistas, de blogs, a própria imprensa escrita, esse tipo de coisa e isso as gravadoras não conseguem fazer, e eu acho os blogs e a imprensa especializada tem um pouco de ranço com as gravadoras, entendeu, o modelo é diferente.” (Bruno, Móveis Coloniais de Acaju). Aqui entra em questão outro aspecto, a importância dos blogs para a divulgação de novas bandas. Como as majors não conseguem lidar com isso, torna-se um ponto negativo para as mesmas. Vinícius Calderoni considera que contratar com uma grande gravadora reduziria sua liberdade: “(...) tudo o que a gente fez no começo foi independente e a gente nunca teve esse aval de gravadora, e até a decisão de gravar o DVD foi totalmente independente. Depois que a gente gravou o DVD a gente teve até alguns convites, algumas sondagens, chegamos a ler contrato, tivemos duas propostas assim, mais claras, mas acabamos não chegando (a fechar) por que a gente achou que não era vantajosa a perda da autonomia artística (...), por que eu acho que ter uma gravadora não é uma coisa em si péssima, eu acho que depende do acordo (...). Embora estar em uma gravadora possa significar uma enorme divulgação, uma enorme ampliação do seu alcance de público, talvez seja interessante ter um menor controle, sabe, ser o dono da máster do seu disco (...). Mas no nosso caso desde o começo (...) todas as nossas decisões foram coisas que a gente acreditava profundamente, sem concessão nenhuma, e a gente quando analisou os contratos a gente viu que eles eram desvantajosos: a gente perdia boa parte da nossa autonomia, sem um ganho correspondente.” O Sambô é, porém, um dos entrevistados que possui contrato com a Som Livre, que realiza a distribuição de seus discos. Ricardo Gama diz que : “O que a gravadora é hoje, é um escritório que ela vai fazer distribuição ou ela tem um esquema de distribuição, ela fecha parceria com alguma distribuidora, que tem os caminhões que distribuem nas lojas, e ela tem conhecimento, ela tem profissionais ali dentro que são amigos do cara da Globo, do cara da rádio, tal, uma equipe, que vai tentar divulgar isso pra ela vender bastante CD e DVD e ganhar dinheiro sobre isso. (...) a gente começou com gravadora faz dois anos”. Em relação à distribuição cabe notar, porém, que as majors têm abandonado cada vez mais essa etapa da 74 cadeia produtiva, realizando parcerias de distribuição com terceiros, e focando na parte final da cadeia fonográfica, a divulgação: (...) eu acho que produzir do zero uma grande gravadora hoje quase que, dificilmente (faz). (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) Horácio relata, ainda, que existem outros caminhos a serem adotados, ainda em parceria com a major: “É, tem vários caminhos. Eu acho que principalmente hoje já tem aqueles músicos que estão consagrados, temos produtos que estão chegando né, e crescendo e tal que ai normalmente um empresário que tem relação com a gravadora pega esse produto, investe nele, grava, faz o produto, faz o DVD, faz o disco, ele investe, não é mais a gravadora que faz esse investimento, esse investimento vem do empresário ai ele chega à gravadora e faz uma parceria de distribuição, comercialização e exposição de mídia. (...) (ela está muito focada nessa etapa), antigamente não, antigamente quem bancava o artista, quem bancava o CD, quem fazia o royalty, o advanced, que era o artista chegava, assinava com a gravadora e recebia por 5 mil cópias vendidas antecipadas, para que ele pudesse se dedicar só à carreira dele. Hoje isso não existe mais, a gravadora não investe mais nisso”. Esse modelo de negócios pode ser interessante, então, na medida em que a gravadora não mais investe financeiramente nos artistas. “Eu acho que o sonho da banda ainda é a grande gravadora por conta disso, que ela ainda vê a grande gravadora quem tem a grande mídia na mão, eu acho que isso é fato. Né, a Nova Digital, por exemplo, que é uma gravadora, um estúdio regional, eu tenho parcerias com a Jovem Pan Ribeirão, com a Intersom que é uma rádio de São Carlos, com uma rádio de Araraquara, tenho uma série de parcerias que a gente tem para os nossos produtos, mas são produtos regionais, são parcerias regionais quer dizer, eu não consigo colocar meus parceiros na Xuxa, Faustão, Jô Soares, e isso um grande empresário, vamos dizer assim, consegue colocar esses produtos. E é muito claro, assim, um produto que custa 10 mil hoje, vai no Faustão, no Jô, tal tal tal, na semana seguinte se ele tiver uma estrutura bem arquitetada ele pula de 5 mil para 20”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) Um aspecto negativo em contratar com uma grande gravadora está relacionado ao estilo musical, como ressaltado por Horácio: “As grandes gravadoras estão ficando cada vez mais com produtos populares né, então um grupo de jazz, uma Sony não contrata, uma Universal não contrata. Um grupo de MPB, novo, não contrata; um grupo de rock, novo, muito difícil. Quer dizer, se você pegar hoje o casting da Universal, Sony, você vai estar falando em sertanejo, samba e pagode é isso, e aí a música nordestina, um pouco de forró e tal, basicamente isso. E aí o que eles fazem, ai existem alguns selos pequenos que trabalham com alguns nichos né (MZA Music), que trabalham com um selo...Biscoito Fino que é um selo 75 que grava Maria Bethania. Mas ai elas pegam esses braços, elas fazem um fomento na música menor e distribui através da Universal, da Sony e tal”. Dessa maneira, a possibilidade de contratar com uma grande gravadora é muito pequena se o estilo musical não é o popular, exceto se houver uma parceria de divulgação e distribuição com as gravadoras independentes. Esse elo, porém, está cada vez menor e talvez Maria Gadú tenha sido uma das últimas a aproveitar esse tipo de parceria. “Antigamente tinha uma coisa, a gravadora investia na música popular, ela recebia um lucro alto e ai investia nos produtos que não davam tanto lucro. Com o fim desse processo o produto não dá tanto lucro mais, ele fica meio à deriva (...)”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) Horácio pensa ainda, em relação aos grandes lucros obtidos pelas grandes gravadoras: “Hoje é diferente, mas antigamente quem bancava o CD era ela, quem pagava o estúdio três meses, colocava o artista lá dentro, dava um advanced era ela, quer dizer, quem tem que ficar com a maior parte é ela. Para mim isso é muito claro, quem corre risco? (...) se não fosse ela, você faturaria aquela receita? (...) os músicos antigamente iam às gravadoras e eles não enxergavam como que a fórmula era boa. Por que, ele reclamava que a gravadora roubava ele, que fazia mais discos do que estava computado (...). Só que como eu te falei, a gravadora tinha o artista brega, que vendia um milhão de discos, e que dava uma fortuna de lucro. E ela tinha o artista de jazz que dava prejuízo, entendeu, mas a gravadora pegava o lucro daqui, embolsava uma parte, pegava um percentual e investia nos produtos que davam prejuízo, que poderiam ser produtos de longo prazo, não sei se o brega um dia vai estar em alta (...). Mas então, aí o que acontece, quando acabou gravadora, hoje a gravadora não arrisca mais ela não investe mais dinheiro onde vai dar prejuízo, ela só vai naquilo que é certo, por isso que ela não investe mais. O artista que investe (...). Então o artista que brigava antes como se a gravadora tivesse uma forma exploratória não percebeu que está muito pior hoje”. A grande gravadora realiza, portanto, somente um trabalho de seleção, evita o risco ao máximo e somente seleciona o que o mercado irá ouvir. É este, entre outros fatores, o motivo pelo qual os contratos com as major são menores: a mesma pega algo pronto, que gera lucro em menor tempo, e possui contratos de alta rotatividade entre as bandas. Cauby pensa que é necessário ainda contratar com uma gravadora: “é preciso de gravadora, a gravadora divulga”. 4.19 Gravadoras independentes 76 As gravadoras independentes possuem um perfil diferente daquele da grande gravadora: “(...) as pequenas sempre foram alternativas, sempre foi assim, cada uma brigando por um espaço independente diferente, então a gravadora grande possui um outro formato. As pequenas estão em parceria, no mesmo barco que o artista (...), ela tem que desembolsar, ela tem que correr risco junto e são produtos pequenos também, entendeu a gravadora pequena não tem nem como explorar um artista por que são valores ainda tão no criadouro do projeto que ela não tem como explorar ele”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) Devido ao fato da pequena gravadora ainda ter que arcar com os custos, ela tem que desenvolver mecanismos para controlar os riscos do negócio. Em relação ao trabalho autoral a Nova Digital contrata: “são artistas que eu tenho visão de longo prazo (...) artistas, como eu te falei, o PlayVinil é um exemplo, que possam ficar comigo por 8, 10, 15 anos. Normalmente quando é com os mais prontos, assim, eu trabalho mais com divulgação, venda de shows, sem estar com a gravadora atrelada, entendeu? Eu tenho outros braços para utilizar que não a gravadora, a gravadora é mais produtos que eu realmente acredite que eu possa ter uma fidelidade de longo prazo (...) não adianta eu colocar um projeto de oito anos para alguém que tenha a necessidade até, não vou falar que ele tenha a cabeça, mas a necessidade que isso dê resultado em seis meses. Eu particularmente acho que em seis meses você não vai a lugar nenhum. (...) Oito a dez anos, é o tempo que um produto ser concebido, colocado no mercado e conseguir se pagar para daí começar a falar bom, agora a coisa vai. É difícil você falar isso para alguém que tem 40 anos de idade, 35 anos de idade, ai até voltando a falar do músico em fim de carreira”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). Uma boa maneira de evitar os riscos é, portanto, investindo em artistas novos e com visão de futuro. Quanto ao cover, porém, não existe essa restrição, uma vez que são produtos mais fáceis de divulgar. Em relação às estratégias adotadas pela Nova Digital: “(...) ela nasceu com a intenção de ser uma empresa verticalizada, que seria desde ter um estúdio de ensaio, temos um estúdio de gravação (...) temos um braço que é exatamente junto com a gravadora que é um comercial de shows né, que é comercializar, quer dizer, a pessoa vem aqui, ensaia com a gente, grava com a gente e ai eu tenho um braço que eu posso ajudar ele a comercializar esse show, (...) junto com isso também tem as parcerias midiáticas né, que tem a parceria com a Jovem Pan, por exemplo, (...) e junto com isso esse caminho de shows (...) (e tem a) locadora de som que a gente tem né, a gente tem uma empresa de som, luz, a parte de produção do show, para quando a gente vender o show a gente também ter um apoio de logística, de luz bacana, um som bom e tudo o mais né”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). Pode-se 77 observar, então, que a indie também busca atuar no mercado de shows, uma vez que a venda de suporte físico diminuiu. Ao realizar essa estratégia concorre com a major, se as duas estiverem atuando nos mesmos nichos de mercado. Em relação ao modo como a Nova Digital busca seus clientes: “nós temos o estúdio de ensaio, então dentro do estúdio de ensaio acabo tendo contato com muitos artistas que eu vejo e começa uma conversa a partir daí. Pelo estúdio de gravação também, que a gente atende o mercado há muito tempo, nem sempre na Nova Digital, mas eu estou no mercado há 25 anos (...) então esses clientes que nos procuram para a gravação muitas vezes eles acabam tendo interesse em outros produtos da produtora, como a produtora de vender show, por exemplo, (...) e alguns a gente vai buscar. Mas até hoje não foi uma prática muito forte de ir buscar os artistas não, meio que a porta está aberta, as pessoas vêm até a gente por vários departamentos e a partir daí que pode ter uma parceria, começar um namoro, pra daí produzir algum evento. (...) (para contratar a banda) primeiro eu faço uma análise de mercado e segundo, uma análise também, existe uma coisa aqui dentro muito de coração, sabe, de empatia, que não é só financeira. Tem produtos que eu começo a gravar, sinto uma empatia e o que eu mais quero é que aquele produto seja bem sucedido (...), pelo menos 50% do que envolve esse lado é o coração e não a questão financeira (...) não dá pra ter um artista aqui que a gente vai ficar brigando o tempo todo por que ele pensa A e eu penso C. (...) isso com o tempo acaba tendo desgastes e a gente acaba tendo atritos né (...)”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) Quanto à distribuição dos produtos da Nova Digital “(...) a distribuição nós não temos né, por que a distribuição física do CD ela é um pouquinho complicada por conta de um mercado muito grande para cobrir. Mas como eu falei anteriormente, como as lojas estão acabando, as lojas de CD, e isso está migrando para a internet, a nossa plataforma hoje nós temos uma distribuição sim, via internet (...) não pelo site da Nova Digital, nós disponibilizamos os nossos produtos via iTunes, via Amazon.com, coloco ela pra escutar na Rádio Uol, entendeu, nós temos uma parceria com uma distribuidora digital”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). Este dado mostra a importância da internet para as pequenas gravadoras, que antes tinham dificuldade de distribuir seu produto. Em relação aos modelos de divulgação utilizados pela Nova Digital, Horácio relata: “têm dois caminhos, um é a internet, que é essencial a confecção de um vídeo (...) existem algumas ferramentas patrocinadas (...) a pessoa vai ver um vídeo do Jota Quest e ai aparece uma citação pro PlayVinil como tem um perfil parecido e disso a pessoa clica naquele PlayVinil (...)um outro caminho é a própria fanpage pessoal de cada um, que existe um 78 trabalho para que isso seja ampliado, (...) como também a própria fanpage do grupo, também com a mesma coisa. E tudo isso linkado uma coisa à outra né. Desde o link patrocinado no Youtube, tem link patrocinado no Face né, e tal. Isso via internet, ai a gente tenta criar algumas ações via vias mais convencionais, a Jovem Pan, por exemplo, se eu não me engano a música toca duas vezes ao dia, uma de manhã e uma a tarde. Essas parcerias são muito com um estreitamento com um veículo de comunicação, que vem a partir de shows que você, faz junto com a rádio e aí você começa com isso, tentando fazer alguém da rádio gostar da banda. (...) Então eu tento criar eventos junto com as rádios, para que eu possa nesses eventos colocar alguns artistas meus e alguém da rádio vê e faz uma amizade tomando uma cerveja e tal e daí nascem projetos pros artistas individuais, por exemplo, a gente tem uma ação junto com a Jovem Pan que é o Ribeirão Moto Festival (...).Ai vem muito da criatividade, de como você vai conseguir fazer isso, é um mercado muito difícil de ganhar dinheiro (...) então você tem que criar ferramentas para tentar viabilizar o mercado. Por último, os estilos trabalhados pela gravadora Nova Digital são: “Tem de tudo, trabalho com sertanejo, trabalho com jazz, trabalho com pop, trabalho com rock, uma coisa que eu nunca tinha trabalhado é com Hip Hop, mas trabalho com música eletrônica por exemplo, tem um projeto da Nova Digital que chama Social House Club (...)”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) 4.20 Diferenças entre o atual mercado brasileiro e o paulista Dedé Cruz relata que existem diferenças significativas entre o mercado brasileiro e o paulista: “(...), por exemplo, o Amado Batista (do norte), o Amado Batista não chegou nunca aqui no interior, mas o mundo todo, ele lota casas noturnas onde ele vai (...), mas não chega aqui (...). A gente fala de 30 músicas que tocam no Brasil inteiro, 30 artistas (...), daqui um mês são outros 30, o resto não toca, entendeu? Vai pra lá o que a grande gravadora, que ainda existe, ou a TV faz tocar, por que as rádios tem todo um link, é uma coisa só (...)”. Horácio, da Nova Digital, concorda que existem diferenças entre esses mercados: “eu acho que tem diferença sim. Primeiro por que o mercado paulista hoje é mais eclético, ele acaba tendo todos os mercados dentro do estado de São Paulo. No Brasil você vai para o norte você já tem uma música mais nortista que funciona, no nordeste também, tem um pouco mais de axé, de forró que aqui não funciona tanto. O sul também tem um mercado Rock’n’ Roll (...) o sul tem uma cena Rock’n’ Roll meio deslocada do resto do país que é interessante, é meio que autossuficiente por lá e acaba não vindo para cá.” 79 Vê-se, então, que existem mercados específicos em diversas regiões do país, mas muitas vezes esses nichos ficam restritos àquelas regiões, devido ao poder das grandes gravadoras. 4.21 O suporte físico hoje O suporte físico teve suas vendas drasticamente reduzidas com o advento da internet e a substituição pelo fonograma digital: “(...) o CD está em seu finalzinho de vida útil ele não vai acabar totalmente eu acho, ele vai continuar como uma mídia de divulgação, e tal, talvez com os colecionadores; como o vinil ele não acabou, tem o mercado dele (...) mas eu não acho que volte, tem uma série de coisas desde o petróleo para fazer o disco que ambientalmente é uma coisa incorreta (...)”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) Gravar um disco pode ser um desperdício do ponto de vista comercial se forem considerados dois aspectos. O primeiro deles é que, com a produção do fonograma para a internet, não é mais necessária a produção das 12 músicas que iam no CD, mas de uma ou duas para divulgar via Youtube. O segundo aspecto é melhor descrito por Dedé Cruz: “(...) Michel Teló (...) tocou o refrão da música dele, olha o que a internet fez (...), mas além do golpe de sorte, você tem que agradar com a sua música em 10 segundos, você não precisa de mais, hoje é assim. Então gravar um disco é um desperdício se o cara for pensar comercialmente”. 4.22 Características do mercado fonográfico brasileiro Cabe observar, nesse tópico, algumas características do atual mercado fonográfico brasileiro, entre elas: “(...) hoje não se precisa de muita coisa para se fazer um disco, você não precisa nem de músico (...) por que não existe mais o sideman (músico profissional que é contratado para se apresentar ou gravar com um grupo a qual ele não integra, Wikipedia, 2014), por que não te ligam mais? Por que não precisa, se eu tenho uma ferramenta que chama Pro Tools, se eu preciso de um som de bateria igual ao do John Bonham do Led Zeppelin eu tenho, ela cria samples, cria não, você pega samples, pega uma batida que o John Bonham bateu (...), isso eu estou dando um exemplo de um baterista famoso (...). É humano, parece que o cara está tocando de verdade. Em uma grande produção você não vai fazer isso, mas em uma produção média você faz isso (...), antes não tinha isso, antes você precisava do cara, tinha que ligar (...). Hoje o cara que trabalha comigo ele não me liga, ele fala: o Duda, acabei de pegar aquele pagode que você gravou com a banda tal e usei aquela 80 bateria para fazer uma outra música aqui (...). Fui sideman do Guilherme Arantes, fui sideman de muita gente, hoje eu sou o sideman do Dimi Zumquê (...), de quem me chamar para tocar (...), mas o músico que grava, no caso, não precisa mais, precisa em algumas produções.” (Duda Lazarini). Pode-se notar, então, que uma característica desse mercado é que a tecnologia tem eliminado alguns atores do mesmo, o que é negativo para o profissional da música, uma vez que aumenta ainda mais a concorrência no setor: “(...) quando você vê que um mercado não cresceu tanto e o tanto de músicos que apareceram um monte de gente vai ficar parada. Isso foi uma conversa que eu tive esses dias com um músico que mora em Nova York, ele falou exatamente isso, ele falou uma coisa mais grave ainda, em Nova York os caras estão saindo das universidades, tocando pra caramba e indo tocar em barzinhos, para ganhar 20, 30 dólares (...), e esses caras estão se drogando pra caramba (...), os caras vão ficando frustrados, por que não tem onde tocar, ele estudou pra caramba, ele fez uma faculdade de seis anos (...).(Duda Lazarini) O aumento da concorrência se deve, principalmente, à internet, que aumenta as possibilidades de produção e divulgação de uma obra, além do fato supramencionado de substituição tecnológica de alguns atores desse mercado. Outro fator pode, ainda, ser apontado. Se esse músico que sai da faculdade tivesse um maior conhecimento administrativo, de forma a se posicionar competitivamente no mercado, ele estaria sem emprego? Como disse Horácio, para divulgar seu trabalho no atual mercado precisa-se de criatividade. Uma outra tendência é a produção de um fonograma mais simples: “(...) Hoje tem esse negócio do conceitual, do som mais simples, do som sem ser muito rebuscado (...). Parece (alguns bateristas) uma bateria eletrônica, do jeito que ele começou ele acaba a música, sem nenhuma intervenção, sem nenhuma mudança de timbre, nada. Você assiste e fala: poxa, esse cara não vai tocar? Ele vai ficar fazendo isso a noite inteira?) É ele vai tocar a noite inteira desse jeito, aquele som simples... Existe toda uma galera fazendo isso, o Los Hermanos foi uma banda que aconteceu assim né, um som simples (...). Você houve o disco e ouve a banda no palco e é a mesma coisa, no estúdio não existe um tratamento muito grande né, tem as edições que sempre ocorrem de afinação (...), corrige tudo, mas é um conceito, hoje tem isso. (...) E isso é o que está acontecendo agora né, essa gravadora, a Trama, essa moçada nova, a Tulipa Ruiz (...) você vê aquilo, a bateria já é diferente, o cara as vezes nem monta uma bateria completa (...). Música conceitual, não é música humanamente tocada, com vida (...). Só que isso muda também, o ano que vem pode ser que venham os exageros de novo só vai rolar de legal aqueles bateristas que tocam muito rápido (...) ou só vai ser legal a música que 81 tiver muita gritaria, você não tem hoje, o negócio é conceitual, não tem gritaria (...)”. (Duda Lazarini) Existe, ainda, um estigma dos músicos em relação à figura do empresário e da gravadora “(...) parece que o empresário tudo que ele ganha parece que é sempre ganhando em cima do artista, mas o empresário também tem o seu papel nessa cadeia, né, desde a criatividade que ele também tem de criar eventos (...) os Beatles é um grande exemplo né, sempre disseram que se os Beatles não tivessem um bom empresário e um bom produtor, totalmente sem destino, talvez não chegasse a lugar nenhum (...) desde o produtor de saber controlar o ego de cada um, de fazer aquilo funcionar com uma química, até de um cara empresário que sabe como articular isso (...) tem que ter, isso é, e muitas vezes o músico ele sempre enxerga esse cara como, é o sonho da vida dele, mas sempre o cara que vai roubar ele, parece que é muito difícil quebrar esse estigma sabe?” (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). Isso pode ser devido à postura muitas vezes perversa da grande gravadora, a qual acaba por criar um estigma contra toda uma categoria de empresários. Empresário é então, o ator responsável pelo financiamento do projeto e pelo elo com os meios de comunicação. É importante ressaltar, ainda, que o mercado fonográfico do interior do estado de São Paulo não possibilita grandes ganhos: “por isso (Rod Hanna ter ido para São Paulo) também que conseguiu agregar valor, por que o interior não tinha condições de bancar um projeto do tamanho do Rod Hanna, se você ficasse só no interior não teria sustentabilidade para o que eu falei, para ser bem sucedido hoje (...) por que o mercado é muito pequeno e tem o seu limite de receita”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) Há uma transformação cada vez maior do fonograma em produto da indústria cultural, o que é observado por meio da “(...) banalização musical, dos temas, das letras, é só você olhar a qualidade musical que vinha de Daniela Mercury que tocou um axé lá trás e um Lepo Lepo que toca hoje entendeu, nada contra o Lepo Lepo (...) eu não ligo da música, vou falar assim, em um tom mais pejorativo, a música ruim estar no mercado, eu acho que isso, normal... faz parte, a música popular ela é simples, ela é... tá tudo certo! O que me incomoda é só isso ter ocupado 90% do mercado, 80% do mercado e ter sobrado 20% para o resto (...) como eu falei, eu acho que o sertanejo, o samba, o axé, é a música brasileira, tem que ocupar sim a maior participação de mercado, boa ou ruim, eu acho que não tem o menor problema. Agora me incomoda muito quando você olha para o jazz, por exemplo, e vê que não tem mais nicho, o MPB, principalmente (...) não existe mais bar MPB na cidade nem pra 100 pessoas que se sustente (...) essa geração ai que conhece o sertanejo, o pagode e tal não tinha um tempinho para ver o jazz, nem que seja uma vez por ano, só para poder entender o que é 82 aquilo (...) essa geração não tem essa curiosidade”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). Aqui se destaca outra característica desse mercado, o fato desse produto gerado pelas grandes gravadoras dominar a maior parte do mesmo. O advento do sertanejo e do pagode universitário não é, porém, totalmente negativo para o país: “(...) desde o pagode dos anos 1990 e que eu falo uma coisa, ele e o sertanejo podem ter até ter piorado um pouquinho a parte musical, por conta talvez da popularização e tal, mas fizeram com que a música brasileira respondesse por 80% do mercado (...) o dinheiro que gera o país hoje está na mão de brasileiros. Coisa que na década de 70, 80, era muito nas mãos dos estrangeiros, isso com certeza, quando a indústria fonográfica tem um poder mais forte de persuasão e tudo o mais (...)”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). Um fato que influenciou a concentração da indústria fonográfica por multinacionais na década de 1970 é o advento da Ditadura Militar no país, como já discutido no referencial teórico. É importante ressaltar, ainda, a importância da internet para a distribuição e divulgação das músicas, fato já discutido com mais detalhes em outros itens do presente trabalho “As músicas hoje estão muito para a internet, o iTunes, o Amazon.com, são os sites de distribuição de música né, linkados às rádios virtuais, que eu acho que é a tendência futura. Vai continuar tendo televisão, vai continuar tendo rádio, CD, vinil, mas eu acho que cada vez mais vai perdendo para a internet, que na verdade nem é a internet né, é o smartphone, na sua mão você ter as fotos, as músicas”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) Estão surgindo novos modelos de negócio e as grandes gravadoras devem buscar se adaptar a esse novo cenário: “esse modelo de negócios tradicional já era, está no finalzinho, se é que ainda existe. (...) então por exemplo, antes para o artista ir para o mercado ele precisava gravar um CD e antes um disco. O CD você tem que fazer ai 13, 14, 15 músicas né, então você tem um custo de estúdio para 13, 14, 15 músicas e depois você tem o custo de criação de capa de impressão de capa, de impressão de CD e tudo o mais. Hoje como estamos falando que o meio de comercialização deve migrar para a internet e até já migrou, tanto é que você vai no Carrefour e ele nem tem mais departamento de CD (...), lojas Americanas, algumas lojas tem, a maioria nem tem CD mais também, então por que tudo vai para mp3 pirata ou compra no iTunes oficial. E o iTunes te dá a possibilidade, não só ele como outras ferramentas, de colocar uma música para vender, não mais 14 ou 15. Enquanto você coloca uma música no iTunes você não precisa de capa, não precisa prensar(...) então se o artista vai no estúdio e grava uma música ele tem um produto para colocar na prateleira e ser vendido” (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). Um ponto positivo da internet, 83 portanto, é que a mesma diminui os custos de produção, a pessoa pode desembolsar valores para produzir apenas uma música, e não mais um CD completo, o que democratiza a comercialização, mas diminui a margem de lucro dessa indústria, segundo os entrevistados. As grandes gravadoras têm dificuldade em adotar esse modelo de negócios, uma vez que sempre se apoiaram no suporte físico. Outro ponto negativo desse modelo é que leva o artista a compor menos: “(...) essa pressão que eu como produtor coloquei em cima deles para bater produtividade, a gente precisa compor, precisa compor, precisa compor, pode ser que essa ferramenta ela não exista mais. Pode ser que eu chegue e diga que eu precise de duas músicas para dai a três meses, e não mais de 12. Então isso eu acho que pode ser que aquela composição técnica né, por que eu acho que existe a composição do artista que está dirigido o carro, o compositor e tem a inspiração e escreve, eu acho que isso é uma composição espontânea. Mas existe, principalmente em grandes compositores já uma composição técnica (...) eu acho que isso pode ser que venha a se perder um pouco em função da melhor necessidade de produção de música para o mercado, o mercado não comprar mais 12, 15 músicas no pacote”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) Um outro ponto a se considerar a respeito do fonograma digital é em relação à sua qualidade: “(...) a qualidade, hoje eu acho que ela está inferior (...). Não que não tenham bons músicos, não que não tenham bons compositores, mas ao mesmo tempo como nós estamos falando de internet e a produção da internet, a qualidade sonora, a música, por exemplo, do arquivo que vai na internet hoje é inferior ao que era o CD e inferior ao que era o vinil. Então antigamente você tinha que gravar um disco, você ia para um estúdio de um milhão de dólares. Hoje se a pessoa quiser gravar um CD em casa, grava. Falar que é o mesmo som de um estúdio de 1 milhão de dólares, não é, é muito inferior, só que, para o meio de transferência de música via internet essa qualidade é o suficiente. Então automaticamente eu acho que vem existindo uma queda de qualidade, tanto sonora quanto artística em função disso, em função que ficou muito pulverizado”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) Cabe ressaltar, em relação ao sertanejo, que suas vendas estão caindo, devido a seu excesso de exposição, entre outros fatores: “(...) o sertanejo ele tem uma característica muito ruim do lado financeiro que é você tem um número muito grande pra que está dentro dos grandes. E você tem um número muito pequeno para quem está dentro dos pequenos. Então por exemplo, uma dupla sertaneja, um Fernando e Sorocaba, podem custar 200 mil, 250 mil um show. E você tem duplas em Ribeirão trabalhando por 800 reais. Entendeu? Então a 84 distancia ela é muito grande e cada vez mais vai diminuindo (...) duplas que custam 25, 20, 22, 15, está criando um buraco. (...) no sertanejo especificamente existe o tal do investidor né, existe o médico, existe o dentista, existe o fazendeiro que vê uma dupla e ah, vou colocar um milhão nessa dupla para ela poder estourar. (...) esses investidores colocam esse investimento como se fosse um investimento bancário (...) mas muitas vezes esses investidores foram levados muito pela empolgação, entendeu? E eu acho que hoje diminuiu muito (...) exatamente por que muita gente investiu e não voltou, não é tão simples assim (...)Por isso que tinham duplas de 15, 20, 25, que eram duplas que tinham uma produção muito boa, tudo muito bom por que tinha alguém investindo para isso ter sustentabilidade”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). Por último, segundo Cauby Peixoto o mercado fonográfico está, hoje, diferente da época em que começou sua carreira: “Eu acho que está diferente, para melhor, hoje o músico pode até improvisar, antigamente não, era só lendo né”. Para Cauby, a possibilidade de improvisação é algo positivo. Nancy Lara, sua empresária, complementa que, com o advento da indústria fonográfica voltada para a internet, as vendas de CDs do Cauby Peixoto não diminuíram. Esse fato demonstra que o público de Cauby, construído ao longo de 67 anos de carreira é composto por consumidores fiéis. Em relação ao show de Cauby no qual esteve presente a entrevistadora, no dia 14/07/2014, pode-se observar que a maioria do público era de pessoas entre 50 e 70 anos. O Teatro estava lotado, o que ilustra mais um nicho a ser explorado. 4.23 Estúdios A maioria dos estúdios cobra locação por hora, o que limita a criatividade do músico, conforme estudado. “O estúdio é contado por hora, a gente mede até com taxímetro né e ai tem uma média que é muito variável né. Antigamente o estúdio fazia parte do processo criativo do artista. Então uma gravadora chegava ao estúdio, fechava em três meses, colocava o artista ali dentro pra ele compor, gravar, isso também mudou muito”(Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). Existem então, pontos positivos e negativos relacionados ao excesso do tempo de estúdio. Duda relata que o estúdio foi positivo para os Beatles, uma vez que serviu de laboratório para o processo criativo. Por outro lado, o excesso de tempo de estúdio pode ser negativo: “O que mais ajudou eles (Os Beatles) a inovar foi o produtor que eles tinham (então além do estúdio). (...) (o estúdio é importante para a criatividade por que) funciona 85 como um laboratório, eu gravo a base da música, está lá o baixo, a bateria e o violão tocando ai a hora que eu chamo um pianista pra tocar (...), mas ele vai embora e a gente fica ouvindo e pensa: mas e se a gente chamasse (outro), o Luís, e ele chega e a gente vê que é aquilo que a gente queria (...). Funcionou como um laboratório. E o Milton fez isso (...) (exemplo do Milton Nascimento, no disco Clube da Esquina, da experimentação em estúdio e ficou maravilhoso, segundo ele). Mas o processo criativo é muito louco, por que tem o negócio do jazz que não precisa, se você está com a sua música escrita e ensaiada é só tocar, uma vez que você tocar está pronto, está bom, se tocar a segunda vai ficar diferente, não quer dizer que vai ficar melhor, pode ficar pior”. Dedé Cruz também acredita que o excesso de tempo de estúdio pode ser algo negativo: “(...), quanto mais tempo, dependendo do que você quer, pior, por que o natural vai indo embora (...), você perde o ponto da gravação (...)”. Horácio acredita que o estúdio é um ambiente “mágico”: “(...) quando o cara fica três meses dentro do estúdio (...) isso é uma coisa que eu acho que favorece muito a criatividade, primeiro que é uma coisa muito prazerosa para o músico estar dentro do estúdio (...) os Beatles se você pensar de 1966 pra frente eles quase não fizeram shows, é uma banda bem dizer de estúdio (...) hoje não, como o estúdio é muito caro, a pessoa, normalmente o artista compõe a sua música em casa, faz uma pré-produção no seu Home Studio e vai ao estúdio profissional, aluga 5 horas, 6 horas, 10 horas, vai lá, grava a música e vai embora (...) erro é dinheiro, está perdendo tempo (...) esse ambiente de estúdio é igual ao Teatro de Arena, é mágico entendeu, eu acho que ele, por ser 100% isolado acusticamente, você não tem barulho e tal, você fica hibernado dentro do projeto (...) você tenta isolar o artista do resto do mundo pra que ele possa se concentrar e criar algo novo enquanto que em casa aquilo vira parte da rotina dele entendeu, então não quer dizer que é pior, que seria melhor, né, não dá para eu afirmar que é pior né (...)”.(Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) Se o músico deseja, porém, produzir um produto com mais tempo de estúdio existem outros modelos que podem ser encontrados no mercado:“(...) onde a gente gravou o Pó de Café, chama Sol e Lua. (...) Você fica lá, hospedado, é uma pousada- estúdio. (...) esse (estúdio) é por dia (a locação), 1500 reais por dia”. (Duda Lazarini). Esse fato é algo novo, uma vez que Dedé relata que “(...) quando vim para Ribeirão senti uma dificuldade imensa de locar um estúdio para gravar um disco, eu tive que voltar para o Rio para gravar, por que não tinha essa política, o cara do estúdio não te via como cliente (...) você era um concorrente dele (...). Hoje não (existe mais) essa dificuldade”. (Dedé Cruz) Vale observar que o estúdio é importante, mas o músico não deve restringir seu orçamento ao estúdio ignorando figuras importantes como a do produtor, por exemplo. Dedé 86 relata que existe uma dificuldade maior em produzir no interior que no Rio e em São Paulo, porque as pessoas não usam muito a figura do produtor, e sim investem em pagar hora de estúdio com a sua verba, mas não pensam que o produtor pode ser seu elo com o público, o que pode fazer com que o produto não seja bem sucedido. Nancy diz, em relação ao tempo de estúdio usado por Cauby: “ele entra no estúdio e em duas horas ele faz um CD, mas ele acha que sempre pode fazer melhor, então ele quer repetir para ver se está bom, ai já sai o improviso, e depois se usa o melhor fonograma, então o Cauby é muito versátil”. 4.24 Home- studios Existem pontos positivos e negativos a respeito da produção em home-studios. Segundo Horácio, o home- studio pode ser negativo pois: “(...) (nos estúdios convencionais) você tenta isolar o artista do resto do mundo pra que ele possa se concentrar e criar algo novo enquanto que em casa aquilo vira parte da rotina dele (...)”. Já Dedé Cruz pensa que o home-studio pode ser positivo, uma vez que permitiu que ele fizesse um disco com um parceiro que se encontra no Japão e que possui um home-studio lá: “(...) eu fiquei muito satisfeito com o trabalho (...). Foram 17 músicas, eu mandava o click, o metrônomo, o violão guia, voz guia e um pequeno texto falando daquela música (...) e ele me devolvia e muitas vezes me emocionava com a leitura que ele fazia daquela canção lá no Japão (...)”. (Dedé Cruz) Outros aspectos negativos ressaltados por Horácio são a falta de know-how e de investimento: “Um engenheiro que já gravou há 30 anos de mercado e gravou 200 CDs já errou 200 vezes, cada CD ele errou um pouquinho para não errar no próximo. Uma banda que grava um CD em casa, que comprou um computador por 2000 reais, uma plaquinha por 3000 reais e sai gravando um CD, ela, mesmo se ela tivesse o mesmo equipamento que o estúdio tem não teria os 25 anos de carreira que os profissionais do mercado do estúdio têm. Essa é a primeira diferença, segundo que tem sim o investimento né, um estúdio hoje, um estúdio bacana, você gasta no mínimo uns 200 mil reais de investimento para ele falar que tem um estúdio profissional, você monta com 100, monta com 50, monta com 20, entendeu, mas a meu ver eu não chamaria isso de um estúdio profissional”. 4.25 O show 87 Uma questão a ser abordada nesse tópico é em relação às produções fonográficas extremamente editadas. Estas poderiam acabar por decepcionar seu público, uma vez que se diferenciam muito do show ao vivo. O som gravado “não mais se assemelhava ao som 'ao vivo', sendo mais um som produzido por equipamentos industriais do que por instrumentos musicais” (PINTO.; JOSÉ PAULO GUEDES, 2011, p.84 apud JAMBEIRO, 1975, p.60). Em relação a isso, Duda Lazarini comenta: “Com certeza (Se a produção for muito editada no estúdio o show ao vivo pode decepcionar), mas hoje você pode usar toda a tecnologia que você usa no estúdio ao vivo. (...) Tudo é armadinho certinho, todos os recursos que se usava no estúdio se usava ao vivo também, fica igual (por exemplo os shows da Sandy). (...) Porém, normalmente em um show de jazz não é isso que acontece né, você para e quer ver o momento, o que vai acontecer ali na hora (...) (eles criam na hora, mudam, etc.) o Pó de Café jamais vai tocar como tocou na gravação, nunca (...)”. Dessa forma, um show diferente do fonograma produzido em estúdios pode ser um aspecto positivo. Nancy Lara complementa: “Outra coisa que influencia muito é que na época dele era o gogó né, não tinha os recursos que tem hoje, então às vezes é até meio decepcionante você escutar um CD muito bem gravado e quando você vai escutar o artista ao vivo não é nada daquilo, por que tem recursos na gravadora que ao vivo não tem”. Entendo, então, que os músicos que abusam na editoração de seus trabalhos devem ter o mesmo cuidado no show ao vivo, de forma a não decepcionar seu público. Esse fato é de especial importância no mercado atual, onde o show se transforma em um dos principais produtos a ser comercializado. Sobre a importância do preparo para o show Nancy relata ainda: “ele (Cauby) é fera no assunto, ele não passa som, os músicos ensaiam na casa dele e ele chega na hora do show, entrou e acabou, eu não tenho a preocupação de saber se ele vai tocar bem ou mal, ele me deixa tranquila (...) até mesmo o produtor de CD dele, desses oito últimos CDs que ele fez, que foram premiados e tudo, fica impressionado (o produtor, pois o Cauby consegue gravar um CD em duas horas e não tem nada a ser corrigido)”. 4.26 Imprensa Especializada É necessário, segundo Bruno, do Móveis Coloniais “(...) trabalhar muito bem a própria rede, os jornalistas, de blogs, a própria imprensa escrita (...)”. Vinícius Calderoni, do grupo 5 a Seco relata, ainda, que uma jornalista da imprensa especializada ajudou a divulgar seu trabalho: “A gente conheceu (no primeiro show), por exemplo, (...) a Marina 88 Neusten, que é jornalista do Caderno 2 e postou uma foto da gente numa coluna no Caderno 2, como uma aposta e tal, e ela estava no primeiro show de todos, que ela foi assistir, um pouco por acaso, por que uma amiga levou e uma amiga conhecia a gente (...)”. 4.27 Características para conseguir se manter em um mercado tão competitivo Um dos fatores que contribuem para que o músico se diferencie dos demais é o estudo e constante aperfeiçoamento. Como mencionado, são poucos os músicos que realmente estudam para atuar no mercado. Duda relata que é importante saber administrar sua carreira e sua vida, além de possuir um bom desempenho profissional em suas apresentações: “Eu acho que se você, pessoalmente investir em você como músico, estudar, chegar a um nível de conhecimento e de desempenho legal, se você está pronto para tocar, vai tocar, (...) mas nunca deixe de administrar o que você vai fazer, onde você vai fazer, como você vai fazer, não saia fazendo qualquer coisa, e não faça algo que você não acredita. (...) não consegui administrar em certo momento da minha vida, ser casado e ser músico (...). Para você fazer música você tem que ter um talento (...), quando você sobre no palco você não pode pipocar (tem que tocar com alma, mesmo que tudo esteja errado na sua vida) né (...). Eu conheci músicos maravilhosos por que ele precisava, não tenho estudo, não tenho mãe, não tenho pai que me ajude, nada, o que vou fazer? Vou tocar em um barzinho para 20 pessoas, mas essas 20 pessoas vão sair de lá arrepiadas, por que eu preciso tocar (...)”. Já Bruno acredita que fatores que contribuíram para o bom desempenho do Móveis foram: “proposta artística é bem interessante, e teve um esforço para realmente fazer algo novo, diferente, até mesmo a composição de instrumentos, eu acho que isso em primeiro lugar. Segundo lugar é ter um show muito bom, um show muito bacana, muito forte”. Segundo ele, deve-se, ainda: “(...) aproveitar a oportunidade com essas três coisas que eu te falei (...), chegar preocupado em fazer um show realmente impactante, dar muita atenção para a imprensa, saber vender bem o peixe também, alinhar o discurso também é importante, por exemplo, aproveitar que você tem dez pessoas para fazer um negócio, você consegue falar com dez jornalistas ao mesmo tempo, agora, esses dez caras precisam estar falando a mesma coisa, entendeu? (...)”. Vinícius também ressalta a importância de conquistar o público no show: “(...) a gente nem entende como uma banda propriamente né, porque uma banda normalmente tem isso, o especialista de cada área, o baixista, o baterista, etc. E a gente tem essa especificidade de cada um, todo mundo, todos nós somos originalmente cantores, compositores, que tem o 89 violão como instrumento base. Mas todo mundo no 5 a Seco se desdobra pra tocar outro instrumentos que não o seu mais natural, pra criar uma sonoridade coletiva interessante (...) tem um natural revezamento que, que em termos de dinâmica do show foi muito interessante, acho que isso foi muito importante, isso cativou muito as pessoas. (...) O 5 a Seco é mais do que uma banda, é um coletivo de compositores assim, que foi construindo uma sonoridade de banda pouco a pouco. Mas dentro dessa variedade (...), não tem posição fixa, não tem lugar cativo, não tem o baterista, não tem o baixista, cada musica tem uma formação e quem vê o show vê isso muito claramente, cada musica que termina costumam trocar todas as posições, ou pelos menos três, quatro posições.” Ricardo Gama, por sua vez, ressalta a importância em se conhecer a música, mais do que a imagem da banda: “A nossa música é muito mais conhecida que a gente, isso é muito interessante (...) por que hoje você tem artistas que são muito conhecidos, mas você não conhece duas músicas do cara, você conhece ele por que ele está nos comerciais, está nos programas mais populares (...) mas você conhece uma música e não conhece a obra do cara (...). Nunca fizemos questão de ter nossa cara colocada em um ônibus (...), a gente sempre fez questão de as pessoas saberem que aquele som que elas escutam é do Sambô, essa preocupação com a marca né, o nome e até o visual, a gente usa um o com circunflexo, assim, isso é bem forte. Hoje as pessoas já conhecem a gente, bastante, quando a gente anda nas ruas do país, pelos programas e pela internet (...)”. O “tocar de ouvido, sem leitura” é, segundo Cauby, um dos pontos que devem ser atentados pelas bandas que estão entrando no mercado fonográfico. Segundo ele, antigamente os músicos, com menos recursos tecnológicos, conseguiam se preparar melhor. Nancy complementa em relação ao improviso hoje: “o Cauby é um cantor que não canta duas vezes iguais” então há a dificuldade de um músico que só segue a partitura em acompanha-lo, “então esse improviso que os músicos jovens fazem hoje de repente é mais fácil”, diz Nancy. Cauby relata ainda que um recurso importante para novos músicos é “se associar a um outro músico e tocar junto, para ir treinando”. Dessa forma, o constante aperfeiçoamento profissional é muito importante, segundo Cauby as bandas que estão iniciando carreira devem: “que eles copiassem o bom, (...) por que a gente vai aprendendo com outros cantores, estudando”. Nancy complementa: “ele fala que sempre a gente aprende mais, ele mesmo fala que ainda tem a aprender”. É importante entender como funciona todo o mercado fonográfico “para poder estar atualizado e direito né, por que tem o canto direito e tem o mais ou menos”. Nancy complementa: “uma das coisas que ele sempre se preocupou e que eu 90 acho que é a chave do sucesso desses 67 anos de carreira é que ele tem vários cantos, tem o antigo, etc. e ele sempre buscou se modernizar”. 4.28 Poder de divulgação das mídias tradicionais Vinícius Calderoni relata que o 5 a Seco só teve um grande impacto de público ao aparecer na Rede Globo: “(...) o Jayme Monjardim (da Rede Globo) conheceu a música, também por que a Maria Gadú gravou no DVD (...) e tinha muito a ver com o universo da novela, Flor do Caribe (2013) (...). A gente fez ai um arranjo especial pra novela, a gente gravou de novo pra não ter que usar a gravação do DVD ao vivo (...). E pra gente foi incrível por que isso foi um enorme aumento de popularidade, de alcance (...)”. Ricardo Gama compartilha a visão: “Lógico que a gente sabe que no momento que você vai para a Rede Globo você é mais visto, assim, de um dia para o outro, que no caso a gente tinha até feito Malhação, participado de três capítulos da Malhação, tinham algumas coisas meio pontuais, tinha participado do Se Vira nos Trinta no Faustão (...). A gente foi no Big Brother, (...) tocou em uma festa do Big Brother, ai você percebe que é muita audiência.” Por isso, observa-se que as mídias tradicionais ainda são aquelas com maior poder de divulgação e que, muitas vezes, elas atuam em parceria com as grandes gravadoras. A grande mídia pode ser atingida, assim, por diversas formas, desde a parceria com a grande gravadora e com o jabá, entre outros meios: “Eles (Rede Globo) chamaram, a gente não tem uma parceria com a Rede Globo na verdade, a gente tem pessoas lá dentro que gostam da gente (...). E isso é muito interessante, por que na mídia né, se eles não gostam fica essa forçação de barra, tem que conhecer alguém, e solta dinheiro pra não sei quem, enfim, tem mil esquemas, mil maneiras de se entrar na mídia, tanto em rádio, foi tão discutido jabá em rádio, realmente existe isso. Mas assim, tem muita gente que não, no nosso caso na televisão as pessoas gostam da gente e sabem que a gente vai dar audiência também (...). Por exemplo, a primeira vez que a gente foi no Ratinho, nós chegamos lá e ele falou: olha sinceramente, eu não conhecia, mas eu tenho emissoras de rádio no Paraná e todo mundo estava me falando de vocês (...) como eu confio na minha equipe eu falei, chama! (...). Tocamos no programa dele, acabou ele entrou, ele invadiu o nosso camarim, o que é muito raro né, por que ele é a estrela do negócio, ele bateu na porta, entrou, falou: meu, vim agradecer por que no momento que vocês estavam tocando eu passava o meu concorrente (...). A gente vai convidar mais vezes, eu gostaria que sempre que vocês pudessem que vocês 91 viessem, que vocês colaboraram com o meu programa e com a emissora que eu trabalho. Então eles também te veem como produto de mercado, entendeu?”. (Ricardo Gama, Sambô) Horácio ressalta, porém, que a internet tem diminuído essa concentração de poder dos canais tradicionais de divulgação: “Antigamente era a Globo que dominava a mídia nacional, por exemplo, então quer dizer, a Globo conseguia imperar o que ela queria, hoje ela não consegue mais. Ela tem o poder dela, tem claro”. 4.29 Parcerias com outros músicos As parcerias com outros músicos são fundamentais, pois possibilitam um maior aprendizado: “(...) uma hora que você está tocando com outros músicos a sua vida muda, a mesma coisa quando você está namorando outra pessoa, a sua vida muda. E no caso da música é isso, você tem que estar sempre do lado de pessoas (interessantes) (...). O contato com outros músicos é mais importante que qualquer outra coisa pra você aprender (...).” (Duda Lazarini). As parcerias com músicos podem ser positivas por outros aspectos, como no aumento da divulgação de seu trabalho, conforme relata Vinícius Calderoni: “O Lenine era um ídolo de nós cinco (...) e a gente conheceu ele em Avaré, em um festival de canções (Fampop) do qual ele era patrono, ele era o artista homenageado e fazia o show de encerramento. E ai todos nós estávamos concorrendo, (...) menos eu (...). Mas foi uma grande felicidade, por que além do Lenini estavam todos os parceiros mais comuns do Lenine, os caras que compõe junto com ele, Lula Queiroga, (...) vários outros (...). E dai logo depois que terminou o festival, (...) rolou uma roda de violão, todo mundo tocando, e rolou um encontro maravilhoso, rolou uma identificação das gerações né (...). E dai surgiu a ideia do Lenine participar do DVD, (...) e ele fez todo o esforço do mundo para participar (...). E foi maravilhoso (...), foi o início de uma amizade muito maravilhosa, hoje em dia o Lenine tem feito coisas conosco (...). A Gadú a gente já conhecia um pouco daqui de São Paulo (...). E depois, quando ela já estava super famosa a gente se reencontrou (...) e dai foi super natural (...) o convite pro DVD (...). E a mesma coisa vale para o Chico César (...) a gente ficou amigo da boemia paulistana (...). E o Ivan Lins também né, participa do DVD, o Ivan Lins é padrinho de batismo do Pedro Altério (integrante da banda) (...). Então foram pessoas que (...) foi mais do que chamar para isso as pessoas famosas pra uma divulgação (...), foram artistas que a gente admira estética e artisticamente, amigos que a gente quer estar por perto (...). E que claro, como contrapartida, também ajudou muito na divulgação (...)”. (Vinícius Calderoni, 5 a Seco). 92 4.30 Distribuição do Fonograma pelas bandas entrevistadas Além do suporte físico, Duda distribui suas músicas através da internet: “Site acho que a gente nunca teve, a gente tem páginas, antes era My Space, agora é Facebook. ai você tem tanto o disco do Balaco quanto do Pó de Café para baixar, mas o Balaco a gente sempre gravou disco independente mesmo, disco caseiro, feito artesanalmente. O Pó de Café não, como a gente ganhou edital a gente conseguiu um disco prensado, na fábrica (edital da Prefeitura de Ribeirão Preto)”. O 5 a Seco, por outro lado, possibilitou o download de seu primeiro disco de forma gratuita: “Para esse primeiro disco foi assim que a gente apostou (download gratuito), não é uma posição permanente nossa (...). A gente acreditou muito nisso, (...) no alcance da difusão espontânea. (...) E isso eu acho que foi uma aposta muito recompensadora, por que de fato a gente hoje em dia chega pra fazer shows em lugares (...) que a gente nunca foi e as pessoas cantam (...), tem lugares que tem público de 700, 600 pessoas, lotados (...). Isso ajuda muito, por que cria essa difusão espontânea (...). O que não significa que a gente vai fazer do mesmo jeito para o próximo disco que a gente está preparando agora (...)”. O Móveis, por sua vez, distribui em lojas físicas pela Som Livre e também de forma gratuita. Ricardo Gama relata ainda que “a gente disponibilizava (download gratuito), o primeiro CD e DVD o fonograma é nosso, a gente fechou o contrato com uma distribuidora, eles distribuem, até hoje distribuem e tal. E ai esses ai a gente disponibilizava gratuitamente (...) e ele foi muito mais vendido que o segundo, é muito interessante né. As pessoas você vê, o segundo faz parte de um sistema...”. Ele diz também que: “A gente ficou três meses como mais vendidos do iTunes no Brasil, em todos os gêneros. (...) A gente ficou como os mais vendidos do iTunes (...), não significa que a gente ficou como mais vendido do Brasil, você não pode confundir isso como sendo o mais famoso do Brasil. A gente era o mais baixado por quem tem iPhone, iPad, e é uma minoria no país. Mas dentro daquela faixa a gente é bem visto (...). Nós batemos recorde na Saraiva, na Fnac, no final de ano de venda de DVD. Mas são lojas que pegam essa classe que a gente está falando”. A distribuição hoje se dá pela Som Livre. Hoje a venda do fonograma do Cauby é feita somente por meio da venda física e Nancy diz: “a divulgação é feita pela internet, pelo site, pelo Facebook (...) e sempre a mídia local faz a divulgação” e isto nem sempre é feito em parceria com as gravadoras: “só quando 93 é lançamento do produto (que a gravadora divulga) mas, por exemplo, o show se procura normalmente” (Nancy, empresária do Cauby Peixoto). Conclui-se que existem diversas formas de distribuição do fonograma hoje, desde a distribuição física até pela internet, possibilitando neste caso o download gratuito. Um aspecto interessante que foi relatado é que a distribuição física ajuda a divulgar um determinado fonograma, uma vez que as vendas de CD caíram “Interessante, né, por que tem gente que acha que você não deve dar, por que você vai perder venda, no entanto (...), quando você dá você divulga mais. (...) E a própria pessoa que baixou de graça depois ela vai e compra, pra ter (...) a venda de CD não dá dinheiro, apesar de que esse segundo mesmo a gente recebeu DVD de Platina, não sei o que lá. Existe uma venda, por que esse público também nesse nível não liga de comprar um DVD, um nível um pouco abaixo já acha caro (...)”. (Ricardo Gama, Sambô) 4.31 Preocupação com fãs fora do Brasil A maioria dos entrevistados relata que já tentou uma carreira internacional, ou mesmo pensa na mesma, mas que o foco hoje é o Brasil. Dedé Cruz é uma exceção, uma vez que seu produto era mais conhecido em países como Peru e México que no Brasil. Vinícius relata que o grupo quer se consolidar no Brasil antes de pensar em uma carreira internacional“(...) a gente sempre pensa em ir se consolidando pouco a pouco. (...) Mas eu acho que a gente tem esse objetivo (em ter um público fora do Brasil), o Tó, por exemplo, já tem uma carreira na França bem significativa (...). A gente certamente tem vontade de fazer show fora, tanto na América Latina quanto Europa, que eu acho que são os principais focos. Os Estados Unidos eu acho que talvez seja um pouco mais complicado por que a barreira da língua (...). A gente sempre foi movido pelas nossas vontades artísticas (...) e dai o alcance foi se dando naturalmente, então eu acho que o alcance do público externo também é muito possível que se dê naturalmente (...)”. O Móveis, por sua vez, já realizou uma turnê internacional. Bruno relata algumas dificuldades desse mercado: “a gente chegou a fazer uma turnê europeia em 2008, mas não teve continuidade, mas a recepção foi muito boa. A questão é que (...) lá funciona muito o negócio do selo e do agente local então, por exemplo, se eu quiser ir pra Europa no ano que vem agora, durante o verão, eu já teria que ter um material lançado por um selo, geralmente selos são agentes também lá, então que já teria que ter o material lançado esse verão para 94 estar fechando as datas para junho em diante, entendeu, então exige um planejamento (...), essa identificação que não é muito fácil não (...)”. Por último, Ricardo Gama conta que existem fãs no exterior, mas que preferem investir no mercado brasileiro nesse momento de suas carreiras: “Não é que o foco é o Brasil, (...) a gente preferiu primeiro rodar pelo país (...). Mas assim, a gente agora pensa em focar fora sim, também. (...) A gente tem muita procura, tanto procura de shows como simplesmente fãs, Argentina, Uruguai, México (...), França, Itália, Espanha, (...) muitos recados (...). Ai você vê, trezentas e tantas pessoas curtiram: postado há três minutos, é muito rápido (...)”. 4.32 O cantor que toca em bares Foi relatado pelos entrevistados que o bar não é um espaço que possui capacidade de divulgar a música autoral, embora seja importante no início da carreira dos músicos: “(...) sem querer desmerecer o cantor de bar (...) mas ele acaba sendo igual um rádio ligado, entendeu? E tem um repertório eclético, quer dizer, se é um cantor de barzinho de MPB é uma coisa, tudo bem, a pessoa pode sair de casa para ir lá ouvir o cantor de MPB que ele gosta ou um bar de rock é a mesma coisa, agora esse artista que você falou, que é eclético, que no bar ele toca desde sertanejo, até axé, até... Quem vai ouvir ele quer dançar e quer beijar na boca, não quer ver ele, entendeu (...)” (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). Deve-se, então, buscar outros nichos para promover a música autoral, até porque o bar, além de não possuir capacidade de divulgar este tipo de música, não possui grandes recursos para pagar bem o músico. Esse espaço é, porém, positivo para as bandas cover, as quais serão tratadas no tópico a seguir: “Uma banda cover que quer tocar em festa toca em um bar, a pessoa está vendo lá, pega um cartãozinho, toca num casamento (...), isso é um mercado, existe (...) agora o cara que vai lá tomar uma cerveja a noite, pelo bar e não pela banda, ele não quer ouvir uma música que ele não conhece, ele quer cantarolar a música que ele conhece então aquele espaço não é o espaço para a música autoral”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital) 4.33 Bandas cover A banda cover tem menor possibilidade de ganho a longo prazo que a banda que toca música autoral: “(...) o Dionísio não tem música autoral (...) eu acho que é um espaço para bandas cover, entendeu? Que é legal, é bacana, é legal, é um som legal, a banda pode 95 evoluir, mas banda cover ela tem um limite né, pra carreira dela. A banda cover ela vai custar uns 2 mil, 3 mil, 5 mil reais para o resto da vida, não vai conseguir...Original é original (...)”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). Dedé diz que as bandas de Ribeirão têm o defeito de preferir trabalhar com a música cover do que com a música autoral, uma música tida por Horácio como ferramenta e não como arte. 4.34 Sugestões para uma produtora musical Dedé, além de músico e compositor, é produtor musical, e dá algumas dicas referentes a esse mercado: “eu trago sempre artistas que eu conheço de perto, com quem eu já tive negócios, já gravei (...), então eu tenho trabalhado mais com isso, até porque (se consegue reduzir um pouco os custos) (...). (Ele já trouxe, por exemplo, Emílio Santiago, Wanderléa, Moacyr Franco, Cauby, Maria Creuza), então tem que negociar preço, ai ele traz para a Casa do Dedé e coloca, por exemplo, em Franca, em São Carlos”. De forma a se reduzir os custos normalmente se faz esses shows durante a semana e com apoio de patrocinadores. Ele relata, ainda, que está produzindo o maior encontro da Bossa Nova do interior e visa levar jovens para o teatro, por meio de parcerias com universidades. Observa-se, aqui, que a criatividade é necessária, conforme já relatado por Horácio, de forma a promover eventos no setor independente. Dedé também trabalha com jingles para empresas. 4.35 Erros cometidos pelas casas noturnas Dedé diz que “no exterior (México, África) se você chegar ao palco com mais de uma hora e meia de diferença do programado (...), existe uma multa para todos os artistas (...). Aqui (no Brasil) em relação a horário, primeiro que as casas não tem diretor artístico, não tem essa exigência. (...) o dono da casa não tem tempo para olhar para o atraso do músico e não tem também experiência e vê aquilo ainda romântico (...). Eu cantei nas casas do Chico (...) e do Ricardo Amaral muito tempo, lá não tinha esse negócio (...), ensaio três vezes por semana, preparar música nova, repertório novo, você tinha que ter a consciência que você está tocando para dançar, que é diferente de tocar por tocar (...), então essa exigência já tinha no Rio, de você chegar de smoking, no mínimo um paletó pra você entrar na casa (...)”. Assim, um dos grandes defeitos das casas noturnas, em especial as do interior, é que elas não têm técnico, diretor artístico e musical, que tem ofereça qualidade ao público, um diretor que faça a programação, que saiba qual o público para cada dia da semana, o que pode gerar 96 insatisfação do público devido aos atrasos das bandas, entre outros fatores. Isso se deve, porém, a muitos donos de casas noturnas não saberem que existe essa necessidade. 4.36 Erros cometidos por músicos Dedé relata que um dos defeitos dos músicos é a desunião, o Brasil possui diversas tendências musicais, mas estas não se comunicam: “(...) o pagodeiro não conversa com o cara da MPB (...), o erudito não conversa com o sertanejo (...) (e nos EUA eles todos se falam) (...). O sertanejo universitário gerou um ódio, que está colocado em muitos segmentos (...)”. Outro erro cometido por músicos é não saber se administrar, não ter conhecimento das ferramentas de marketing para divulgar seu trabalho. Ao longo do presente trabalho já foi bastante enfatizado a grande necessidade do músico saber administrar sua carreira. O engenheiro, por exemplo, não possui essa urgência: “(...) você acabou de sair da faculdade, você tem que (...) formar seu grupo, fazer um bom trabalho, colocar na internet, divulgar, você entendeu? Envolve um monte de coisas (...). O engenheiro civil, por exemplo, já sai (da faculdade) e vai procurar uma empresa (...). Você vai sair da faculdade de música e bater na porta do Bruce Springsteen e perguntar se ele está precisando de baterista? Quando você vê um teste, a banda tal vai fazer um teste, isso é igual Big Brother, os caras fazem isso para dar um marketing para a banda, eles já sabem o cara que eles irão colocar na banda (...). Hoje tem muito músico, para pouco mercado musical, o mercado não acompanha. Qual o mercado de Ribeirão? As duplas sertanejas, (...) deve ter vinte (duplas), mas quanto ganha um baterista para tocar com uma dupla sertaneja? 200 reais, ai ele (...) vai comprar um instrumento, o instrumento custa (...)(Duda Lazarini). Para saber lidar com esse mercado é, então, imprescindível o conhecimento de gestão. Duda ressalta, ainda, que o músico tem que permanecer sempre jovem: ”tem que falar: vou tocar, vou tocar, vou tocar”. A maioria dos entrevistados sugere que o maior erro das bandas é a busca pelo sucesso. Horácio destaca que o músico não deve desistir de sua carreira por ainda não ter conseguido os resultados almejados: “você não pode sair mais por que você não sabe quando que vai chegar a sua vez. Né, então você vê artistas assim como o Lenini que apareceu para o Brasil inteiro com 37 anos de idade né e de repente ele com 28 anos fala que: a música não dá dinheiro, cansei, vou virar bancário. Então eu acho que tipo assim, entrou nesse negócio, vai até o fim (...) por que às vezes você vai abandonar quando vai acontecer o que você buscou a vida inteira”. 97 Um erro cometido por artistas conhecidos é não se aproximar de seu público: “A gente frequenta lugares que são iguais aos lugares que o nosso público frequenta, isso também é uma coisa interessante, você às vezes tem o artista que é muito conhecido e muito popular, a população e principalmente classe C e D conhecem muito (...) mas ele não circula na classe C e D, ele anda na classe A (...). A Xuxa vive em uma realidade muito lá em cima e a grande maioria dos fãs, o grosso não tem carro para ir no show dela, não tem dinheiro para ir no show, é muito interessante (...), o nosso caso não, a gente vive muito parecido como vive o nosso público (...). Então onde a gente circula (...) essas pessoas nos conhecem”. (Ricardo Gama, Sambô). Deve-se ter cautela com a figura do vocalista que pensa ser mais importante que o conjunto da banda:“(...) em muitas bandas chega uma hora em que esse cantor, essa figura, confunde as coisas e sai para fazer uma carreira solo achando que só ele é importante e ele dança por que as pessoas gostavam daquele conjunto de pessoas (...). E acontece não só por culpa do próprio cara que se destacou, muitas vezes por culpa dos outros que estão em volta e não sabem entender isso e acabam ficando enciumados (...). Em uma multidão você vai precisar, por exemplo, de dois seguranças, um para nós todos e um para o San (Daniel San, vocalista) (...)”.(Ricardo Gama, Sambô). Horácio diz que as bandas não devem colocar preço em seu produto: “Me perguntam muito assim, quanto vale a minha banda, quanto eu vendo o meu show, ela vale o tanto que o contratante ganhar dinheiro com o seu projeto. Se uma banda colocar 1000 pessoas a 100 mil reais lá dentro, o cara vai te pagar 200 mil reais de cachê agora, agora se a banda não colocar ninguém dentro da casa dele, do espaço, do teatro, o cachê vale zero. Né, eu acho que é proporcional, não adianta. Tem muita banda que fala ah, minha banda vale mais que 2 mil, 3 mil, 5 mil, não vale. Se ela valesse ela estava vendendo. É igual quanto vale um carro usado quando você vai vender o seu carro né (...) e as bandas erram muito isso, inclusive erram a meu ver em colocar preço no seu produto (...) sempre por que ele tem a visão do trabalho que deu para montar o seu produto e não do que o contratante vai ter de lucro, isso é uma dificuldade que as bandas têm os artistas, de cobrar a seu preço. O que acontece, às vezes ele cobra caro demais no momento errado, cobrar menos em uma hora que ele podia aparecer mais, ter mais divulgação e tal (...)”. Assim, se a finalidade é promover uma banda autoral nova, ela deve disponibilizar um período de seu dia útil para trabalhar sem receber cachê, de forma a divulgar seu produto, não importando se o artista trabalha há muito tempo no mercado musical: “Eu acho que os dois primeiros anos da banda com a intenção autoral têm que ser sem cachê. (...) não interessa se a pessoa tem muito tempo ou não, se a banda é 98 nova e o marketing é em cima da banda nova, a carreira do músico pode ter 30 anos de carreira, não faz a menor diferença (...). Ele pode até falar, não me interessa tocar de graça. Tá, então pra mim tá no projeto errado. (...) É aquele lado da visão empresarial né, eu empresário sempre falo que a gente tem que ter dois tiros, um curto e um longo. Né, eu tenho que ter o tiro daqueles clientes que vão me sustentar hoje e tenho que ter os tiros longos, que é daqueles clientes que vão me sustentar amanhã. (...) mas isso é uma coisa empresarial, muitas vezes eu falo que o músico ele enxerga muito como operário. (...) Ele reclama que o dono do bar explora ele, que uma possível gravadora pode vir a explorá-lo como empresário e tal, mas muitas vezes ele se coloca desse jeito né, por que se ele se coloca como uma mãode- obra por hora, uma mão- de- obra operária, ele vai estar no mercado capitalista e a ponta que ele vai estar na pirâmide empresarial vai ser essa, vai ser de operário”. (Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). Para evitar isso Horácio sugere que a banda tenha uma visão de longo prazo. 4.37 Ensaio Os entrevistados divergem a respeito da necessidade de ensaiar. Bruno relata que “(...) o Móveis é uma banda que ensaia todo dia. (...) então ali era uma oportunidade de fazer os informes gerais. (...) Em 2011 quase que a gente não ensaiou por que a gente estava preocupado em divulgar o disco e o repertório já estava bem firmado, em 2012 eram três horas de ensaio por dia (...)”. Já o Sambô é um grupo que não ensaia: “A gente não ensaia. O grupo nunca ensaiou, mas cada um estuda o seu instrumento e pesquisa o seu instrumento. (...) A gente vai montando no decorrer da estrada, mas a gente não para pra ensaiar a música (...), a gente combina de boca o que fazer (...). Em vez de experimentar no ensaio a gente experimenta no palco, com o público, já (...).”. (Ricardo Gama, Sambô). Essas são estratégias diferentes, as quais geram sonoridades e experiências diferentes. 4.38 Como promover projetos que fogem à Indústria Cultural Dedé Cruz promovia seus produtos de uma forma interessante:“(... ) nos meus primeiros discos, eu tinha uma Brasília, eu enchia de discos (...), e ia para a estrada, vender, dar para as gravadoras, vender você não vendia, você está louco para a sua música ser tocada, ser conhecida (...). Buscava esse caminho, o alternativo, que é o mais barato (...), até ter a sorte da sua música cair no agrado geral e você virar um grande artista (...)”. Ele 99 relata, porém, que um produto da indústria cultural, como o sertanejo, pode ser mais difícil de divulgar: “por que o mercado está tão cheio de músicas de compreensão mais fácil, de leitura mais rápida e o sertanejo se inclui, que fica meio naquela da sorte”. Horácio acredita que se deva “agregar valor a isso, entende, então vamos supor um Ravidan, só um exemplo assim, eu nunca nem fiz com a Geciane, pra ter a liberdade só de viajar um pouquinho. Talvez se o Ravidan criasse um workshop de guitarra, bateria e contrabaixo e fizesse esse workshop gratuitamente para os alunos dos conservatórios da cidade, uma hora antes do show, um bate-papo e dali muitos ficassem para assistir a apresentação musical, colocando em prática aquilo que está dentro de um workshop pode ser que você vá com 10 conservatórios, cada conservatório com 200 alunos, você fala de 2000 alunos, (...) eu acho que esse dinheiro (com panfletagem), ele é desperdiçado. Entendeu, alguém que tá no carro e pega no semáforo um flyer divulgando o show do Ravidan na USP, a probabilidade de você conseguir levar ele até a USP para ver aquele show é mínima ou quase que zero. (...) eu acho que nosso desafio daqui para a frente, nós produtores, é exatamente isso, achar ferramentas novas, (...) inovando. Outro exemplo de estratégia inovadora: “Eu acho que tem que achar alternativas, como eu falei você tem que buscar, eu acho que hoje o mercado é um desafio (...). O PlayVinil por exemplo, é uma banda hoje, de um público mais forte deles de 15 a 17. Então eu estou com um projeto agora que está para sair (...) que é para fazer shows gratuitos do PlayVinil dentro de escolas de 8ª série. Não vai me dar um centavo, entendeu? Eu preciso viabilizar o que, que eles façam shows, esse mercado de 8ª série não tem dinheiro para comprar um CD ou pra ir em um show, esse mercado nem existe mas, se eu plantar isso agora, o ano que vem, o próximo CD que vai sair daqui a três anos, esse pessoal todo virou fanclube, começou a entrar nos shows, compartilha no Facebook, se eu der o CD de graça para eles na escola (...) daqui a três anos eu talvez tenha formado um público (...)”.(Horácio Silveira, gestor da Nova Digital). Dessa forma, entendo que se o músico não dispõe dos canais de mídia tradicionais para divulgar um produto deve trabalhar com esforço e criatividade nesta divulgação. 100 5. ANÁLISE DOS RESULTADOS 5.1 A Cadeia Produtiva da Música e seus atores A indústria fonográfica possui diversos atores em sua cadeia produtiva, considerando neste trabalho a cadeia voltada para a produção musical, dentre eles: o intérprete, aquele que interpreta uma obra musical de outro; o compositor, aquele que criou a obra; o sideman (ator cada vez mais desnecessário no atual cenário fonográfico, observa-se, aqui, que a tecnologia tem eliminado atores desse mercado); os estúdios de gravação, uma instalação destinada para a gravação de um som, podendo ser um estúdio comercial ou um home-studio, o engenheiro de som, aquele responsável pela qualidade musical do som que será produzido; os técnicos de áudio, o profissional que opera equipamentos de som, ajudado pelo assistente de som. O distribuidor é aquela empresa que distribui o fonograma. Há, também, a figura do produtor, aquele que interfere no trabalho criativo do músico e administra a empresa fonográfica. Existem, ainda, os empresários, os selos e as gravadoras, sendo estas as majors ou as indies, as sociedades autorais, que defendem os direitos dos autores; as editoras, empresas que administram os direitos autorais de compositores e intérpretes; o ECAD, um órgão que arrecada e distribui os direitos autorais; a televisão, as rádios, revistas, blogs e a imprensa especializada, responsáveis pela divulgação da obra; as casas de espetáculo e bares; as lojas de venda de instrumentos musicais e de venda de suportes físicos, os varejistas (estes últimos cada vez mais raros); as empresas privadas, com editais de promoção musical; o governo, com editais e programas de incentivo à cultura. Existem também os intermediários de programas governamentais, aquele que, sem ter contribuído em nada com o projeto, possui contatos com empresas para a destinação desse imposto e, por último, os consumidores finais. Pode-se observar a interação entre estes atores, os quais atuam nas fases de produção, distribuição e divulgação, na figura abaixo: 101 102 Uma das constatações do presente trabalho, fundamentada pela análise dos inúmeros resultados coletados, é que a indústria da música tem diminuído o número de atores em sua cadeia, devido ao advento de novas tecnologias. Um exemplo é a figura do sideman, o qual se torna cada vez mais desnecessário. Dessa maneira, o mercado, que já é competitivo, torna-se ainda mais acirrado. Surgem, porém, novas oportunidades com o advento da tecnologia, como gravar em parceria com pessoas que se encontram em localidades diversas. 5.2 As vantagens e desvantagens em se contratar com uma grande gravadora Vantagens em se contratar com uma major Disco com um selo reconhecido no mercado Divulgação Mais uma parceira para a banda Nem todos os contratos possuem cláusulas extorsivas - Desvantagens em se contratar com uma major Estratégias de mercado agressivas, como o risco de engavetamento Perda de controle e de liberdade de produção artística Não tem sabido aproveitar as oportunidades de comunicação e distribuição no meio digital Não sabe se comunicar com a imprensa independente, importante no meio digital Contrata com um produto pronto, não realiza mais grandes investimentos no artista Contratos de alta rotatividade Está cada vez mais focada em nichos específicos de mercado Quadro 5: Vantagens e desvantagens em se contratar com uma major O quadro 5 apresenta as conclusões do presente trabalho e do referencial teórico. Autores como Hershmann (2013), Luersen (2012) e Pinto (2011) relatam que existem pontos positivos e negativos ao se contratar com uma grande gravadora. Corrobora-se que contratar com uma grande gravadora não é mais um sinal de sucesso no atual mercado fonográfico. Novas contribuições são trazidas por este trabalho quando comparadas ao material bibliográfico estudado: 1) Contratar com uma grande gravadora pode ser negativo ou não, depende do contexto no qual se encaixa a obra, da sonoridade que ela propõe e do tipo de contrato com a grande gravadora. A banda deve analisar se o poder de divulgação que a grande gravadora oferece compensa os riscos descritos acima. Uma vez que a divulgação é uma das vantagens em se contratar com a grande gravadora, a banda deve analisar se o fato do contrato não ser extorsivo está aliado ao pouco potencial de divulgação oferecido para a mesma. Dessa maneira, se o contrato não oferecer outros benefícios não seria vantajoso contratar com a major. 103 2) Em relação às gravadoras independentes, deve-se lembrar que também pode ocorrer perda de liberdade, mas em menor grau. O contrato com a indie pode ser positivo, pois pode gerar mais um parceiro para a banda, uma vez que a indie ainda arca com os custos da produção. Porém, se a banda sabe se administrar, sabe comunicar seu produto, possui um estúdio que possa locar ou um home-studio, consegue desenvolver parcerias regionais, etc., creio que não seria necessário contratar com a gravadora independente, uma vez que a banda, por meio de suas capacidades administrativas, consegue suprir as funções que seriam desempenhadas pela gravadora indie. Deve-se lembrar, porém, que a banda saber se administrar é um dos pontos mais discutidos do presente trabalho, e consiste em uma das maiores dificuldades dos músicos no mercado atual. 5.3 Oportunidades para as bandas Existem diversas oportunidades para atuação das bandas no atual mercado fonográfico, dentre elas: A banda que se administra pode atuar em nichos não explorados ou nichos específicos, nos quais as grandes gravadoras não atuam. Para artistas e gravadoras independentes pode ser interessante promover produtos que não o sertanejo, por exemplo, uma vez que, promovendo o sertanejo se concorre com a major. Essa é uma conclusão do presente estudo, mas que condiz com a linha teórica de autores como Herschmann (2013) e Vicente (2008). Porém, os resultados desse trabalho levam a uma outra conclusão importante: a oportunidade de buscar diferentes estilos musicais e nichos pode se transformar em uma potencial ameaça, uma vez que, se esta estratégia não for bem arquitetada e comunicada para o público, os ganhos serão menores, pois não se conseguirá atrair a “grande massa”, que costuma ouvir os produtos promovidos pela “indústria do entretenimento”. Assim, a oportunidade se transformará em ameaça. Outra conclusão importante desse trabalho é sobre a oportunidade a ser explorada pelas bandas por meio dos programas governamentais de incentivo à cultura e essa oportunidade deve estar articulada à capacidade administrativa das bandas, já descrita acima. Este aspecto não é abordado na bibliografia estudada. Para que os músicos possuam melhor capacidade de gestão, deve-se atentar à uma lacuna: as faculdades de música devem se preocupar mais em formar músicos-gestores de suas vidas e carreiras artísticas pois existem nichos que buscam propostas diferentes, e essas propostas são poucas no mercado, o presente trabalho contribui nessa perspectiva. Ainda, as 104 gravadoras preferem contratar músicos com capacidades administrativas, essa é uma contribuição do presente trabalho, mas que corrobora a tese de Pinto (2011). Quanto à internet, estão surgindo diversas formas de negócios virtuais, o que comprova a tese de autores como Dalmazo (2010), Nakano (2010), Herschmann (2013) e Menezes (2010). As bandas devem, ainda, saber se inserir nesses cenários e usar esse potencial para se desvincular da major. A análise dos resultados desse estudo confirma a internet como uma oportunidade a ser explorada, mas deve-se ter cuidado com as restrições que a mesma ocasiona. Este fato é analisado frente aos estudos teóricos desenvolvidos pelos autores descritos acima e pelas contribuições do presente trabalho: Oportunidades Divulgação que ultrapassa geográficas Menor custo de divulgação Maior liberdade para as bandas fronteiras Possibilita a quebra do vínculo com as grandes gravadoras Aproxima as pessoas Ameaças Diminui o ciclo de vida das bandas Aumenta a concorrência entre as bandas Utilizar técnicas eficientes de divulgação na internet é cada vez mais uma atividade que requer conhecimentos de gestão e comunicação, o que pode faltar às bandas Pode gerar perda da qualidade do fonograma - Quadro 6: Oportunidades e ameaças geradas pela internet Existem outras oportunidades a serem aproveitadas, identificadas pela presente pesquisa: o uso de espaços alternativos, um exemplo é o circuito Sesc. Ainda, deve-se aproveitar dos editais de empresas privadas, e de ideias que envolvam o uso criativo de espaços culturais, como o Espaço Kaiser em Ribeirão Preto. Esses circuitos independentes podem constituir espaços para se produzir disco e também para divulgar a obra. A criatividade é muito importante para se conquistar consumidores do mercado fonográfico, devem-se encontrar maneiras criativas de agregar valor ao produto e buscar formas criativas de divulgar. Outra oportunidade destacada pelo presente trabalho é a união de diversos estilos musicais, pois existe uma desunião na música hoje, existem estilos que não se misturam. 5.4 Estratégias a serem adotadas pelas bandas Algumas bandas se tornam conhecidas do grande público devido a uma série de fatores: 105 - Saber administrar: tanto sua vida privada quanto sua carreira profissional. Conforme a linha teórica de Marchi (2012). - Saber escolher um estilo sonoro ao qual a banda tenha condições de apresentar um bom desempenho, uma constatação do presente estudo. - Uso de home-studios como forma de baratear os custos de produção, corroborando Sallaberry (2008). - Saber administrar o tempo de estúdio, passar muito tempo no estúdio pode ser positivo por aumentar a criatividade, mas isso não é válido para todos os estilos musicais e para todas as bandas, pois pode gerar a perda da naturalidade da gravação. Não se deve, também, restringir o orçamento da banda exclusivamente ao tempo de estúdio, outros aspectos devem ser considerados ao se ratear os recursos orçamentários da banda entre as diversas etapas da sua produção. Deve-se, também, ter cuidado com a falta de know-how dos home- studios. Essa conclusão de que o excesso de tempo de estúdio pode não ser positivo contraria autores como Luersen (2012). -Produzir bons shows, uma vez que são, hoje, o maior produto dessa indústria. Cuidado com a postura, a vestimenta, a qualidade sonora, saber se adequar ao ambiente em que se está tocando, etc., são observações que se destacam neste estudo, mas que confirma a importância dos shows descrita por Herschmann (2013). -O bar não é o espaço para divulgação da música autoral, mas pode ser positivo para as bandas cover, conforme se avaliou neste estudo. Este aspecto não é abordado na bibliografia estudada. - Ensaiar bastante, fato este que surgiu como um aspecto significativo no presente estudo mas que não é destacado na bibliografia estudada. -Proposta artística interessante. Esta também é uma contribuição deste estudo, não abordada na bibliografia estudada. - Se a proposta da banda for comercial, estar pronto para tocar todos os estilos, observando àqueles que, por sonoridade, a banda não tem condições de atender. Outra conclusão do presente estudo, não abordada na bibliografia estudada. -O músico deve saber se posicionar como profissional nesse mercado e saber se administrar, confirmando, assim, a linha teórica de autores como Marchi (2012). -Tocar em mais de uma banda se quiser promover a carreira do artista individual, ou se quiser aumentar os ganhos no mercado. Mas o presente trabalho leva à conclusão de que, se o artista deseja promover determinado projeto, talvez seja interessante se concentrar nele. Este aspecto não é considerado na bibliografia estudada. 106 -A música como entretenimento possui maior aceitação do mercado nesse momento, mas existem outros nichos a serem explorados. Essa conclusão é respaldada por autores como Nakano (2010). -Focar na venda de shows, conforme linha teórica de Herschmann (2013) e na venda do suporte físico de forma digital, conforme linha teórica desenvolvida por Dalmazo (2010). Também é interessante possibilitar o download gratuito de forma a aumentar a divulgação da banda. O CD também não é mais necessário uma vez que as pessoas não querem mais comprar músicas de forma agregada, tese confirmada por Barros (2010), mas as bandas ainda devem se preocupar com o CD como forma de divulgar um produto, conforme também relata Sallaberry (2008). As atividades descritas a seguir são conclusões do presente estudo: -Não buscar desenfreadamente o sucesso. -Parcerias com outros músicos, para aprender com eles e divulgar seu trabalho. -Esforço e dedicação. -Se aperfeiçoar constantemente. -Não depender exclusivamente de programas governamentais, quando são utilizados. -Persistência na carreira. -Familiaridade e vínculo com o público. -Cuidado com a figura do vocalista que se considera mais importante que a banda. Para as bandas que se administram existem, ainda, outras dicas: -Ter CNPJ. -Dividir papéis administrativos entre seus integrantes. -Parcerias estratégicas com outros atores do mercado -Contratar com uma editora, ou ter a própria editora. -Contratar consultoria com empresas especializadas de forma a saber como se posicionar no mercado. - Saber se inserir nos meios digitais e nas redes sociais, uma contribuição do presente trabalho, que condiz com autores como Dalmazo (2010). - Buscar inovações fonográficas e de mercado, novas formas de comunicar o produto. - Deve-se agregar valor ao fonograma, por meio de parcerias ou ações culturais. Estas duas últimas são uma contribuição do presente trabalho, mas que não apresenta divergência com a bibliografia estudada. As bandas podem, dessa forma, combinar essas estratégias de diferentes maneiras a fim serem bem sucedidas. 107 5.5 Caminhos trilhados pelas bandas entrevistadas Observa-se, com o presente trabalho, que não existe um caminho fixo a ser trilhado pelas bandas, como pode ser observado pelo quadro seguir: Banda Trajetória Dedé Cruz Trabalha com a música desde pequeno, possui público em mercados estrangeiros, nunca contratou com uma grande gravadora (somente realizou a locação de estúdios), é, além de músico, produtor, dono da Casa do Dedé, etc. Móveis Coloniais de Acaju É uma banda que começou a tocar junto na escola e que foi crescendo aos poucos. Toca em circuitos como Sesc, etc. e recentemente possui contrato com uma major. O grupo relata que existem dificuldades em realizar shows fora do Brasil, mas eles já fizeram uma turnê internacional. 5 a Seco Surge como um projeto, hoje é uma banda que se produz por meio de circuito Sesc, etc. e não possui contrato com gravadora. O download do primeiro disco foi feito de forma gratuita. O grupo deseja se consolidar no país antes de buscar uma carreira internacional. Sambô Surgiu também de maneira informal, tocando em festas universitárias e foi crescendo aos poucos. Hoje possui contrato com uma major. Hoje a distribuição não é gratuita, mas a do primeiro disco foi. Venda hoje, por meio de distribuição digital, como iTunes e por meio da venda do suporte físico. O grupo possui fãs fora do Brasil, mas nesse momento eles preferem investir no mercado interno. Duda Lazarini Participa de várias bandas e aprendeu a tocar sozinho. Hoje participa de projetos como ProAC e não possui vínculo com gravadoras. Distribui o fonograma por meio do suporte físico e pela internet. Cauby Peixoto Possui uma carreira musical de mais de 67 anos, é um dos maiores músicos brasileiros. Já teve carreira em outros países, como EUA. Sempre contratou com gravadoras. Quadro 7: Trajetória dos músicos/bandas entrevistados 5.6 Possibilidades de produção Nesse cenário onde as grandes gravadoras estão perdendo o poder de mercado que sempre detiveram, conforme também relatam Menezes (2010) e Pinto (2011). Surgem diversas oportunidades de produção para as bandas: - Elas podem se auto-produzir, sem intermediários, conforme também afirma Marchi (2012). As bandas que se auto- produzem podem, ainda, contratar com empresário ou com um escritório, como apontam as conclusões do presente estudo. - Podem contratar com uma gravadora indie, também de acordo com autores como Menezes (2010). 108 - Podem contratar com a própria major, conforme também descrevem Pinto (2011) e Menezes (2010). Nesse cenário existem diversos tipos de contratos possíveis, até contratos somente de locação de estúdios. Essa é uma nova constatação. 5.7 Modelo de negócios que melhor se adaptará à crise dessa indústria Se deve adotar um modelo onde não se é mais dono do fonograma, mas apenas se tem a sua posse, o direito de uso, são modelos de acesso temporário do fonograma. Outra tendência a ser explorada é associar a venda do fonograma a outros fatores, como aos celulares e tablets, o que corrobora Pinto (2011). Deve-se entender a importância dos shows ao vivo, corroborando autores como Herschmann (2013) e das redes sociais. Deve-se focar na venda de shows e nos eventos. Outra importante característica a ser adotada é a gravação via E-REC, com músicos que se encontram em localidades diferentes, seguindo o raciocínio de Sallaberry e o streaming, a venda de músicas por meio de catálogos digitais, conforme também relata Menezes (2010). Deve-se, também, atrelar o fonograma a jogos como o Guitar Hero e a outras indústrias, como a do cinema (Hanna Montana). No meio digital estão surgindo diversas novas formas de negócios, como a visualização de músicas online, sem cobrança, mas com a prévia visualização de propagandas, o que suporta os direitos autorais. Existem, ainda, empresas que inovam no meio digital fornecendo produtos locais, por não possuírem recursos para fornecer produtos advindos das multinacionais. Dessa forma, elas exploram nichos diferentes. Por último, deve-se entender a importância de blogs e imprensa especializada e saber se comunicar com esses atores. Essa é uma importante conclusão do presente estudo. O CD é um recurso que se encontra em fase de extinção, pois, entre outros fatores, ele tem muitas músicas e não leva em conta a seleção que o cliente quer ouvir, conforme também relata Barros (2010). 5.8 Pirataria Ela gera oportunidades, o que corrobora a linha teórica de Vicente (2008) e prejuízos: Oportunidades Maior divulgação das obras, “marketing gratuito” Meio de divulgação para gravadoras e artistas independentes e Prejuízos Diminui a verba de direitos autorais - 109 para as bandas que se administram Mostra quão bem sucedido é o seu produto. - Quadro 8: Ameaças e oportunidades e criadas pela pirataria Uma consideração do presente trabalho é a conclusão de que a diminuição da verba de direitos autorais pode ser suprida pelo maior alcance gerado pela pirataria, o que promove um “marketing gratuito” da banda. Assim, deixa-se de ganhar de um lado para se economizar em outro. 5.9 Sucesso do sertanejo O sertanejo sabe se administrar e se adequa à indústria do entretenimento. Ele cria, porém, um papel alienante, uma vez que é produto da indústria cultural, definida por Adorno. Esse papel alienante do sertanejo seria proposital e promovido por essa indústria? Esse questionamento cabe a outro trabalho. O sertanejo é, por outro lado, positivo, pois aumenta a participação da música brasileira no mercado nacional, em oposição ao poder das músicas estrangeiras. Essa é uma consideração do presente trabalho que contraria Trotta (2005), o qual afirma que a música brasileira possui menos prestígio que a estrangeira em nosso país. 5.10 Análise do Ambiente Fonográfico segundo Porter Figura 2: Análise do Ambiente Fonográfico segundo Porter 110 Fonte: Adaptado de Porter, 1979 Nesta figura, se considera as ameaças ambientais que existem para as grandes gravadoras. Deve-se considerar que há um alto poder de barganha dos fornecedores digitais, uma vez que existe uma grande concorrência no meio digital entre as grandes gravadoras, gravadoras indies e músicos autônomos. As grandes gravadoras, as quais não tem se posicionado de forma eficiente no meio digital, encontram uma forte concorrência nesse meio, a qual fortalece o poder de barganha de fornecedores de conteúdo na internet. Os novos entrantes surgem devido às mudanças geradas pela crise da indústria fonográfica, e à crise do fonograma como forma de suporte físico. Assim, surgem novas empresas atuantes no cenário fonográfico, como empresas que produzem shows, as quais concorrem com as grandes gravadoras, uma vez que estas também têm voltado suas vendas para o mercado de shows. Surgem, também, bandas que se administram, além das bandas indies, as quais, devido ao barateamento das técnicas de produção e ao advento da internet como ferramenta de distribuição e divulgação se desvinculam (a banda que se administra se desvincula apenas parcialmente) da grande gravadora e surgem como novos atores nesse cenário. Em relação ao mercado digital, este surge como uma ameaça de produtos substitutos para a grande gravadora, uma vez que esta não tem sabido se posicionar de forma eficiente nesse mercado. Assim, o mercado digital consiste em uma oportunidade para as indies e em uma ameaça de substituição para as majors. Os concorrentes das grandes gravadoras consistem principalmente nas bandas e gravadoras independentes, as quais têm sabido aproveitar de forma mais eficiente as novas oportunidades que surgem por meio do mercado digital. Por último, a pirataria (em especial a pirataria virtual) consiste em um poder de barganha para os clientes, os quais não desejam mais pagar pelo fonograma com as diversas músicas, buscando gratuitamente o download de suas preferidas. Tal fato tem obrigado as grandes gravadoras a reposicionar suas estratégias, uma vez que diminuiu drasticamente as vendas do suporte físico CD. 111 6- CONSIDERAÇÕES FINAIS E LIMITAÇÕES DO ESTUDO Buscou-se, com essa pesquisa, um melhor entendimento da indústria fonográfica e dos papéis desempenhados pelos seus atores. O presente trabalho visou, ainda, auxiliar bandas que estão iniciando suas carreiras a buscar novas oportunidades no mercado. Deve-se, porém, levar em conta uma limitação do estudo, a qual diz respeito à escassez de material bibliográfico sobre o tema. Em relação à cadeia produtiva da música, objetivo geral da presente pesquisa, representada e descrita no subitem 5.1, cabe observar que essa ainda não está completamente definida, uma vez que busca se adequar e se posicionar melhor frente às atuais mudanças estruturais do mercado fonográfico. Ainda, surgem novos atores, como as bandas que se administram e o governo, enquanto outros são eliminados, como a figura do sideman. Essa cadeia permeia pelas fases de criação, produção, distribuição e divulgação de uma obra. O presente trabalho levou à conclusão geral de que, embora o atual mercado fonográfico esteja em crise, surgem diversas oportunidades a serem aproveitadas pelas bandas e gravadoras menores, dentre elas o uso da internet, a divulgação em nichos específicos, entre outros, de forma a fugir da concorrência com as grandes gravadoras. Assim, se entende que o contrato com as majors é uma opção para as bandas que buscam uma maior divulgação, mas não é uma necessidade, uma vez que surgem outros caminhos que podem ser trilhados. Quanto às estratégias a serem adotadas pelas bandas, concluiu-se que a mesma deve saber se administrar, utilizar os estúdios de forma eficiente, produzir bons shows, possuir uma proposta artística interessante, sempre aperfeiçoar seus conhecimentos musicais, não buscar o sucesso de mídia como único objetivo e focar suas atividades na venda de shows e do suporte físico digital, entre outras. A banda deve combinar estas estratégias de maneira eficaz visando posicionar-se de forma competitiva no mercado, atingindo assim o conhecimento do grande público, o que corresponde aos objetivos específicos b e c do presente trabalho. Conclui-se, assim, que essa banda não é necessariamente aquela que possui um produto de boa qualidade, mas sim aquela que consegue articular as características descritas acima de forma eficiente e eficaz. Os fatores que limitam as bandas atingirem o objetivo d são: não saber se administrar; buscar somente o sucesso de mídia, sem se preocupar em produzir um fonograma de qualidade; não saber usar as ferramentas de comunicação que a internet dispõe; não produzir um fonograma que se adeque ao seu estilo musical, entre outros erros cometidos por músicos descritos no trabalho. 112 Em relação aos modelos de negócios competitivos, descritos pelo objetivo f da presente pesquisa, serão aqueles que souberem se adequar às atuais mudanças dessa indústria, focando na venda de shows ao vivo e em eventos musicais, além de atrelar a venda do fonograma a outras indústrias, como a do cinema. Ainda, ressalta-se a importância dos blogs e imprensa especializada. Já o objetivo e, mapear os caminhos trilhados pelas bandas que atualmente podem ser considerar conhecidas do grande público, descritas no quadro 7 do presente trabalho, pode-se observar que as bandas entrevistadas, todas consideradas conhecidas do público, trilharam os mais diversos caminhos em suas carreiras musicais. Portanto, não existe um modelo de melhor caminho a ser trilhado. Porém, deve-se ressaltar uma vez mais que as bandas devem usar das estratégias descritas no presente trabalho, de forma a se posicionar competitivamente no mercado fonográfico. Em relação ao objetivo específico a, o qual diz respeito aos fatores do mercado fonográfico que influenciam na produção de uma banda, deve-se mencionar: a crescente importância da internet e da imprensa especializada; o fato do CD se encontrar no fim de sua vida útil; a possibilidade de se produzir uma banda sem vínculos com gravadoras; as novas formas de distribuição do fonograma; aos programas governamentais; o surgimento de novos atores nesse mercado; etc. Os programas governamentais de incentivo à cultura surgem como uma nova oportunidade a ser explorada pelas bandas (objetivo específico h). Programas como ProAC e Lei Rouanet possibilitam que os músicos consigam arrecadar verba para desenvolver seus projetos, como produzir um CD ou DVD, realizar uma turnê de shows, entre outros, os quais não seriam passíveis de serem realizados com recursos próprios. Por último, em relação ao objetivo g da presente pesquisa, o qual diz respeito às oportunidades ou nichos não explorados para a atuação de novas bandas, deve-se observar que tal fato foi comprovado neste trabalho, uma vez que as grandes gravadoras têm focado sua atuação cada vez mais em nichos específicos, o que faz com que os demais estilos se tornem passíveis de serem explorados pelas gravadoras independentes ou mesmo pelas bandas que se administram, como uma forma de evitar a concorrência em um mesmo nicho de mercado com a grande gravadora. Ainda, cabe ressaltar que a necessidade do músico possuir conhecimentos administrativos, transformando-se em um músico-gestor é uma das principais conclusões do presente estudo. 113 7.REFERÊNCIAS ABMI. Associação Brasileira da Música Independente. A ABMI. 2014. Disponível em http://www.abmi.com.br. Acesso em 20 mai. 2014. ABPD. Associação Brasileira dos Produtores de Discos. Estatísticas e Dados de Mercado. 2014. Disponível em <http://www.abpd.org.br>. Acesso em 24 marc. 2014. ADORNO, T. W.; ARANTES, P. E. (Org). Os Pensadores: Adorno. São Paulo: Nova Cultura, 1999. (Coleção Os Pensadores). APCM. Associação Antipirataria de Cinema e Música. Pirataria. 2014. Disponível em <http://www.apcm.org.br/>. Acesso em 24 marc. 2014. BARROS, D. F. et al. Download, Pirataria e Resistência: uma investigação sobre o consumidor de música digital. Comunicação, Mídia e Consumo, São Paulo, v. 7, n. 18, p. 125- 151, mar. 2010. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei. 2014. Disponível em < http://www.camara.gov.br/sileg/integras/670851.htm>. Acesso em 30 abr. 2014. Chamamento Poiesis. Poiesis. 2013. Disponível em <http://www.poiesis.org.br/new/editais/arquivos/chamamento-poiesis-5-2013-descritivo.pdf>. Acesso em 2013. DALMAZO, L. Para entrar no ritmo atraídas pelo crescimento do mercado de musica digital no mundo, empresas inovam para criar no pais um serviço relevante de venda de musica na internet. Exame, s. l., v. 44, p. 140, dec. 2010. DE MARCHI, L; ALBORNOZ, L. A., HERSCHMANN, M. Novos negócios fonográficos no Brasil e a intermediação do mercado digital de música. FAMECOS, Porto Alegre, v. 18, p. 279- 291. 2011. Dilma Roussef. Marco Civil é a legislação mais avançada no mundo e nos coloca na vanguarda na proteção dos usuários da internet. Blog do Planalto. 2014. Disponível em < http://blog.planalto.gov.br/dilma-marco-civil-e-a-legislacao-mais-avancada-no-mundo-e-noscoloca-na-vanguarda-na-protecao-dos-usuarios-dainternet/?utm_source=rss&utm_medium=rss&utm_campaign=dilma-marco-civil-e-alegislacao-mais-avancada-no-mundo-e-nos-coloca-na-vanguarda-na-protecao-dos-usuariosda-internet>. Acesso em 24 marc. 2014. Editais de Cultura. Oi. 2013. Disponível em <http://www.oifuturo.org.br/editais/editais-de cultura/historico/>. Acesso em 2013. Editais. Caixa Econômica. 2013. Disponível <http://www.caixacultural.com.br/html/main.html>. Acesso em 2013. em Editais. Sesc Paraná. 2013. Disponível em <http://www.sescpr.com.br/cultura/editais/>. Acesso em 2013. 114 Editais. Vale. 2013. Disponível em <http://www.vale.com/PT/Paginas/Landing.aspx>. Acesso em 2013. Edital de Apoio a Artistas. Petrobrás. 2013. Disponível em <http://ppc.petrobras.com.br/regulamentos/producao-e-difusao/apoio-a-artistas-grupos-ouredes-musicais/>. Acesso em 2013. Edital de Patrocínio. Banco do Brasil. 2013. Disponível <http://www.bb.com.br/docs/pub/inst/dwn/EditalPatrociniosBB.pdf>. Acesso em 2013. em Edital de Patrocínio. Santander. 2013. Disponível em <http://www.santander.com.br/portal/wps/script/templates/GCMRequest.do?page=6842>. Acesso em 2013. Edital Música nos Parques. Prefeitura de Curitiba. 2013. Disponível <http://www.curitiba.pr.gov.br/servicos/empresa/edital-musica-nos-parques-fundacaocultural-de-curitiba/1006>. Acesso em 2013. em Edital. Banco do Brasil. 2013. Disponível em <http://www.bb.com.br/portalbb/page509,128,10400,0,0,1,1.bb?codigoMenu=10665&codigo Noticia=18030&codigoMenu=10665>. Acesso em 2013. Edital. Correios. 2013. Disponível em <http://www.correios.com.br/institucional/conheca_correios/acoes_culturais/esp_cult_rj/patro cinio/Conteudo/edital.cfm?edital=Unidades%20Culturais>. Acesso em 2013. Edital. Funarte. 2013. Disponível em <http://www.funarte.gov.br/wpcontent/uploads/2013/07/EDITAL-CORRIGIDO_17.07.2013_Edital-Funarte-paraRealiza%C3%A7%C3%A3o-de-Encontros-Semin%C3%A1rios-Mostras-Feiras-eFestivais.pdf>. Acesso em 2013. Facebook. Sobre a Empresa. MZA Music. 2014. <https://www.facebook.com/mzamusic/info>. Acesso em 10 mai. 2014. Disponível em Governo do Estado de São Paulo. ProACSP. Secretaria da Cultura. 2014. Disponível em <http://www.cultura.sp.gov.br/portal/site/SEC/menuitem.426e45d805808ce06dd32b43a8638c a0/?vgnextoid=29378ac36e651410VgnVCM1000008936c80aRCRD&vgnextchannel=29378a c36e651410VgnVCM1000008936c80aRCRD>. Acesso em mai de 2014. Governo Federal. Lei Rouanet. Ministério da Cultura. 2014. Disponível http://www.cultura.gov.br/leis/-/asset_publisher/aQ2oBvSJ2nH4/content/lei-rouanet578538/10895. Acesso em mai de 2014. em GUEDES FILHO, J.P. No Ritmo do Capital, Indústria Fonográfica e Subsunção do Trabalho Criativo antes e depois do MP3. 2011. 177 f. Tese (Doutorado em Economia)Faculdade de Economia e Administração, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011. 115 HERSCHMANN, M. Carência de dados e desafios metodológicos para o desenvolvimento dos estudos da indústria da música. FAMECOS, Porto Alegre, v. 20, p. 131- 146. 2013. Home. A Musicoteca. 2014. Disponível em < http://www.amusicoteca.com.br>. Acesso em 10 mai. 2014. Home. Clube de Jazz. 2014. Disponível em < http://www.clubedejazz.com.br/noticias/noticia.php?noticia_id=422>. Acesso em 10 mai. 2014. Home. Collectors Room. 2014. Disponível em <http://www.collectorsroom.com.br>. Acesso em 10 mai. 2014. Home. Fita Bruta. 2014. Disponível em <http://fitabruta.com.br/>. Acesso em 10 mai. 2014. Home. Miojo Indie. 2014. Disponível em <http://miojoindie.com.br/>. Acesso em 10 mai. 2014. Home. Monkey Buzz. 2014. Disponível em <http://www.monkeybuzz.com.br/>. Acesso em 10 mai. 2014. Home. Na Mira do Groove. 2014. Disponível em <http://namiradogroove.com.br/>. Acesso em 10 mai. 2014. Home. Noize. 2014. Disponível em <http://www.noize.com.br/>. Acesso em 10 mai. 2014. Home. Rock’n Beats. 2014. Disponível em <http://www.rocknbeats.com.br/>. Acesso em 10 mai. 2014. Home. Soma Am. 2014. Disponível em <http://soma.am/>. Acesso em 10 mai. 2014. Lei Rouanet. Wikipedia. 2014. Disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/Lei_Rouanet>. Acesso em 20 mai. 2014. LUERSEN, E. H. Condições do Músico Emergente no ambiente digital: apontamentos sobre acessibilidade e mercado. Sessões do Imaginário, s. l., n. 28, p. 66-75. 2012. MALHOTRA, N. K. Pesquisa de Marketing. 6. ed. Porto Alegre: Bookman, 2012. MARCHI, L. DE. Inovação e institucionalização na indústria fonográfica brasileira: Um estudo de caso das estratégias de negócio de músicos autônomos no entorno digital. Revista de Economía Política de las Tecnologias de la Información y de la Comunicación, s. l., v. 14, n.2, s. l., maio/ago. 2012. MENEZES, Thiago Andrade de. Uma análise das estratégias de gravadoras independentes no mercado fonográfico. 2010. 92 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Administração)- Faculdade de Economia Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2010. 116 Mônica Herculano. Para que servem as editoras musicais? Cultura e Mercado. 2014. Disponível em <http://www.culturaemercado.com.br/agenda/para-que-servem-as-editorasmusicais/>. Acesso em mai de 2014. NAKANO, D. A produção independente e a desverticalização da cadeia produtiva da música. Gest. & Prod, São Carlos, v. 17, n.3, p. 627-638. 2010. NAPSTER. Pacotes de Assinatura. Terra Música. <http://napster.terra.com.br/>. Acesso em: 24 marc. 2014. 2014. Disponível em NOGUEIRA JÚNIOR, D. A. Direitos autorais e a pirataria: uma polêmica na realidade virtual. FAMECOS, Porto Alegre, v. 20, p. 47-68. 2013. Patrocínio a Eventos Culturais. BNDES. 2013. Disponível em <http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/Apoio_Financeiro/Patro cinio/Introducao/eventos_culturais2013.html>. Acesso em 2013. Planalto. Constituição Federal de 1988. 2014. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 24 marc. 2014. Portela, G. L. Abordagens teórico- metodológicas. In: Projeto de Pesquisa no ensino de Letras para o Curso de Formação de Professores da UEFS, 2004, s.l. PORTER, M. E. How Competitive Forces Shape Strategy. Harvard Business Review 57, no. 2 (March–April 1979): 137–145. Projeto Rumos. Itaú Cultural. 2013. <http://novo.itaucultural.org.br/projeto/rumos-2/>. Acesso em 2013. Disponível em Regulamento Edital. Sesc. 2013. Disponível em <http://sesc.sistemafecomerciodf.com.br/portal/images/downloads/regulamento_musica_2013 .pdf>. Acesso em 2013. Regulamento FAM. FAM. 2013. Disponível http://festivaisdobrasil.com.br/fam/Regulamento%20-%20FAM%202013.pdf. Acesso 2013. em em Regulamento Natura Musical. Natura Musical. 2013. Disponível em <http://www.naturamusical.com.br/?gclid=CPb1nbjNn74CFePm7Aoddz0ATw>. Acesso em 2013. SALLABERRY. Manual Prático de Produção Musical. 1. ed. Rio de Janeiro: Música & Tecnologia, 2008. Sideman. Wikipedia. 2014. Disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/Sideman>. Acesso em 10 mai. 2014. SOM LIVRE. Venda de músicas online. <http://www.escute.com/>. Acesso em 24 marc. 2014. Escute. 2014. Disponível em 117 Stop Online Piracy Act. Wikipedia. 2014. Disponível <https://pt.wikipedia.org/wiki/Stop_Online_Piracy_Act>. Acesso em 30 abr. 2014. em TROTTA, F. Música e mercado: a força das classificações. Contemporânea, s. l., v. 3, n. 2, p. 181- 196, julh/dez. 2005 VICENTE, E. Música e Fé: A cena religiosa no mercado fonográfico brasileiro. University of Texas Press, Austin, Tex, v. 29, p. 29-42. 2013. Washington Post. SOPA died in 2012, but Obama Administration wants to revive part of it. Blog Washington Post. 2014. Disponível em <http://www.washingtonpost.com/blogs/theswitch/wp/2013/08/05/sopa-died-in-2012-but-obama-administration-wants-to-revive-part-ofit/>. Acesso em 30 abr. 2014.