Lucro Contábil: Critério para o cálculo e distribuição aos sócios das sociedades limitadas empresárias - Art. 1.078 - CC 2002 Prof. MSc. Wilson Alberto Zappa Hoog* Resumo O artigo apresenta a nova visão ou realidade em que se inserem as sociedades empresárias limitadas, sob a perspectiva de critério para o cálculo e deliberação da distribuição aos sócios, dos lucros, bem como, a importância do contrato social, e a nova lei de direito empresarial e contábil, código Civil de 2002, que deve ser interpretada pelo raciocínio lógico-científico dos contadores. Nesta abordagem em tela, a ciência contábil pura e a doutrina contábil assumem integralmente seu papel de orientar a uma melhor decisão empresarial. Por esta razão, é apresentada uma seqüência de quatro situações que tem por objetivo demonstrar o alcance da visão moderna de uma ciência, onde surge a força da consultoria empresarial, pela ciência e pela política contábil, além de revelar e estudar várias hipóteses ou modelos de deliberações e poder político-administrativo sobre o destino de resultado - lucro. Algumas mudanças importantes surgem nesse cenário, pela semântica contábil, envolvendo aspectos da responsabilidade social das sociedades empresárias, diante da necessidade de deliberação em reunião ou assembléia. A exemplificação da interpretação dadas às quatro hipóteses e as referências de cada categoria ou vocábulo contábil-jurídico estão explicitada no texto, que procura traduzir a mensagem direcionada aos profissionais da área, contadores, administradores, economistas e advogados. Palavras-chave Lucro de sociedade empresária limitada, assembléia de sócios, regência supletiva à lei das sociedades anônimas, Lei 10.406/02, prestação de contas, aprovação de contas, administrador, lacuna, Código Civil de 2002. Introdução A moderna atividade do profissional da contabilidade na assembléia ou reunião de sócios, quando da aprovação das contas dos administradores de sociedades empresárias1 limitadas (§3 art. 1.078), depara-se com situações que envolvem o balanço patrimonial e balanço de resultado econômico, incluindo-se por uma questão consuetudinária da escrituração contábil, nesta reunião ou assembléia, a deliberação sobre o destino do lucro, motivo pelo qual, devem ser observadas as seguintes hipóteses. A responsabilidade civil do administrador2 e do profissional de contabilidade torna deveras relevante o tema, pois estes profissionais respondem por culpa, logo ilícito, no desempenho de seu labor. A força política, poder de decisão, voto, ante a lacuna3 da lei sobre o destino do rédito nas sociedades limitadas4. Em decorrência do referente5 desta pesquisa, lucro, necessário se faz revelar o sentido e alcance desta categoria contábil. LUCRO (inc. VII do art. 997; arts. 1.006, 1.007, 1.008, 1.026, 1.027, 1.059; inc. II do art. 1.187; art. 1.189 do CC2002) – lucro conforme a nossa doutrina6, é o resultado positivo7 da eficiência da gestão do conjunto de bens organizados para o exercício da empresa (atividade), objeto social. É o objetivo social que está derivado do objeto social, sendo também esta organização a tecnologia de produção ou circulação de bens; está protegido pelo sigilo empresarial (CP, art. 154). Entendemos que a expressão “lucro”, no CC/2002, tenha o alcance também dos ganhos, embora, sob o prisma científico, sejam diferentes. Ganho não é vertente do objeto social e sim, de fatores atípicos à atividade, como, um exemplo, a venda de um ativo imobilizado com resultado positivo. O resultado da pesquisa Quando da aprovação das contas (§3 art. 1.078), no balanço patrimonial e no balanço de resultado econômico, inclui-se, por uma questão consuetudinária da escrituração contábil, o destino do lucro, motivo pelo qual devem ser observadas as seguintes hipóteses de deliberação, pois em conseqüência tem-se o enquadramento da força deliberativa em uma das alternativas: 1. Se no contrato social da sociedade limitada empresária, não há nenhuma disposição sobre a destinação de resultados, e, ainda, se não existir a opção pela regência supletiva à Lei das S/A8, segue-se a vontade dos sócios majoritários, devendo estar pactuado no contrato que compete aos sócios pela maioria do valor das quotas decidir sobre os negócios, pois estão livres, pela maioria dos votos9, para deliberarem sobre o destino, como, por exemplo: a retenção da totalidade do lucro, a título de reserva, não existindo, em conseqüência, a distribuição aos sócios. Nesse caso, cabe aos sócios minoritários apenas acatar a decisão dos majoritários, quanto ao destino do lucro. 2. Se no contrato social da sociedade limitada empresária, não houver cláusulas sobre a destinação de resultados, concomitante com a opção pela regência supletiva à Lei das S/A, e, ainda não podendo estar prevista a maioria absoluta10 do capital e conseqüentemente dos votos, para decidir sobre os negócios, segue-se a supremacia da vontade dos sócios, número de pessoas presentes à reunião11, e não, da participação no capital, pois são livres, pela maioria dos votos dos presentes à reunião ou assembléia, deliberarem sobre o destino do lucro como, por exemplo, a não-retenção de parte do lucro, a título de reserva e distribuição total aos sócios. 3. Se no contrato social estiver pactuado o destino do resultado, indicando o percentual de retenção a título de reserva e o percentual de distribuição aos sócios, este critério deverá prevalecer sobre as regras da regência supletiva da Lei nº. 6.404/76 e a dos artigos do CC/2002 que tratam da sociedade simples. 4. Se o contrato social da sociedade limitada empresária não contiver disposição sobre a destinação de resultados e, concomitantemente, existir a opção pela regência supletiva à Lei das S.A, aplica-se com supremacia o disposto no art. 202 da Lei nº. 6.404/76, sobre as regras da sociedade simples, ou seja, deverão ser distribuídos pelo menos 50% do lucro líquido ajustado12. Síntese conclusiva Este modo de interpretação contábil13 tende a aprumar a situação políticoinstitucional14, econômica15 e financeira16, quando a célula social empresarial apresentar lucro 2 do exercício e a respeito deste exige-se uma decisão, pois o fim do exercício social de 2005 se aproxima, sob a vigência também do novo Código Civil. Por fim, em relação ao lucro contábil da sociedade limitada empresária, espera-se ter demonstrado que existem quatro hipóteses ou critérios distintos para a apuração do cálculo e sua distribuição aos sócios. 1 SOCIEDADE EMPRESÁRIA - é um acordo de vontades que cria uma entidade, pessoa jurídica, com fins econômicos, organizada, de direito privado, constituída por contrato escrito que se vincula ao Registro Público de empresas mercantis, a cargo das Juntas Comerciais, nos termos do art. 1.150 do CC/2002; que tem por objeto o exercício da atividade própria de empresário, nos termos do art. 982, constituída sob os tipos regulados no novo Código Civil, arts. 1.039 a 1.092. Ex: qualquer tipo de sociedade que pratique a produção ou circulação de bens e serviços, como os supermercados, bancos, as indústrias em geral. Incluem-se nessa categoria todas as sociedades anônimas, independente do tipo de “empresa” (atividade). A sociedade não é a atividade; mas a atividade ou o objeto, existência ou não do elemento de empresas, classifica a sociedade pelo gênero: empresária ou simples. Possuem denominação ou firma; art. 1.155 do CC 2002. Os seus tipos possíveis são: Sociedade Anônima, art. 1.088 (unipessoal originária, subsidiária integral, art. 251 da Lei 6.404/76; de garantia solidária – Lei 9.841/99, art. 17. S/A tradicional (mínimo de dois sócios). Limitada, sociedade de pessoas ou de capital, art. 1.052. Sociedade em Nome Coletivo, com sócios somente pessoa física, responsabilidade solidária ilimitada, art. 1.039. Comandita Simples, com sócios pessoa física, responsabilidade ilimitada e pessoa jurídica, cuja responsabilidade é limitada, art. 1.045. Comandita por Ações, Diretor, responsabilidade ilimitada, art. 1.090. São atividades econômicas, organizadas com responsabilidade social entre outras, com personalidade jurídica, sujeitas à dissolução, resolução, liquidação e à falência; são regularmente inscritas na junta comercial, podendo ser administradas por outra pessoa jurídica ou natural; art. 1.060 do CC/2002, podem desenvolver um ativo intangível, atributo do estabelecimento “fundo empresarial”. Pode ser do tipo sociedade de pessoas ou de capital, por vontade própria de seus sócios. Possuem estabelecimento empresarial, nos termos do art. 1.142 do CC/2002, conjunto de bens e serviços organizados de forma dominante sobre os outros elementos necessários, recessivos, mas não essenciais. Característicos da ciência, tecnologia, arte, literatura e inteligência, para o exercício da “empresas”, ou seja, a atividade empresarial. Possuem elemento de empresa, fabricação ou laboração que são os meios ou métodos utilizados no processo de produção, desenvolvidos a partir do taylorismo nos Estados Unidos e do fayolismo na Europa, entre 1880 e 1890, a produção em massa, a partir de uma concepção eminentemente pragmática (conjunto de regras e métodos harmonizados entre capital e o trabalho), ou seja, produção de bens ou serviços de formas padronizadas, iguais, de forma contínua, sistema de produção por processo ou por ordem, um ou vários produtos em série para atender os fregueses, têm preço de venda para os seus produtos e não honorários, sem distinção, ou seja, sem a característica dominante de intuitu personae, como, por exemplo: os serviços de correio, de energia elétrica, ou bens como os produzidos e ou comercializadas pela indústria e ou comércio de cimento, automobilística, de açúcar, álcool e combustíveis, uma livraria, e não a atividade intelectual do escritor. 2 ADMINISTRADOR (arts. 1.011, 1.012, 1.018, 1.022, inc. I do art. 1.069, inc. I do art. 1.098 do CC2002) – administrador: pessoa natural, administra as sociedades simples (CC/2002, art. 997, inc. VI), ou eventualmente pessoa jurídica (CC/2002, art. 1.060), que administra sociedades empresárias do tipo: limitada. A regra civil da administração consta do CC/2002 nos arts. 1.010 à 1.021. Nos nossos comentários ao art. 1.013 do CC/2002 temos: “O administrador tem, no exercício de suas funções, o dever de informar, de lealdade e de dupla diligência, que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração de seus próprios negócios, sob pena de responder por culpa no desempenho de suas funções. A culpa se caracteriza pela ação tida como ilícita ou por omissão. As deliberações que estejam infringindo o contrato ou a lei tornam ilimitada a responsabilidade dos que as praticaram ou aprovaram (CC/2002, art. 1.080)”. Responde, também, por perdas e danos, perante a sociedade, o administrador que realizar operações, sabendo ou devendo saber que está agindo em desacordo com a maioria, por força do § 2º do art. 1.013 do CC/2002. Não podem ser administradores, além das pessoas incapazes, impedidas por Lei (CC/2002, art. 4º); os condenados a pena que vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos públicos; ou por crime falimentar (Dec.-Lei 7.661/45, arts. 186 ao 199); de prevaricação, peita ou suborno, concussão, peculato; ou contra a economia popular (Lei 1.521/51); contra o sistema financeiro nacional (Lei 7.492/86); contra as normas de defesa da concorrência (Lei 8.884/94); contra as relações de consumo (Decreto 861/93); a fé pública ou a propriedade (Dec.-Lei 7.903/45); enquanto perdurarem os efeitos da condenação. Aplicam-se à atividade dos administradores, no que couberem, as disposições concernentes ao mandato, constantes nos arts. 653 a 692 do CC/2002. E, neste sentido, temos o art. 667 do CC/2002, segundo o qual os mandatários são obrigados a indenizar qualquer prejuízo causado por culpa sua ou daquele a quem substabelecerem. Como exemplo, podemos citar o caso de uma multa 2, por venda sem nota fiscal. Esta penalidade, multa, deve ser indenizada pelo administrador que agiu contra as Leis, chamando para si a 3 responsabilidade de indenizar, por culpa, no exercício de suas funções. Pela teoria ultra vires, a pessoa jurídica não responde além dos poderes concedidos. Pelo CTN, arts. 134 e 135, os sócios são responsáveis pelas obrigações tributárias, resultantes dos atos praticados por excesso de poderes ou contrários à Lei. Para o exercício do cargo de administrador não sócio, apenas para os não sócios art. 1.061 do CC/2002, entendemos ser possível a exigência do registro no Conselho de Administração, por força dos arts. 3º e 14 da Lei Federal 4.769/65. 3 LACUNA – Supressão legal sobre fatos contábeis ou negócios jurídicos, enfim, um “vazio” na lei, podendo esta omissão, silêncio na lei, ser suprida pela aplicação dos princípios gerais do direito e da contabilidade, pela doutrina, ou pela jurisprudência se existir, ou por fatores consuetudinários locais, ou pela ratio legis intenção ou espírito da lei como, por exemplo, a exposição de motivos, ou por analogia a outras leis e por fim, com o direito estrangeiro comparado e o bom senso. Esta posição deriva da interpretação do art. 4 da Lei de introdução ao código civil (decreto-lei nº4.657/1942) 4 SOCIEDADE LIMITADA - ( Sentido e alcance do Código civil de 2002) – tipo societário personificado e pertencente aos gêneros empresarial e simples. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social. 5 REFERENTE - é a situação contextual que uma pesquisa acadêmica ou profissionalizante remete, ou seja, a explicação do objeto e produto desejado, demarcar o alcance da abordagem de uma atividade cientifica. Logo, o referente é o estribo da abordagem, que se vai dar ao tema dum labor científico. O referente é um forte indicativo para a “pesquisa bibliográfica”, e o uso da “categoria contábil”. 6 HOOG, Wilson Alberto Zappa. Novo Código Civil – Especial para Contadores. Curitiba: Juruá, 2003. p. 105. 7 Diferença positiva, saldo credor, entre o valor das receitas, saldos credores e os valores de custos e despesas saldos devedores. 8 Art. 1.053 do CC.2002. 9 Situação prevista no art. 1.010 do CC-2002: Maioria absoluta, ou seja, votos correspondentes a mais da metade do capital social. 10 Idem à nota anterior. 11 Situação prevista no inciso III do art. 1.076. 12 Reprodução parcial do art. 202 da Lei 6.404/76: Os acionistas têm direito de receber como dividendo obrigatório, (...), metade do lucro líquido do exercício diminuído ou acrescido dos seguintes valores: I - quota destinada à constituição da reserva legal (artigo 193); II - importância destinada à formação de reservas para contingências (artigo 195), e reversão das mesmas reservas formadas em exercícios anteriores; III - lucros a realizar transferidos para a respectiva reserva (artigo 197), e lucros anteriormente registrados nessa reserva que tenham sido realizados no exercício. 13 HERMENÊUTICA CONTÁBIL – Provém do grego hermeneúe (designação de uma ciência, da interpretação de textos científicos). A hermenêutica contábil dá a interpretação correta do sentido das palavras, alcance que se pretende com a terminologia científica ou tecnológica grafada. O cerne da questão, que se enfatiza, tem na sua gênese conceptiva a parametrização da essência da sentença, ou de um ponto controvertido, ou o objeto da uma análise científica, que é o referente e suas categorias operacionais, onde se faz necessária a viripotente utilização da hermenêutica contábil e jurídica, em especial destacamos uma correta opinião em laudos, pareceres, contratos, estatuto, doutrina e relatórios. A hermenêutica contábil revela-se como sendo uma referência metodológica, além do conhecimento mediano dos lidadores da ciência contábil, por fundamentar-se na filosofia, ou seja, na sabedoria científica que é capaz de tornar a contabilidade uma ciência social objetiva, guiada pelos rigorosos critérios que são próprios dos cientistas. E, neste foco a hermenêutica contábil se firma modernamente. Como saber científico de um sistema normatizado por fatores consuetudinários idealizado pelos estudiosos da ciência do patrimônio, confere coerência e lógica à compreensão e operacionalização contábeis. 14 Sistema de regras respeitantes à direção dos negócios e de sua estrutura, decorrente de necessidades sociais básicas, com caráter de relativa permanência, e identificável pelo valor de suas condutas deliberativas ou de seu instituto contratual. 15 SITUAÇÃO ECONÔMICA – posição do capital sob o prisma de crescimento real do patrimônio líquido: “capital dos proprietários”. O fortalecimento desta situação, em relação ao capital de terceiros, propicia à azienda uma maior segurança frente a uma economia relativamente instável como a do Brasil. Também mostra a capacidade de geração de lucros comparada ao capital à disposição da organização. HOOG. Wilson Alberto Zappa. Moderno Dicionário Contábil, Curitiba: Editora Juruá, 2004, p.174. 16 SITUAÇÃO FINANCEIRA – posição do capital sob o prisma de capacidade de liquidez, geração de caixa, giro de capital e pagamento ou financiamento das dívidas; de forma resumida: “é a capacidade de pagamentos da azienda”. Idem, ibidem. (*)Wilson Alberto Zappa Hoog, www.zappahoog.com.br; Bacharel em Ciências Contábeis, Mestre em Direito, Perito Contador; Auditor, Consultor Empresarial, Palestrante, especialista em Avaliação de Sociedades Empresárias, escritor e pesquisador de matéria contábil, professor doutrinador de perícia contábil, direito contábil e de empresas em cursos de pós-graduação de várias instituições de ensino. 4