(in) constitucionalidade da castração química nos crimes

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NUNES, Bruna Luiza. A (in) constitucionalidade da castração química nos crimes sexuais. Revista Eletrônica de
Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Políticas da UNIVALI. v. 2, n.1, p. 61-79, 1º Semestre
de 2011. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN 2236-5044.
A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA CASTRAÇÃO QUÍMICA NOS
CRIMES SEXUAIS
Bruna Luiza Nunes1
Guilherme Augusto Correa Rehder2
RESUMO
O presente artigo tem por finalidade uma breve apresentação a respeito da
castração química, bem como a sua repercussão em nosso ordenamento jurídico,
verificando se tal prática é constitucional. Dentro disso, será avaliada a
ressocialização do pedófilo. Será avaliado também o Projeto de Lei nº552/2007 que
estabelece a pena de castração química nas hipóteses em que o autor de crimes
sexuais for considerado pedófilo, conforme o Código Internacional de Doenças. Ao
final serão verificados os países que utilizam a castração química. Foi utilizada a
metodologia indutiva para desenvolver a pesquisa, utilizando-se das técnicas do
referente, do fichamento e das categorias.
Palavras
Pedofilia.
chave:
Castração
química.
Constitucionalidade.
Ressocialização.
SUMÁRIO
Introdução; 1. A ressocialização de pedófilos; 1.1 Conceito de pedofilia; 1.2 A
ressocialização de um pedófilo;1.3 A medida de segurança e sua não aplicabilidade;
2. Castração química: uma luz no fim do túnel?; 2.1 Projeto de Lei 552/2007; 2.3
Indicações; 2.4 Efeitos Colaterais; 2.5 Castração química e o Direito comparado; 3.
A (in) constitucionalidade da castração química; Considerações Finais; Referências
das Fontes Citadas.
INTRODUÇÃO
O presente artigo científico terá a castração química como tema principal,
discorrendo acerca de sua (in) constitucionalidade.
1
Acadêmica do 9º período do curso de Direito da UNIVALI- Universidade do Vale do Itajaí.
[email protected].
2
Advogado graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e especialista
em Ciências Criminais. Leciona na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.
[email protected]
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NUNES, Bruna Luiza. A (in) constitucionalidade da castração química nos crimes sexuais. Revista Eletrônica de
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de 2011. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN 2236-5044.
O objetivo geral é analisar a constitucionalidade da castração química no
ordenamento jurídico brasileiro. Os objetivos específicos são verificar: as formas
para a ressocialização de pedófilos, aplicabilidade da medida de segurança, as
indicações e os efeitos colaterais da castração química e os países que adotam a
castração química.
Por razões metodológicas, o presente artigo será dividido em três partes,
sendo que primeiro será verificada as formas de ressocialização de pedófilos, na
segunda será discutido se a castração química é a solução adequada para coibir a
pedofilia e na terceira será analisada a (in) constitucionalidade da castração química
no ordenamento jurídico brasileiro.
Foi utilizada a metodologia indutiva para desenvolver a presente pesquisa,
utilizando-se das técnicas do referente, do fichamento e das categorias.
1 A RESSOCIALIZAÇÃO DE PEDÓFILOS
Far-se-á uma análise das formas de ressocialização em pedófilos.
1.1 Conceito de pedofilia
Desde a antiguidade há a prática da pedofilia, no entanto, como a
disseminação da informação dos meios de comunicação é cada vez mais crescente,
tem-se a falsa impressão de ser tal prática recente.
A origem etimológica da palavra pedofilia advém do grego pedos que
significa criança e phyla referente a amor.
A pedofilia é descrita pelo item F65.4 da Classificação Internacional de
Doenças (CID-10) da Organização Mundial da Saúde (OMS) como a: “Preferência
sexual por crianças, quer se trate de meninos, meninas ou de crianças de um ou do
outro sexo, geralmente pré-púberes”. 3
3
BIBLIOTECA VIRTUAL EM SAÚDE. Disponível em: <http://bases.homolog.bireme.br/cgibin/wxislind.exe/iah/onlineCID/?IsisScript=iah/iah.xis&nextAction=lnk&format=detailed.pft&base=CI
D10&lang=p&indexSearch=EX&exprSearch=F65.4>. Acesso em 4 set.2010.
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Segundo o doutrinador Genival Veloso de França4:
A pedofilia é uma perversão sexual que se apresenta como predileção
erótica por crianças, vindo desde os atos obscenos até a prática de
manifestações libidinosas, denotando graves comprometimentos psíquicos
e morais dos seus autores.
1.2 A ressocialização de um pedófilo
No ordenamento jurídico brasileiro não há um tipo penal definido para a
pedofilia, conforme elucida Ana Selma Moreira5. O indivíduo portador do distúrbio
pode praticar atos que infrinjam regras de conduta, possuindo capitulação através
dos dispositivos penais legais, caso contrário, o pedófilo não pratica crime algum.
Dessa forma, não é por ser portador do distúrbio que o indivíduo é criminoso, mas
porque, em face ao distúrbio, comete um delito penal e por conseqüência recebe o
tratamento pertinente.
De acordo com Joseph Spradlin apud Ana Selma Moreira6 existem várias
formas de tratamento para pedófilos e estupradores, sendo a maioria desses em
laboratórios ou clínicas, tais como: 1. Psicoterapia individual ou de grupo;
2.Associação de um evento aversivo com fotografias ou fitas de vídeos mostrando
um alvo sexual inapropriado; 3. Aplicação direta de contingências a comportamentos
precursores em ambientes clínicos; 4. Treinamento preventivo de recaída. Spradlin7
sugere ainda como forma de tratamento:
Idealmente o tratamento deveria começar em um serviço de internamento.
Deveria haver uma avaliação detalhada envolvendo: (a) entrevistas
detalhadas com o entrevistado ligado a um polígrafo; (b) avaliação com um
plestismógrafo; (c) avaliação de relatos pela polícia e acusadores.
O tratamento inicial envolveria: (a) condicionamento encoberto com o
objetivo de reduzir as propriedades reforçadoras de alvos sexuais
inapropriados e sexo forçado; (b) aconselhamento individual com o objetivo
de estabelecer relatos verdadeiros a respeito de atos sexuais e fantasias
sexuais, desenvolvendo planos para evitar atividades e contextos de alto
4
FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1998. p.
197.
5
MOREIRA, Ana Selma. Pedofilia: aspectos jurídicos e sociais. São Paulo: Cronus, 2010.p.169.
6
SPRADLIN, Joseph E et all apud MOREIRA, Ana Selma. Pedofilia: aspectos jurídicos e sociais, p.
110-111.
7
SPRADLIN, Joseph E et all apud MOREIRA, Ana Selma. Pedofilia: aspectos jurídicos e sociais,
p.113-114.
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risco, e planos para uma vida nova e diferente; (c) adesão a grupo com o
objetivo de estabelecer controle social.
A pessoa seria re-introduzida na comunidade sob supervisão de uma
pessoa de apoio que monitoraria, treinaria e daria “feedback” ao longo do
dia. Durante esse tempo, a pessoa usaria um plestimógrafo portátil e um
aparelho de rastreamento por satélite. O aconselhamento individual e os
encontros de grupo continuariam.
Redução gradual do tempo que a pessoa de apoio fica em contato direto
durante o dia. Outros monitores, entretanto, estariam acompanhando o
comportamento da pessoa. A pessoa em tratamento seria avisada de que
seria monitorada por algum tempo durante o dia. Mas não seria contado
quando ou por quem. Durante os encontros de grupo ou individuais a
pessoa seria informada sobre o que o monitor viu. A pessoa continuaria a
usar os aparelhos eletrônicos de monitoração.
Encontros de grupo continuados (similares aos Alcoólicos Anônimos),
monitoração eletrônica continuada, mas monitoração direta reduzida.
Segundo o psiquiatra americano este programa apesar de soar caro e
invasivo, é mais benéfico do que a prisão, havendo a possibilidade de proteger a
sociedade, enquanto permite que o agente permaneça na comunidade.
No Brasil, há o Ambulatório de Transtornos de Sexualidade da Faculdade de
Medicina do ABC e o Centro de Estudos e Atendimento de Abuso Sexual do
Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, instituições que
realizam tratamentos em pedófilos, objetivando a ressocialização destes.
O Ambulatório de Transtornos de Sexualidade da Faculdade de Medicina do
ABC, em Santo André, sob coordenação de Danilo Baltieri, mestre e doutor em
medicina pela USP, desde 2003, atende pacientes portadores de disfunções
sexuais, transtornos da preferência sexual, transtornos da identidade sexual e
transtornos da maturação e desenvolvimento sexual. Entre os pacientes, 3% são
pedófilos.8 De acordo com Baltieri:
Os pacientes portadores de Pedofilia que procuram tratamento médico e
psicológico devem, uma vez adequadamente diagnosticados, participar de
programas específicos de psicoterapia. As formas de terapia mais
estudadas para esta população têm sido as de definição cognitivocomportamental. Através da psicoterapia, objetiva-se melhorar a qualidade
de vida do paciente, prevenir quaisquer formas de recaídas, adequar a sua
sexualidade patológica para uma forma mais adequada, auxiliar este
indivíduo a reestruturar suas crenças e conceitos a respeito de sexo e
prazer, proporcionar habilidade cognitivas para o controle das fantasias e
8
Dados extraídos do site de Disciplinas de Psiquiatria Médica da Faculdade de Medicina do ABC.
Disponível
em:
<http://www.clinicaarthurguerra.com.br/clientes/fmabc/oficial/servicos.
php?FiCont=5>. Acesso em: 02 nov.2010.
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impulsos, orientar técnicas de manejo comportamental para situações de
9
risco, dentre outras.
Acrescenta Baltieri, que a princípio cerca de 90% dos portadores de pedofilia
conseguem uma resposta terapêutica adequada através da psicoterapia e de
medicações como antidepressivos e outras medicações que auxiliam no controle
dos impulsos sexuais desviados. Somente serão utilizadas medicações que
controlam a ação da testosterona, conhecidas como medicações hormonais, quando
nenhuma outra forma de tratamento obtiver eficácia. Para o psiquiatra, é incorreto
definir esse tratamento como castração química, pois o termo transmite a idéia de
coação, sofrimento e perda de função sexual. O objetivo do tratamento é melhorar a
qualidade de vida do paciente, promover o bem-estar, evitar as recaídas e adequar a
sua sexualidade, não prejudicando a ereção do indivíduo, mas sim promovendo o
controle de seus impulsos.
No Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais foi
inaugurado em maio de 2010, o Centro de Estudos e Atendimento de Abuso Sexual
que objetiva tratar homens condenados pela justiça pelo crime de abuso sexual de
crianças e adolescentes. Segundo o psiquiatra José Raimundo Lippi, coordenador
da implantação do ambulatório e presidente da Associação Brasileira de Prevenção
e Tratamento de Ofensas Sexuais (Abtos), o tratamento do pedófilo é feito através
da terapia cognitivo-comportamental e medicação. "Se, além do transtorno de
preferência sexual, ele tiver um distúrbio de personalidade, então será necessária a
medicação porque ele se torna mais perigoso.” 10
Diante do exposto, vê-se que a ressocialização do pedófilo é algo
extremamente necessário para coibir a prática de crimes, bem como a reincidência.
1.3 A medida de segurança e sua não aplicabilidade
A medida de segurança é definida por Fernando Capez na seguinte forma:
Sanção penal imposta pelo Estado, na execução de uma sentença, cuja
finalidade é exclusivamente preventiva no sentido de evitar que o autor de
9
BALTIERI, Danilo A. Pedofilia é doença?: depoimento. São Paulo: Guia-me. Entrevista concedida a
Adriana Amorim. Disponível em:<http://www.guiame.com.br/v4/16718-1702-Pedofilia-doen-a-.html>.
Acesso em: 07 nov.2010. .
10
LIPPI, José Raimundo apud BRANCO, Castello Andréa. Íntegras, São Paulo, 22 mar. 2009.
Disponível
em:
<http://integras.blogspot.com/2009/03/uma-doenca-chamada-pedofilia.html>.
Acesso em: 02 nov.2010.
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uma infração penal que tenha demonstrado periculosidade volte a
11
delinqüir.
Tal instituto teve origem no Código Italiano de 1889 e está presente na
maioria dos Códigos Penais mundiais. Asseveram Newton e Valter Fernandes: “A
pena retira o criminoso do meio social, como castigo pelo mal cometido para evitar
que ele torne a delinqüir. Já o fim da medida de segurança não é punir, mas, sim,
segregar, isolar, e também corrigir [...]”.12
Assim, vê-se que a finalidade da medida é reabilitar o agente para que esse
não volte a delinqüir.
O Código Penal brasileiro adotou o sistema vicariante, no qual não é
possível aplicar cumulamente pena e medida de segurança. Aos imputáveis, aplicase pena; aos inimputáveis, medida de segurança; aos semi-imputáveis, uma ou
outra, conforme recomendação do perito.
A aplicação da medida de segurança, prevista nos artigos 96 a 99 do Código
Penal, pressupõe a prática de um fato definido como crime ou contravenção e a
periculosidade, definida por Fernando Capez como: “a potencialidade para praticar
ações lesivas. Revela-se pelo fato de o agente ser portador de doença mental.”
13
O
mesmo afirma que na inimputabilidade, a periculosidade é presumida, bastando o
laudo apontar a perturbação mental para que a medida de segurança seja
obrigatoriamente imposta. Já a semi-imputabilidade precisa ser constatada pelo juiz.
Mesmo que o laudo aponte a falta de higidez mental, deverá ainda ser investigado,
no caso concreto, se é caso de pena ou de medida de segurança.
O Código Penal brasileiro prevê duas espécies de medida de segurança:
a) Detentiva: consiste em internação em hospital de custódia e tratamento
psiquiátrico, caso não tenha, em outro estabelecimento adequado (art.96, I);
b) Restritiva: consiste em se submeter a tratamento ambulatorial (art.96, II),
não havendo internação, o agente permanece livre realizando o tratamento
em clínica psiquiátrica.
11
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral. 9ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v.1.p. 424.
12
FERNANDES, Newton. Criminologia Integrada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 666
13
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral. p. 425-429.
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Dessa forma, se o crime é punido com reclusão, sendo o agente inimputável
ou semi-imputável, torna-se obrigatória a medida de segurança detentiva, na forma
de internação quando o juiz optar pela aplicação da medida de segurança, podendo
ainda optar pela redução da pena. Caso o fato seja punível com detenção, o juiz
observando o grau de periculosidade do agente poderá optar entre a internação e o
tratamento ambulatorial (art.97 do Código Penal).
No entanto, a doutrina moderna vem questionando muito o dispositivo
supracitado, pois não é porque o crime é punido com reclusão que o agente deve
ser submetido a internação, uma vez que o artigo 97 do Código Penal trabalha com
a proporcionalidade do fato. Porém, a medida de segurança deve se preocupar com
a periculosidade do agente. Assim sendo, o magistrado deve determinar a medida
de segurança que mais se adapta com o grau de periculosidade do agente e não
com a gravidade do fato.
De acordo com Fernando Capez, a execução da medida obedece ao
seguinte procedimento:
Transitada em julgado a sentença, a guia de internação ou de tratamento
ambulatorial é expedida, conforme a medida de segurança seja detentiva ou
restritiva;
É obrigatório dar ciência ao Ministério Público da guia referente à internação
ou ao tratamento ambulatorial;
O diretor do estabelecimento onde a medida de segurança for aplicada, até
um mês antes de expirar o prazo mínimo, deverá remeter ao juiz um
relatório completo que o habilite a resolver sobre a revogação ou a
permanência da medida;
O relatório será instruído com o laudo psiquiátrico;
O relatório não supre o exame psiquiátrico;
Deverá ser dado vista ao Ministério Público e ao defensor do sentenciado
para manifestação dentro do prazo de 03 dias para cada um;
O juiz determina novas diligências ou profere a decisão em 05 dias;
Da decisão proferida caberá agravo, com efeito suspensivo (art.179 da
LEP).
Embora haja previsão legal, o instituto da medida de segurança ainda é
pouco aplicado em nosso país, em virtude de estruturas precárias e limitadas.
Quanto à aplicação da medida de segurança em infratores pedófilos, verifica-se que
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a medida não é aplicada, o que pode ser observado no julgado abaixo do Tribunal
de Justiça de Santa Catarina14:
ATENTADO
VIOLENTO
AO
PUDOR.
SEMI-IMPUTABILIDADE
RECONHECIDA POR EXAME DE SANIDADE MENTAL. PRETENDIDA
SUBSTITUIÇÃO DA PENA POR MEDIDA DE SEGURANÇA ANTE A
NECESSIDADE DE ESPECIAL TRATAMENTO CURATIVO QUE NÃO
ENCONTRA FUNDAMENTO NAS CONCLUSÕES DO EXPERT.
APLICAÇÃO DA PENA COM A REDUÇÃO PREVISTA NO ART.26,
PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO PENAL. SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO DESPROVIDO.
Conforme analisa Ana Selma Moreira15 o julgado, trata de um atentado
violento pudor cometido em face de uma menor com 6 anos de idade. A pena
aplicada ao infrator foi de 3 anos e 04 meses de reclusão, em regime inicialmente
fechado, “devidamente acompanhado de tratamento psicoterápico ambulatorial”.
Inconformado, o infrator apelou alegando sua semi-imputabilidade e requerendo a
aplicação de medida de segurança pertinente, para que fosse tratado em
conformidade com sua condição. O laudo pericial efetuado no processo constatou
perfil indicativo de pedofilia embora houvesse a presença de álcool. Constatou-se
também que o apelante possui dificuldade de controle dos impulsos sexuais, porém,
não foi possível a constatação da intensidade desses. Entretanto, o juízo a quo e o
ad quem não aplicaram a medida de segurança, mesmo com a súplica do apelante
que se mostrou interessado em tratamento. O fundamento do Tribunal de Justiça de
Santa Catarina foi no sentido de que a perturbação de saúde mental não elimina a
capacidade de compreensão e que pode o apelante sofrer prejuízo de reprovação
social em sua culpabilidade.
Moreira afirma que:
O pedófilo não deixa de ser um membro da sociedade, uma pessoa como
as demais, ou seja, um ser complexo, constituído de (des) valores,
experiências e outras características. A sociedade moderna se caracteriza
pelo afeto, pelo sentimento de pertença e, diante disso, não faz sentido
banir o pedófilo do meio social e deixá-lo a mercê de um sistema penal e
carcerário ineficiente, que não trará resultado algum ao que a sociedade
16
espera.
14
Apelação Criminal n.2005.033157-7, de Jaraguá do Sul. Des. Relator: Túlio José Moura Pinheiro.
15
MOREIRA, Ana Selma. Pedofilia: aspectos jurídicos e sociais, p.180.
16
MOREIRA, Ana Selma. Pedofilia: aspectos jurídicos e sociais, p.194.
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Assim, a pena privativa de liberdade não é de forma alguma eficaz na
ressocialização de pedófilos, visto que a pedofilia é um distúrbio que requer
tratamento, o cárcere não reabilita, mas sim auxilia a alimentar desejos que o agente
possa vir a executar quando obtém a liberdade. Deve-se aplicar a medida de
segurança, no sentido de reabilitar o infrator.
2 CASTRAÇÃO QUÍMICA: UMA LUZ NO FIM DO TÚNEL?
No presente item será avaliado se a castração química é a solução
adequada para coibir a pedofilia.
2.1 Projeto de Lei 552/2007
O Projeto de Lei nº552/2007, de autoria do senador Gerson Camata (PMDBES), prevê o acréscimo do art. 216-B ao Código Penal, para cominar a pena de
castração química nas hipóteses em que o autor dos crimes tipificados nos artigos
213 (redação alterada pela Lei nº12.015 de 07 de agosto de 2009), 214 (revogado
pela Lei nº12.015 de 07 de agosto de 2009), 218 (redação alterada pela Lei
nº12.015 de 07 de agosto de 2009) e 224 (revogado pela Lei nº12.015 de 07 de
agosto de 2009), for considerado pedófilo, conforme o Código Internacional de
Doenças.
A proposta consiste que na primeira condenação o criminoso beneficiado
pelo livramento condicional pode ser voluntariamente submetido ao tratamento
hormonal para contenção da libido, antes de deixar a prisão, sem prejuízo da pena
aplicada. A partir da segunda condenação, o criminoso beneficiado pela liberdade
condicional, será obrigado a passar pelo tratamento.
A dosagem do remédio e a periodicidade do tratamento podem variar
conforme o caso, de acordo com Gerson Camata: "Da primeira vez, é pelo tempo
que o sujeito foi condenado, da segunda é para sempre”
17
, admitindo-se a
possibilidade de reincidência. Perante as críticas de alguns parlamentares que
avaliam o projeto como cruel, o autor nega que haja crueldade, afirmando que na
proposta o tratamento é voluntário e dura o tempo da condenação. Afirma ainda que
17
Internet legal: o Direito na Tecnologia de Informação, 20 set.2009. Disponível em: <
http://www.internetlegal.com.br/2009/09/para-presidente-da-cpi-da-pedofilia-castracao-quimicafavorece-criminoso/>. Acesso em 13 nov.2010.
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o objetivo do projeto é salvar crianças no futuro. Segundo Camata, em outros
países, como o Canadá, a reincidência após a castração química é de menos de
1%.
O senador Magno Malta (PR-ES), presidente da CPI da Pedofilia, argumenta
que o projeto favorece o criminoso no sentido de que qualquer advogado irá mandálo tomar o medicamento para ter a pena reduzida e que o medicamento funciona
como redutor de apetite. “Quando o remédio acaba e passa o efeito, a pessoa tem
apetite dobrado. Como os pedófilos são compulsivos, não há redução de libido com
castração química que vá mudar a situação”.18 Para Malta, a proposta tem
problemas jurídicos, pois o condenado não é obrigado a tomar o medicamento e
problemas práticos, e questiona: “Quem vai fornecer o medicamento? Vai ser o
Sistema Único de Saúde? O pedófilo vai ter uma carteirinha de pedófilo? Como é
que faz para comprar na farmácia?”.19
A Associação Brasileira de Psiquiatria em nota considera a expressão
castração química inadequada, porque traz a idéia de punição, constrangimento,
lesão corporal, sofrimento. 20
Segundo a associação, o tratamento médico da pedofilia é composto por
várias etapas, incluindo a psicoterapia, medicações para controle do impulso sexual
podem ser indicadas, como antidepressivos e remédios que regulam a testosterona.
Ainda segundo a associação, o uso do medicamento raramente excede seis meses
e é reversível. “Medicações reguladoras da ação da testosterona são recomendadas
para menos de 10% do total de pacientes que de fato sofrem da grave doença
médica conhecida como pedofilia. Os pacientes devem entender o processo
terapêutico, aceitar o tratamento e ter o apoio de familiares”.21
O relator Marcelo Crivella, ao analisar o referido projeto de lei, destacou no parecer
que caso o projeto seja aprovado, a pena de castração química deverá ser aplicada
como última opção a criminosos que não apresentarem melhoras com o uso de
18
Internet legal: o Direito na Tecnologia de Informação.
19
Internet legal: o Direito na Tecnologia de Informação.
20
Internet legal: o Direito na Tecnologia de Informação.
21
Internet legal: o Direito na Tecnologia de Informação.
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outras drogas e psicoterapia. Em sua proposta de emenda22 especificou a idade da
vítima (menor ou igual a quatorze anos) sob o argumento de que o Código Penal
não pode ter norma penal em branco, dependendo de consulta ao Código
Internacional de Doenças; facultou o tratamento, prevendo a redução da pena em
um terço (tratamento químico hormonal) ou a extinção da punibilidade (intervenção
cirúrgica de efeitos permanentes). O projeto de lei não especifica no que consiste a
castração química, já a proposta de emenda prevê a castração química e a
castração cirúrgica, diferenciando também os efeitos sobre a pena (redução e
extinção).
O projeto foi arquivado em 07/01/2011 ao final da legislatura conforme o
artigo 332 do Regimento Interno do Senado Federal.
2.2 Conceito de castração química
A castração química é uma forma temporária de castração ocasionada por
medicamentos hormonais, conforme elucida Faustino Gudín Rodríguez-Mariños:
A castração química é um tratamento terapêutico temporal e completamente
reversível mediante o qual se injeta no homem um hormônio sintético
feminino – Depo Provera (acetato de medroxiprogesterona, DMPA) – que
produz um efeito anti-andrógeno e que reduz o nível de testosterona para
23
inibir seu desejo sexual durante, aproximadamente, seis meses.
Assim, a castração química objetiva reduzir o nível de testosterona para
inibir o desejo sexual durante certo período.
2.3 Indicações
A castração química é indicada como medida preventiva ou de punição
àqueles que tenham cometido crimes sexuais violentos.
22
BRASIL. Parecer s/nº, de 2009 sobre o Projeto de Lei nº552/2007. Portal Legislativo do Senado
Federal. Brasília, 2009. Disponível em: <http://legis.senado.gov.br/mate-pdf/56869.pdf>. Acesso
em: 06 set.2010.
23
RODRÍGUEZ-MARÍÑOS, Faustino Gudín. Medidas legales para la salvaguarda de la infancia frente
a los crímenes de pedofilia. Revista de Derecho y Processo Penal, Navarra, 2008. p.89.
71
NUNES, Bruna Luiza. A (in) constitucionalidade da castração química nos crimes sexuais. Revista Eletrônica de
Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Políticas da UNIVALI. v. 2, n.1, p. 61-79, 1º Semestre
de 2011. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN 2236-5044.
2.4 Efeitos colaterais
Conforme explica Pedro Paulo da Cunha Ferreira24, as consequências a
médio e longo prazo da administração do Depo Provera para a saúde físico-mental
do indivíduo variam, desde uma “simples” diminuição ou queda de cabelo até o
desenvolvimento de diabetes, passando por problemas respiratórios, depressão,
trombose, hipertensão, dificuldades de circulação sanguínea, aumento de colesterol,
dentre outras mutações fisiológicas.
Dessa forma, vê-se que a castração química acarreta vários danos à saúde
e a integridade do indivíduo a esta submetida.
2.5 Castração química e o Direito comparado
A castração química teve sua primeira aplicação no Reino Unido, quando o
cientista Alan Turing, famoso por suas contribuições à matemática e ciência da
computação, por ser homossexual preferiu se submeter à castração química para
evitar prisão em 1952. Na época, a homossexualidade ainda era ilegal e
considerada como uma doença mental que poderia ser tratada com castração
química.25
Na década de 60, médicos alemães utilizaram antiandrogênicos como
tratamento para parafilia sexual.26
Em 1966, John Money prescreveu acetato de medroxiprogesterona (MPA,
utilizado atualmente como base do Depo Provera) como tratamento para um
paciente com ímpita pedofilia, tornando-se o primeiro americano a empregar a
castração química. 27
24
FERREIRA, Pedro Paulo da Cunha. A castração química como alternativa no combate à pedofilia:
algumas palavras acerca do projeto de Lei nº552/2007. IBCCRIM, Maringá, 17 mar.2010.
Disponível: < http: //www.ibccrim.org.br>.Acesso em 13 nov.2010.
25
BROWN, Jonathan. The Turing enigma: Campaigners demand pardon for mathematics genius. The
Independent News UK and Worldwide News Newspaper, Londres, 18 ago. 2009. Disponível em:
<
http://www.independent.co.uk/news/uk/this-britain/the-turing-enigma-campaigners-demandpardon-for-mathematics-genius-1773480.html>. Acesso em: 13 nov.2010.
26
MD, Charles L.Scott and Trent Holmberg MD. Castration of Sex Offenders: Prisoners’ Rights Versus
Public Safety. Volume 31, Number 4. The Journal of the American Academy of Psychiatry an
the Law, Connecticut, 2003. Disponível: <http://www.jaapl.org/cgi/reprint/31/4/502.pdf>.Acesso em:
13 nov.2010.
27
MD, Charles L.Scott and Trent Holmberg MD. Castration of Sex Offenders: Prisoners’ Rights Versus
Public Safety.
72
NUNES, Bruna Luiza. A (in) constitucionalidade da castração química nos crimes sexuais. Revista Eletrônica de
Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Políticas da UNIVALI. v. 2, n.1, p. 61-79, 1º Semestre
de 2011. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN 2236-5044.
A Califórnia foi o primeiro estado dos Estados Unidos a especificar o uso da
castração química como punição para o abuso sexual infantil, através da
modificação do artigo 645 do Código Criminal. Na legislação californiana, aquele que
for condenado por ter molestado menores de 13 anos, em liberdade condicional,
poderá ser submetido ao tratamento de castração. Em caso de reincidência, o
tratamento será obrigatório. Se o agente se submeter voluntariamente à castração
física (remoção dos testículos), não será passível de castração química. O
tratamento poderá ser feito com o agente em liberdade condicional, sendo
necessário iniciar o tratamento uma semana antes da liberdade, visto que o
medicamento produz efeitos rapidamente.28
A aprovação da lei na Califórnia influenciou na criação de leis semelhantes
em outros estados, como o Estatuto da Flórida Seção 794.0235, transformado em lei
em 1997. Como na Califórnia, o tratamento é obrigatório após a segunda ofensa.
Além da Califórnia e Flórida, pelo menos outros sete estados americanos, incluindo
a Geórgia, Iowa, Louisiana, Montana, Oregon, Texas e Wisconsin, utilizam a
castração química. Em Iowa, bem como na Califórnia e na Flórida, os infratores
podem ser condenados a castração química em todos os casos envolvendo crimes
sexuais graves. 29
Em maio de 2009, em Israel, dois irmãos da cidade de Haifa, sentenciados
por abusos a menores, concordaram na aplicação da castração química para evitar
a prática de novos crimes.
Os países europeus demonstram posicionamentos distintos em relação à
castração química. A Polônia foi o primeiro país europeu a aprovar legislação
obrigatória acerca, em 25 de setembro de 2009. A lei entrou em vigor em 09 de
junho de 2010, assim, qualquer "culpado de estuprar uma criança menor de 15 anos
de idade já pode ser obrigado a submeter-se a química e terapia psicológica para
reduzir o desejo sexual no final do cumprimento da pena.30 A Corte Constitucional da
28
Law and Legal Research. Disponível em: <http://law.onecle.com/california/penal/645.html>. Acesso
em: 19 set.2010.
29
MD, Charles L.Scott and Trent Holmberg MD. Castration of Sex Offenders: Prisoners’ Rights Versus
Public Safety.
30
POLAND okays forcible castration for pedophiles. Reuters.com, Warsaw, 25 set. 2009. Disponível
em: <http://www.reuters.com/article/idUSTRE58O4LE20090925>. Acesso em 11 nov.2010.
73
NUNES, Bruna Luiza. A (in) constitucionalidade da castração química nos crimes sexuais. Revista Eletrônica de
Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Políticas da UNIVALI. v. 2, n.1, p. 61-79, 1º Semestre
de 2011. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN 2236-5044.
Alemanha cassou a lei que instituía a medida sob a justificação de ser
inconstitucional, violando direitos individuais e humanitários. Na Itália há um projeto
sugerindo que aquele que aceitar a castração química poderá descontar pena em
prisão domiciliar. Caso suspenso o tratamento, que é reversível, o beneficiado
voltará ao cárcere. A França faculta o tratamento ao pedófilo julgado perigoso
socialmente. A medida está em discussão na Espanha, onde a Justiça disponibilizou
online, a consulta a banco de dados sobre processos em curso de suspeitos e
condenados. Na Inglaterra, somente com o consentimento do agente poderá ser
aplicada a medida.31
A província argentina de Mendonza aprovou em 15/03/2010 a castração
química para prisioneiros condenados por estupro reincidentes. Os que se
submeterem a medida terão tratamento privilegiado na avaliação de concessão de
liberdade condicional e saídas temporárias, além disso, receberão acompanhamento
quando saírem da cadeia.32
A Coréia do Sul aprovou em 29/06/2010 a legalização da castração química
como punição para pedófilos. A legislação irá permitir que juízes sentenciem
agressores sexuais adultos, cujas vítimas tenham menos de 16 anos. Aos
agressores será disponibilizada assistência comportamental e psicológica.33
Em linhas gerais, verifica-se a projeção a castração química no âmbito da
legislação mundial, sendo já aplicada em alguns países/estados.
No Brasil, já foram apresentadas quatro propostas de lei. Em 2002, o
deputado Wigberto Tartuce (PPB-DF) apresentou o Projeto de Lei n°7.021 que
fixava como pena exclusiva a castração com recursos químicos para os crimes de
estupro e atentando violento ao pudor (hoje unificado em um único tipo penal). O
31
VOTAÇÃO sobre castração química é adiada no Senado. Estadão.com.br, São Paulo, 16 set.2009.
Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,votacao-sobre-castracao-quimica-eadiada-no-senado,436002,0.htm>. Acesso em 11 nov.2010.
32
SMINK, Verônica. Província argentina oferecerá castração química a estupradores. BBC Brasil,
São
Paulo,
10
mar.2010.
Disponível
em:
<
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2010/03/100317_castracaoquimica_ba.shtml>. Acesso em
11 nov.2010.
33
CORÉIA do Sul aprova castração química de pedófilos. VEJA.com, São Paulo, 29 jun.2010.
Disponível
em:
<http://veja.abril.com.br/noticia/internacional/coreia-do-sul-aprova-castracaoquimica-de-pedofilos>. Acesso em 11 nov.2010.
74
NUNES, Bruna Luiza. A (in) constitucionalidade da castração química nos crimes sexuais. Revista Eletrônica de
Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Políticas da UNIVALI. v. 2, n.1, p. 61-79, 1º Semestre
de 2011. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN 2236-5044.
projeto teve grande repercussão na imprensa, sendo considerado por grande parte
dos juristas como desumano e inconstitucional e arquivado em janeiro de 2003. Em
2007, foi apresentado o Projeto de Lei nº552, de autoria do senador Gerson Camata
também arquivado, em 07/01/2011. Em março de 2011, a Assembléia Legislativa de
São Paulo recebeu um projeto de lei do deputado Rafael Silva (PDT) propondo a
castração química para pedófilos, utilizando hormônios como medida terapêutica e
temporária de forma obrigatória. A prescrição médica caberia ao corpo clínico
designado pela Secretaria de Estado da Saúde. Além da polêmica suscitada em
relação a constitucionalidade da medida, foi levantada a questão da competência do
estado para legislar sobre o tema.34 Ao final do mês de maio de 2011, o senador Ivo
Cassol propôs o projeto de lei que altera o artigo 98 do Código Penal prevendo a
aplicação de medida de segurança através de tratamento químico hormonal aos
condenados por pedofilia (artigos 217-A, 218 e 218-A do Código Penal).
35
Na
primeira condenação, o tratamento seria voluntário em substituição da pena e na
segunda seria obrigatória a substituição da pena por tratamento ambulatorial
químico-hormonal, podendo o juiz revogar a medida de segurança e aplicar a pena a
pena privativa de liberdade fixada na sentença se o condenado descumprir as
condições impostas, sem prejuízo do tratamento. O condenado que voluntariamente
se submeter à intervenção cirúrgica de efeitos permanentes não se sujeitará ao
tratamento ambulatorial, podendo o juiz extinguir a punibilidade.36 Atualmente, o
projeto está tramitando no Senado Federal.
3 A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA CASTRAÇÃO QUÍMICA
Passa-se a uma analise acerca da constitucionalidade da castração química
no ordenamento jurídico brasileiro.
34
ASSEMBLEIA analisa castração química. Estadão.com.br, São Paulo, 31 mar.2011. Disponível
em: <http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110331/not_imp699716,0.php>. Acesso em 10
jun.2011.
35
IVO Cassol propõe a castração química para pedófilos. Senado Federal. Portal de Notícias,
Brasília, 24 mai.2011. Disponível em: < http://www.senado.gov.br/noticias/ivo-cassol-propoecastracao-quimica-para-pedofilos.aspx>.Acesso em: 10 jun.2011.
36
BRASIL. Projeto de Lei s/nº 2011. Portal Legislativo do Senado Federal. Brasília, 2011.
Disponível em: <http://legis.senado.gov.br/mate-pdf/90990.pdf>. Acesso em: 10 jun.2011.
75
NUNES, Bruna Luiza. A (in) constitucionalidade da castração química nos crimes sexuais. Revista Eletrônica de
Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Políticas da UNIVALI. v. 2, n.1, p. 61-79, 1º Semestre
de 2011. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN 2236-5044.
Rege a Constituição Federal em seu artigo 1º, III sobre o princípio da
dignidade da pessoa humana, que é explanado por Alexandre de Moraes da
seguinte forma:
A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente a
pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e
responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por
parte das demais pessoas, que constituindo-se um mínimo invulnerável que
todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente
excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos
fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que
37
merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.
O artigo 5º, XLIX de nossa Carta Magna assegura aos presos o direito de
respeito à integridade física e moral. Assegura no mesmo artigo, em seu inciso III
que ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante.
O mesmo artigo ainda estabelece no inciso XLVII que não haverá penas cruéis no
ordenamento jurídico brasileiro.
Os artigos 38 e 40 da Lei de Execução Penal dispõem que o preso conserva
todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as
autoridades o respeito à integridade física e moral dos condenados e dos presos
provisórios.
Os efeitos colaterais da castração química provocam danos que atingem
consideravelmente
a
integridade
física
do
submetido,
ferindo
o
principio
constitucional da dignidade da pessoa humana. Além disso, o ordenamento jurídico
brasileiro não permite a aplicação de penas cruéis.
Em suma, conclui-se que a castração química é inconstitucional. Conforme
já explanado, o tratamento com psicoterapia é extremamente eficaz nos pedófilos.
Só assim haverá a melhoria na qualidade de vida do agente, de forma a evitar
recaídas e adequar a sua sexualidade. Ressocializar não é inconstitucional. O que é
inconstitucional é interferir na integridade física e não respeitar os princípios
constitucionais norteadores de nosso Direito.
37
MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º
ao 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. 5 ed. São Paulo:
Atlas, 2006, p.338.
76
NUNES, Bruna Luiza. A (in) constitucionalidade da castração química nos crimes sexuais. Revista Eletrônica de
Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Políticas da UNIVALI. v. 2, n.1, p. 61-79, 1º Semestre
de 2011. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN 2236-5044.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sob a perspectiva do que fora explanado, tem-se que no ordenamento
jurídico brasileiro não há um tipo penal definido para a pedofilia. O indivíduo portador
do distúrbio pode praticar atos que infrinjam regras de conduta, possuindo
capitulação através dos dispositivos penais legais, caso contrário, o pedófilo não
pratica crime algum. Dessa forma, não é por ser portador do distúrbio que o
indivíduo é criminoso, mas porque, em face ao distúrbio, comete um delito e por
conseqüência recebe o tratamento pertinente.
Contudo, a pedofilia é um distúrbio que requer tratamento, o cárcere não
reabilita, mas sim auxilia a alimentar desejos que o agente possa vir a executar
quando obtém a liberdade. Deve-se aplicar a medida de segurança, no sentido de
reabilitar o infrator.
Como programas de ressocialização de pedófilos, há o Ambulatório de
Transtornos de Sexualidade da Faculdade de Medicina do ABC e o Centro de
Estudos e Atendimento de Abuso Sexual do Hospital das Clínicas da Universidade
Federal de Minas Gerais, instituições que realizam tratamentos, objetivando a
ressocialização dos pedófilos.
Verifica-se também a previsão da castração química no âmbito da legislação
mundial, sendo já aplicada em alguns países/estados como: os estados americanos
da Califórnia, Flórida, Geórgia, Iowa, Louisiana, Montana, Oregon, Texas e
Wisconsin; a Polônia; Israel; França e Inglaterra. A província argentina de Mendonza
e a Coréia do Sul aprovaram neste ano legislação acerca da castração química.
No Brasil, já foram apresentadas quatro propostas de lei. Em 2002, o
deputado Wigberto Tartuce (PPB-DF) apresentou o Projeto de Lei n°7.021 que
fixava como pena exclusiva a castração com recursos químicos para os crimes de
estupro e atentando violento ao pudor que se encontra arquivado. Em 2007, foi
apresentado o Projeto de Lei nº552, de autoria do senador Gerson Camata também
arquivado, em 07/01/2011. Em março de 2011, a Assembléia Legislativa de São
Paulo recebeu um projeto de lei do deputado Rafael Silva (PDT) propondo a
castração química para pedófilos, utilizando hormônios como medida terapêutica e
temporária de forma obrigatória. Ao final do mês de maio de 2011, o senador Ivo
77
NUNES, Bruna Luiza. A (in) constitucionalidade da castração química nos crimes sexuais. Revista Eletrônica de
Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Políticas da UNIVALI. v. 2, n.1, p. 61-79, 1º Semestre
de 2011. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN 2236-5044.
Cassol propôs o projeto de lei que altera o artigo 98 do Código Penal prevendo a
aplicação de medida de segurança através de tratamento químico hormonal aos
condenados por pedofilia (artigos 217-A, 218 e 218-A do Código Penal). Atualmente,
o projeto está tramitando no Senado Federal.
Todavia, a castração química fere os princípios da dignidade da pessoa
humana e da legalidade sendo, portanto inconstitucional no ordenamento jurídico
brasileiro.
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS
ASSEMBLEIA analisa castração química. Estadão.com.br, São Paulo, 31
mar.2011. Disponível em:
<http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110331/not_imp699716,0.php>.
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07 nov.2010. .
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2011. Disponível em: <http://legis.senado.gov.br/mate-pdf/90990.pdf>. Acesso em:
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78
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79
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