Texto de apoio ao curso de Especialização Atividade física adaptada e saúde Prof. Dr. Luzimar Teixeira SARA INTRODUÇÃO A Síndrome de Angústia Respiratória Aguda (SARA) tem como expressão clínica, alterações da permeabilidade da membrana alvéolo capilar, com extravasamento de plasma para o interior dos alvéolos resultando com isto, no desenvolvimento de edema pulmonar não-hidrostático. A literatura nos traz relatos de descrição de uma situação de colapso pulmonar agudo em feridos durante a primeira Guerra Mundial. Na década de 20 Osler descreveu sua fase inicial, no entanto os estudos não foram aprofundados. Moon em 1931 descreveu pacientes que tinham falecido com quadros de atelectasia congestiva do pulmão. Burford no final da 2ª Guerra Mundial relatou achados de edema agudo de pulmão e insuficiência respiratória em soldados que tinham sido feridos durante o combate. Jenkins em 1950 descreveu pela primeira vez um quadro compatível com SARA em vítima de acidente. Braer relacionou em 1960 a circulação extracorpórea com edema agudo de pulmão não cardiogênico. Porém com a evolução da medicina favorecendo maior suporte de vida conseguiu-se uma melhor descrição desta patologia. Em 1967 Asbaugh e Petty publicaram um artigo no Lancet onde denominaram esta patologia com a denominação de SARA como uma nova patologia clínica que foi observada em 12 pacientes no Hospital de Denver, Colorado. Esta síndrome era caracterizada por: 1 - Uma hipoxemia refratária mesmo a altas frações inspiradas de oxigênio.(FiO2). 2 - Radiografia de tórax com infiltrado bilateral difuso e heterogêneo. 3 - Necessidades de altas pressões para conseguir-mos ventilar este paciente. 4 - PaO2 que responde a utilização de PEEP. 5 - Complacência estática baixa. SINONIMIA: Em decorrência de haver sido descrita por um número grande de autores, que valorizaram pontos específicos da lesão, também é conhecida por Sindrome: do pulmão branco, do pulmão de choque, do pulmão úmido(WET LUNG), da atelectasia congestiva, do pulmão de Da Nang, da insuficiência respiratória aguda póstraumática, da doença da membrana hialina do adulto, do pulmão de circulação extra-corpórea, da hipoxemia refratária, do edema pulmonar não cardiogênico, do edema pulmonar não hemodinâmico, atelectasia hemorrágica, pulmão pós-perfusão, sofrimento pulmonar progressivo, pulmão transplantado, pneumonia plasmocelular, hiperventilação hipóxica. ETIOLOGIA: A Sindrome de Angústia Respiratória Aguda não é causada por uma única etiologia, pois ela representa a via final comum de resposta a um grupo imenso de agressões que acometem os pulmões. Existem várias condições clínicas que irão atuar como fatores predisponentes e/ou desencadeantes da SARA, tais como: Choque - hemorrágico, séptico, cardiogênico e anafilático. Traumatismos torácicos e não torácicos. Queimaduras. Embolia gordurosa, líquido amniótico. Infecção - Sepse, SRIS, pneumonia, tuberculose. Inalação de gases tóxicos. Aspiração de conteúdo gástrico (aspiração de material com pH menor que 2,5 tende a causar lesão pulmonar) Afogamento ( o surfactante é lavado pela água salgada ou destruído pela água doce, podendo causar lesão alveolar osmótica direta) Ingestão de drogas. Causas metabólicas (uremia, cetoacidose diabética) Diversas ( pancreatite, pós-cardioversão, múltiplas transfusões, CID, eclâmpsia, carcinomatose, infarto intestinal) . FISIOPATOLOGIA: A lesão primária da SARA esta localizada na membrana alvéolo-capilar, estas células (endoteliais) realizam a produção e a degradação de prostaglandinas, metabolizam aminas vasoativas, convertem angiotensina I em angiotensina II, produzem em parte, fator VIII. O pneumócito tipo I forra a parede dos alvéolos e é através deles que ocorre a troca gasosa. O pneumócito II é caracterizado por possuir muitos corpos lamelares que produzem o surfactante. Com a lesão teremos uma série de eventos fisiopatológicos que irão culminar com um quadro de insuficiência respiratória aguda. Existem vários mediadores circulantes envolvidos com o mecanismo da lesão da barreira alvéolo-capilar: Vários trabalhos mostram que um fator desencadeante levaria a migração dos macrófagos, a liberação do fator de necrose tumoral (FNT), a liberação interleucina 1, 6, e 8,a liberação fator ativador de plaquetas(FAP), radicais livres e proteases. Qualquer um dos fatores citados acima ativaria a cascata do ácido aracdônico que produziria icosanóides (prostaglandina, tromboxano e leucotrieno), ativando também a coagulação e o sistema de complemento. Todo este processo culminando com a lesão da membrana alvéolo-capilar. FASES NA SARA: Fase 1 ; Lesão inicial ou aguda. Caracterizada por taquicardia, taquipnéia, e alcalose respiratória, Rx do tórax normal. Fase 2 ; Período de latência. Esta fase dura em média 6-48 horas após a lesão, paciente clinicamente estável, persiste hiperventilação, nota-se queda progressiva da PaO2 e hipocapnia, ocorre aumento do trabalho respiratório, notamos aumento do gradiente alveolo-arterial, aumenta o Shunt podendo chegar até 20%, a complacência diminui pouco, aparece pequenas alterações no exame físico e na radiografia de tórax Fase 3 ; Insuficiência respiratória aguda. Caracterizada por intensa taquipnéia e dispnéia, Diminuição da complacência pulmonar, Radiografia de tórax com condensações alveolares difusas e heterogêneas, Hipoxemia refratária a elevadas concentrações de O 2 mostra deterioração pulmonar (requer ventilação mecânica com PEEP), Shunt pulmonar elevado, PaCO2 começa a elevar-se. Fase 4 ; Anormalidades severas. Nesta fase notamos hipoxemia grave que não responde ao tratamento, Shunt pulmonar bastante elevado e acidose respiratória e metabólica. CRITERIOS DIAGNÓSTICOS: Petty quando descreveu SARA estabeleceu critérios diagnósticos a serem usados para diagnóstico de síndrome. CLÍNICOS: Evento súbito: pulmonar e não pulmonar. Dispnéia: aumento do trabalho respiratório. Taquipnéia: freqüência respiratória > 20 incursões/minuto. RADIOLÓGICOS: Varia de acordo com a fase, inicialmente infiltrado intersticial e posteriormente infiltrado alveolar FISIOLÓGICOS: PaO2 < 50mmHg em vigência de FiO2 > 60%, complacência menor que 50ml/mbar, aumento do Shunt e do espaço morto. ANATOMO PATOLÓGICOS: Pulmões pesados > 1.000g Atelectasia congestiva. Membrana hialina. Fibrose. PROGNÓSTICO: Está relacionado com a hipoxemia sobrevida Hipoxemia responsiva FiO2>0,5 PaO2< 75 61% PEEP>5 31% FIO2>0,6 PEEP>5PaO2 <50 8% FIO2=1,0 PaO2< 50 PEEP>5 8% FIO2=1,0 PaO2< 45 PEEP>5 0% Murray e Mathay elaboraram o IAP índice de agressão pulmonar tomando quatro critérios básicos que são: Escore para Avaliação da Gravidade da SARA VALOR RADIOGRAFIA DE TÓRAX Nenhuma condensação alveolar 0 Condensação alveolar em 1 quadrante 1 Condensação alveolar em 2 quadrantes 2 Condensação alveolar em 3 quadrantes 3 Condensação alveolar nos 4 quadrantes 4 HIPOXEMIA PaO2/FiO2 >= 300 0 PaO2/FiO2 de 225-299 1 PaO2/FiO2 de 175-224 2 PaO2/FiO2 de 100-174 3 PaO2/FiO2< 100 4 COMPLACÊNCIA DO SISTEMA RESPIRATÓRIO(quando ventilado) >= 80 0 60-79 1 40-59 2 20-39 3 <= 19 4 PRESSÃO EXPIRATÓRIA FINAL POSITIVA (PEEP) (Quando ventilado) <= 5 0 6-8 1 9-11 2 12-14 3 > 15 4 Obs.: soma-se todos os pontos e divide-se pelo numero de itens TRATAMENTO: Desde o inicio da descrição desta síndrome até os dias de hoje não temos um tratamento farmacológico, o que temos de concreto são medidas de suporte de vida. E como a insuficiência respiratória compromete as trocas gasosas, é importante ter sempre em mente que o objetivo final do organismo é a respiração tecidual, que de um lado encontramos a oferta de oxigênio aos tecidos e do outro lado esta a capacidade dos tecidos em extrair este oxigênio. O nossa objetivo é tentar restaurar esta função que encontra-se comprometida, para isto devemos lançar mão de algumas condutas. * Utilizar PEEP( manter alvéolos abertos) através da curva pressão-volume e ajustar com 2 cm/H20 acima do primeiro ponto de inflexão. Quando por algum motivo não conseguimos o ponto de inflexão poderemos utilizar uma PEEP "empirica" elevandoa de 2 em 2 cm/H20 observando a hemodinâmica do paciente, ajustando este valor antes de a complacência estática começar a decrescer. * Utilizar volumes correntes de 4 a 7 ml/Kg, tendo sempre o cuidado de não permitir Pressões de Platô acima de 35cm/H20 ou Pressões de Pico acima de 40cm/H20. (manter pressões intra torácicas as mais baixas possíveis) * Freqüência respiratória entre 12 e 22 ipm. * Fazer uso de modos ventilatórios que tiver maior familiaridade e segurança para o paciente, dando preferência aos modos que determinam menor pressão nas vias aéreas, associado a um fluxo em rampa decrescente. * Evitar assincronia entre paciente e respirador. * Manter paciente sedado e/ou curarizado. * Manter PaCO2 na faixa entre 40 e 80mmHg, elevações na PaCO 2 podem ser tolerados pelo organismo desde que não esteja ocorrendo hipoxemia. Tolerar pH até 7.20, níveis acima deverão ser corrigidos com bicarbonato. * Em pacientes portadores de hipertensão intracraniana, coronariopatia grave ou naqueles em que os níveis de PaCO2 estão bastante elevados deveremos lançar mão da insuflação de gas traqueal. O uso desta técnica deverá ser utilizada por pessoal treinado devido aos riscos de hiperinsuflação pulmonar e ressecamento das secreções. * Em caso da necessidade de altos FiO2 (acima de 50%), com níveis elevados de PEEP, poderemos tentar relação inversa iniciando 1:1 aumentando progressivamente para 2:1, 3:1 usando sempre o modo de pressão controlada até atingirmos níveis adequados de ventilação. Para a utilização desta manobra se faz necessário a monitorização da hemodinâmica com cateter de Swan-Ganz, de respirador microprocessado assim como de domínio da técnica. * Vigilância do Débito cardíaco - a PEEP altera o retorno venoso e com isto o débito cardíaco. * Manter hematócrito em níveis superiores a 30% para uma melhor oferta de O2 aos tecidos. * Manutenção da volemia adequada com infusão de soluções cristalóides, devendo ser evitadas reposições com colóides. * Coibir infecção com uso de antibióticos. * Fazer uso de drogas vasoativas - não existe uma padronização devemos lançar mão das drogas de acordo com a necessidade do caso. * Correção do equilíbrio ácido básico. * Nutrição - a alimentação enteral tem prioridade sobre a parenteral salvo quando houver contra-indicação. A enteral diminui as possibilidades de translocação bacteriana. O gasto energético destes pacientes é enorme, e se eles permanecem sem suplemento nutricional adequeado mais difícil será superar o quadro. Cuidado deverá ser observado para a oferta de carboidratos quando estes estiverem na fase de desmame, onde poderão apresentar elevação do coeficiente respiratório pelo aumento da produção do CO2 e dificuldade para excreção pelo pulmão comprometido. * Óxido nítrico - Administrado por via inalatória é um potente vasodilatador pulmonar com meia vida bastante pequena. * Surfactante usado em recém nascidos com doença hialina. * Corticosteróides - Alguns autores preconizam o seu uso em baixas doses nas fases do SARA em que predomina a inflamação, porém seu uso em altas doses não é indicado. * Prostaglandina - não apresentou melhora na sobrevida. * Almitrina - Mecanismo não completamente esclarecido, alguns trabalhos mostram melhora na troca gasosa porém pode aumentar a pressão na artéria pulmonar. * Pentoxifilina - aumenta o nível de AMP-cíclico, diminui o fator de necrose tumoral (TNF). BIBLIOGRAFIA: 1 -Knobel, E. et al Condutas no paciente grave. Livraria Atheneu. 1994. 2 -Júnior, J.O.C.A; Amaral,R.V.G., et al Assistência ventilatória mecânica. Livraria Atheneu.1995. 3 -Gonçalves, J. L.et al; Ventilação artificial. Editora lovise.1991. 4 - David, C. M. et al; Ventilação mecânica, Editora Revinter,1996. 5 -Revista brasileira de terapia intensiva, vol 6-número 1- Janeiro/março 1994