II Encontro da Sociedade Brasileira de Sociologia da Região Norte 13 a 15 de setembro de 2010 -, Belém (PA) Grupo de Trabalho: 5 Trabalho e Formas de Ocupabilidade na Amazônia Título do Trabalho: Organização Social dos Trabalhadores e Trabalhadoras no Município de Barcarena-Pará: o caso da Associação Agroextrativista Natureza e Arte do PA da Ilha São Mateus e Cafezal Autora: Profª. Msc. Roselene de Souza Portela Instituição: Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA), Universidade Federal do Pará (UFPa) Organização Social dos Trabalhadores e Trabalhadoras no Município de Barcarena-Pará: o caso da Associação Agroextrativista Natureza e Arte do PA da Ilha São Mateus e Cafezal Resumo: A Microrregião do Baixo Tocantins paraense desponta como um dos maiores produtores agrícolas do Estado e tal vocação é presente também na organização social, uma vez que grande parte da produção é repassada ao mercado consumidor através de associações e cooperativas de produção. Nesse sentido, a transferência de tecnologia social, tenta contribuir com o processo de organização social dos empreendimentos solidários, bem como, desenvolve ações de capacitação, formação e sensibilização dos grupos, pois é necessário que o grupo acredite na capacidade de transformação de cada um, reconhecendo que todo individuo pode adaptar-se a novas experiências e formas de ser e superar situações adversas em direção ao crescimento e desenvolvimento pessoal e social, contando com a parceria entre governo e sociedade. Assim, o objetivo do artigo é fazer uma reflexão acerca da organização social dos trabalhadores e trabalhadoras vinculados a Associação Agroextrativista Natureza e Arte do PA Ilha São Mateus e Cafezal, no município de Barcarena-Pará, no intuito de demonstrar as ações que o PITCPES vem desenvolvendo no mesmo, visando fortalecer os empreendimentos solidários. Sendo assim, o acompanhamento técnico teve como principal objetivo contribuir para a organização sócio-política e para o trabalho coletivo nos empreendimentos, bem como proporcionar as condições necessárias para a sustentabilidade sócioeconômica na perspectiva da economia solidária sobre os princípios do cooperativismo, possibilitando assim, a organização social de sujeitos da agricultura familiar na busca da melhoria da qualidade de vida, tendo em vista o combate as desigualdades sócio-econômicas e político-culturais que ali podem ser bastante visualizadas. Palavras-Chaves: Trabalho, empreendimentos solidários. economia solidária, organização social, 1. INTRODUÇÃO As transformações no mundo do trabalho vividas desde o final dos anos 1970 pelos países capitalistas, e os impactos daí resultantes sobre a reestruturação do processo produtivo, têm definido novas práticas produtivas, precarizam relações de trabalho, favorecem o desemprego, baixos salários e exigem novas qualificações dos trabalhadores. A reestruturação do processo produtivo trouxe novas técnicas de gestão e inovações tecnológicas em todos os ramos de produção, fazendo com que fosse reduzida a demanda por mão-de-obra. Percebe-se que o maior ônus destas transformações recaiu sobre a classe trabalhadora, que permaneceu no mercado através de atividades precárias ou que tem sofrido um processo crescente de exclusão do mundo do trabalho, principalmente dos postos de trabalho formais e estáveis. Nesse contexto, os trabalhadores se vêem diante de um novo padrão de acumulação capitalista, no qual valores da competitividade e do individualismo são reivindicados. Isto leva à necessidade de uma organização dos trabalhadores em outras bases produtivas e de gestão, pautadas na cooperação e no desenvolvimento de ações que gerem alternativas de trabalho e renda. As novas formas de organização do trabalho regem-se pelos princípios da solidariedade, ajuda mútua, colaboração, enfim, da busca da emancipação social. Estas experiências de organização social dos trabalhadores, que procuram romper com a lógica excludente do modo de produção hegemônico, têm-se mostrado viáveis, através da expansão em nível mundial. É neste cenário que surge a economia solidária, baseada na autogestão e na democracia participativa, que procura, a partir das relações sociais coletivas, vincular as diversas concepções e saberes da sociedade, implementando mecanismos de apoio mútuo e princípios da solidariedade, no que se refere tanto aos aspectos econômicos como sociais e ambientais. Para Nascimento (2004, p. 3), autogestão é uma relação de produção que se generaliza e se expande para todas as outras esferas da vida social, significa que os próprios produtores associados dirigem suas atividades e os produtos dela derivados . A autogestão é um modo de administrar empreendimentos coletivos solidários, por todos aqueles que nele estão inseridos, mas com a fundamental perspectiva de promoção da inclusão social, pela organização de cooperativas proporcionando oportunidades de desenvolvimento e interação dos trabalhadores com os diversos setores sociais. Assim, o presente artigo tem o propósito de fazer uma reflexão acerca da organização social dos trabalhadores e das trabalhadoras vinculados a Associação Agroextrativista Natureza e Arte do PA Ilha São Mateus e Cafezal, no município de Barcarena-Pará, no intuito de demonstrar as ações que o Programa Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares e Empreendimentos Solidários (PITCPES) vêm desenvolvendo no mesmo, visando fortalecer os empreendimentos solidários. 2. ORGANIZAÇÃO SOCIAL DE EMPREENDIMENTOS SOLIDÁRIOS: ADOÇÃO DE NOVOS PARADIGMAS O capitalismo, desde seu surgimento e expansão, vem avançando nas formas de organização da produção, revolucionando e disciplinando as formas de gestão da força de trabalho e conseguindo, assim, ampliar sua dominação mundial, através de novos processos de trabalho, tecnologias e materiais. Entretanto, a apropriação privada da produção, construída coletivamente, produz reflexos negativos na sociedade. O agravamento das desigualdades sociais é uma das faces do capitalismo, pois os bens produzidos e de interesse coletivo são de difícil acesso para a maioria da população. Neste contexto, o poder e a grande maioria das riquezas são usufruídos por parcela mínima da população, enquanto que as desigualdades são fundamentais para a ampliação do modelo e para legitimar a exclusão e a eliminação dos menos capazes (CATTANI, 2003). Nesse sentido, uma das alternativas existentes é a opção pelo desenvolvimento de empreendimentos econômicos solidários, pautados nos princípios da solidariedade e da cooperação. Entretanto, a materialização destas alternativas de enfrentamento da situação de vulnerabilidade social não se faz de maneira individual, mas através da decisão e posterior organização dos empreendimentos, para a construção de um projeto coletivo voltado para a geração de trabalho e renda e a melhoria das condições de vida dos integrantes, por meio da economia solidária. Talvez pela constatação de que, nos últimos anos, somando-se as diversas formas de resistência a um modelo econômico estruturalmente excludente e concentrador de renda, multiplicam-se as iniciativas das organizações populares diretamente empenhadas na criação de atividades econômicas como uma das formas de luta pela vida. São práticas que se vinculam ao mercado e enfrentam temas como trabalho, renda e políticas públicas. Diferentemente do que ocorria até há pouco tempo, estas iniciativas não se encontram à margem, mas na confluência dos fatos e análises que perpassam os movimentos sociais (KRAYCHETE, 2000, p. 25). A economia solidária é uma alternativa para o trabalhador e a trabalhadora, na qual se busca a valorização das pessoas que estão desempregadas e excluídas do mercado produtivo. É o povo excluído que vem tomando iniciativas com expectativas de satisfazer suas necessidades e abrir novos caminhos na vida , através do uso de suas próprias forças e recursos, associando-se a outros e organizando-se em grupos, associações e cooperativas (CULTI, 2002). Nesse contexto, a economia solidária viria como uma opção da inclusão social, por meio do trabalho, em que as atividades cotidianas de construção e produção do empreendimento iriam contribuir para a ação participativa da cidadania. Sendo assim, é necessário ampliar a atuação dos empreendimentos solidários, fortalecendo sua identidade, garantindo os direitos com responsabilidade e a autogestão das organizações. Os empreendimentos solidários valorizam a pessoa humana, como forma de expressão da economia solidária que pode até assumir formato de cooperativa, empresa autogestionária, rede e outras formas de associação para produção e/ou aquisição de produtos e serviços, o bem estar coletivo, no qual homens e mulheres são respeitados em suas especificidades, sem preconceito. O princípio básico é a solidariedade em produzir, comercializar, consumir e poupar, o que só virá acontecer se for organizada igualitariamente em uma associação entre iguais, sem competição e todos participam dos ganhos e das perdas (SINGER, 2002, p. 25). Nesse sentido, Castells (2006) ressalta que a construção de identidade dos atores sociais é um processo de construção de sentido a partir de um atributo cultural, político, social, ou de um conjunto coerente de atributos, que têm prioridade sobre todas as outras fontes. Assim, um mesmo indivíduo ou o mesmo ator coletivo pode ter várias identidades. Considera-se que a identidade de cada um de nós pode ser eventualmente segmentada em frações relevantes, por exemplo, a identidade étnica, nacional, regional, de classe, profissional ou familiar, mas também é proveniente dos grupos de sociabilidade em que se encontra inserido, do bairro que se habita, ou da comunidade de interesses a que se encontra associado. O que fundamenta as novas identidades é a experiência de vida comum que reúne o grupo e seu modo democrático de funcionamento que garante a autenticidade do grupo. Tratada deste modo, a formação de identidades novas parece produto apenas de vivência de carências comuns que explicitam, para todos os membros do grupo, uma mesma condição de dominação. Considerados como novos atores do cenário político e organizados a partir de novas identidades sociais e políticas, ultrapassam o quadro institucional vigente, exigindo o reconhecimento de categorias excluídas do jogo político e são, portanto, instrumentos de modificação deste jogo. Giddens (2002) compreende o termo identidade como um termo essencialmente moderno, e que se refere a articulação que o sujeito faz de diversas forças presentes na sociedade atual, sociedade esta caracterizada pela pluralidade de escolha e pelo individualismo exacerbado. Pode-se então dizer que, a identidade surge da negociação com o contexto, sendo necessário o entendimento da lógica deste contexto, ou seja, a compreensão da concepção de mundo atual no qual estamos inseridos. É nesse processo de reconstrução da identidade coletiva que surge um novo elemento como princípio norteador de uma nova prática, a solidariedade. Esse processo de construção da nova identidade é permeado com a construção de uma nova cultura política, em que os valores e crenças anteriores são substituídos por outros, surgindo o princípio da solidariedade em outra dimensão. Sendo assim, a organização social se transforma no referencial de ampliação das possibilidades de acesso de alguns segmentos dos setores produtivos dentro de uma perspectiva de desenvolvimento da sociedade civil e de fortalecimento dos mecanismos democráticos. Nesse contexto, torna-se necessário fortalecer as organizações solidárias, através das relações de valores de solidariedade e justiça, para que se tenha uma sociedade mais participativa. É necessário que as forças de trabalho se juntem, organizem-se como modo de produção, com liberdade individual, cumprindo a função de gerar uma renda para o cidadão, que possa ser entregue a todos que participam igualmente do meio de produção do empreendimento solidário. Os empreendimentos solidários vêm se constituindo como uma alternativa para a crise do emprego, pois são responsáveis pela criação de novas formas de distribuição de renda e de gestão, a partir da participação de todos nas sobras e na tomada das decisões, e tendem a estabelecer relações de cooperação entre si, através do estabelecimento de redes de trabalho, troca de informação, ajuda-mutua, comercialização, feiras, entre outras atividades, na busca por soluções conjuntas, contanto com o apoio de instituições parceiras, universidades, governos municipais e estaduais para a viabilização e fortalecimento das experiências. Dessa maneira, a economia solidária é construída coletivamente, através da participação dos integrantes em todos os processos decisórios, por meio do direito à democracia, liberdade e autogestão de cada um e do empreendimento, tendo na força do próprio trabalho a maior riqueza das suas organizações e nos princípios da solidariedade e cooperação o diferencial das relações sociais que estabelecem. A economia solidária estabelece uma forma diferente nas relações de trabalho e apropriação da renda, permitindo a atuação conjunta de seus integrantes e o partilhamento igualitário tanto do trabalho como do resultado deste. Daí que, com base no compartilhamento dos bens, pode-se dizer que a economia solidária contribui para uma organização social mais justa e mais igualitária. 3. FORMAS COLETIVAS DE PRODUÇÃO: O CASO DA ASSOCIAÇÃO AGROEXTRATIVISTA NATUREZA E ARTE DO PA DA ILHA SÃO MATEUS E CAFEZAL A Microrregião do Baixo Tocantins paraense desponta como um dos maiores produtores agrícolas e agroextrativistas do Estado e tal vocação é presente também na organização social, uma vez que grande parte da produção é repassada ao mercado consumidor através de associações e cooperativas de produção (ver mapa 1). Mapa 1: Microrregião do Baixo Tocantins Fonte: IBGE, 1998 O município de Barcarena1, situado à margem esquerda do Rio Murucuça e a direita do Rio Pará, até o ano de 1980, era um município totalmente agroextrativista, 1 Em 2007, Barcarena possuía cerca de 78.005 habitantes, segundo dados da Secretaria de Estado de Planejamento, Orçamento e Finanças do Pará (SEPOF), sendo que destes 34.235 vivem na área urbana e 43.770 vivem em áreas rurais. sua população em torno de 14.000 mil habitantes, vivia basicamente do extrativismo; do barro para fabricação de cerâmicas; do açaí; do látex da seringa e da pesca artesanal, além de cultura branca para subsistência milho, arroz, mandioca etc. A própria sede do município apresentava-se pouco expressiva diante da quantidade reduzida de habitantes que abrigava, conforme gráfico 1. 44% 2000 56% 47% 53% 1991 1980 POP. URBANA POP. RURAL 34% 67%8 14% 1970 86% 4% 1960 96% 2% 1950 0% 98% 20% 40% 60% 80% 100% 120% Gráfico 1: População Rural e Urbana de Barcarena entre 1950 e 2000 Fonte: IBGE/2000. A disparidade entre a população rural e a população urbana na década de 1950 demonstra a predominância da população rural com um percentual de 98,1% em relação à população urbana com apenas 1,9 %. Esta situação mudou com a implantação do primeiro empreendimento na década de 1980, quando a população urbana apresentou gradativamente índices mais elevados em relação à população rural, bem como, a população total do município apresentou altas taxas de crescimento. Com a construção da barragem da Usina Hidrelétrica de Tucuruí (UHT), nos anos de 1980, o município entra na rota do desenvolvimento acelerado e desordenado culminando com a implantação do projeto Albrás/Alunorte/Porto de Vila do Conde. A partir de então, os trabalhadores e as trabalhadoras rurais e seus familiares sofreram grandes impactos em sua forma orgânica de vida. As mudanças provocadas pelo desenvolvimento do município de Barcarena com a chegada desses projetos, através das desapropriações sem critérios, sem indenização justa, mudanças bruscas de hábitos e costumes da cultura, levaram muitos pescadores e agricultores das áreas de várzea e de terra firme, extrativistas, a transformarem-se em operários braçais da construção civil absorvidos pelas indústrias para o desenvolvimento de atividades secundárias, ganhando baixos salários. Esses impactos no modo de vida da população ocasionaram um verdadeiro desastre social, econômico, cultural e ambiental. O sindicato dos Trabalhadores Rurais da Agricultura Familiar, a partir do ano 1985, ciente dos problemas que os afligia, firmou parceria com a Universidade Federal do Pará (UFPA), através do curso de Serviço Social, Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Pará (FETAGRI), Central Única dos Trabalhadores (CUT) e Organizações não-governamentais no sentido de capacitar os trabalhadores e trabalhadoras por meio de debates, palestras, seminários etc., com o objetivo de promover a conscientização necessária às mudanças na forma da produção rural do município de Barcarena. Mais recentemente, firmou parceria com o PITCPES/ICSA/UFPA no sentido de fazer parte das ações de incubação. As reivindicações e lutas sociais durante esses anos trouxeram conquistas significativas em relação ao direcionamento de políticas públicas para os agricultores e as agricultoras familiares, a exemplo do crédito agrícola. No entanto, era necessário o fortalecimento e a organização dos mesmos de forma participativa e organizada. Os agricultores e as agricultoras familiares apresentam uma produção extrativista sustentável por meio de projetos de manejos, tendo a partir do ano de 2003, trabalhado com a certificação orgânica dos açaizais dos cooperados. A experiência da certificação concretiza-se como um produto a mais a ser agregado à produção e comercialização do açaí (Euterpe olaracea Mart). Culturalmente, o açaí é de grande importância para a população local, tendo inclusive sua identidade relacionada ao consumo da fruta que hoje se transformou em símbolo do Estado como um todo, uma vez que ele, além de maior produtor, constitui-se também em maior consumidor, tendo todo um imaginário já descrito em Andrade (2004). No município de Barcarena, além da produção e comercialização do açaí, que é o carro-chefe do município, existem outros produtos que são comercializados, dentre eles destacam-se a produção e comercialização de produtos advindos do agroextrativismo e do artesanato em cerâmica. Nesse sentido, a Associação Agroextrativista Natureza e Arte do PA da Ilha São Mateus e Cafezal (Natur Art), objeto de estudo desse trabalho, destaca-se como um dos principais empreendimentos solidários incubados pelo PITCPES. A associação foi fundada em 22 de julho de 2005 e, de acordo com seu Estatuto, tem como objetivo melhorar as condições de vida de seus associados e de seus familiares, dando condições dignas de trabalho, vida e moradia, por meio de cursos profissionalizantes e projetos de desenvolvimento sustentáveis. A Natur Art possui 152 associados, compreendendo cerca de 300 famílias residentes na Ilha de São Mateus e Cafezal. Os trabalhos realizados pela associação foram: elaboração e implementação, em conjunto com o INCRA, de projeto de assentamento para os agricultores e agricultoras da Ilha de São Mateus e Cafezal; cursos profissionalizantes; construção de forno para queimar as peças em cerâmica; dentre outros. As principais dificuldades a serem superadas relacionam-se ao desempenho na área da gestão, principalmente para a melhoria das habilidades de negociação e técnicas de venda, pois o processo de comercialização ainda é bastante complexo, sendo considerado como um dos principais entraves junto à falta de recursos dos produtores. Destacam-se, também, as dificuldades de infra-estrutura no transporte que inviabilizam em muito o intuito de se atingir um bom planejamento da produção. Dessa maneira, a gestão de empreendimentos solidários dos pequenos produtores/agricultores rurais na Amazônia, e em especial no Estado do Pará, mais precisamente no município de Barcarena, vem recebendo apoio do Programa Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares e Empreendimentos Solidários (PITCPES/ICSA/UFPA) e da Fundação Interuniversitária de Estudos e Pesquisas sobre o Trabalho (REDE UNITRABALHO), como co-executora, desde o ano de 2006. As ações do PITCPES, vinculado ao Instituto de Ciências Sociais Aplicadas (ICSA) da Universidade Federal do Pará (UFPA), direciona-se à inclusão social, por meio da geração de trabalho e renda; democratização do acesso ao crédito, fortalecimento da agricultura familiar, estímulo do associativismo e do cooperativismo e a organização de negócios com soluções sustentáveis, inclusivas e participativas e, que visa assim, contribuir para melhores condições de vida dos agricultores e das agricultoras da Região do Baixo Tocantins. Nesse sentido, vários projetos foram desenvolvidos na região com o objetivo de incubar os empreendimentos solidários, articulados em redes de comercialização, que deverão resultar no fortalecimento da unidade produtiva de beneficiamento de produtos oriundos da cadeia produtiva da fruticultura e agroextrativista, na perspectiva da economia solidária e da segurança alimentar e nutricional em busca do desenvolvimento de organizações associativistas com sustentabilidade econômica e social de caráter auto-gestionário, articulado às políticas públicas de geração de trabalho e renda. As ações que foram desenvolvidas buscaram criar alternativas concretas de inclusão sócio-econômica dos trabalhadores por meio do acesso à produção. O processo de incubação tem como pressuposto pedagógico a educação popular, centrada na concepção freireana. Segundo essa perspectiva pedagógica, o processo educativo é realizado a partir do universo do próprio educando, isto é, de palavras geradoras que emergem do cotidiano, as quais passam a fazer parte dos ciclos de debates coletivos, facilitando o aprendizado, ao tratar de questões que tocam a realidade dos pequenos produtores e produtoras rurais e seus familiares. A atuação do PITCPES teve como perspectiva dar visibilidade a uma revolução silenciosa que vem alterando concretamente as condições de vida no campo, mostrando que é possível criar alternativas de desenvolvimento diferentemente da trajetória histórica de financiamento do Estado-nação aos grandes projetos, que trouxeram na realidade, a pobreza no campo, ao externalizar os recursos naturais superabundantes que poderiam potencializar dinâmicas produtivas de valorização da vida e não de desterritorialização das riquezas locais para reterritorializá-las em outros países, agregando valor e, conseqüentemente, padrões de vidas estáveis nos países desenvolvidos. Diante de tudo, a transferência de tecnologia social, tenta contribuir com o processo de organização social dos empreendimentos solidários, bem como, desenvolve ações de capacitação, formação e sensibilização dos grupos, pois é necessário que o grupo acredite na capacidade de transformação de cada um, reconhecendo que todo individuo pode adaptar-se a novas experiências e formas de ser e superar situações adversas em direção ao crescimento e desenvolvimento pessoal e social, contando com a parceria entre governo e sociedade. A partir desses avanços e do aumento da produção advindo das mudanças na forma de produzir, deparam-se com novos desafios que é a comercialização e o mercado. Assim sendo, os trabalhadores e as trabalhadoras rurais, por meio das ações do programa PITCPES, puderam receber de forma organizada e coletiva/participativa conhecimentos e assistência técnica articulada com o processo produtivo, que pudessem de fato, promover o desenvolvimento sustentável de suas unidades produtivas. No município de Barcarena, mais precisamente na Natur Art, o PITCPES desenvolveu uma série de ações que visavam fortalecer os empreendimentos solidários. Nesse sentido, o acompanhamento técnico teve como principal objetivo contribuir para a organização sócio-política e para o trabalho coletivo nos empreendimentos, bem como proporcionar as condições necessárias para a sustentabilidade sócio-econômica na perspectiva da economia solidária sobre os princípios do cooperativismo e do associativismo, possibilitando assim, a organização social de sujeitos da agricultura familiar na busca da melhoria das condições de vida, tendo em vista o combate as desigualdades sócio-econômicas e político-culturais que ali podem ser bastante visualizadas. Foram realizados diversos cursos de capacitação no intuito de munir os cooperados/associados do empreendimento com conhecimentos sobre comercialização e mercados, gestão e planejamento, contabilidade, e manipulação de alimentos. Assim, a capacitação/formação e a assistência técnica propostas pelas ações de incubação, tornaram-se um momento de reflexão coletiva, em que a participação de todos favoreceu a construção de conhecimento básico sobre as temáticas acima, tendo em vista a melhoria do desempenho da economia rural, como meio de fomentar a produção de excedentes para combater a fome e, ao mesmo tempo, potencializar a geração de trabalho e renda, garantindo, assim, a permanência dos agricultores e agricultoras familiares no campo. A metodologia de incubação buscou a atualização do conhecimento dos participantes em novas tecnologias para a construção de um know-how sobre a gestão participativa da agricultura familiar na perspectiva de estruturação da agroindústria baseada em princípios agroecológicos. A garantia da sustentabilidade sócio-econômico-ambiental é outro eixo central para se estabelecer o diálogo entre os diferentes níveis de formação, instrução e saberes dos participantes, ao se valorizar seus conhecimentos histórico-culturais. No que diz respeito ao desenvolvimento local pode-se destacar que há uma efetiva participação das redes técnicas, políticas e institucionais na produção de uma dinâmica potencializada pelos empreendimentos solidários. Isso pode ser caracterizado como uma estratégia de inovação, nas quais formas de cooperação e integração das cadeias produtivas e das redes sociais desenvolvem-se, ampliando oportunidades para geração de trabalho e renda. Para José Silva (1985), um fator importante para o desenvolvimento da agricultura é a implementação da inovação tecnológica na agricultura. Entretanto, esse mecanismo não é suficiente para captar o desenvolvimento da mesma e suas relações com a sócioeconomia. Dessa maneira, novas formas de organização e gestão de empreendimentos solidários indicam a construção de um novo processo de desenvolvimento rural, cuja sustentabilidade depende da capacidade dos trabalhadores e trabalhadoras rurais em planejar a intervenção na realidade local, de modo a possibilitar a implementação de ações na perspectiva do desenvolvimento econômico, social e ambiental sustentável. Assim, as formas de organizações sociais e da produção, por meio de associações/cooperativas, têm ganhado força quando se apresentam como alternativas de trabalho e renda. A estratégia da economia solidária, nesse sentido, se fundamenta na tese de que as contradições do capitalismo criam oportunidades de desenvolvimento de organizações econômicas cuja lógica é oposta à de seu modo de produção sem ocorrer no entanto, fora deste mesmo sistema. Conforme afirma Monteiro (2003, pág. 13): Enquanto fator de gestão, observa-se o caráter econômico e teórico desses empreendimentos autogestionários. Assim, não se pode esquecer que, seja uma cooperativa, uma associação de produtores, um empreendimento familiar, uma micro-empresa, etc., o empreendimento vai estar inserido no sistema capitalista e precisará sobreviver nele, sem, contudo, trilhar o mesmo caminho que este sistema segue, tanto no que diz respeito ao seu padrão de acumulação, quanto nos elementos que vão levar a um processo de heterogestão do empreendimento. Construindo-se dentro de novos princípios e valores, deve este ser pautado pelos fundamentos da decisão democrática e coletiva, mas também da distribuição igualitária da renda gerada no referido empreendimento solidário. A economia solidária é um valioso instrumento de combate à exclusão social, pois apresenta-se como uma alternativa viável para a geração de trabalho e renda e para a satisfação direta das necessidades de todos, demonstrando que é possível organizar a produção e a reprodução da sociedade de modo a eliminar as desigualdades materiais e difundir os valores da solidariedade humana. A economia solidária é, também, um projeto de desenvolvimento integral que visa a sustentabilidade, a justiça econômica e social e a democracia participativa. Assentada em redes de colaboração solidária entre os diferentes setores da sociedade organizada, ela exige o compromisso dos poderes públicos com a democratização do poder, da riqueza e do saber, e estimula a formação de alianças estratégicas entre organizações populares para o exercício pleno e ativo dos direitos e responsabilidades da cidadania, exercendo sua soberania por meio da democracia e da gestão participativa. 4. À GUISA DE CONCLUSÃO A Economia Solidária apresenta-se como uma alternativa a um modelo de desenvolvimento que produz riquezas gerando miséria, subordinando e explorando o trabalho e a natureza. No final do século XX, a economia solidária ressurge e se fortalece num contexto de crise do mundo do trabalho. Os altos índices de desemprego e precarização das relações de trabalho contribuem para o alargamento da pobreza e da miséria de parcelas significativas da população. A reestruturação produtiva baseada nos avanços tecnológicos e nos modelos de gestão intensificadores de trabalho alterou de forma rápida e intensiva o mercado e as condições de trabalho. Milhões de postos de trabalho foram extintos. Direitos sociais conquistados pelas lutas das classes trabalhadoras foram flexibilizados e eliminados. As condições de sub-emprego fragilizaram ainda mais a proteção de milhões de trabalhadores. Assim, os trabalhadores e trabalhadoras que foram excluídos do mercado de trabalho procuram e desenvolvem formas alternativas de produção e organização do trabalho, que possuem em suas práticas a cooperação, ajuda mutua, solidariedade, entendida como empreendimentos solidários. Os empreendimentos solidários se configuram como novos espaços de geração de trabalho e renda e de melhoria das condições de vida. Promovem as condições para a satisfação das necessidades básicas dos seus membros, contribuem para a diminuição das desigualdades sociais e para a propagação dos valores solidários e cooperativos na sociedade. Nesse sentido, a partir das mudanças ocorridas no processo de organização e gestão dos empreendimentos solidários, fruto das parcerias que foram estabelecidas, pode-se inferir que a organização dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, sob forma de trabalho coletivo, possibilitou o acesso a tecnologias, financiamento público para pequenos agricultores familiares e favoreceu a criação de uma rede de negócios em escala ampliada, visando dar sustentabilidade econômica, social e ambiental aos empreendimentos solidários e ao processo produtivo estabelecidos em regiões como a Amazônia, particularmente, o Território Rural do Baixo Tocantins. Referências ANDRADE, Lúcia C. G. Gestão Ambiental e políticas públicas para o açaí: experiência na ilha Trambioca, Barcarena/PA. Belém, 2004 56 f. Monografia (Especialização em Gestão Ambiental. Núcleo de Meio Ambiente NUMA Universidade Federal do Pará, 2004). CASTELLS, Manuel. O Poder da Identidade. In: CASTELLS, Manuel. 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