UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE DEPARTAMENTO DE SAÚDE PÚBLICA XIV CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA CRISTIANE ORTEGA LUTKE ECONOMIA SOLIDÁRIA E O CONCEITO AMPLIADO DE SAÚDE FLORIANÓPOLIS (SC) 2012 CRISTIANE ORTEGA LUTKE ECONOMIA SOLIDÁRIA E O CONCEITO AMPLIADO DE SAÚDE Monografia apresentada ao XIV Curso de Especialização em Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Saúde Pública. Orientador: Prof . Dr. João Luiz Dornelles Bastos FLORIANÓPOLIS (SC) 2012 UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE DEPARTAMENTO DE SAÚDE PÚBLICA XII CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM SAÚDE PÚBLICA ECONOMIA SOLIDÁRIA E O CONCEITO AMPLIADO DE SAÚDE CRISTIANE ORTEGA LUTKE Essa monografia foi analisada pelos professores e julgada e aprovada para obtenção do grau de Especialista em Saúde Pública no Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 19 de abril de 2012. Profª Dra. Jane Maria de Souza Philippi Coordenadora do Curso Prof. Dr. João Luiz Dornelles Bastos Orientador do trabalho Prof. Prof. Dr. Alcides Milton da Silva Membro da Banca RESUMO O movimento da Economia Solidária surgiu no Brasil no início da década de 1990. Atualmente, engloba diversas experiências de produção, crédito, consumo e comercialização, norteados por princípios de cooperação, desenvolvimento sustentável, democracia participativa, autogestão e igualitarismo. A presente monografia pretende apresentar conceitos e descrever o fenômeno da Economia Solidária, bem como suas relações com o conceito ampliado de saúde. Trata-se de um levantamento bibliográfico com base em material publicado em livros, revistas, teses e dissertações. A Economia Solidária ultrapassa a questão da empregabilidade. Contudo, viabilizar os princípios da Economia Solidária, juntamente com o conceito ampliado de saúde e suas relações com a promoção da saúde, tende a gerar uma melhora significativa do padrão de vida dos participantes nos empreendimentos e lhes proporciona uma inserção social mais justa e igualitária, entendida como produtora de saúde. Palavras-chave: Economia solidária. Promoção da saúde. Sistema Único de Saúde. Conceito de saúde. Reforma sanitária. Conceito ampliado de saúde. Determinantes sociais da saúde e Iniquidades em saúde. SÚMARIO 1 1.1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................6 OBJETIVOS......................................................................................................7 1.1.1 Objetivo geral..................................................................................................7 1.1.2 Objetivos especificos .....................................................................................7 1.2 JUSTIFICATIVA................................................................................................8 1.3 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA................................................................8 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA..............................................................................10 2.1 ECONOMIA SOLIDÁRIA ................................................................................10 2.2 O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SUS .........................................................16 2.3 CONCEITO AMPLIADO DE SAÚDE ..............................................................18 3 DISCUSSÃO......................................................................................................21 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................27 REFERENCIAS.........................................................................................................29 INTRODUÇÃO A motivação para pesquisar sobre o movimento social da Economia Solidária se deu durante a realização do curso de especialização em Saúde Pública, oferecido pela Universidade Federal de Santa Catarina, no ano de 2011. Durante a apresentação de seus conteúdos, alguns conceitos foram ganhando destaque, no que se refere à determinação do processo saúde-doença, com ênfase nas iniquidades em saúde, determinantes vinculados aos comportamentos individuais e às condições de vida e trabalho. Ao se referir a este processo, tornou-se indispensável contemplar as contribuições do meio social, devendo-se relacioná-las com processos que envolvem a população na obtenção de saúde com qualidade, conforme o disposto pela Organização Mundial de Saúde (OMS): saúde como o estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas como ausência de doença (FERREIRA; MAGALHÃES, 2007). O mundo capital apresenta-se injusto e excludente, no qual predomina um contexto com elevado grau de violência e desarmonia de vida. Observa-se um país de enormes mazelas e exclusões, com a característica de uma realidade onde muitos são explorados em demasia, por meio de sub-condições de existência e trabalho e, por outro lado, poucos detendo enormes privilégios e oportunidades. Uma conjuntura de vida presente na maioria dos cidadãos brasileiros (DAL RI, 2010). Segundo Barfknecht (2005), em resposta a esta realidade, surge o cooperativismo para abrandar o desemprego, os excluídos do mercado (idosos, os de pouca qualificação ou experiência profissional, os discriminados por raça ou gênero). Este modelo de autogestão assume papel importante nas possibilidades de (re)inserção social. A partir da década de 1980, o aumento de desemprego e pobreza, provocou o aumento do número de experiências de autogestão, em que os trabalhadores surgem coo-participativos dos meios de produção. Para resgate do bem comum, promove-se, por exemplo, os valores e princípios da Economia Solidária. Desse modo, o presente trabalho versa sobre a a Economia Solidária e suas possíveis relações com o conceito ampliado de saúde. Portanto, ao abarcar um conceito ampliado de saúde que preconize o bem-estar, procurou-se, através de revisão de literatura, avaliar de que forma a Economia Solidária pode contribuir no processo de construção de condições de saúde populacionais mais humanas e igualitárias. Essencialmente, o trabalho trata da importância da Economia Solidária como foco humanizador, com perspectivas de cooperação, solidariedade e autogestão e os benefícios que pode trazer à saúde da população. OBJETIVOS 1.1.1 Objetivo geral Revisar a literatura sobre o conceito de Economia Solidária e sua relação com a concepção de saúde em seu sentido ampliado. 1.1.2 Objetivos especificos • Descrever o fenômeno da Economia Solidária; • Descrever o conceito ampliado de saúde; e • Analisar a viabilidade dos princípios da Economia Solidária, juntamente com o conceito ampliado de saúde e suas relações com a promoção da saúde. JUSTIFICATIVA O presente trabalho busca tratar do desenvolvimento coletivo e social humano frente à saúde, influenciado por princípios pautados no social solidário. Segue-se uma linha política socialista, defendendo o trabalho e a saúde para o desenvolvimento da sociedade na busca pela cidadania. Este trabalho busca averiguar se é possível referenciar a Economia Solidária como passível de articulação com o Sistema Único de Saúde (economia e saúde). Para tanto, se fez necessário pesquisar conceitos, fatos e argumentos, frente à saúde em relação à Economia Solidária, concebendo esta última com uma abrangência maior, e não somente na aplicabilidade pratica dos seus princípios (cooperação, solidariedade e autogestão) ou na produção de renda "suficiente" para seus cooperados. A abrangência maior, supracitada é especificamente no que se refere às possíveis contribuições para a saúde da sociedade, na mudança que acarretam para seus próprios protagonistas, na possibilidade de deixar estigmas de classificação social, criando vínculos sociais, na sua perspectiva de inclusão e estes sendo sujeitos das suas escolhas. Pesquisar essa relação entre Economia Solidária e o conceito ampliado de saúde é inaugurar pensamentos e quebrar paradigmas ideológicos (capitalismo e ou socialismo), importante contribuição para ampliar a visão de saúde pública. CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA Trata-se de pesquisa bibliográfica que, segundo Vergara (2000, p. 48), corresponde ao “estudo sistematizado, desenvolvido com base em material publicado em livros, revistas, jornais [...], isto é material acessível ao público em geral”. O levantamento de bibliografias foi efetuado na base de dados LILACS (Literatura Latino-Americana em Ciências de Saúde) e Google Acadêmico. Utilizouse de palavras-chaves; “promoção da saúde”, “Sistema Único de Saúde”, “conceito de saúde”, “reforma sanitária”, “conceito ampliado de saúde”, “determinantes sociais da saúde”, "iniquidades em saúde" e "Economia Solidária". Com este procedimento, foram encontrados diversos artigos, dissertações, relatórios e publicações. Houve o cuidado para se trabalhar com as publicações mais recentes. O método de inclusão das publicações na revisão incluiu leitura dinâmica de seus resumos, índices e sumários, e julgamento da relevância, com base na identificação das palavras-chave supracitadas. 2 2.1 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ECONOMIA SOLIDÁRIA São inúmeras lutas em prol da dignidade e emancipação humana, como também o desenvolvimento e sustentabilidade de uma produção social e econômica mais justa, viável e equilibrada, aquém das explorações, desarmonias e exclusões do sistema capitalista (OLIVEIRA, 2011). A Economia Solidária tornou-se uma ferramenta de lutas e debates, frente às diversas formas de exclusão social. É caracterizada por um modo inovador e diferente de se vender, produzir, trocar e comprar, necessário para se viver. Desenvolve-se no respeito a toda forma de vida, fomentando uma construção de relacionamentos sociais com princípios e valores, fundamentados na ética e relações harmônicas. Esta economia se apresenta como alternativa de geração de renda e trabalho, a favor da inclusão social. Compreende práticas econômicas e sociais organizadas (cooperativas, clubes de troca, associações, redes de cooperação, empresas autogestionárias, entre outras), que realizam atividades de prestação de serviços, produção de bens, finanças solidárias, comércio justo, trocas e consumo solidário (BRASIL, 2010b). No entendimento de Oliveira (2011, p. 46), a Economia Solidária é uma prática democrática com cooperação, participação, solidariedade, sustentabilidade e respeito à vida, pautada em princípios que buscam respeitar a produção social e as relações humanas. [...] São práticas econômicas e sociais, que são contra as discrepâncias do Capitalismo, se organizando sob a forma de cooperativas, associações e empreendimentos autogestionárias, entre outros apoiadores que realizam atividades de produção de bens, prestação de serviços, trocas, comércio justo e consumo consciente. Tendo como pauta o cooperativismo, a busca pela Economia Solidária tem origem em pensadores como Saint-Simon, Owen, Fourier e Blanc, preconizadores da união dos trabalhadores em cooperativas para construção de sociedades socialistas. Ações no campo da Economia Solidária possibilitam geração de trabalho e renda, com organização e relações de trabalho fundamentadas em princípios cooperativistas (GUIMARÃES; MACIEL; EIDELWEIN, 2007). Segundo pensamentos de Singer (2003) e Guimarães; Maciel e Eidelwein (2007): O cooperativismo operário surgiu das lutas de resistência contra a Revolução Industrial, ao longo do século XIX e XX. Robert Owen foi um importante iniciador do movimento socialista, que, diferentemente de seus contemporâneos, sempre buscou testar suas proposições na prática social e econômica [...] O desenvolvimento das idéias de Owen visava encontrar alternativas, trazer melhores condições de trabalho nas fábricas ou (re)inserir os trabalhadores na produção, possibilitando ganhos e, através desses, poder de consumo. Desta forma, o cooperativismo tinha, em seu início, a pretensão de ser um modo de produção alternativo ao capitalismo, razão pela qual foi denominado de "cooperativismo revolucionário", configurando a origem histórica da economia solidária (apud TAGLIAFERRO, 2011, p. 32). Com ideias alternativas para melhoria do poder de consumo, em 1832, Owen criou a "Bolsa de Trabalho", para fomentar o intercâmbio entre cooperativas a partir de movimentos sindicais, através da circulação de mercadorias com preços justos (SINGER, 2003). Em 1844, é fundada a cooperativa “Pioneiros Equitativos de Rochdale”, com princípios de igualdade política, autogestão, neutralidade política e religiosa, livre entrada e saída do quadro social, educação cooperativista, divisão das sobras. Teve significado êxito econômico e social, tendo seus princípios adotados pela Inglaterra e outros países (MASCARENHAS, 2010). Na década de 1980, a economia solidária surgiu no Brasil, num contexto de redemocratização, grave crise econômica e elevado índice de desemprego da população de baixa renda. Experiências cooperativistas de economia solidária combinaram-se com iniciativas de desenvolvimento local (redes sociais de comercialização e articulação, grupos informais, associações, clubes de trocas e compras, centros públicos de economia solidária, etc.) (MASCARENHAS, 2010). No final do século XX, a economia solidária passa dar atenção a diversos espaços, com sua inclusão no sistema socioeconômico de associações de trabalhadores e cooperativas autogestionárias, promovendo a satisfação de todos os envolvidos. Esta economia se apresenta como alternativa de geração de renda e trabalho, a favor da inclusão social. Compreende práticas econômicas e sociais organizadas que realizam atividades de prestação de serviços, produção de bens, finanças solidárias, comércio justo, trocas e consumo solidário (BRASIL, 2010b).Constitui, também, reposta organizada à exclusão, uma posição política, ideológica e ética, apontando para uma sociedade com solidariedade (SINGER, 2005). A década de [19]90 foi marcada por iniciativas de políticas públicas voltadas a esta economia com o objetivo de gerar trabalho e renda para as pessoas que estavam excluídas do mercado de trabalho. Em seguida, surgiu o interesse das Universidades por este campo, dando inicio à sua atuação por meio das Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares (ITCPs) e, posteriormente, com a Rede Unitrabalho, uma rede de universidades para discutir, estudar e desenvolver ações voltadas ao mercado de trabalho [...] Há diversas iniciativas que demonstram a busca pela construção e efetivação da economia solidária. Algumas entidades e, agora, o governo federal tem criado Centros Públicos de Economia Solidária para que se faça possível o diálogo constante com a comunidade, de forma a se concretizar como política pública (TAGLIAFERRO, 2011, p. 36). Em 1999, publica-se a Lei n° 9.867 dispondo sobre a criação e funcionamento de cooperativas sociais, para inserção de pessoas no mercado de trabalho em desvantagem no mercado econômico (BRASIL, 1999). A trajetória cooperativista no Brasil evidencia dois tipos de iniciativas econômicas: a primeira, relativa a empreendimentos, pouco se diferencia de empresas tradicionais em sua hierarquização de relações no trabalho; a segunda, cooperativas fraudulentas, onde trabalhadores não são donos dos meios de produção e do poder de decisão. Por essas razões, a fim de evitar as duas situações citadas anteriormente se faz necessário a participação da economia solidária como cooperativas populares , com princípios consagrados pelo movimento, sendo a autogestão considerada o principal deles (CORTEGOSO, 2007). A busca pela legitimação da economia solidária como política social pública, desencadeou-se: [...] a partir do I Fórum Social Mundial (FSM) realizado em 2001, na cidade de Porto Alegre, o qual possibilitou a formação do Grupo de Trabalho Brasileiro (GT), que reivindicou a criação da Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES) [...] Em 2002 foi realizada a I Plenária Nacional de Economia Solidária em São Paulo, na qual tiveram início o debate sobre a criação do Fórum Nacional de Economia Solidária e a construção da Carta de Princípios. Durante o III Fórum Social Mundial em Porto Alegre, em 2003, realizou-se a II Plenária, com o propósito de mobilizar apoiadores da economia solidária em todos os estados brasileiros para a criação do Fórum Nacional [...] em 2003 foi realizada a III Plenária Nacional em que se criou o Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES) com a finalidade de direcionar a política de economia solidária no Brasil [...] Neste mesmo momento, também criou-se, no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), a SENAES com a Lei n° 10.683, de 28 de maio de 2003 e Decreto n° 4.764, de 24 de junho de 2003 (TAGLIAFERRO, 2011, p. 36-37). A Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES) desenvolveu o Sistema de Informações em Economia Solidária (SIES), constituindo o sistema de registro e identificação dos empreendimentos econômicos solidários e entidades de apoio no Brasil. O sistema orienta-se pelos preceitos da Portaria de 20 de março de 2006, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) n°. 30, que mapeia os empreendimentos solidários existentes, reconhecendo e fortalecendo experiências de geração de trabalho e renda (BRASIL, 2006b). Por meio do Decreto n° 5.811 de 21 de junho de 2006, criou-se o Conselho Nacional de Economia Solidária, passo importante para o avanço na política pública (Poder Público Federal), com representações de diversos ministérios e setores da sociedade civil, com criação de instrumentos permitindo a participação mais direta da sociedade civil e integração de ações interministeriais. Em Brasília, 2006, ocorreu a I Conferência Nacional de Economia Solidária (CNAES) precedida por 90 préconferências locais, regionais e estaduais, representando importante espaço de interlocução entre governo e sociedade civil no desenvolvimento de princípios, diretrizes, estratégias e prioridades políticas voltadas a esta economia (BRASIL, 2010b). A II Conferência Nacional de Economia Solidária ocorreu em junho de 2010, tendo como objetivos: Realizar um balanço dos avanços, limites e desafios da economia solidária e das políticas públicas de economia solidária no atual contexto socioeconômico, político, cultural e ambiental nacional e internacional; Avançar no reconhecimento do direito a formas de organização econômica baseadas no trabalho associado, na propriedade coletiva, na cooperação, na autogestão, na sustentabilidade e na solidariedade; Propor prioridades, estratégias e instrumentos efetivos de políticas públicas e programas de economia solidária, com participação e controle social; e promover o conhecimento mútuo e a articulação dos Poderes Públicos, das organizações e sujeitos que constroem a economia solidária" (BRASIL, 2009, p. 3). Apresentando-se atualmente como política oficial do governo brasileiro, a Economia Solidária é um movimento organizado em resposta à exclusão por raça, idade, gênero, estilo de vida e instrução, entre outros fatores, de indivíduos inseridos no mundo do trabalho. As entidades de apoio e assessoria à Economia Solidária desenvolvem diversas ações junto a empreendimentos econômicos solidários como: incubação, assessoria, capacitação, assistência técnica e organizativa. Dentre essas entidades, encontram-se ONGs, órgãos governamentais, universidades, entre outras instituições (BRASIL, 2010d). Segundo descreve Tagliaferro (2011, p. 12), dentro das universidades há projetos para: Organizar e qualificar os desempregados históricos a fim de possibilitar a entrada desses excluídos no mercado formal de trabalho por meio da construção de cooperativas ou de empresas autogeridas. As incubadoras possuem o papel de assessoria, desde o nascer do empreendimento, oferecendo cursos de qualificação, ou seja, viabilizando a troca de saberes entre a universidade e os grupos excluídos da sociedade, além de facilitar o acesso ao crédito e aos recursos materiais, importantes para a formação do empreendimento solidário [...] a criação das incubadoras surgiu como uma das possíveis respostas a esta necessidade, e como mecanismo de aproximação da população excluída, tanto em busca de melhor conhecer suas necessidades e saberes, quanto para promover a transformação do conhecimento produzido dentro das universidades em comportamentos humanos [...] desenvolvem o papel de fomento aos empreendimentos por meio de uma metodologia de intervenção junto à realidade social [...] recebem apoio do PRONINC da SENAES, o qual tem se mostrado uma das experiências de maior sucesso no enfrentamento de realidades extremamente adversas em áreas de grande nível de pobreza e desemprego, pois traz como objetivo o apoio, a consolidação e ampliação das incubadoras e o fomento aos processos de criação e acompanhamento de cooperativas populares. Mello et al. (2010) ressaltam que esta rede possibilita a troca de experiências, melhora da metodologia de incubação e participação no movimento nacional. Formas alternativas de geração de renda constituem sua principal motivação. A estruturação de diversos valores e princípios e o processo das causas de movimentos de Economia Solidária apresentam várias conquistas, participação e apoio. Agentes participativos como: empreendimentos, cooperativas, associações grupos autogestionários, além de órgãos e entidades que apoiam o fortalecimento desta causa. No intuito de beneficiar a formação, organização e difusão desta causa, há o apoio de institutos e gestores públicos como, por exemplo, o Fórum de Economia Solidária (FBES), a Secretaria Nacional de Economia Solidária do Ministério do Trabalho e Emprego (SENAES/MTE) e o Centro de Apoio de Desenvolvimento Tecnológico (CDT) (OLIVEIRA, 2011). Nesse contexto, há discussão quanto à sua importância, bem como à formação em Economia Solidária, preparo e multiplicação desta. O fato é que já se apresentam alguns cursos formadores, entre eles, curso realizado na Faculdade de Economia (FE) da Universidsde de Brasília (UnB), promovido com intuito de ampliar e melhor difundir estes princípios e valores (OLIVEIRA, 2011). Os valores e princípios que regem a Economia Solidária são demasiadamente amplos e estão em constate aperfeiçoamento e desenvolvimento, com organização, ampliação e articulação dos agentes participativos, movimentos e apoiadores desta causa empolgante (OLIVEIRA, 2011). A Economia Solidária aponta para uma lógica de desenvolvimento sustentável, gerando trabalho e distribuição de renda, mediante crescimento econômico protegendo recursos naturais e valorizando o ser humano, oposto à exploração do trabalho e recursos naturais. Logo, esta economia representa um conjunto de formas de organização e atividades econômicas com as seguintes características: viabilidade econômica, cooperação, autogestão e solidariedade; complementares e não funcionando de forma isolada (BRASIL, 2010a). Os princípios do cooperativismo e economia solidária, segundo Tagliaferro (2011, p. 32-33), consistem em: Adesão livre e aberta; gestão e controle democrático dos cooperados; participação econômica dos cooperados; autonomia e independência; educação, formação e informação; intercooperação e interesse pela comunidade. Princípios estes que se assemelham aos da economia solidária [...] O conceito desta economia está associado a práticas de consumo, comercialização, produção e serviços, que defendem a solidariedade, democracia, autogestao, cooperação, promoção do desenvolvimento humano, responsabilidade social, produção e consumo éticos com o intuito de conferir cidadania, trabalho e renda a estas pessoas. A cooperação é entendida como interesses e objetivos comuns do grupo, em que ocorre a união coletiva das capacidades e esforços, de forma a compartilhar os resultados e responsabilidades em todas as situações (BRASIL, 2006b). A solidariedade é dada como uma categoria dos tempos modernos, revolucionando a ordem econômica, preocupa-se permanentemente com justa distribuição de resultados e melhoria da condição de vida de seus participantes; comprometida com o meio ambiente saudável e com o bem-estar do trabalhador e consumidor, estimula a solidariedade com prática de autogestão, poder democrático e compartilhado na tomada de decisões, e pratica de solidariedade com as classes desfavorecidas (BRASIL, 2006b). Sobre a Economia Solidária e autogestão, Tagliaferro (2011, p. 34), descreve como: uma forma organizacional de empreendimentos coletivos caracterizada "como processo em construção do trabalho e da relação entre as pessoas, buscando resgatar o dimensionamento humano, envolvendo sujeitos que produzem e decidem". A autogestão é uma forma de organização, onde todo individuo participante possui igual direito a voz e voto, garantindo sua atuação nas decisões daquilo que lhe pertence, apresentando um caráter multidimensional (social, econômico, político e técnico). Apesar de todos os avanços alcançados pelo movimento de Economia Solidária, tem-se desafio de consolidar uma política pública na qual integrem-se diferentes setores e órgãos governamentais, sendo parceiros com a sociedade civil, de modo a apoiar e fomentar o cooperativismo social no Brasil (BRASIL, 2010a). 2.2 O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SUS O Sistema Único de Saúde (SUS) se deu pelo Movimento da Reforma Sanitária Brasileira, processo político em que a sociedade exigiu novas políticas e ações, que constituíram em arranjo organizacional do Estado, efetivando a política de saúde como direito de cidadania e dever do Estado no Brasil (CAMPOS et al., 2008). O Movimento Sanitário surgiu na década de 1970, questionando as ações de prevenção e controle de doenças que não considerassem relações sociais de exploração (ARREDONDO, 1992). No Brasil, anos 1980, a saúde assume uma dimensão política com vínculo direto com a democracia. Cessado o regime militar, o movimento sanitário se fortalece com a Nova República, assumindo posições estratégicas em instituições de saúde pública. Em 1986, em Brasília, convoca-se a 8a Conferência Nacional de Saúde (OLIVEIRA, 2009). Conforme descreve Araújo (2011, p. 16): Este importante marco histórico para a saúde brasileira contou com a participação de cerca de 5000 pessoas de diversos movimentos sociais e de saúde, trabalhadores, usuários, estudantes, parlamentares, sindicatos, entre outros. Debateram-se os princípios e as diretrizes da Reforma Sanitária, o conceito ampliado de saúde, o reconhecimento da saúde como dever do Estado e direito de todos, a criação de um Sistema Único de Saúde, a descentralização e a hierarquização dos serviços, a atenção integral às necessidades de saúde da população e a participação popular. [...] A partir desta conferência, onde o movimento da Reforma Sanitária teve seu auge, foi instituída uma Comissão Nacional de Reforma Sanitária para o encaminhamento das propostas â Assembléia Nacional Constituinte. Com a nova Carta Magna do país, em 1988, institui-se um Sistema Único de Saúde, buscando atendimento a todos. Nesse sentido, para garantir a todo cidadão uma assistência e cuidado, tomou-se como motivo principal, organizar um sistema de saúde único e hierarquizado. Tal processo de rompimento com a política anterior acontece com a Constituição de 1988, onde instituiu-se o SUS como Política Nacional de Saúde e consolida os ideais do visionário Movimento Sanitário (ROSA; LOPES, 2011). A ideologia dos princípios doutrinários do SUS são: a universalidade, garante a saúde a todo indivíduo e o Estado deve assegurá-lo; a integralidade afirma que o usuário é um todo, devendo ser tratado pela articulação da saúde e seus profissionais de todas as áreas da saúde; e a equidade, que é tratar os desiguais com justiça social (OLIVEIRA, 2009). O SUS é uma política pública que envolve diferentes setores da sociedade civil e do estado desde sua concepção até a sua plena implantação. Segundo a Constituição Federal de 1988, artigo 196, a saúde é um dever do Estado e direito de todos, “garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário as ações e serviços para promoção, proteção e recuperação”. Para tanto, instituiu-se a Lei Orgânica 8.080/1990, onde o Ministério da Saúde definiu Agenda de Compromisso pela Saúde: Os pactos em Defesa do SUS, em Defesa da Vida e o de Gestão. O da Vida constitui-se de conjunto de compromissos sanitários a tornarem-se prioridades nos três entes federativos e, definição das responsabilidades de cada um. Uma destas prioridades é o aprimoramento do acesso dos serviços prestados pelo SUS. 2.3 CONCEITO AMPLIADO DE SAÚDE Da compreensão da saúde simplesmente como ausência de doenças, resultou o legado de um quadro nacional de inúmeras desigualdades, insatisfação dos usuários, como também resoluções limitadas frente ao processo saúde, dentre muitos outros (SUS, 2012). O conceito ampliado de saúde, tomado como direito, está descrito em Batistella (2008, [s.p.]): [...] a saúde é a resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiento, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso aos serviços de saúde. Sendo assim, é principalmente resultado das formas de organização social, de produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos níveis de vida. Para o mesmo autor, a saúde compreendida como uma necessidade cuja satisfação: [...] associa-se imediatamente a um conjunto de condições, bens e serviços que permitem o desenvolvimento individual e coletivo de capacidades e potencialidades, conformes ao nível de recursos sociais existentes e aos padrões culturais de cada contexto específico (BATISTELLA, 2008, [s.p.]). Reportando-se com ênfase a análise descrita acima, o conceito ampliado de saúde esvazia referência às especificidades psíquicas e biológicas da enfermidade. Nesta perspectiva, a promoção da saúde ganha espaço em debates acadêmicos e nas políticas públicas mais abrangentes (BRASIL, 2006). Assim, conforme descreve Batistella (2008, p. 82), a saúde deve ser: [...] compreendida em seus múltiplos aspectos. Ela nunca será redutível a qualquer de suas dimensões, seja ela biológica, psicológica, individual ou coletiva, objetiva ou subjetiva. Objeto complexo, requer instrumental teórico de nova ordem, não mais referenciado á epistemologia positivista, analítica, e sim a partir de uma perspectiva transdisclpllnar, totalizante. Estendendo o conceito de saúde à esfera social e compreendendo a saúdedoença num processo coletivo, tal enfoque, segundo Minayo (2002, p. 181-2), indica: [...] a necessidade de recuperar o sentido do 'lugar' como o espaço organizado para a análise e intervenção, buscando identificar, em cada atuação específica, as relações entre as condições de saúde e seus determinantes culturais, sociais e ambientais, dentro de ecossistemas modificados pelo trabalho e pela intervenção humana. Ao enfatizar e colocar em evidência as desigualdades encontradas nas condições sociais em que os cidadãos vivem e trabalham, essas desigualdades são injustas e inaceitáveis, chamadas de iniquidades. O papel dos determinantes sociais frente ao fenômeno do adoecimento humano levou muitos países a reformularem suas estratégias e preocupações com as iniquidades em saúde. Logo, a equidade em saúde passou ser definida aos gradientes de poderes econômicos, sociais e políticos acumulados (BRASIL, 2008). Como resultante do processo de embates políticos, o conceito ampliado de saúde abarca um diagnóstico em que o setor da saúde brasileira historicamente enfrentou as mais diversas dificuldades, e reverter este quadro implica extrapolar muitos dos limites restritivos existentes (SUS, 2012). Ações de integralidade e as relações de trabalho no campo da saúde coletiva tendem evidenciar-se como responsáveis pelas condições de saúde. Como seus pressupostos temos a saúde mental e o trabalho. Abordar a saúde mental integrada à saúde do trabalhador leva a propor o trabalho como constitutivo de adoecimento e de saúde mental, o que para Barfknecht (2005, p. 23). O trabalho que, em diferentes circunstâncias, preside à constituição de formas de desgaste e sofrimento mental, conforme a situação, tanto poderá fortalecer a saúde mental quanto levar a distúrbios que se expressarão coletivamente em termos psicossodais e ou individuais, em manifestações psícossomáticas ou psiquiátricas. 3 DISCUSSÃO Compreende-se a saúde como resultante das condições em que as pessoas vivem (incluindo agentes patológicos, alimentação, higiene, lazer, trabalho, moradia, renda, assistência médica, entre outros), fatores que venham interferir no dia-a-dia do indivíduo, provocando-lhe questionamentos e desmotivações (BECHARAMAXTA, 2012). Diante das condições de saúde de grande parte da população, agravadas pelas condições de trabalho, sobrevivência, moradia e acesso às políticas públicas, a efetivação da saúde prevista na Constituição Federal de 1988, direito universal, só acontecerá quando se desmercantilizar a saúde, incentivar-se formas não lucrativas na produção de serviços e criar as condições necessárias à construção de uma nova consciência sanitária (ELIAS, 2004). A saúde, com dimensão política e coletiva, possibilita questionar relações de poder, alterar e organizar situações e normas estabelecidas que agridem psíquica ou fisicamente, trazem sofrimento e insatisfação e, produzir novas maneiras de viver e trabalhar. Para Dejours (1999), trabalhadores que possuem proteções sociais (funcionários de grandes empresas), em contrapartida exige-se maior produtividade, disciplina e disponibilidade, sob constante tortura de desemprego. Esse sistema capitalista, compromete a saúde dos seus colaboradores, com péssimas condições e organização do trabalho. Essa situação de sentir-se explorado e a pressão referente às condições e organização do trabalho podem desestabilizar a saúde mental do trabalhador. Uma gestão solidária deve promover uma organização social e econômica que consiga romper o individualismo e propor o coletivo nas relações de mercado. É primordial vivenciar o trabalho como atividade que possibilite emancipar, criar e solidarizar. O que, para Albuquerque (2003, p. 20), “o empreendimento da economia solidária constitui-se em conjunto de práticas sociais que se caracterizam pela natureza democrática das tomadas de decisão, que propiciam a autonomia de um coletivo” No mesmo viés, Barfknecht (2005, p. 31) assevera que: A saúde mental do trabalhador traz mobilidade para buscar e estruturar seus afazeres, constituir relações mais democráticas de gestão, estabelecendo novas formas de divisão do trabalho, menos alienantes e mais produtivas. A saúde mental no trabalho é possível quando, no cotidiano dos trabalhadores, pelas suas ações e movimentos, eles buscam melhores condições para organizar o trabalho e para viver. Portanto, pode-se inferir que a saúde indica a possibilidade de mudar situações que provocam sofrimento e adoecimento no trabalhador. O que para Canguilhem (1990 apud BARFKNECHT, 2005, p. 24), “a saúde é a possibilidade de ultrapassar a norma que define o normal momentâneo, a possibilidade de tolerar infrações à norma habitual e de instituir novas normas em situações novas - potentadas na conexão dos diversos elementos e dos modos de produzir e trabalhar. ”. Os empreendimentos solidários frente à saúde e trabalho, para Barfknecht (2005, p. 41): A forma associativa nos empreendimentos solidários se estabelece pela vinculação dos trabalhadores da economia solidária com as atividades que executam, as condutas, os comportamentos, as vivências de sofrimento/prazer, a organização do trabalho e as relações sociais. Esses aspectos referem-se à saúde mental dos trabalhadores e aos modos de viver o trabalho. O desafio para compor relações que promovam a saúde mental no trabalho está em possibilitar ao sujeito e ao coletivo transformar criativamente seu trabalho. A relação entre saúde mental e trabalho refere-se à organização do trabalho, ou seja, à divisão das tarefas, ao seu conteúdo e a divisão dos trabalhadores no espaço de trabalho (funções, competências, relacionamentos...). A divisão de tarefas promove o interesse e o sentido do trabalho entre os trabalhadores através do modo operatório, enquanto a divisão de homens se refere às relações entre os trabalhadores, aos investimentos afetivos, ao amor, ódio, amizade, solidariedade, confiança. A Economia Solidária objetiva promover o conhecimento e desenvolvimento sobre o fazer do trabalhador, recuperando a propriedade e o controle sobre os meios de sua atividade. O trabalho se recompõe no encontro solidário social entre os trabalhadores, com integração e cooperação coletiva (BARFKNECHT, 2005). É oportuno destacar que processos autogestionários não são simples mecanismos participativos (consultas, conselhos, eleições). Condicionam a conquista de igualdade no poder de gestão, frente ao direito de controle coletivo sobre meios sociais de produção, e não, trabalhadores assalariados como simples executores materiais (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 2004). O Brasil está assistindo e assimilando mudanças sociais extremas no tocante às novas relações de trabalho e tendências de mercado, que direcionam para uma reestruturação produtiva, atrelado a sua atual condição de enfrentamento às questões de pobreza e desigualdade social. Nos meios produtivos, percebe-se o surgimento de vias alternativas de renda e trabalho, trazendo inovações nas racionalidades de produção e disposições sociais com a revalorização do trabalho voltado para a autossuficiência. A situação emergencial dos empreendimentos econômicos solidários frente aos princípios de autogestão e cooperativista, “configura-se, dessa forma, como uma saída ao desemprego e à geração imediata de renda, articulando ações de proteção social no cotidiano de vida dos trabalhadores.” (BECHARA-MAXTA, 2012). Conforme pesquisa apresentada por Butzke e Santana (2008), em sua revisão teórica e bibliográfica sobre os propósitos das políticas públicas para a Economia Solidária, implementadas pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico, assim apresentam seu parecer concluso: Por fim, em que pese as divergências nas percepções dos atores pesquisados, não se pode afirmar que as políticas de fomento à economia solidária levadas a efeito pela SDE são ações assistencialistas, mas que se constituem em meio para possibilitar o trabalho e a renda, sem desconsiderar a emancipação dos indivíduos enquanto participantes de coletivos produtivos conscientes do seu papel no desenvolvimento local e sustentável; cabendo, portanto, à célula de economia solidária, com apoio institucional, promover ações para mitigar as limitações e avançar nas conquistas em prol do movimento (BUTZKE; SANTANA, 2008, p. 112). No controle estatal nacional, ao confeccionarem-se políticas públicas para a saúde, surgiram mudanças significativas, apropriando-se de paradigmas inovadores para operacionalizar os fenômenos sociais (saúde e doença pessoal e coletiva). Criticamente, conceber uma saúde baseada “na lógica cartesiana do modelo biológico e hegemônico, determinado pela dissonância entre saúde-doença, constitui processos produtivos em saúde que se expressam nas relações de poder entre Estado e sociedade.” (ROSA; LOPES, 2011, p. 16). A promoção da saúde nos espaços de Economia Solidária leva a questionar o envolvimento no processo autogestionário e mudança de atitude, em vários setores frente à implementação social, política e econômica para viabilizar diversos empreendimentos. Disposições para promover a saúde podem-se configurar pela possibilidade de organizar e acompanhar juntamente com trabalhadores, os processos de autogestão e seus impactos na saúde e, reorientar o sistema de saúde para ampliar as ações de assistência ao trabalhador (BARFKNECHT, 2005). Segundo Freitas (2003 apud BECHARA-MAXTA, 2012, [s.p.]), os empreendimentos econômicos solidários na promoção da saúde relacionam-se a(o): 1) superação das desigualdades econômicas, sociais, ambientais, políticas e culturais através do acesso e cobertura dos serviços de saúde; 2) criação de alternativas em saúde orientadas a combater as enfermidades causadas pela pobreza e daquelas decorrentes da urbanização e industrialização; 3) reafirmação da democracia nas relações sociais; 4) desenvolvimento integral e recíproco dos seres humanos. Tais empreendimentos constituem novos contextos de reflexão e práticas em saúde. Portanto, ainda segundo Bechara-Maxta (2012, [s.p.]): Tais agrupamentos possibilitam o desenvolvimento de ações que envolvam as problemáticas resultantes das condições de vida do grupo, em parceria com profissional de saúde. ampliando assim a lógica de assistência da doença para a as intervenções nas questões que qualificam e promovam o estado de saúde dos sujeitos, capacitando-os no que se refere à autonomia e participação para a percepção dos agravos, acidentes e estratégias de resolução de seus problemas cotidianos no trabalho. Diz-se que, a doença e todas as suas consequências psicológicas apresentam maiores dificuldades em se lidar, onde o emocional dos indivíduos doentes eleva-se e resulta em maior evidência. Há de se entender que bem-estar psicológico possui papel protetor quanto ao dinâmico ponto de equilíbrio entre doença e saúde. Onde a necessidade de inclusão da “análise da função na vida diária, produtividade, desempenho de papéis sociais, a capacidade intelectual, estabilidade emocional e bem-estar, tem emergido como uma parte crucial da investigação clínica e de assistência ao paciente.” (FAVA; SONINO, 2012, p. 2). No sentido de constituir iniciativas visando garantir aos indivíduos considerados doentes (com transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas), onde ocorre situação de internação com longa permanência, para garantia de cuidado integral e direitos com a promoção do exercício de cidadania e progressiva inclusão social; instituiu-se a portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011, com estratégias de desinstitucionalização, inclui os serviços residenciais terapêuticos, moradias inseridas na comunidade destinadas a acolher pessoas egressas de internação de longa permanência, de hospitais psiquiátricos e hospitais de custódia, entre outros. A portaria nº 3.088, em seu art. 7º e parágrafo único, apresentam o componente psicossocial reabilitador composto por iniciativas de gerar trabalho e renda/empreendimentos solidários/cooperativas sociais. As ações destinadas à reabilitação psicossocial, por meio da inclusão produtiva, formação e qualificação para o trabalho devem articular sistematicamente as redes de saúde e de economia solidária com os recursos disponíveis no território para garantir a melhoria das condições concretas de vida, ampliação da autonomia, contratualidade e inclusão social de usuários da rede e seus familiares.1 Sendo o conceito de saúde abrangente impreciso e dinâmico não deve trazer impedimento para tomá-lo como eixo na reorientação de práticas de saúde. Mas sim, sua importância é primordial para conceber uma superação de um modelo medicalizante, biologicista e prescritivo (BATISTELLA, 2008). A promoção da saúde destaca duas tendências. Segundo Bechara-Maxta (2012, [s.p.]), uma trata a saúde como “um componente das propostas de desenvolvimento e a atribuir um valor de mercado, de forma a articular às políticas de ajustes estrutural, de caráter intersetorial”. A outra ocorre: [...] em paralelo aos fatores de riscos de adoecimentos e acidentes e a condutas de comportamento sociais as questões sociais em saúde. Esta última tendência possui como motivação central o desenvolvimento de habilidades individuais e comunitárias orientadas a suprimir as questões levantadas pela população, bem como à reorientação dos serviços de saúde - de forma a superar os modelos biomédicos de atenção da 1 Disponível em: <http://www.brasilsus.com.br/legislacoes/gm/111276-3088.html>. Acesso em mar. 2012. doença/assistência individual [...] para a responsabilidade pela redução das doenças e prolongamento da vida dos indivíduos [...] Deste modo, a promoção da saúde busca articular políticas públicas e as ações profissionais em conjunto com os sujeitos, tendo como foco os condicionantes do processo de adoecimento e saúde das populações. Dentro deste preâmbulo contextual, os empreendimentos econômicos solidários abarcam um certo conjunto de organizações humanas (empresas, associações, cooperativas, projetos comunitários) com iniciativas socioeconômicas diversas (solidariedade, cooperação, mutualismo, autogestão, entre outros). Onde, a autogestão organiza e controla democraticamente o trabalho dos participantes, há mecanismos participativos para os aspectos normativos, valoriza a autonomia dos participantes contemplando suas idéias e saberes. Donde, segundo Bechara-Maxta (2012, [s.p.]), observa-se que, os trabalhadores devem construir estratégias necessárias para “a emancipação, autonomia e participação no trabalho, programando mudanças no seu estilo de vida, no ambiente produtivo e de convivência social, configurando-se como ações diversificadas em promoção da saúde”. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com o contexto teórico apresentado no presente trabalho de revisão de literatura, a Economia Solidária essencialmente ultrapassa a questão da empregabilidade. A partir da busca para construir novas relações envolvendo o homem, o trabalho e a natureza, deve-se caminhar no sentido de pensar um novo projeto societário. Uma questão importante ao se pensar em política pública de economia solidária é garantir meios de se obter uma renda digna. Contudo, muitos autores de Economia Solidária não relacionam o ganho financeiro como sendo digno ou suficiente. Eles argumentam instituindo crítica a Economia Solidária (onde não há gestão compartilhada, solidariedade e outros, ou seja, empresas disfarçadas de cooperativas). Há que se desafiar os gestores, para promover o movimento social visando, para além da produção de renda, e que a Economia Solidária capacite a geração de processos que consigam proporcionar condições necessárias ao acesso a bens e serviços. Conforme pensamentos de Butzke e Santana (2008), esse desafio insere estratégia de política pública de Economia Solidária voltada para além de ações pontuais e focalizadas. A política pública deve se constituir no direito de todos e não uma “política pobre, para pobres”. Deve-se estabelecer um relacionamento importante frente ao exercício da cidadania no sentido de reorientar a saúde como um todo. Esta deve se relacionar com a promoção da saúde, desviando a centralização das doenças e pensar no trabalhador como ator da sua própria vida. Também, devem-se construir estratégias considerando a política pública compondo questões orçamentárias, planejamento e participação social. Conforme a revisão bibliográfica dos elementos que se inserem no contexto da Economia Solidária, pode-se concluir que esta vem passando por um processo de ressignificação da promoção da centralidade da pessoa, quanto à geração de renda e trabalho. Essa ressignificação apresenta estratégias para a conquista de direitos sociais e coletivos, dando possibilidades de inclusão social e exercício da cidadania. Para Pereira (2011), nota-se que por meio de processos democráticos e da articulação com causas sociais, organizações econômicas mais e menos estruturadas estão compondo um cotidiano extremamente mais democrático do que o observado nas empresas tipicamente capitalistas. A Economia Solidária abarca postura de trabalho diferente do sistema capitalista, pois segundo Baffi (2008), ela redimensiona, promove e estimula a participação, além da inclusão. Sua ideologia de trabalho não estimula a competição e tampouco o individualismo, mas favorece a igualdade, autorrealização e inserção dos desfavorecidos e marginalizados pela sociedade. Exemplo disso é as cooperativas que recebem pessoas portadoras de doenças como AIDS e tuberculose ou ex-dependentes químicos, ex-detentos, etc., sem distinção. Para Lima e Gómez (2008), tratar a composição saúde, trabalho e economia solidária implica uma tarefa complexa. Tal complexidade, num momento histórico onde grande parte da força de trabalho situa-se fora do mercado formal, e considerarmos diversas experiências internacionais, onde acontece melhora significativa qualidade de vida dos participantes nos empreendimentos e lhes proporciona uma inserção social mais justa e igualitária, entendida como produtora de saúde. Com a Economia Solidária tem-se a possibilidade na vigilância nos riscos para o trabalho e juntamente com os trabalhadores que podem transformar as relações do mundo do trabalho dando novas dimensões a suas vidas com perceptivas para a saúde mudando o foco das doenças para produção da saúde comportando ideário de ajuda mútua, cooperação e associação, para resistir à tendência dominante do mercado e do consumo. Na perspectiva de desmercantilizar a saúde para, enfim, investir na proposta de promoção de saúde quebrando este ciclo do capitalismo que envolve o processo saúde e doença tem-se o movimento social Economia Solidária. Entretanto, não se pode afirmar que mesmo com a consolidação do política movimento social da Economia Solidária, será este um dos caminhos para essa construção, visto que ela vem sendo apropriada das mais diversas formas, pelos mais diversos interesses. REFERENCIAS ARAUJO, Nathália Campos A. de. O projeto com-vivência e o direito à saúde. 2011. 60f. 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