Notas sobre o neonazismo no site Extreme Violent Racism

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Notas sobre o neonazismo no site
Extreme Violent Racism
Pedro Carvalho Oliveira
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Resumo: O trabalho busca compreender como o fascismo vem
ressurgindo no tempo presente e como este discurso extremista tem
sido difundido atualmente, assim como observar de que maneira os
grupos voltados para estas ideias se apropriam da Internet para expor
propagandas violentas contra os opositores deste pensamento. Para
tanto, analisaremos o site norte-americano Extreme Violent Racism
(http://www.whitehonor.com/), que em suas páginas utilizam de
apelos de todos os tipos para angariar adeptos tentando convencê-los
da necessidade de tornarem-se nacional-socialistas.
Palavras-chave: neonazismo; fascismo; História do tempo presente;
Internet.
Introdução
O fim da Segunda Guerra Mundial não sepultou o fascismo,
ao contrário do que muitos pensavam e pensam até os dias de hoje.
No mundo inteiro, diversas manifestações a favor do nacionalsocialismo hitlerista e das ideias de Benito Mussolini podem ser
observadas, como na Alemanha, onde, de acordo com fontes oficiais,
Graduando em História pela Universidade Federal de Sergipe. Bolsista do
Programa de Educação Tutorial (PET/História/UFS) e membro do Grupo de
Estudos do Tempo Presente (CNPq/UFS). Orientador: Prof. Dr. Dilton Cândido
Santos Maynard. E-mail: [email protected].
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aproximadamente 80 grupos, reunindo cerca de 68 mil pessoas,
tinham o potencial para serem classificadas como militantes
fascistas, no final do século XX (SILVA, 2004). A Internet,
mecanismo que desde a década de 1990 tem ganhado força na
sociedade de informação, tem se tornado uma ferramenta essencial
para a propaganda extremista, uma vez que alcança o mundo inteiro
e facilita a expansão destes ideais. O site Extreme Violent Racism
(http://www.whitehonor.com/), sobre o qual nos debruçaremos, é
uma prova de que a extrema-direita ganha força com a rede mundial
de computadores.
O Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS/CNPq),
da Universidade Federal de Sergipe, e a pesquisa vinculada a ele,
intitulada "Intolerância Digital: história, extrema-direita e
cibercultura (1999-2009)", buscou durante um ano investigar e
catalogar sites ligados à extrema-direita, realizar leituras a respeito
deste tema e apresentar trabalhos como resultado destes estudos, a
fim de trazer a público aspectos do mundo neonazista durante uma
década. A pesquisa também buscou conhecer mais proximamente o
plano em que estas informações pairam, a internet, sua cultura
particular e de que forma ela vem sendo utilizada por estes grupos.
Para a História, esta pesquisa pode auxiliar na compreensão do
ressurgimento do fascismo e da força que tem ganhado através dos
anos, afastando-o da idéia de que esta ideologia ficou no passado, e
que é possível observá-la no tempo presente, momento no qual se
foca esta vertente historiográfica que tanto tem gerado discussões a
respeito de sua validade científica.
Antes de adentrarmos nas informações resultantes da
pesquisa no site Extreme Violent Racism, tentaremos esclarecer os
propósitos de estudar o tempo presente, sua necessidade, sua
metodologia, e de que forma ela está associada ao tema aqui
proposto, além de transitarmos num breve reconhecimento do mundo
virtual, onde as fontes para este estudo estão disponíveis.
Estudo do tempo presente - jornalismo ou história?
O surgimento de uma história do presente, no final da
Segunda Guerra Mundial, serve à necessidade de compreender os
diversos precedentes e resultados deste acontecimento na Europa.
Fenômenos políticos como o nazismo e o fascismo apareciam como
importantes objetos de estudo, uma vez que se fazia necessário
entender as razões pelas quais estas políticas chegaram ao poder,
para que, desta forma, se evitasse que pudessem fazê-lo novamente;
os diversos países que participaram da guerra agora ganhavam novas
faces que seriam apresentadas para o mundo: a Alemanha, derrotada
e culpada pela guerra de um lado, e a França, triunfante em sua
vitória, de outro, entre outras ocorrências, levaram à necessidade de
um estudo daquele período, mesmo que, para o historiador,
encarregado deste exame, não houvesse o recuo temporal necessário
exigido pela metodologia tradicional de sua ciência (LAGROU,
2009).
Graças a esta exigência metodológica, esta vertente
historiográfica vem sendo alvo de críticas no universo acadêmico
devido a uma confusão existente quanto a uma possível semelhança
com o jornalismo, em razão de sua análise estar direcionada a
acontecimentos muito recentes, estando o historiador dedicado a esta
modalidade de história muito próximo de seu objeto de estudo,
presenciando seus desdobramentos "no calor do momento"
(LAGROU, 2009). Esta confusão existe devido a um perfil
conservador inspirado pelo historicismo, em que se procura afirmar
que para que o historiador seja imparcial e examine seu objeto de
estudo sem se envolver com ele (o que por si só é impossível,
admitem até mesmo alguns dos autores mais conservadores), faz-se
necessário um afastamento temporal para que as informações obtidas
sobre este objeto sejam devidamente recolhidos e possuam, também,
uma qualidade quantitativa. Para Robert Frank,
há imediatismo entre o historiador do presente e a
testemunha, e é preciso tirar partido disso. Mas o dever
do historiador consiste em criar uma mediação entre o
depoimento e ele. Eis porque a noção de "história
imediata" é sem dúvida criticável. A mediação é
necessária. Ela deve ser construída, e passa pela
reflexão crítica sobre o tempo e pela colaboração do
depoimento na perspectiva da espessura da duração,
aquela do passado próximo e longínquo. E essa
consideração do longo termo que faz a diferença
fundamental entre a "história do presente" e o trabalho
sobre a "atualidade, entre o historiador e o jornalista.
(FRANK, 1999, p. 117)
Vemos que, por se tratar de uma história dos
acontecimentos recentes, a história do presente se assemelha ao
jornalismo, que é imediato aos acontecimentos, sejam eles quais
forem: políticos, sociais, econômicos etc. Entretanto, a diferenciação
entre o jornalista e o historiador pode ser simplesmente observada:
enquanto as notícias trazidas pelos jornais exibem as informações
mais simples e menos aprofundadas dos acontecimentos, tendendo
para uma superficialidade, insuficiente para a história, o historiador
buscará confrontar as mais diversas informações visando alcançar
uma conclusão que seja a mais próxima possível dos acontecimentos,
explicando-os, então, ainda que muito próximo dos acontecimentos;
a diferença entre o jornalista e o historiador do tempo presente é o
tratamento que ambos dão às informações, e para que exista esta
diferença, o historiador apóia-se numa metodologia de pesquisa.
Este perfil metodológico que obriga o historiador a estudar
somente o passado distante é visto pelos historiadores do presente
como ultrapassado e inadequado aos rumos que esta ciência tomou
após 1945.
Já se foi o tempo em que se acreditava que, quanto
mais distante de nós, mais científica poderia ser a
História. Vivíamos ainda o mito da História
positivista, aquela que "fazia os documentos falarem",
como se História não fosse uma articulação entre o
nosso olhar e o acontecido. Não que eu aceite a idéia
de esquecer o passado remoto. Fingir que filósofos
gregos, profetas hebreus, legisladores romanos ou
papas medievais não nos influenciaram é ingênuo e
tolo. Como ingênuo e tolo é tentar estudar o tempo
presente de forma a-histórica, apenas pelo noticiário
televisivo ou de rádio, com suas fórmulas batidas e
levianas (PINSKY, 2007, p. 8).
Portanto, o historiador do presente envolve-se com seu
estudo de uma maneira maior, afastando-se do positivismo que
negava essa possibilidade, na tentativa de realizar uma crítica mais
adequada ao seu objeto de estudo: os acontecimentos recentes.
Tomar cuidado para que estes acontecimentos sejam adequados ao
perfil de fato histórico é indispensável ao pesquisador, devendo ele
produzir conhecimento, e não apenas informação, objetivo único do
jornalismo (PINSKY, 2007).
Mas, por outro lado, um tratamento adequado das fontes
pesquisadas exige que o historiador constitua uma metodologia para
organizar suas informações. Esta sistematização das informações
permitirá ao pesquisador uma precisão essencial para o avanço de
seu trabalho, além de permitir a coleta de uma significativa
quantidade de elementos constituintes de seu objeto de pesquisa e
produzir conhecimento através delas, como um resultado final. Este
processo envolve aquilo que chamamos de "método histórico", que
é "a constelação de regras do pensar o passado". As
regras indicam os processos pelos quais o passado
humano é contemporizado como história. Ao longo do
desenvolvimento do pensar histórico, foram sendo
consolidados os pontos referenciais de sua
regulamentação nos mais diferentes paradigmas
metodológicos (DIEHL, 2001, p. 21)
Ou seja, a pesquisa histórica deve obedecer alguns
princípios para que possua um sentido, para que seu resultado
alcance o objetivo previsto. Dentre estes princípios, a crítica ao
objeto de estudo, sua interpretação em seus diversos níveis, dentre
outros, assumem o papel de regra para que seja possível determinar
as direções da pesquisa a um resultado satisfatório. Em nossa
pesquisa, a catalogação dos sites visitados, utilizando o sistema
CODEX, um site (www.codexbrasil.org) que permite cadastrar e
controlar links da Internet, descrevendo-os e inserindo informações
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sobre seu funcionamento, nos permite acessar as informações
contidas neles para observar com detalhes como se articula a
expansão de idéias fascistas no meio virtual, conhecendo seus
hábitos, costumes e a forma como se comportam na rede mundial de
computadores. Esta catalogação, além dos downloads das próprias
páginas, utilizando o programa WinHTTrack, capaz de realizar esta
função, nos permite acumular dados para posterior leitura, crítica e
interpretação de informações que nos levem a um conhecimento cada
vez mais abrangente destes grupos.
Aquilo que vimos nos sites pesquisados foi confrontado
com as leituras a respeito do assunto, disponibilizadas pelo
orientador, para que a crítica das informações disponíveis na rede
fosse assegurada, uma vez que existe um preconceito por parte de
alguns historiadores quanto à integridade das fontes encontradas na
Internet que, em razão do fácil acesso e possibilidade de inserção de
informações por qualquer indivíduo, acabam caindo em certo
descrédito.
Internet e História - A Web Como Fonte Para O Historiador
O surgimento da Internet na década de 1960, como um
mecanismo de defesa militar durante a Guerra Fria (1945 a 1991),
aproximou homens de máquinas, uma vez que esta relação era
necessária para o desenvolvimento tecnológico em demanda na
época, enquanto Estados Unidos e seus aliados do bloco capitalista e
a União Soviética ao lado dos demais países socialistas tentavam
superar um ao outro neste âmbito (BRABROOK, 2009). O
aparecimento desta relação deu origem a uma linguagem específica
para que a comunicação entre homens e computadores pudesse
existir. Os elementos designativos dos componentes virtuais dos
computadores e todo seu comportamento interativo, ou seja, seu
mundo próprio, são chamados de cibercultura. Como explica Erick
Felinto:
A cibercultura assinala sua especificidade com base
nesse novo modelo tecnológico [digital], cujas
características seriam inteiramente distintas do modelo
anterior. Para Lev Manovich, por exemplo, essa
transformação envolve, em última instância, "[...] a
tradução de toda mídia existente em dados numéricos
acessíveis por meio de computadores" (2001, p. 20).
Temos aí, de fato, um dado essencial: na cibercultura,
o valor supremo é a informação representada
numericamente. Em outras palavras, a cibercultura
promoveu uma radical "informatização" do mundo uma visão na qual toda a natureza, incluindo a
subjetividade humana, pode ser compreendida como
padrões informacionais passíveis de digitalização em
sistemas computadorizados (FELINTO, 2006, p. 4)
Sendo assim, a cibercultura transfere para o mundo virtual o
mundo dos homens, numa espécie de "digitalização" da nossa
cultura, a fim de que se torne possível a interação entre ambos os
mundos - o real e o virtual. Nela, a Internet e os demais mecanismos
são parte de um imaginário muito particular. Com a popularização da
Internet em meados da década de 1990, o acesso tornou-se mais fácil
e cada vez mais pessoas passaram a utilizá-la como meio de
comunicação, desprendendo-a de sua proposta militar inicial
(BARBROOK, 2009). Seu crescimento assinalou o a expansão da
informação como objeto de interesse das sociedades mais
desenvolvidas, facilitando a velocidade da recepção e transmissão de
notícias, a interação entre pessoas de pontos diferentes do mundo, o
que, consequentemente, ampliou o conhecimento do homem a
respeito da cibercultura, fundamental para o acesso aos benefícios
proporcionados dentro deste ambiente. Ou, como disse Pierre Lévy,
"o espaço cibernético está se tornando um lugar essencial, um futuro
próximo de comunicação humana e de pensamento humano" (2009).
O homem passa a criar também dentro deste novo ambiente aquilo
que criava fora dele.
Porém, devemos observar que, em parte, o mundo da
cibercultura transcende o mundo virtual, chegando a nós através de
manifestações artísticas e culturais baseadas neste universo
imaginário. A música eletrônica, os filmes de ficção científica que
exploram a fusão entre homem e meio cibernético (Matrix, Blade
Runner - O Caçador de Andróides, Johnny Mnemonic - O Cyborg
do Futuro, para citar alguns exemplos), a literatura (como no livro
Neuromancer, de William Gibson, que inaugura o termo
ciberespaço) inspiraram o surgimento de movimentos urbanos
modernos que busca viver esta "realidade" futurista, prevista nestas
produções culturais, onde homens e máquinas chegam a se
confundir, vivendo num mesmo mundo que nem é completamente
real, nem completamente virtual, mas uma mescla entre os dois,
proposta por estes elementos midiáticos. O cyberpunk, espécie de
movimento subversivo que mistura elementos da cibercultura e do
movimento punk, é um dos exemplos desta tentativa de transpor o
mundo virtual para o mundo real.
Surgido com o livro de William Gibson, o cyberpunk é
contrário às regras impostas pela cultura virtual, desobedecendo-as.
No livro, trata-se de um indivíduo imerso num mundo dividido entre
humanos e máquinas e que se utiliza de seus conhecimentos
tecnológicos para quebrar as barreiras impostas pelas autoridades.
Semelhantes a eles, na vida real, são os hackers, indivíduos que, em
nome do compartilhamento das informações contidas na rede,
capazes de adentrar em ambientes virtuais restritos e policiados por
sistemas de segurança considerados invioláveis. Os "cowboys" de
Gibson preocupam políticos e banqueiros:
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Por trás deste discurso hacker existe uma filosofia. O
conhecimento deve ser livre. Isto é muito diferente da
ética protestante, para a qual o dinheiro enobrece o ser
humano. De acordo com o jargão hacker ,"a original
ética hacker significa a crença que o compartilhamento
da informação é um bem um poderoso e positivo." Na
prática isso significa um dever ético de se trabalhar
sob um sistema aberto de desenvolvimento, no qual o
hacker disponibiliza a sua criação para outros usarem,
testarem e continuarem o desenvolvimento
(DIMANTAS; MARTINS, 2008, disponível em
http://diplo.uol.com.br/2008-02,a2213, acesso em 27
de Julho de 2010)
Os hackers aparecem como indivíduos contrários a uma
espécie de privatização da informação, que deve ser restrita a poucos.
Para eles, a informação presente na Internet, seja de que natureza for,
deve ser pública. Essencialmente, os hackers agem em benefício
coletivo, e não individual, da mesma forma que parte do movimento
punk passou a pensar no início da década de 1980, quando tornou-se
mais politizado. Daí o termo cyberpunk a este tipo de atitude.
Não somente esta interação homem-máquina, como o caso
dos hackers, é importante para o historiador como um possível objeto
de estudo, mas também a forma como esta interação gera
informações a respeito de acontecimentos pertinentes ao estudo da
história, como no caso do fascismo. Nos sites visitados durante a
pesquisa, pudemos observar a cultura, o comportamento e os modos
de agir destes grupos, assim como sua ideologia e as formas como
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ela é apresentada, através da música, de vídeos, panfletos, textos
desenvolvidos por ideólogos dos movimentos e até mesmo por
membros deles, além da disposição de livros e revistas importantes
para estender a propaganda nacional-socialista.
Extreme Violent Racism - A Violência Como Forma De Luta
"For those with hope, for those with courage, for those who
have finally realized that nothing short of a White Revolution will
save our race. Supreme White Power, doing whatever it takes for
total Aryan Victory." Estes dizeres são o cartão de boas vindas do
Extreme Violent Racism (IP: 65.98.56.50). O próprio nome do site
(Racismo extremamente violento, em português) deixa clara a sua
proposta: combater a presença de negros, judeus e outras minorias na
política e na sociedade norte-americana.
Ao adentrarmos no site, em sua página inicial,
encontraremos um banner com a fotografia de uma arma de fogo e a
frase Powered by hate (ou Movido pelo ódio). Acima, a frase
"Revolução branca é a solução final". Mesclando as duas sentenças,
podemos concluir que a violência é algo estratégico e importante
para grupo idealizador da página em uma esclarecida e explícita luta
a favor do racismo. E ao adentrarmos mais profundamente nas
páginas do site poderemos comprovar ainda mais este viés agressivo,
fundamentado em teóricos nazistas e em propostas políticas
nacional-socialistas.
A cada página, encontramos novas provas deste radicalismo
violento, além da insistência de que uma revolução é necessária para
eliminar completamente os negros da vida do "homem branco",
assim como para que a consciência a respeito da importância do
nacional-socialismo se faça presente na sociedade norte-americana.
Vejamos o trecho a seguir, retirado de uma das postagens do sítio:
Every intelligent individual on the planet predicted
Obama's failure and traitorous actions against
America's White Working Class, and they were right.
In just a few months, he has spent over $1 Trillion and
is talking about all the gun rights he plans on taking
away, while giving rights to illegal mexicans. Maybe
all of you out there who have e-mailed me about
finally being fed up with "our" government's crooked
actions will get off your butts and start becoming
racial activists - spread the word.
Axl Hess, codinome do principal autor e dono do site, diz
que o atual presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, primeiro
presidente negro a ser eleito naquele país, traiu a classe operária
norte-americana e que isto já era previsível. A traição, segundo o
autor, se trata do fato do presidente supostamente ter investido um
trilhão de dólares em planos de desarmamento, além de intencionar
eliminar os outros direitos armamentistas existentes no país,
enquanto, em contrapartida, seu governo concede direitos a
imigrantes (neste caso, mexicanos) ilegais. A indignação do autor é
tamanha que ele aconselha a todos que se sentiram incomodados com
as ações do presidente, tomarem partido e tornarem-se "ativistas
raciais". Com isso ele busca convencer os militantes neonazistas a
praticar atos de violência contra seus "inimigos", promovendo até
mesmo atentados, os quais o próprio site ensina a realizar, com
manuais práticos e ilustrativos.
O problema da imigração é uma constante no discurso
neonazista. Em momentos de grandes crises como o vivido pelos
EUA recentemente, as tensões sociais dão origem a este pensamento
xenófobo e racista, que funciona como uma válvula de escape para
os problemas vividos pelo Estado, e, desta maneira, os estrangeiros,
negros, homossexuais e outras minorias, passam a significar pessoas
que iriam tomar os empregos, mudar os modos de vida daquele povo,
introduzir drogas, criminalidade e decadência para aquela sociedade
(VIZENTINI, 2000).
Panfletagem Online
A propaganda é, definitivamente, a alma do negócio
neonazista. O uso dela é de extrema necessidade para que se faça
chegar ao maior número possível de pessoas a ideologia racista
pregada dentro do movimento, um dos principais objetivos deste site.
Trata-se de um site voltado quase que exclusivamente à questão
racista, e não à repulsa ao comunismo, por exemplo, ou ao controle
dos ditos zionistas (judeus) em vários segmentos da sociedade,
embora este discurso também apareça; entretanto, seu foco é
entusiasmar, ensinar e incentivar as pessoas a violentar as raças que
eles, os organizadores do site, jovens nacional-socialistas
aparentemente sem muita experiência, supõem ser inferiores.
Porém, há um paradoxo no que diz respeito à propaganda
neonazista, e isto é perceptível no próprio website. Enquanto a
propaganda se faz necessária para que a palavra nacionalsocialista se
espalhe, é necessário que ela se faça de maneira discreta. Portanto,
ela deve ser feita de um modo que chegue até os que estão
previamente interessados no assunto, pois, caso contrário, poderá
atrair autoridades que impeçam a continuidade da ação e possam
atém mesmo prender os "agentes" neonazistas. Numa página
reservada a instruções de como realizar este tipo de divulgação da
idéia racista, os autores do site demonstram onde e como estas
informações devem ser transmitidas e para quem; além disso, os
encarregados de se aventurar em nome de espalhar a palavra
neonazista podem conseguir conselhos e instruções para fugir da
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polícia, de delatores e qualquer um que se coloque no caminho desta
"cruzada pelo racismo".
Axl Hess é o maior responsável por este manual virtual
sobre como propagar informações a respeito do nacional-socialismo,
buscando alcançar seus objetivos. Ele disponibiliza panfletos que
podem ser facilmente impressos, contendo ilustrações, frases de
efeito, além de estatísticas duvidosas a respeito dos problemas que
negros, imigrantes e judeus seriam responsáveis nos Estados Unidos
e conclamações inflamadas para que os brancos lutem contra seus
"inimigos". Axl também disponibiliza aos visitantes textos
fundamentais para entender como a propaganda nazista funciona,
incluindo o ensaio chamado Modern Politicai Propaganda, de Josef
Goebbels, ministro da propaganda do Terceiro Reich, um especialista
no assunto.
"Eu criei este website com a intenção de fornecer a Racistas
Brancos informações sobre o que podemos fazer para garantir
efetivamente a existência de nosso povo." Este trecho abre a página
de boas-vindas do site Extreme Violent Racism, parte de um longo
texto enfatizando seus propósitos, também escrito por Axl Hess.
Mais adiante podemos ler: "Esta é a hora de lutar!" e, logo em
seguida, a frase "Deus deu à Raça Branca o cérebro para fazer armas,
mas ele não irá puxar o gatilho por você." Não é preciso muito
esforço para compreender o viés declaradamente racista e violento
que o site propõe aos seus visitantes. Fica claro ao lermos toda a
declaração desta página que a intenção é abandonar as formas
pacíficas de luta pelo poder e contra os negros e judeus e assumir que
apenas através da violência, ou de uma espécie de guerra, será
possível chegar a estes objetivos.
Para que os brancos possam sobreviver a esta guerra, o site
disponibiliza manuais de luta urbana, de como se defender, evitar
prisões, fabricar armamentos caseiros e realizar treinamentos físicos,
a fim de que os "soldados arianos" possam realizar sua luta de
maneira eficaz. Esta guerra proposta pelos idealizadores do site é
fundamentada por diversos documentos, artigos e livros dispostos na
própria página, incluindo uma versão em PDF de "Minha Luta",
escrito por Adolf Hitler enquanto esteve preso, anos antes de tomar o
poder na Alemanha. Para alguns neonazistas, a Segunda Guerra não
terminou com a derrota dos alemães, ela ainda continua e sua direção
deve ser revertida a todo custo.
Considerações Finais
Através da Internet, grupos de extrema-direita vem
propagando o racismo, a xenofobia e a busca por um retorno do
nacional-socialismo, aproveitando-se do fácil manuseio que este
mecanismo possibilita e o seu longo alcance, num mundo onde a
globalização se faz a cada dia também através da rede
(BARBROOK, 2009). A rede mundial de computadores nos serviu,
nesta pesquisa, como um portal para as informações que, uma vez
cuidadosamente estudadas e confrontadas com outras fontes de
conhecimento histórico, nos possibilitou a compreensão de que, ao
contrário do que se pensava, o fascismo ressurge diante de nossos
olhos e não é apenas um fenômeno de um passado distante, que deve
ser esquecido, como algo exclusivo daquele tempo histórico
(PAXTON, 2007).
Diariamente milhares de acessos são realizados nestes
websites e a participação é grande, o que demonstra que o interesse
por eles é significativo, o suficiente para percebermos que o fascismo
ainda se mantém presente e ganhando novos adeptos a cada clique.
Conhecer a ação destes grupos é entender que o fascismo sobreviveu
à Segunda Guerra Mundial, tornou-se minoritário, porém muito
grande, e espalhou-se pelo mundo inteiro. Eventos como a queda do
Muro de Berlim (1989), o desmantelamento do bloco socialista com
o fim da União Soviética (1991) e as crises nos Estados Unidos no
último ano são propícios ao ressurgimento de partidos de extremadireita com plataformas conservadoras e nacionalistas, que culpam
estrangeiros, negros e outras minorias pelas mazelas da sociedade,
como uma forma de desviar o olhar da sociedade dos problemas
reais.
Quando, após 1991, o experimento pós-soviético com
a democracia eleitoral e a economia de mercado trouxe
resultados desastrosos para a Rússia, movimentos
como o Paymat ("memória") resgatam essa rica
tradição eslavófila, agora atualizada com elogios
explícitos à experiência nazista (PAXTON, 2007, p.
308).
A crise traz ao povo o desespero, e movimentos de extremadireita, como o Paymat, na Rússia, tentam explicar esta crise
utilizando concepções que não são necessariamente seguras ou
possuem um fundamento concreto. Levada a acreditar que os
problemas sociais vividos são realmente aqueles, tal sociedade acaba
considerando as opiniões destes grupos ou partidos políticos, uma
vez que, aparentemente, nem o capitalismo, nem o socialismo (já
derrubado) resolveram os seus problemas (PAXTON, 2007). A
Internet junta o mundo, e com isso pessoas da América do Sul se
identificam com o que acontece na Europa, ou na América do Norte,
se tal crise ou tal acontecimento político, social ou econômico for
semelhante à que vive em tal situação. Estes sites são catalisadores
desta identificação com o nacional-socialismo: se já existe no
indivíduo que os visita uma pré-disposição para aceitar o que as
páginas dispõem, ele se tornará facilmente influenciado.
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