FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS CENTRO DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM ADMINISTRAÇÃO - CEPEAD BELO HORIZONTE, M. G. GESTÃO PARTICIPATIVA NO BRASIL: O ELEMEN TO JURÍDICO COMO NOR MA DISCIPLINADORA DA REGULAÇÃO DE CONFLITOS. ALEXANDRE BOGLIOLO SIRIHAL CEPEAD / UFMG Rua Dom Lúcio Antunes, 230 Coração Eucarístico Belo Horizonte - MG 30.535-630 Fone: (031) 375-7483 (031) 973-8189 RESUMO DO TEXTO O modelo capitalista de organização é representado, via de regra, por sociedades em cotas de capital. Nesta concepção, sempre haverá um distanciamento entre os interesses do trabalhador e da organização, distanciamento este definido na teoria marxista como alienação do trabalho. Este distanciamento provoca o conflito entre trabalhador e empresa, que precisa ser regulado ou mesmo reduzido através de políticas de gestão de recursos humanos. Uma dessas políticas, tida como moderna, consiste na gestão através da participação. Quando se fala em participação como forma de gestão de recursos humanos na moderna concepção, ou seja, como forma de regulação de conflitos, o que se quer dividir com a participação é o poder. Os sistemas participativos, tomados nas esferas do processo produtivo, processo decisório e resultados econômico-financeiros, conjuntamente, de certo modo, tendem a amenizar a alienação do trabalho. Este estudo tem como propósito fazer uma revisão dos esforços jurídico-legais que têm sido feitos no Brasil no sentido de propiciar a participação dos empregados na gestão das empresas, e determinar como esta participação terá influência decisiva na regulação dos conflitos. GESTÃO PARTICIPATIVA NO BRASIL: O ELEMEN TO JURÍDICO COMO NOR MA DISCIPLINADORA DA REGULAÇÃO DE CONFLITOS. ALEXANDRE BOGLIOLO SIRIHAL • Graduado em Administração de Empresas pela FACE/UFMG • Mestrando em Administração pelo CEPEAD/UFMG Rua Dom Lúcio Antunes, 230 Coração Eucarístico Belo Horizonte - MG 30.535-630 Fone: (031) 375-7483 (031) 973-8189 CENTRO DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISAS EM ADMINISTRAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS – CEPEAD / UFMG 1. INTRODUÇÃO A gestão de recursos humanos, para fazer face a uma série de transformações sociais que têm impacto direto sobre as organizações, é forçada a delinear e implementar uma série de estratégias de regulação de conflitos visando obter o nível de comprometimento adequado à condução dos negócios da empresa. Estes conflitos que precisam ser regulados, por sua vez, são substancialmente derivações da dicotomia capital X trabalho que tem como origem a consolidação do modo de produção capitalista, ocorrida em meados do séc. XIX. 1 Assim, as medidas adotadas hoje pelas áreas de recursos humanos das empresas respondem, em grande parte, a necessidades já existentes, ou no mínimo latentes, das organizações desde o séc. XIX. Uma dessas medidas, tida como moderna, consiste na gestão através da participação. A participação teve seu significado inicialmente muito limitado, sugerindo apenas participação financeira - quando os trabalhadores usufruem do resultado econômico obtido pela organização - e participação à vida da empresa - a simples existência de diálogo na organização. Mas quando se fala 1 Não se nega a existência de conflito anterior a este período – afirma-se, apenas, que o conflito capital X trabalho é próprio do capitalismo. •2• em participação como forma de gestão de recursos humanos na moderna concepção, ou seja, como forma de regulação de conflitos, o que se quer dividir com a participação é o poder. Os sistemas participativos, tomados nas esferas do processo produtivo, processo decisório e resultados econômico-financeiros, conjuntamente, de certo modo, tendem a amenizar a alienação do trabalho. 2 A idéia é que, tomando parte no processo decisório, será reduzida a distância entre o trabalhador e o produto de seu trabalho, o que, nas esferas ética, política e econômica propiciará a redução do conflito. MELO sugere que a participação já vem sendo utilizada por algumas organizações com este propósito de quatro formas diferentes: participação em procedimentos de estímulo à produtividade e qualidade, participação em procedimentos de segurança no trabalho, participação em relação à integração das famílias e participação na institucionalização do conflito. O presente estudo pretende, seguindo esta linha de raciocínio, demonstrar que os sistemas de gestão participativa tão populares hoje, na verdade respondem a anseios datados do séc. XIX e, no caso brasileiro, desde então já eram objeto de previsão j urídico-legal. Pretende, ainda, caracterizar estes sistemas participativos na prática empresarial brasileira. Pretende, por fim, evidenciar o paradoxo gerado pelo empresariado que, ao pressionar o mundo jurídico para dar cabo à previsão legal dos sistemas de gestão participativa, impôs ele mesmo uma das maiores óbices à atual consolidação da gestão participativa, que se chama Legislação Trabalhista e Previdenciária. 2. O DIREITO COMERCIAL E O ADVENTO DO CAPITALISMO O direito comercial é um ramo do direito que surgiu na Idade Média, ligado ao início do processo histórico de ascensão de uma classe social – a burguesia. O comércio, como atividade econômica, é muito mais antigo, remontando o seu surgimento à Antigüidade. O mesmo se diz das normas jurídicas disciplinadoras do comércio, que, historicamente, antecedem em muito o direito comercial, havendo normas desta categoria desde a Roma Clássica. Neste sentido, pode-se dizer que o direito comercial, assim entendido o conjunto pretensamente sistemático de normas jurídicas disciplinadoras do comércio, é um fenômeno histórico relativo aos sécs. XI em diante. No entanto, da mesma forma que as normas jurídicas reguladoras do comércio evoluíram para acompanhar o desenvolvimento da civilização, atingindo os primórdios do direito comercial, a civilização permaneceu em desenvolvimento, fazendo com que o direito comercial deixasse de ser, apenas, um direito da atividade mercantil. Passou a abarcar, ainda, muitos institutos e instituições não necessariamente comerciais, incluindo-se aí as sociedades comerciais e industriais. 2 O conceito de alienação do trabalho, resultante da divisão do trabalho, é estudado por Hegel e Marx, e pode ser resumidamente examinado em MENDONÇA, pp. 35-40. •3• A etapa mais importante do desenvolvimento da civilização para este estudo é o advento do capitalismo. A criação da produção em massa fez surgir novos personagens na cena econômica. Para o direito comercial, a principal modificação foi o surgimento de uma nova figura – o empresário. J. B. Say, citado em REQUIÃO, P. 13, destaca a importância dos capitais para a exploração das forças produtivas da natureza. Assim é que, a partir da consolidação do modo de produção capitalista, o direito comercial passou a fundamentar-se na Teoria da Empresa. O direito comercial passou a ser entendido, portanto, como “ordenamento destinado a estabelecer a disciplina jurídico-privada das empresas” (Prof. Ferrer Correia, citado em REQUIÃO, P. 14). No Brasil, a despeito da evolução histórica dos atos de comércio aqui praticados, o marco principal do direito comercial é a sanção da Lei nº 556, de 25 de junho de 1850, que promulga o Código Comercial brasileiro. Este diploma, constituído já sob os primó rdios da consolidação do capitalismo, servirá de referência para a seqüência dos estudos dos sistemas de gestão participativa. 3. AS SOCIEDADES DE CAPITAL E INDÚSTRIA A sociedade de capital e indústria resulta da convergência de vontade de sócios de duas categorias: o sócio capitalista, que contribui para a formação do capital social com recursos materiais (dinheiro, bens ou crédito) e responde ilimitadamente pelas obrigações da sociedade; e o sócio de indústria 3 , que contribui para a formação da sociedade com trabalho e não tem responsabilidade, sequer subsidiária, pelas obrigações desta. A sociedade de capital e indústria tem sua disciplina legal nos arts. 317 a 324 do Código Comercial. O sócio de indústria, neste tipo de sociedade, está sujeito a alguns tipos de restrições: não pode dar seu nome civil à firma, e não pode “dedicar-se a operações estranhas, salvo pacto expresso em contrário” (REQUIÃO, P. 304 – grifo nosso). Isto significa que, em tese, somente o sócio capitalista é que pode gerir a sociedade, mas, como se vê no grifo acima, contratualmente susceptível de exceção. Ainda a respeito deste tipo de sociedade, fica por conta do contrato a fixação de cota de lucros que caberá ao sócio de indústria. Na omissão do contrato, caberá a este parcela de mesma proporção que aquela conferida ao sócio de capital de menor partic ipação na composição deste. Entendido o conceito da sociedade comercial de capital e indústria, torna-se evidente que tal 3 “A expressão indústria, usada pelo art. 317 do Código Comercial, tem a ace pção econômica de trabalho, atividade”. (REQUIÃO, P. 304) •4• sociedade, prevista na carta comercial de 1850, configurava a liberdade jurídica para o estabelecimento da gestão participativa de duas formas: em primeiro lugar, e mais explicita, através da participação nos lucros; em segundo lugar, com ressalvas, a participação na gestão propriamente dita. Assim é que, já na metade do séc. XIX, havia no Brasil métodos legais para que se instaurassem empresas com participação dos trabalhadores na gestão, confirmando que os anseios daquela época já se responsabilizaram pelas ferramentas de regulação de confl itos através da participação. 4. A GESTÃO PARTICIPATIVA E A CO-GESTÃO Tem-se falado ao longo deste estudo sobre a regulação de conflitos através da participação. Ora, é importante ter a clareza de que isto é de fato possível, para que se possa entender o porque da busca pela gestão participativa. “A questão importante parece ser a de que o capitalismo burocrático, expressão pela qual designamos o capitalismo de organização, depende, para a administração do conflito, isto é, para sua antecipação e controle, de um concurso voluntário de todos os agentes da produção; em suma, a colaboração das classes torna-se essencial para o equilíbrio do sistema, o que põe na ordem do dia as propostas social-democratas. A participação surge dessa forma como meio por excelência do trato com o conflito.” (MOTTA, pp. 10,11) Não obstante a imperativa importância da participação na administração dos conflitos, deve -se lembrar também que ela tende a minimizá-los. “O regime de autogestão – exeqüível em todas as categorias de entidades de trabalho – elimina radicalmente a oposição entre dirigentes e dirigidos, que tem sido eterna causa de conflitos sociais em todos os povos.” (NOGUEIRA FILHO, p. 243) Afirmada e caracterizada a função da gestão participativa como processo de administração de empresas, cabe analisar como esta pode se manifestar no interior das organizações. 4.1 Participação no processo produtivo – Uma das primeiras formas de se conceder aos empregados participação dentro das empresas consiste em imbuí-los da tarefa de tomar decisões dentro de suas próprias atividades, isto é, •5• decisões limitadas ao processo de produção. Este tipo de participação, analisado a olhos neutros, não disfarça sua real intenção, qual seja, suprir deficiências do processo de produção. “Na realidade, quando o patronato ‘outorga’ a participação, é por causa das ‘disfunções’ do taylorismo, ou, mais simplesmente, das dificuldades tecnológicas resultantes do trabalho em cadeia. Não parece mais rentável mecanizar inteiramente o trabalho humano. É preciso que os operários se interessem pelo que fazem, para que a adesão subjetiva se produza.” (GUILLERM, BOURDET, p. 21) O que se abstrai desta forma de participação é que, se por um lado ela atinge seu objetivo principal de regulação de conflitos, nem de longe ela representa de fato uma participação: os trabalhadores envolvidos neste processo não tem participação nas decisões políticas; apenas é lhes concedido o direito de tomar decisões na forma de produzir. 4.2 Participação nos lucros A participação nos lucros consiste na distribuição dos resultados financeiros obtidos pela empresa pelos diversos agentes responsáveis pela busca daqueles resultados. Assim, de imedia to se percebe que tal participação não divide aos trabalhadores responsabilidades sobre a gestão dos negócios. Ao se repartir os lucros, sem ao menos dar o devido esclarecime nto educacional de como se transforma trabalho em lucros, é de difícil aceitação a idéia de que se minimizará a alienação. Nesse sentido, espera-se que haja uma minimização dos conflitos, ou que estes sejam adequadamente regulados, mas não se vincula isto ao fato de haver estreitamento de interesses entre empresa e empregado. Pelo contrário, entende-se que a redução dos conflitos dar-se-á tão somente pelo sentimento do aumento do valor do trabalho a ser remunerado. Uma ilustração talvez possa evidenciar o que se pretendeu dizer: grande número de empresas que adotam a participação nos lucros para os funcionários, vincula a fração a ser distribuída a uma série de ocorrências, ou requisitos. Um desses requisitos tem sido a limitação das despesas com mão-deobra da empresa a um determinado percentual do valor adicionado, para que haja distribuição desta participação. Ora, ao se limitar o custo da mão-de-obra na composição do valor adicionado, na verdade o que se está fazendo é determinando que deve haver um nível mínimo de produtividade, ou seja, que deve haver um nível mínimo de rendimento na mão-de-obra. Torna-se fácil perceber, então, que para que haja distribuição de lucros, neste caso, houve que se ter, preliminarmente, um •6• ganho de produtividade. Este ganho de produtividade, remunerado pela “participação nos lucros”, na verdade não deixa de ser uma parcela de trabalho remunerada a posteriori. Não há, como se abstrai do exemplo, participação na gestão quando se fala em participação nos lucros.4 Assim, embora tal forma também se preste a atingir os objetivos de regulação de conflitos, ainda não é útil para explicar a importância da gestão participativa. 4.3 Participação na gestão, co-gestão e autogestão – Os três conceitos em epígrafe distinguem-se em minúcias, mas guardam semelhanças estruturais que permitem um estudo único. Fundamentalmente, o que se apreende destes termos é que há uma participação efetiva da massa operária nos processos decisórios políticos da organização. Esta participação efetiva pode ser conseguida de diversas formas, mas basicamente há dois meios. A primeira forma trata da obtenção de representação dentro das assembléias diretivas através de colegiados de trabalhadores. A segunda forma se dá através da obtenção de participação no capital votante da empresa por parte dos trabalhadores, tornando-se eles, então, também acionistas da organização. Conceitualmente, estas duas formas denominam-se “órgãos de representação autônoma e órgãos de representação estrutural. (...) Na primeira espécie, a intervenção do pessoal na entidade sócio-jurídica da empresa se processa, por assim dizer, (...) do pessoal para a direção. Na segunda, a intervenção é efetivada diretamente no âmago da entidade sócio-jurídica. Não há mais intermediários. (...) Na segunda hipótese, quando a vontade dos representantes do pessoal possua força numérica equivalente à dos representantes do capital, verifica-se o domínio do alto, que pode ser tanto na codecisão como na cogestão. (GOTTSCHALK, pp. 97,98) A distinção maior que se faz entre estas duas formas encontra-se nos objetivos principais a serem alcançados pelas representações. Via de regra, a representação autônoma acaba atuando como um sindicato interno, ou seja, a participação nos conselhos diretivos das empresas visa basicamente a defesa dos interesses particulares (não individuais) dos trabalhadores. Por sua vez, a participação estrutural (chamada também de acionariado) configura o atingimento de um nível de aproximação entre empresa e trabalhador, quando este, aí já não mais ressalvando-se a individualidade de interesses, adquire propriedade sobre fração, ainda que irrisória, da empresa. 4 Muito interessante é lembrar que nem mesmo na decisão de que percentual do lucro se destinará para cada funcionário há participação dos funcionários; que dirá nas decisões políticas da organização. •7• “O título que credencia os trabalhadores a participarem dos órgãos estruturais da sociedade, é o direito de propriedade, e não mais uma conquista social. Num caso, procura atribuir-se ao trabalhador um estatuto de capitalista, e nesta qualidade é admitido nos conselhos diretivos. No outro, aí ele chega com o seu próprio ‘Status profissionalis’ de trabalhador subordinado. (...) No acionariado não há, pois, a integração do trabalhador na empresa, como tal, isto é, respeitado o seu ‘status’ original de trabalhador. Esta afirmativa não deve, porém, ser levada às útlimas conseqüências para entender-se, por exemplo, que toda e qualquer atribuição de ações ao trabalhador cancele nele a sua essencial qualidade de empregado.” (GOTTSCHALK, p. 237) Assim, a despeito das ressalvas que se possa fazer à representação estrutural como forma participativa de gestão, parece ter ficado claro o bastante que os trabalhadores dispõe de diversos meios de acesso à gestão das organizações em que trabalham. 5. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA E PREVIDENCIÁRIA Ultrapassa o escopo deste artigo a conceituação através do Direito das legislações mencionadas. Pretende-se, neste momento, apenas tecer considerações sobre o impacto que uma e outra têm sobre o quotidiano das organizações, e sobre a Carta Comercial. A Legislação Trabalhista Brasileira, pronunciada substancialmente através da CLT (e pelo texto das Cartas Magnas que vêm se suc edendo), surgiu num contexto de fortes movimentos operários de imigrantes europeus com inspirações anarquistas, mas foi determinada pela política trabalhista de Getúlio Vargas. A Lei, concebida através de política paternalista e extremamente comprometida com o empresariado, surgiu, então, com um claro objetivo de limitar o conflito. Não fazendo o julgamento de mérito de sua eficácia enquanto limitadora de conflito, conveniente é demonstrar como a Lei Trabalhista deu fim à previsão legal para a ocorrência da sociedade comercial de capital e indústria. Em seu art. 2º, a CLT define a figura do empregador: “Considerase empregador a empresa, indiv idual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços.” (NASCIMENTO, p. 134) Ainda, em seu art. 3º, diz: “Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não-eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante aslário.” (IBIDEM, p. 100) Sob a vigência desta lei, nas sociedades de capital e indústria, nas quais o sócio de capital assumia •8• os riscos econômicos da atividade, remunerava o sócio de indústria e geria seu trabalho, e ainda o sócio de indústria trabalhava habitualmente sob a tutela do sócio de capital e sendo remunerado, configurou-se a relação de trabalho sob a forma de emprego. Assim, “a sociedade de capital e indústria hoje é rara. (...) O antigo sócio de indústria hoje em dia é substituído pelo empregado altamente qualificado, em cujo contrato de trabalho se inserem cláusulas de participação nos lucros, afastando-se a idéia de sociedade.” (REQUIÃO, p. 305) A Lei Previdenciária, por sua vez, vai se tornar interessante para o escopo deste trabalho apenas na medida em que determina uma carga de ônus ao contratante que provoca um sério desgaste na relação de emprego. O excesso de tributos parafiscais incidentes nas empresas inviabiliza o aproveitamento mais extensivo de mão-de-obra, ao mesmo tempo que minimiza as tentativas de estreitamento de diálogo entre direção e trabalhadores. 6. CONEXÕES, CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES 1. O desenvolvimento das civilizações fez com que, em meados do séc. XIX, se consolidasse o modo de produção capitalista, marcando o estabelecimento de um novo agente econômico, o empresário, responsável pelo agrupamento de pessoas em um processo produtivo de massa. 2. Em resposta ao capitalismo, os conflitos sociais e as lutas de classe, sempre existentes na história das civilizações, convergiram para a dicotomia capital x trabalho. 3. Também em resposta ao capitalismo, a nova forma de organização da produção fez surgir a figura das sociedades de pessoas sob a forma jurídica de empresas. Coube ao direito comercial disciplinar e regular as atividades das empresas. 4. No Brasil o direito comercial estabeleceu a previsão para um tipo de sociedade de pessoas em que haveria tanto sócios de capital quanto sócios de trabalho (indústria). Este tipo de sociedade abriu margem, já em 1850, para a participação dos trabalhadores nos resultados das empresas e, embora com ressalvas, na gestão política das organizações. 5. A participação dos trabalhadores, sob suas diversas formas, presta-se fundamentalmente à regulação dos conflitos gerados pela dicotomia capital x trabalho, descrita em “2”. Este objetivo principal pode ser alcançado tanto por satisfação de necessidades egoísticas (participação no processo produtivo) ou econômicas (participação nos resultados), como pela minimização da alienação do trabalho, através da participação na direção das empresas. •9• 6. A Legislação Trabalhista no Brasil, de certa forma imposta pela vontade do empresaria do brasileiro, praticamente fez extinguir a possibilidade legal de formação de sociedade de capital e indústria, ao caracterizar tal sociedade como relação de emprego. Assim, tornou-se óbice ao processo de legalização da gestão partic ipativa. 7. A Legislação Previdenciária no Brasil, por sua vez, ao impor uma elevada carga tributária às empresas, determina uma resistência ao diálogo aberto entre patronato e trabalhadores, e diminui a possibilidade de existência de uma relação informal de gestão participativa. 8. Em grande parte, os conflitos atuais existentes entre trabalhadores e empresas brasileiros, que poderiam ser minimizados ou administrados sob formas diversas de organização das relações de trabalho vigentes, não o são por resistência da Lei em conferir liberdades contratuais. E, por sua vez, sabe-se que, historicamente, a Lei brasileira responde aos interesses particulares, e por vezes até mesmo individuais, das classes dominantes no país, constituída do empresariado. 9. Há, portanto, imperativos inerentes à própria classe dominante para que se possa estabelecer sistemas organizacionais com gestão participativa eficientes na realidade brasileira. Alguns destes imperativos são a desregulamentação das leis trabalhistas e a redução dos tributos parafiscais regulados pela legislação previdenciária. 10. Outros imperativos, já não inerentes às classes dominantes, devem ser observados para que se estabeleça com sucesso a adoção dos sistemas participativos. 11. Na esfera da participação na produção impera a necessidade de qualificação técnica do trabalhador para que possa tomar decisões no processo produtivo. 12. Na esfera da participação nos resultados, prescinde de acordo entre as partes a solução para repartição de resultados negativos quando ocorrer da empresa operar com prejuízos. 13. Na esfera da gestão participativa, torna-se evidente a necessidade de dar educação, desde educação de base até nível superior, à massa trabalhadora, para que se possa esperar que esta atinja um nível de competência suficiente para assumir definitivamente um posto na mesa de decisões das assembléias e conselhos diretivos das empresas, sem o risco de se ater tão somente a assuntos de competência das organizações sindicais e/ou equivalentes. 14. A educação do trabalhador, além de sua importância social isolada, é a única forma que se apresenta de fazer convergir os interesses do capital com os interesses do trabalho. É, portanto, o primeiro caminho que deve ser buscado para que se alcance um estágio de relações de trabalho em que haja efetiva co-gestão e autogestão, e que se minimize e administre adequadamente os conflitos. • 10 • 7. BIBLIOGRAFIA COELHO, Fábio Ulhoa Manual de Direito Comercial. São Paulo: Saraiva, 1993. GOTTSCHALK, Elson Guimarães A Participação do Empregado na Gestão da Empresa. Salvador: Progresso, 1958. GUILLERM, Alain e BOURDET, Yvon Autogestão: Uma Mudança Radical. Rio de Janeiro: Zahar, 1976. MELO, Marlene C. O. L. Participação como meio não institucionalizado de regulação de conflitos IN FISCHER, R. M. et alli Processo e relações do trabalho no Brasil. São Paulo: Atlas, 1987. MENDONÇA, Luís Carvalheira de Participação na Organização. São Paulo: Atlas, 1987. NASCIMENTO, Amauri Mascaro Iniciação ao Direito do Trabalho . São Paulo: LTr, 1993. NOGUEIRA FILHO, Paulo Autogestão: Participação dos Trabalhadores na Empresa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1969. REQUIÃO, Rubens Curso de Direito Comercial. São Paulo: Saraiva, 1993 . SARASATE, Paulo Participação nos lucros e na vida das empresas. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1968.