Artigo Técnico Endocrinologia – Agosto / 2007 Os efeitos benéficos da L-tiroxina nos fatores de risco cardiovascular, função endotelial e qualidade de vida no hipotireoidismo subclínico: um experimento randomizado cruzado. O hipotireoidismo subclínico (SCH) é uma condição comum e que afeta 6-17% da população geral. É controverso se o SCH pode conduzir ao risco aumentado de doença cardiovascular, e se o tratamento com L-tiroxina reduz ou anula este risco. Além disso, os efeitos do SCH no risco vascular podem ser de um grau modesto, tal que nenhum estudo possa, adequadamente, fornecer um resultado poderoso. Fármaco em estudo: Autoria: Levotiroxina RAZVI, S; INGOE, L; KEEKA, G. et al. The Beneficial Effect of LThyroxine on Cardiovascular Risk Factors, Endothelial Function, and Quality of Life in Subclinical Hypothyroidism: Randomized, Crossover Tria.l The Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism. n.92(5), p.1715-1723, 2007. Resumo Introdução O hipotireoidismo subclínico (SCH) é uma condição comum que afeta 6 a 17% da população geral. É bem definido através de níveis de T4 livre sérico (T4L) dentro dos valores de referência, mas com níveis de TSH séricos elevados. É controverso se o SCH pode conduzir ao risco aumentado de doença cardiovascular, e se o tratamento com L-tiroxina reduz ou anula este risco. Além disso, não se sabe se a terapia com L-tiroxina melhora os sintomas no SCH. Um estudo populacional concluiu que o SCH está associado com a aterosclerose aórtica e com o infarto do miocárdio em mulheres idosas, independente dos níveis de colesterol. Diversas investigações subseqüentes mostraram também uma associação de resultados vasculares pobres com o SCH. Entretanto, contrário a estes achados, diversos outros estudos não mostraram nenhum risco aumentado de doença cardiovascular no SCH. Além disso, os efeitos do SCH no risco vascular podem ser de um grau modesto, tal que nenhum estudo possa, adequadamente, fornecer um resultado definitivo. Métodos Os pacientes, de 27 clínicas generalistas em Gateshead, Inglaterra, com SCH estável (TSH maior que 4 mIU/litro e T4L dentro dos padrões de normalidade), com idade entre 18 e 80 anos, foram identificados da base de dados do laboratório depois que tinham realizado pelo menos dois testes de função da tireóide (TFT). Os TFTs tinham sido realizados devido aos sintomas que poderiam ser atribuídos ao hipotireoidismo (n=179), ou a achados coincidentes (n=103), ou devido à história familiar de doença da tireóide (n=24). Duzentos e vinte e dois pacientes foram excluídos após a avaliação inicial ou após uma visita de seleção, sendo que 100 pacientes foram recrutados para o estudo. Os critérios de exclusão foram: doença de tireóide precedente e seu tratamento, medicamentos que pudessem causar disfunção de hormônios tireoideanos, diabetes mellitus, creatinina sérica maior que 1,36 mg/dl (120 mol/litro), doença vascular (história e eletrocardiograma), condições psiquiátricas ou tratamento psiquiátrico (pelo histórico) e gravidez atual ou precedente nos último dois anos. 1 Os participantes da intervenção foram divididos aleatoriamente para receber 100 microgramas diários de L-tiroxina ou placebo, por 12 semanas. Aos pacientes foi indicado tomar uma cápsula inteira (com água) pela manhã, meia hora antes de se alimentarem. Os pontos analisados no estudo foram a melhoria no fluxo da artéria braquial e os níveis de colesterol após 12 semanas. Índices secundários como mudança no peso corporal e sua distribuição; qualidade de vida e sintomas de hipotireóide foram avaliados também. Tabela 2: O efeito do tratamento com L-tiroxina versus placebo no parâmetro vascular da artéria braquial. Tabela 1: O efeito da L-tiroxina versus placebo nos marcadores bioquímicos e antropométricos. Resultados Os resultados obtidos no estudo estão apresentados nas tabelas a seguir (dados originais): 2 Tabela 3. O efeito do tratamento com L-tiroxina versus placebo na qualidade de vida dos pacientes (dados originais) Conclusões Em conclusão, este estudo sugere que pessoas com SCH e nenhuma doença vascular aparente podem obter uma melhoria em seu perfil de fator de risco cardiovascular após o tratamento com Ltiroxina na dose de 100 microg/dia. Se a redução no LDL for sustentada nos pacientes com SCH que fazem uso de T4, os autores estimam uma redução relativa na mortalidade por doença cardiovascular em 10 anos de aproximadamente 10%. Estes dados sugerem também que os níveis do T4 sérico são fortemente correlacionados às mudanças no risco cardiovascular e os autores recomendam seu uso para monitorar tal tratamento. Estudos a longo prazo são necessários para confirmar se estes benefícios a curto prazo aparentes se traduzirão na redução de morbidade e mortalidade por doença cardiovascular. Leitura Sugerida 1. 2. 3. 4. 5. 6. Hak AE, Pols HA, Visser TJ, Drexhage HA, Hofman A, Witteman JC 2000 Subclinical hypothyroidism is an independent risk factor for atherosclerosis and myocardial infarction in elderly women: the Rotterdam Study. Ann Intern Med 132:270–278 Jorde R, Waterloo K, Storhaug H, Nyrnes A, Sundsfjord J, Jenssen TG 2006 Neuropsychological function and symptoms in subjects with subclinical hypothyroidism and the effect of thyroxine treatment. J Clin Endocrinol Metab 91:145–153 Meier C, Staub JJ, Roth CB, Guglielmetti M, Kunz M, Miserez AR, Drewe J, Huber P, Herzog R, Muller B 2001 TSH-controlled l-thyroxine therapy reduces cholesterol levels and clinical symptoms in subclinical hypothyroidism: a double blind, placebo-controlled trial (Basel Thyroid Study). J Clin Endocrinol Metab 86:4860–4866 Nystrom E, Caidahl K, Fager G, Wikkelso C, Lundberg PA, LindstedtG1988 A double-blind crossover 12-month study of l-thyroxine treatment of women with ‘subclinical’ hypothyroidism. Clin Endocrinol (Oxf) 29:63–75 Rodondi N, Newman AB, Vittinghoff E, de Rekeneire N, Satterfield S, Harris TB, Bauer DC 2005 Subclinical hypothyroidism and the risk of heart failure, other cardiovascular events, and death. Arch Intern Med 165:2460–2466 Walsh JP, Bremner AP, Bulsara MK, O’Leary P, Leedman PJ, Feddema P, Michelangeli V 2005 Subclinical thyroid dysfunction as a risk factor for cardiovascular disease. Arch Intern Med 165:2467–2472. FARMACOLOGIA RESUMIDA: LEVOTIROXINA Fármaco Classe Terapêutica Indicações Principais Levotiroxina Hormônio tireoideano • Complementação ou reposição da secreção tireoideana. • Diagnóstico e tratamento do hipotireoidismo: a tiroxina (levotiroxina; L-tiroxina) é indicada no tratamento da deficiência dos hormônios da tireóide (hipotireoidismo) de várias etiologias, bem como para hipotireoidismo simples e linfocítico crônico (Tireóide de Hashimoto). • Geralmente a levotiroxina (tiroxina na posição levógira) é o hormônio preferido para o tratamento do hipotireoidismo porque é ausente de variação e de fácil monitoração das concentrações plasmáticas; é o fármaco de escolha para o tratamento do hipotireoidismo congênito. • Profilaxia e tratamento do carcinoma de tireóide: a administração profilática de levotiroxina depois da irradiação local da glândula previne o desenvolvimento de carcinoma de tireóide. • Estudo da função da tireóide: a levotiroxina é indicada como auxiliar diagnóstico (por 3 exemplo, no teste para supressão de T3). • Interações Medicamentosas Principais Bócio adenomatoso: a levotiroxina é indicada na supressão do crescimento de bócios adenomatosos e para prevenir os efeitos bociogênicos de outros fármacos (lítio, ac. aminosalicílico). • Supressão da secreção de TSH • Os hormônios tireoideanos podem potencializar os efeitos de anticoagulantes. Assim sendo, é recomendável que se façam nos pacientes em uso destes medicamentos, freqüentes determinações do tempo de protrombina, durante tratamento com hormônios tireoideanos. • Antidepressivos tricíclicos: Aumento dos efeitos terapêuticos e tóxicos dos antidepressivos, possivelmente por aumentar a sensibilidade dos receptores das catecolaminas; efeitos tóxicos incluindo arritmias cardíacas e estimulação do SNC. • A colestiramina liga-se à levotiroxina no intestino, impedindo sua absorção. Por isso é necessário um intervalo de quatro a cinco horas entre as administrações dos dois medicamentos. A fenitoína, os salicilatos, o clofibrato, assim como a furosemida em altas doses, podem potencializar os efeitos da levotiroxina. 1. Mulheres hipotireóideas em uso de estrogênios necessitam de doses maiores de levotiroxina, pois os estrogênios aumentam os níveis séricos da globulina plasmática à qual se liga a tiroxina. Reações Adversas Principais Precauções de Uso • Quando levotiroxina é utilizada de maneira adequada, sob rigoroso controle médico, não é de se esperar a ocorrência de efeitos colaterais. Estes surgem quando se ultrapassa o limite de tolerância individual para a levotiroxina ou em caso de superdosagem, em especial se, no início do tratamento, a posologia for aumentada rapidamente. Os efeitos colaterais compreendem sinais e sintomas indicativos de hiperfunção tireoideana, tais como taquicardia, agitação, nervosismo, tremor fino nas mãos, perda de peso, diarréia, sudorese aumentada e hipertermia. • Insuficiência Adrenocortical: em pacientes com insuficiência adrenocortical, o uso concomitante de tiroxina pode levar ao aparecimento de crises agudas; • Miastenia: o uso de tiroxina pode precipitar ou exacerbar a síndrome miastênica préexistente; • Os hormônios tireoideanos devem ser usados com grande cautela sempre que houver comprometimento, comprovado ou suspeito, da integridade do sistema cardiovascular, especialmente das artérias coronárias, tal como ocorre na angina pectoris ou nos idosos. O tratamento de pacientes cardiopatas deve ser iniciado com baixas doses, que serão aumentadas aos poucos e lentamente. • A experiência clínica existente até o momento não indica qualquer efeito adverso sobre fetos, quando a levotiroxina é administrada a gestantes. • Pequenas quantidades de levotiroxina são eliminadas pelo leite, o que implica em cuidados quando se pretende administrá-la a pacientes que estejam amamentando. O uso de hormônios tireoideanos pode agravar a intensidade dos sintomas de pacientes com diabetes mellitus ou insípido, assim como insuficiência supra-renal, obrigando a reajustes no tratamento destas patologias. Referências: 1. 1. Martindale; The Complete Drug Reference; 33a edição; Pharmaceutical; Massachusetts, 2002. 2. Mosby´s. Drug Consult Ô. An Imprint of Elsevier Science. St. Louis, EUA; 2002. 3. United States Pharmacopeial Convention; Drug Information for the Health Care Profissional (USP DI); 4. 5. 6. 7. 20a edição. Korolkovas, A. e França, F.F.C.A. Dicionário Terapêutico Guanabara. Edição 2001/2002. Editora Guanabara Koogan. Rio de Janeiro-RJ. P.R. Vade Mécum; Brasil, 10a edição; Câmara Brasileira do Livro. São Paulo-SP, 2005. Rang, H. P.; Dale, M. M.; Ritter, J. M.; Farmacologia; 5a edição (3ª revisão); Editora Guanabara Koogan; Rio de Janeiro, 2005. Goodman & Gilman. The pharmacological basis of therapeutics, 11th ed. Bruton, Lazo and Parker editors; Mc Graw Hill Ed. USA, 2006. Artigo Técnico Endocrinologia é parte integrante do SAP®, produto exclusivo da Racine Consultores Ltda. 4