PARA INVESTIGAR OS ARGUMENTOS DE REPRESENTAÇÕES SOCIAIS MAZZOTTI, Tarso B.1 - UNESA Grupo de Trabalho - Cultura, Currículos e Saberes Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo As instituições escolares são um laboratório “natural” para identificar os argumentos que constituem representações sociais, pois conceitos produzidos por grupos de especialistas precisam ser adaptados às finalidades de ensino para que influenciem as condutas dos alunos, bem como de seus professores. Este procedimento, não específico da escolarização, atende às necessidades e interesses dos grupos sociais, servem para garantir o que se considera desejável. O anonimato das representações sociais tem grande força persuasiva, pois aparecem como a voz comum e seus argumentos são condensados e coordenados por figuras de pensamento, ou elementos figurativos. As figuras ou esquemas de pensamento que condensam e coordenam argumentos persuasivos. Esses esquemas “desviam” o que se considera serem os significados de palavras, ou enunciados literais instituindo novos significados ou ressignificando os conhecidos. Os que mais interessam no âmbito da análise são a metáfora e a metonímia, que instituem o que se diz ser o real. Ambas comparam o tema, o que se quer significar ou ressignificar, com o foro, do qual são escolhidos os significados a serem transferidos ao tema. Estas duas figuras ligam noções, uma operação cognitiva cujo inverso, a dissociação, divide em dois termos uma noção usualmente unida, em que o primeiro carece das qualidades afirmadas completas e superiores do segundo. Estes e outros esquemas encontram-se no tratado Retórica, um conjunto de conhecimentos confiáveis acerca dos limites das ações que pretendem modificar as crenças, atitudes e valores. Logo, tem o mesmo objeto da Psicologia Social: expor e explicar o processo de influência. Palavras-chave: Representações Sociais. Ressignificação de palavras. Novos significados. Introdução A representação social é um fenômeno generalizado que tem por função operacionalizar em comportamentos os argumentos produzidos em alguma ciência, ideologia 1 Doutor em Educação pela USP; Professor Titular de Filosofia da Educação UFRJ; Professor Adjunto na Universidade Estácio de Sá, P.P.G. em Educação; Pesquisador Associado do CIERS-ed/Fundação Carlos Chagas. 7105 ou cultura (MOSCOVICI, 2004 [1961]), em que qualificativo social refere-se ao para quê serve (MOSCOVICI, 2004, p. 75-76): A representação social tem por função “operacionalizar” proposições de alguma atividade especializada para influenciar as condutas dos membro de um grupo. O que se faz por meio de uma adaptação de suas proposições, assim “[...} uma ciência recebe seu duplo, uma sombra sobre o corpo da sociedade, e, de outro, duplica-se no que está fora do ciclo e no ciclo das transações dos interesses comuns da sociedade (MOSCOVICI, 2004, p. 77). Uma vez que a produção de representação social é intencional, então: O argumento de precisão, graças a uma nova abordagem quantitativa, não é decisiva. Nos parece que o estudo comparativo da representações sociais é absolutamente necessário para uma disciplina como a nossa, dependente da possibilidade de gerar conteúdos que possam ser sistematicamente relacionados (MOSCOVICI, 2004, p. 69) A representação social “[...] oferece um conjunto de elementos figurativos e um sistema de significações prontos para operar” (MOSCOVICI, 2004, p. 79). Por isto, a pesquisa de representações sociais deve partir da análise do que é duplicado para expor as suas proposições, comparando-as com as figuras de pensamento que constituem o “campo da representação ou imagem” (MOSCOVICI, 2004, p. 66). O que se pode entender por “elementos figurativos”? Os elementos figurativos. Qual o significado os elementos figurativos? Aqui é suficiente dizer que figurativo refere-se a esquema (palavra grega que os latinos traduziram por figura) que “desvia” (tropos) uma palavra ou um enunciado de seu significado “literal”. As figuras que mais interessam no âmbito da análise dos discursos são a metáfora e a metonímia, que instituem o que se diz ser o real. Ambas comparam o tema, o que se quer significar ou ressignificar, com o foro, do qual são escolhidos os significados a serem transferidos ao tema. A metáfora é produzida a partir da comparação entre noções que diferem em gênero ou espécie; a metonímia, compara noções de mesmo gênero ou espécie. Ao dizer: "a cabeça da criança é como uma folha de papel em branco", produz-se uma metáfora; enquanto, “o professor é como um organista que executa uma partitura que eventualmente não saberia escrever”, produz-se duas metonímias. A metonímia professor/organista, em que compara atividades humanas similares, ambas são intelectuais e técnicas, portanto do mesmo gênero; e, 7106 livro didático/partitura, que se refere a um conjunto de regras do fazer, logo, da mesma espécie do gênero atividades reguladas (MAZZOTI, 2008). Estas duas figuras de pensamento ligam noções, uma operação cognitiva que requer a escolha dos referentes, ou do foro. A operação inversa, a dissociação, divide em dois termos uma noção usualmente unida, em que o primeiro carece das qualidades afirmadas completas e superiores do segundo. Assim, no âmbito dos discursos acerca da educação escolar, o professor é o termo I da dissociação de trabalho docente, em que educador é o termo II. O primeiro expressa a noção pejorativa de “funcionário”, “mero técnico”, enquanto o segundo, o educador, aproxima-se da noção usual de apóstolo. Esta dissociação encontra-se em Rubem Alves em seu Conversas com quem gosta de ensinar, e que é uma expressão da ideologia de o magistério ser como um apostolado (REBOUL, 1984). Em suma, as operações de ligação e de dissociação de noções sustentam-se em comparações entre o tema e o foro, no primeiro caso; e entre os termos divididos de uma noção habitualmente unida, no segundo. Ambas as operações expõem o que se escolhe para comparar, portanto, o que as pessoas consideram relevantes para si em seus grupos. Haveria um lugar psicossocial privilegiado para investigar as representações sociais?. Laboratório para identificar as representações sociais. O laboratório privilegiado para a investigação dos argumentos que constituem representações sociais são as instituições escolares, estas entendidas como o conjunto de produtores de materiais de ensino e de exames, bem como de professores organizados segundo suas disciplinas escolares. No ensino de conceitos produzidos pelas ciências os atores sociais procuram adaptá-los aos seus públicos para influenciarem as condutas dos alunos. Este procedimento não é específico da escolarização, é mais amplo e comum, como mostrou Moscovici, não sendo relevante saber quem produziu a representação social, mas para que ela serve. De fato, o anonimato tem grande força persuasiva, pois os argumentos aparecem como se todos os admitissem e constituídos e expostos nos “elementos figurativos”. O que pode ser mostrado, por exemplo, nas proposições originárias da ideologia naturalista que afirma ser preciso desenvolver “uma consciência ecológica” para constituir uma “sociedade ambientalmente sustentável”, uma representação social que adapta os conceitos científicos àquela ideologia (MAZZOTTI, 2013, no prelo). 7107 Conclusão Estes e outros esquemas encontram-se no tratado Retórica, que é um conjunto de conhecimentos confiáveis acerca dos limites das ações que pretendem modificar as crenças, atitudes e valores. Logo, tem o mesmo objeto da Psicologia Social: expor e explicar o processo de influência. Este é, como se sabe, o problema central da tese de Moscovici, na qual procura compreender os mecanismos de difusão e propaganda, centrando-se nesta que incita a agir e produzir avaliações favoráveis e contrárias a algo por meio de uma nova representação do que se diz ser real (MOSCOVICI, 2004, p. 454). REFERÊNCIAS MOSCOVICI, Serge. La psychanalyse son image et son public. Paris: P.U.F. 2004. ( 1. ed. 1961). MAZZOTTI, Tarso B. Doutrinas pedagógicas, máquinas produtoras de litígios. Marília (SP): Poïesis, 2008. MAZZOTTI, Tarso B. Educação ou doutrinação ambiental? Análise retórica dos discursos de ambientalistas latino-americanos. Marília (SP); New York, Poíesis, 2013 (ebook, no prelo). REBOUL. Olivier. Le langage de l‘éducation. Paris: P.U.F. 1984.