a reforma do estado e suas expressões para a reforma

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A REFORMA DO ESTADO E SUAS EXPRESSÕES PARA A REFORMA
UNIVERSITÁRIA BRASILEIRA
Aline Viero Kowalski
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Resumo: O presente artigo discute sobre a reforma universitária e as
transformações que vem ocorrendo nela a partir de 1990. Assim,
desenvolveu-se uma reflexão sobre a crise do Estado brasileiro, o
qual passa por uma profunda reforma na passagem dos anos 198090. A reforma do Estado representou a adequação da sua estrutura
às exigências de um país mais subalterno e eficiente aos interesses
do capital internacional. Esta incorporação do Estado à lógica do
mercado externo, levou a educação a uma redemodelagem,
materializada em legislações que redimensionam o ensino superior e
rebatem na garantia do acesso ao direito à educação no Brasil.
Palavras-chaves: Reforma universitária, políticas de assistência
estudantil.
Abstract: This article discusses the university reform and the changes
that has occurred there since 1990. Therefore, it was developed a
reflection on the crisis of the Brazilian state, which course for a deep
reform throughout 1980 and 1990. The reform of state represented
the structure of its appropriateness to the requirements of a country
more subordinate and efficient to the interests of international capital.
This joint of State to the market logic, brings a redesigning education,
materialized in laws that resizes the higher education and dispute in
ensuring the right of access to education in Brasil.
Key words: University reform, policies for student assistance.
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Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande Do Sul. E-mail: [email protected]
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1 INTRODUÇÃO
Atualmente vivemos um período de reestruturação do Estado e desregulamentação
das relações econômicas e sociais em uma perspectiva neoliberal que submete o Estado
nacional aos ditames do capital internacional e dos organismos internacionais como Banco
Mundial, FMI, BIRD. Trata-se de uma lógica de contra-reforma que visa atender as
demandas do capital e possibilitar o controle de países que se caracterizam pelo seu
subdesenvolvimento social, econômico, político e educacional (LIMA, 2007).
No âmbito do ensino superior, a política orientada por organismos internacionais tem
implicações negativas para educação, uma vez que busca de novos mercados e também,
novos campos de exploração.
Essas implicações negativas talvez sejam as mais
destrutivas das reformas neoliberais, materializadas na reforma universitária, marcando a
proliferação desordenada dos cursos de ensino à distância e a expansão vertiginosa de
instituições privadas em detrimento do ensino público.
A partir dessas evidências, o presente artigo visa discutir e refletir sobre a reforma
universitária, a qual acompanhou a reforma do Estado brasileiro, sendo que as principais
transformações no ensino superior brasileiro foram indicadas na Lei de Diretrizes e Bases
(LDB, N. 9394/96) e materializadas no governo Fernando Henrique Cardoso e Luis Inácio
Lula da Silva.
Nesta perspectiva, a LDB representa um marco no processo da liquidez do ensino
superior no Brasil, na privatização interna das universidades públicas ou do estímulo à
abertura de cursos privados. Essas ações foram administradas desde a década de 1990
com a institucionalização da nova LDB e através do apoio dos governos Fernando Collor de
Mello passando por Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso e, atualmente, Luis Inácio
Lula da Silva.
O tempo presente revela a desregulamentação e perda de conquistas, sendo que a
educação ainda não se tornou direito a todos, forjando-se um quadro de desigualdade e
injustiça social, tanto no campo das oportunidades de acesso a níveis cada vez mais
complexo de ensino, quanto no campo da qualidade de oferta dos serviços educacionais
existentes no país.
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2 CONTEXTO HISTÓRICO DA REFORMA DO ESTADO A PARTIR DOS ANOS 1990 E
SUAS EXPRESSÕES NA REFORMA UNIVERSITÁRIA NO BRASIL
Refletir sobre as transformações do Estado, remete uma análise para a reforma do
Estado brasileiro na passagem dos anos 1980-1990, marcado por um processo tenso de
disputas sociais e políticas. Netto lembra que “foi no percurso dos anos 80, que a questão
de reformar o Estado se colocou no Brasil de maneira inadiável” (NETTO, 2001, p.11).
Certamente foi inadiável a reforma do Estado neste período, pois deriva a
passagem para a democratização do país, no esforço de superar os marcos da ditadura, a
qual somos herdeiros de uma tradição política marcada por golpes, cujo escopo é manter a
estrutura de classe, de concentração, de poder e de renda. Esta tradição política, social e
cultural radicaliza-se numa regressão nos colocando no rol das sociedades mais desiguais
do mundo!
O marco dessa passagem histórica está consubstanciada na promulgação da
Constituição Federal de 1988. Esse ordenamento jurídico-político vai significar um avanço
social e político para a sociedade, configuram-se pela primeira vez na história do Brasil, as
garantias sociais e os direitos sociais. Entretanto, sua materialização é marcada por
percalços e movimentos políticos de desmantelamento.
Assim, vale lembrar que a apreensão as transformações no ensino superior como
elemento isolado é um equívoco, pois, ela esta inserida num movimento mais amplo do
capital em busca de novos mercados e também, de novos campos de exploração.
Lima (2007) discute em sua obra, a reforma do Estado paralelamente conectada com a
reforma do ensino superior no Brasil. Apresenta a “reformulação da educação superior”,
fazendo um recorte temático a partir da década de 1990. Essa autora demonstra em seu
trabalho que a reforma aconteceu sob um discurso moralista, baseado num forte apelo de
progresso e desenvolvimento para a educação superior no Brasil. Entretanto, tais
argumentos, como a do alívio à pobreza que se amplia e aprofunda; de constituir um novo
projeto de sociabilidade burguesa, e de fomentar a constituição de novos mercados de
investimentos para o capital internacional. (LIMA, 2006). Representaram na prática, as
privatizações em massa das universidades públicas e abertura de vagas em instituições
privadas. Este período configura-se como a autora chama de primeira fase da reforma
universitária.
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Nesta primeira fase da reforma do Estado e da educação superior no Brasil, o país
era dirigido pelo então presidente Fernando Collor de Mello (1990/ 92), seguido pelo
sucessor Itamar Franco (1993/ 94). Esses governos elaboram as noções de eqüidade,
eficiência e competitividade na educação. Lima (2007) contribui para sistematizar as
principais ações desses governos na reformulação da educação:
1°) Abertura da economia brasileira e modernização das universidades:
“Proponha um percentual fixo do orçamento da União para as universidades Federais, para
que assumissem o pagamento dos salários e das despesas de custeios e novos
investimentos”. (LIMA, 2007, p.131)
2°) Essa ação, trata-se de transformar as universidades públicas em uma organização,
retirando a condição de servidor público dos trabalhadores, com isso visa o enfraquecimento
da categoria profissional e consequentemente o aniquilamento da mesma.
3°) Incide na desnacionalização de setores estratégicos do país, detona a política privatista
deste governo.
4°) Outra ação de política privatista é a proposta de extinção da Coordenação
de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior- CAPES e do Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais- INEP. A idéia de formação para o mercado e não para pesquisa
científica.
5°) Essa ação volta-se ao financiamento público, o qual não era utilizado o mínimo (18%),
conforme previsto na Constituição Federal de 1988.
6°) Nesta ação evidencia-se o favorecimento da expansão do ensino privado, há um maior
subsídio público para o setor privado, estimulando a modernização da educação por meio
da tecnologia. (LIMA, 2007).
Observa-se que as ações governamentais estão intimamente conectadas a reforma
de ensino superior no país. Toda coincidência não é ingênua! Ora, se a idéia era e é tornar o
país mais competitivo, mais engajado ao mercado internacional, então é evidente que a
educação como parte da União também tem que seguir esse ritmo e acompanhar o
movimento dito de “modernização da educação” superior brasileira.
Vale ainda salientar que é também neste governo, que irá emergir uma forte disputa
de discussões em torno da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Neste processo de
regulamentação da LDB2 /1996 se expressam as correlações de forças entre Estado e
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Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – lei 9.394, de 20/12/1996 que se constitui como
arcabouço legal da mais ampla e profunda reforma do ensino superior no Brasil, após a ditadura
militar. (IAMAMOTO, 2000, p.35)
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sociedade e neste terreno de disputas acredita-se que a universidade é contributiva no que
se refere “a construção do processo histórico na direção da liberdade, da equidade e da
democracia para todos os cidadãos e cidadãs” (NETTO, 2000, p.37).
O significado da LDB está em redimencionar a política educacional do país. Portanto,
foi anunciada como uma medida modernizadora, de universalização e democratização da
educação. Para além do discurso imposto, estamos diante da redução dos serviços públicos
e estímulos aos serviços privados. A Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa do Serviço
Social –ABEPSS (2000), alerta que a LDB repercute em todos os níveis da educação,
perpassando pela:
Opção político-econômica que se desenvolve a partir de três eixos: a reestruturação
produtiva, a mundialização do capital e o neoliberalismo, com suas reformas
orientadas para o mercado, e como corolário ídeo-político estimulador do
individualismo possessivo, da competitividade, do consumismo e do autismo.
(ABEPSS, 2000, p.167).
Nesta citação emblemática, fica evidenciado que as mudanças no ensino superior
estão indicadas pela LDB, as quais, também, estão de acordo com os organismos
internacionais.
No governo Fernando Collor de Mello e Itamar Franco a reforma do Estado e no
ensino superior ganhou maior visibilidade por conta institucionalização da nova LDB;
entretanto, nos governos seguintes também foi aprofundado essas transformações. Assim,
no governo de Fernando Henrique Cardoso- FHC (1995/98 e 1999/2002) concebeu-se a
educação numa segunda fase de reformulação:
A identificação da educação como um serviço público não-estatal, foi
operacionalizada uma crescente desresponsabilização do Estado com a educação
superior, por meio da redução de verbas públicas para seu financiamento e,
simultaneamente, do estímulo ao empresariamento deste nível de ensino, sob a
aparência de democratização do acesso à educação. (LIMA, 2007, p.126)
Se no governo anterior houve a institucionalização da legislação que propunha a
liquidez do Estado, neste governo é a própria viabilização da lei com objetivo de concretizar
a reforma. Nesta via, a terceira fase de reforma é dada pelo governo Luís Inácio da Silva (de
2003 até o decorrer deste ano-2009), onde vem aprofundar as ações de governos
anteriores.
A premissa deste governo que a educação está inserida no setor de serviços não
exclusivos do Estado, assim, naturaliza a alocação de verbas públicas para as privadas e o
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financiamento privado para instituições públicas, diluindo as fronteiras entre o público e o
privado. (LIMA, 2007).
Neste governo viu-se o aprofundamento da reforma do ensino superior no Brasil. O
exemplo disso tem-se nas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) como meio da
educação superior à distância, no qual atualmente vive um processo de expansão acelerada
com a proposta de reforma universitária.
Segundo Boschetti (2008) é no governo de FHC e Lula que a reforma toma seu ápice
de visibilidade, sendo essa indicada pela LDB.
As mudanças do ensino superior estão indicadas na LDB, mas foram as propostas
de reforma universitária do governo FHC e governo Lula que materializaram e
agudizaram as propostas da LDB. Todas as medidas ali previstas – exame nacional
de curso, mestrado profissionalizantes, substituições dos currículos mínimos por
diretrizes curriculares, cursos seqüenciais, ensino à distância em todos os níveis –
seguem diretivas dos organismos internacionais, no sentido da privatização das
políticas sociais, de favorecimento da expansão dos serviços privados, de
diversificação e massificação do ensino e de reconfiguração das profissões.
(BOSCHETTI, 2008, p.07).
Desta forma, não se pode deixar de mencionar alguns rebatimentos da reforma
universitária que vem alterando a organização de ensino superior pública e privada do país:
Aumento desigual de oferta de vagas na privada em relação às instituições de ensino
público;
Acepção de novas modalidades de ensino: cursos tecnológicos, ensino a distância,
mestrados profissionalizantes;
Precarização do trabalho docente e esgotamento do mesmo. A exigência de um
trabalhador polivalente;
A emergência de novos projetos de formação profissional;
Novo perfil profissional compatível com a lógica atual (competitivo, empreendedor,
qualificado para atuar no mercado);
A concepção de direito a educação voltada para produção e reprodução capitalista,
conforme os ditames do mercado internacional.
Santos (2005) vem lembrar que a crise nas universidades públicas por via da
descapitalização, é um fenômeno global, ainda que sejam significativamente diferentes as suas
conseqüências nos países em desenvolvimento.
Os fatores desta crise configuram-se no período do capitalismo avançado por via de
lutas de direitos sociais e econômicos. Desta forma, a crise das universidades também é
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agudizada pela diminuição de investimentos nos programas assistenciais aos estudantes, os
quais subsidiam a permanência do aluno no ensino superior.
Na argumentação de ALMEIDA (2000) a crise estrutural do sistema de educação não
permite a universalização do ingresso na educação escolarizada. Em razão das condições
objetivadas da luta pela sobrevivência que obriga parte da população a optar pelo trabalho. A
política educacional no Brasil mostra-se atualmente atravessada por um forte traço assistencial
com programas focados nos diferentes segmentos das classes subalternizadas.
Seja pela dificuldade de se conciliar trabalho e escola seja pela perda de atrativo
social da escola no que diz respeito às possibilidades reais de ascensão social via
estudos ou ainda, em razão de que as alterações na esfera da produção acabaram
por deslocar certos processos de qualificação da mão de obra, através de
conhecimentos e informações, da escola para as próprias unidades produtivas ou
por todos os fatores combinados, o fato é que a escola vinha se esvaziando
qualitativa e quantitativamente de forma cada vez mais acelerada. Daí o conjunto de
ações assistenciais que foi tomado para mudar esse quadro, inclusive na esfera da
educação superior, onde são extremamente elevados os índices de evasão,
chegando a cerca de 50% (ALMEIDA, 2000, p.73).
Sendo a educação um dos pilares fundamentais dos Direitos Humanos, da
democracia e do desenvolvimento da sociedade, portanto como um bem público deve ser
acessível e estar a serviço de todos. Por esse motivo, o acesso universal e a permanência
ao ensino superior é considerado um meio de garantir direitos através da formação
profissional qualificada e buscar o redimensionamento de espaço plural onde se possa
exercitar o conhecimento, a cidadania, o diálogo, a tolerância e o reconhecimento das
diversidades sociais.
3 CONCLUSÃO
O desafio posto neste estudo, foi à análise da reforma universitária no Brasil a partir
dos anos 1990 e no advento da LDB/1996, pois a realidade está em curso, impondo novos
contornos e novas configurações travadas pelo projeto antagônico da reforma universitária.
A reforma universitária que está sendo desenvolvida pelo atual governo (Lula) está
inserida em um processo mais amplo do reordenamento do Estado capitalista, considerando
como uma das principais estratégias para o enfrentamento da crise estrutural do
capitalismo.
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A materialização da reforma universitária é visível pelo aprofundamento das reformas
neoliberais, em conexão com as políticas elaboradas, difundidas e monitoradas pelos
organismos internacionais. Desta forma, é perceptível o reordenamento do Estado frente à
reforma universitária, onde vem realizando a diluição das fronteiras entre o público e o
privado, alargando meios de processo de privatização de serviços públicos, incluindo a
educação superior.
Neste movimento, a reforma universitária aliada ao pouco investimento orçamentário
nas Instituições de Ensino Superior- IES, revelam a desregulamentação e até mesmo a
perda de direitos conquistados ao longo dos anos. Essa perda de direitos incide na política
de assistência estudantil, aprofundando a crise em sua estrutura, assim como, no miúdo da
vida concreta do estudante.
REFERÊNCIAS
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