Thamilin Aso A COMPUTAÇÃO GRÁFICA NO CONTEXTO DA EXPERIMENTAÇÃO ARTÍSTICA: O CASO DA CRIAÇÃO DE AMBIENTES VIRTUAIS INTERATIVOS Pesquisa desenvolvida sob orientação da Prof. Dra. Monica Baptista S. Tavares, no Departamento de Artes Plásticas da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, vigência: setembro de 2011 a agosto de 2012. São Paulo, 2012 FORMULÁRIO PARA ENCAMINHAMENTO DE RELATÓRIO FINAL BOLSA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA – PIC/USP (PIBITI/USP - CNPq-INSTITUCIONAL) 1. IDENTIFICAÇÃO TÍTULO DO PROJETO: A computação gráfica no contexto da experimentação artística: o caso da criação de ambientes virtuais interativos NOME DO BOLSISTA: Thamilin Aso NOME DO ORIENTADOR: Monica Baptista S. Tavares 2. APRECIAÇÃO DO ORIENTADOR SOBRE O RELATÓRIO O relatório apresentado pela aluna destaca as atividades por ela desenvolvidas no período de vigência da Bolsa PIBIT / CNPq. No mesmo, estão indicadas as etapas realizadas e os resultados do que foi produzido neste ano de trabalho. O relatório está muito bem organizado, está completo e expõe com clareza e detalhe o conteúdo produzido no período de vigência da bolsa. O trabalho demonstra a qualidade do percurso galgado pela bolsista. É importante destacar a originalidade e a qualidade do material produzido, tanto no que se refere à pesquisa bibliográfica quanto à experimentação artística. 3. APRECIAÇÃO DO ORIENTADOR SOBRE O DESEMPENHO ACADÊMICO DO BOLSISTA A aluna realizou com compromisso as atividades implicadas na pesquisa, apresentando um excelente desempenho. Demonstrou avanço e progresso principalmente no que concerne à capacidade de sistematizar e associar idéias. A bolsista trabalhou com seriedade, empenho e dedicação. Manifestou capacidade criativa e familiaridade no “manuseio” dos modelos de representação, conseguindo transpor as limitações encontradas durante todo o desenvolvimento da iniciação. Utilizou de forma bastante adequada o aparato teóricometodológico indicado para obtenção dos objetivos requeridos no plano de trabalho. Merece destacar a sua iniciativa nas direções e decisões tomadas para a concretização do estudo. 1 4. SÚMULA DO PROJETO O plano de trabalho intitulado “A computação gráfica no contexto da experimentação artística: o caso da criação de ambientes virtuais interativos” se insere no contexto da pesquisa “Os modos de ver e a formação de identidades na era da estética digital: o caso dos ambientes virtuais interativos”, de autoria da Profa. Dra. Monica Tavares. Esta pesquisa investiga as especificidades do processo de produção artística a partir de mídias digitais e prevê a produção de trabalhos de arte que tem como base a utilização de inovações tecnológicas, mais especificamente a computação gráfica. Dentro do amplo leque de estudos e aplicações que a computação gráfica e os ambientes virtuais interativos permitem, este plano de trabalho optou por se focar em um caso específico: o dos videogames, ou jogos eletrônicos. Antes marginalizado como “brincadeira de criança” ou “puro entretenimento”, nos últimos tempos, o videogame tem ganhado a atenção de diversos teóricos, começando a ser estudado como uma mídia de grandes potencialidades e inegável impacto sócio-cultural. Nesse sentido, esta pesquisa buscou investigar essa nova linguagem, principalmente a partir de seu enorme potencial artístico e narrativo. O desenvolvimento da pesquisa se deu a partir dos seguintes procedimentos metodológicos: - Pesquisa bibliográfica – investigação teórica a partir da leitura e fichamento de textos sobre teoria de games, focando especificamente a questão dos jogos narrativos. - Pesquisa experimental – busca de repertório tecnológico e poético acerca da produção atual dos trabalhos de arte em questão, no caso, jogos de videogame. - Pesquisa de laboratório – atividade prática de desenvolvimento da proposta poética com base na utilização das mídias digitais, no caso, desenvolvimento de um projeto de jogo. - Seminários de discussão – reuniões de discussão do andamento do projeto. 2 Cronograma: Ano 2011/ 2012 Pesquisa bibliográfica Pesquisa experimental Set Out Nov Dez Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago / 11 / 11 / 11 / 11 / 12 / 12 / 12 / 12 / 12 / 12 / 12 / 12 X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X Pesquisa de laboratório Seminários de discussão X X X 5. RESUMO DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS Durante o primeiro período de vigência da pesquisa, foram realizados a leitura e o fichamento de textos que abordam a linguagem dos videogames, focando principalmente a questão das narrativas interativas e a relação entre videogames e histórias, uma vez que este era, desde o princípio, o assunto de maior interesse dentro do tema. Ainda no primeiro período, também foi realizada a pesquisa experimental, isto é, a busca pela criação de um repertório tanto tecnológico quanto poético acerca do tema, o que significou um levantamento das primeiras questões gerais, que serviram como base para a criação da proposta prática. A busca pelo repertório tecnológico partiu de uma investigação geral das necessidades técnicas para a produção de jogos de videogame e uma busca pelos meios mais adequados em termos de sua realização prática, dadas as condições de pesquisa. Nesse sentido, foi realizada uma pesquisa das alternativas em termos de programas de computador e linguagens de programação que poderiam ser utilizados, e também a verificação da existência de materiais de auxílio à utilização do instrumental tecnológico, de acesso fácil e gratuito, como os tutoriais disponíveis online. Já no que se refere à construção do repertório poético, foi realizada uma pesquisa com relação a diferentes tipos e gêneros de jogo, numa busca por referências para a criação do projeto prático. De posse dos conhecimentos adquiridos, iniciou-se então a pesquisa de laboratório, isto é, o desenvolvimento da atividade prática propriamente dita, que corresponde ao foco central deste plano de trabalho. 3 No primeiro período, foram desenvolvidas as primeiras ideias em torno do projeto de jogo, considerando variáveis importantes como: tamanho do projeto, viabilidade de realização e possibilidades criativas. Também se definiu o gênero e a atmosfera que se pretendia criar, e foram iniciados os primeiros esboços de roteiro. Além disso, foi iniciada a pesquisa a respeito dos assuntos técnicos específicos a serem aprendidos para a construção da experimentação prática. No segundo período de pesquisa, definiu-se o roteiro definitivo da experimentação prática, e realizou-se a sua execução efetiva, a partir da continuidade da pesquisa técnica. A princípio, o plano de trabalho previa um aprofundamento da pesquisa bibliográfica no segundo período, porém dada a complexidade das implicações técnicas envolvidas na realização da proposta poética, preferiu-se, nesse segundo momento, privilegiar a realização da experimentação prática. Vale observar que o resultado obtido no primeiro período já apresenta boa consistência teórica. Por fim, vale notar que durante todo o período de pesquisa também foram realizados os encontros semanais de discussão do projeto. 6. RESULTADOS FINAIS 6.1. Pesquisa Bibliográfica 6.1.1. Teoria de Games e Estudos sobre Games e Histórias Jogos fazem parte de uma tradição humana muito antiga. Mas jogos de computador ou videogames não são apenas jogos numa nova tecnologia, mas também uma nova linguagem midiática, artística e narrativa. No entanto, o reconhecimento do videogame como uma mídia de expressão cultural parece ser um fenômeno recente. Por um longo período, os videogames foram marginalizados como entretenimento de “baixa cultura”, do mesmo modo que o cinema, em seus primórdios, era apenas um número a mais em feiras de atrações. Segundo Celia Pearce (2004, p. 143), a literatura, o cinema, e mesmo a música popular, todos começaram como gêneros “populares” que, uma vez que tiveram sua relevância cultural provada, chamaram a atenção dos teóricos e entraram no discurso acadêmico. Os videogames parecem então estar seguindo este mesmo 4 caminho, sendo hoje, segundo Espen Aarseth (2004, p. 45), finalmente reconhecidos como um fenômeno social e estético de larga escala a ser levado a sério. Boa parte dos autores atenta para o fato de haverem muitos questionamentos e discordâncias nos estudos sobre a relação entre games e histórias. Aarseth (2004, p. 45) coloca em palavras simples a controvérsia que existe nos estudos de games a respeito da relevância da narrativa para a linguagem do meio. Segundo ele, um lado argumenta que os games são uma mídia para contar histórias, enquanto o outro defende que games e histórias são estruturas diferentes com objetivos opostos, acreditando que a combinação entre os dois é impossível. Henry Jenkins (2004, p. 118) faz uma divisão parecida, utilizando as expressões “ludologists” – para se referir àqueles que procuram focar a discussão nas mecânicas do gameplay, isto é, na jogabilidade e no funcionamento do jogo em si – e “narratologists” – para definir os que estão interessados em estudar os games ao lado de outras mídias narrativas. A maioria dos teóricos estuda e analisa as tentativas de combinação entre games e histórias, permanecendo insatisfeitos com o modelo de jogos narrativos que impera hoje. A diferença é que alguns acreditam que os games não deveriam aspirar a contar melhores histórias, enquanto outros estão à procura de alternativas para a criação de uma perfeita fusão entre as duas estruturas. A simples pergunta “o videogame conta ou não conta histórias?” gera uma discussão enorme que começa com a dificuldade de obter uma definição universal para a ideia de “narrativa”. Cada autor percebe este conceito a partir de sua própria interpretação, de modo que a definição do videogame como uma linguagem narrativa ou não, acaba dependendo sobretudo da definição de narrativa que se tem em mente. Jenkins (2004, p. 119) defende que nem todos os games contam histórias, tratandose de uma forma essencialmente abstrata, expressiva e experiencial, que fica mais próxima da música e da dança do que do cinema. Ao mesmo tempo, entretanto, o autor admite que muitos games têm sim aspirações narrativas: Minimally, they want to tap the emotional residue of previous narrative experiencies. Often, they depend on our familiarity with the roles and goals of 5 genre entertainment to orient us to the action, and is many cases, game designers want to create a series of narrative experiences for the player.1 Muitos autores também se atentam para o fato de que teóricos de outras áreas, como cinema e literatura, começaram a discutir teoria de games. Para Pearce (2004, p. 144), é natural que eles tentem trazer seus conhecimentos para a discussão, uma vez que são especialistas em narrativa. O problema é que os elementos do videogame que fazem as histórias dos games diferentes das outras permanecem pouco compreendidos. Segundo Pearce (2004, p. 143), peritos de narrativa em outras mídias na maioria das vezes não conseguem realmente entender o que os games são em essência. Nas palavras da autora, “they continue to struggle to ‘fit a square peg into a round hole’, so to speak, by attempting to force games into their own notions of narrative and ‘text’”2. É importante então estar atento à particularidade dos videogames como uma linguagem, aos aspectos que nós gostamos nos games e que lhes são únicos e originais. Comentando o exemplo do jogo arcade Ms. Pac-Man, Eric Zimmerman (2004, p. 162163) afirma que sua “game story”, ou seja, a história “contada” pelo game, certamente não oferece os mesmos prazeres que um romance ou um filme. Mas não há motivo para que tenhamos este tipo de expectativa, pois a questão em jogo é: quais prazeres narrativos os games podem proporcionar que os filmes e livros não podem? Segundo Sabina Anzuategui (2002, p. 7), em mídias interativas, o modelo clássico de dramaturgia (três atos, protagonista, conflito, desfecho) não se aplica. Nos videogames, a narrativa tem uma função diferente da que ela exerce em outras mídias. A literatura e o cinema focam na história, e a ênfase de uma história está no desenvolvimento do enredo, nas relações causais entre os eventos, no arco dramático, etc. Games, no entanto, focam na jogabilidade e na experiência do jogador (PEARCE, 2004, p. 144). As prioridades das histórias e dos jogos são, portanto, diferentes. Nos games, os conceitos de jogo e diversão estão acima dos outros princípios. 1 No mínimo, eles querem tocar o resíduo emocional de experiências narrativas anteriores. Freqüentemente, eles dependem de nossa familiaridade com os papéis do entretenimento de gênero para nos orientar para a ação, e em muitos casos, os game designers querem criar uma série de experiências narrativas para o jogador (tradução nossa). 2 Eles continuam a lutar para “encaixar um pino quadrado em um buraco redondo”, por assim dizer, ao tentar forçar os games dentro de suas próprias noções de narrativa e “texto" (tradução nossa). 6 A função primordial da narrativa nos games seria então criar uma experiência de jogo estimulante (PEARCE, 2004, p. 144), sendo que a razão pela qual os jogos narrativos ganharam tanta popularidade é que eles aproveitam o que é envolvente e interessante sobre outras formas de narrativa e usam-no para melhorar a experiência de jogo. 6.1.2. Do que se tratam os Games – Características Gerais Jogos são, por definição, um “tipo formal de brincadeira”, um sistema criado para uma “brincadeira estruturada”. Na maioria dos casos esta estrutura inclui algum tipo de objetivo, obstáculos a esse objetivo e recursos favoráveis para ajudar no objetivo, assim como conseqüências, na forma de punições ou recompensas (PEARCE, 2004, p. 144). A estrutura a partir da qual a jogabilidade surge é baseada em regras. Todos os jogos têm regras. Elas definem o que os jogadores podem ou não fazer, limitando seu comportamento. Participar de um jogo é, portanto, submeter seu comportamento às restrições das regras (ZIMMERMAN, 2004, p. 160-161). Além disso, todos os jogos apresentam também um gameworld, ou seja, um sistema semiótico que representa o universo do jogo, sendo que a jogabilidade resulta da aplicação das regras a este sistema (AARSETH, 2004, p. 47-48). Games também estão relacionados à ideia de competição de poderes (ZIMMERMAN, 2004, p. 160) ou conflito. Para Janet Murray (2004, p. 2), a competição, em inglês “contest, the meeting of opponents in pursuit of mutually exclusive aims"3, e o puzzle (quebra-cabeça), que pode ser visto como uma disputa entre o jogador/espectador e o game designer/autor, são elementos que os games e as histórias têm em comum. E essa seria uma das razões pelas quais podemos apostar no potencial de uma boa fusão entre games e histórias. O conflito de um jogo apresenta um resultado final que Zimmerman (2004, p.160) chama de "quantifiable outcome" (ao pé da letra, “resultado quantificável”). Em outras palavras, podemos dizer que ao final de um jogo os jogadores precisam ganhar, perder ou receber alguma espécie de pontuação, que, arriscamos dizer, pode ser não apenas numérica mas também qualitativa. 3 O encontro de adversários em busca de objetivos mutuamente exclusivos (tradução nossa). 7 Como aponta James Newman (2001, apud AARSETH, 2004, p. 52), os prazeres do videogame não são essencialmente visuais, mas cinestésicos, funcionais e cognitivos, sendo que nossas habilidades são recompensadas e nossos erros são punidos. Quando jogamos videogames, precisamos portanto controlar a relação entre o que fazemos e o que queremos que ocorra. Para fazê-lo, nossos cérebros precisam decodificar a relação entre botões e ações. Pela repetição, nosso cérebro pode dominar tarefas complexas e desenvolver uma espécie de "memória muscular". E é no momento em que nossos dedos já sabem quais botões apertar e nossos olhos interpretam a tela inconscientemente, que somos arrastados para o maravilhoso mundo dos games e podemos desfrutar a experiência de forma adequada (QUEIROZ, 2008). Outro aspecto do jogo é o replay. Games têm uma estrutura narrativa não linear em que as coisas podem acontecer de mais de uma maneira, permitindo que o jogador repita o jogo de formas diferentes, experimentando todas as possibilidades de um momento (MURRAY, 2004, p. 6-7). Games também são caracterizados pelo fato de serem espaciais. O texto “Game Design as Narrative Architecture” de Henry Jenkins (2004, p. 119-121) baseia-se completamente no conceito de “espacialidade”, defendendo que games devem ser definidos menos como histórias e mais como espaços com possibilidades narrativas, da mesma forma que game designers devem ser percebidos menos como contadores de histórias e mais como arquitetos narrativos. Muitos jogos têm uma estrutura narrativa exploratória, que se centra na luta para dominar os espaços e conseguir prosseguir no cenário. A construção do enredo de histórias espaciais está relacionada com a criação da geografia de mundos imaginários, de forma que os obstáculos e as recompensas guiam o movimento do jogador para a resolução (JENKINS, 2004, p. 124-125). Boa parte do trabalho de transmitir a história que o game designer está tentando contar é feita pelo espaço físico, através da distribuição de informações pelo cenário com base em estratégias dramáticas. Além disso, histórias espaciais também fornecem um palco com recursos para eventos narrativos acontecerem (JENKINS, 2004, p. 123-126). Para Murray (2003, p. 129), “A habilidade de se locomover por paisagens virtuais pode ser prazerosa em si mesma, independentemente do conteúdo dos espaços.” Mídias digitais em geral também são o que Murray (2003, p. 88) define como "enciclopédico", ou seja, capaz de armazenar diferentes tipos de informação em grandes 8 quantidades, e isto é relevante quando estamos falando de narrativas para games. O modelo de criatividade associado ao meio digital está relacionado à sua capacidade de copiar e recombinar materiais de muitas fontes diferentes. Oferecendo uma série de possibilidades (imagens still e em movimento, textos, sons, modelos 3D, espaços navegáveis, etc), os games apresentam potencial artístico para contar histórias com uma grande riqueza de detalhes. 6.1.3. Interatividade e Agência Outra importante característica dos games está relacionada ao conceito de interatividade. Primeiro, é importante separar diferentes noções de interatividade, uma vez que a definição do termo pode variar bastante de autor para autor. Com base nas ideias de Zimmerman (2004, p. 158-159), que divide a interatividade narrativa em quatro modos (cognitiva, funcional, explícita e meta-interatividade), propõe-se uma simplificação do entendimento deste conceito, a partir da diferenciação básica em dois tipos de interatividade: uma seria a “interatividade implícita” – uma espécie de interação psicológica ou emocional que uma pessoa pode ter com o conteúdo de qualquer tipo de narrativa –, e outra seria a “interatividade explícita” - uma efetiva participação a partir de escolhas e procedimentos mediados por algum tipo de interface tecnológica. O principal aspecto da “interatividade explícita” é, portanto, a mudança de papel do espectador de mero observador para participante ativo. Os videogames são um bom exemplo de interatividade explícita, já que sem a participação do jogador, o jogo simplesmente não acontece. Sem o jogador, existe um banco de dados pronto, mas que nunca será ativado. Existem, no entanto outros tipos de mídia explicitamente interativa, como hipertextos, vídeos interativos, livros interativos, etc. Nesse sentido, é importante portanto notar que não é a interatividade em si que faz os videogames tão prazerosos (e tão únicos em sua maneira de contar histórias). O prazer da interatividade nos games está relacionado ao conceito de “agência”, um termo utilizado por Murray (2004, p. 10) para expressar o prazer da sensação de ser capaz de realizar ações significativas e ver os resultados expressivos e coerente destas ações. Em um jogo de videogame, nossas ações têm um impacto sobre o universo do jogo, e é a capacidade de resposta deste universo, a coerência dos resultados das ações tomadas, que torna a experiência gratificante (MURRAY, 2004, p. 10). Mover um joystick ou clicar em 9 um botão por si só não é agência. Agência está relacionada com a escolha de ações e a verificação dos resultados de acordo com as intenções do jogador. 6.1.4. Imersão e Artificialidade Quando, em um jogo de videogame, usamos objetos e vemos eles funcionarem, a sensação de que pertencemos àquele mundo artificial é intensificada. Esta ideia está relacionada ao conceito de “imersão”, definido por Murray (2003, p. 102) como “a experiência de ser transportado para um lugar primorosamente simulado”. Grande parte do poder envolvente dos cenários de jogo se deve aos efeitos visuais incríveis que são possíveis nos dias de hoje, porque o espetáculo captura a nossa atenção. A sensação de imersão nos games, no entanto, é intensificada principalmente pelo fato do ambiente de simulação ser participativo. Segundo Murray (2003, p. 101), “O meio digital leva-nos a um lugar onde podemos encenar nossas fantasias. (...) podemos matar nossos próprios dragões ou pilotar nossa própria nave espacial.” Uma das grandes qualidades dos jogos narrativos é exatamente a possibilidade de mergulhar dentro de uma história e este é um dos motivos pelos quais os games tem tanto potencial narrativo. A sensação de ser o protagonista de uma história, de ser você aquele que está vivenciando a aventura, torna a experiência narrativa muito mais interessante. E o meio digital promete satisfazer este desejo de uma maneira que nunca foi possível antes. Com a evolução da tecnologia, as possibilidades para a criação de ambientes imersivos vão aumentando numa alta velocidade. A última geração de consoles de videogame, com o lançamento do Nintendo Wii e posteriormente do Kinect para Xbox 360, já popularizaram os sensores de movimento, permitindo a incorporação do próprio corpo como instrumentos para a realização de ações nos games. O Nintendo 3DS, por sua vez, incorporou o realismo da imagem em profundidade 3D ao videogame portátil, e sem a necessidade de utilização de óculos especiais. Em breve é possível que até capacetes de realidade virtual e outras invenções ainda inimaginadas sejam popularizados. O desejo que muitas pessoas têm de "entrar" um filme ou um livro está relacionado ao fato de que as histórias extraordinárias dos filmes ou livros parecem muito mais interessantes do que a “vida real”. Com relação a isso, é importante notar que a artificialidade é também uma característica que define os videogames. Os games mantém 10 um limite, uma fronteira com vida real (ZIMMERMAN, 2004, p. 160), e isso é um outro aspecto que eles têm em comum com as histórias. Uma boa história tem a função de nos oferecer algo que é exterior a nós mesmos, mas sobre a qual podemos projetar nossos sentimentos (MURRAY, 2003, p. 103). Através de seus ambientes imersivos, os games nos fornecem, portanto, o acesso a emoções, pensamentos, ações e lugares que muito provavelmente nunca alcancemos na vida real. Além disso, como comenta Arthur Bobany de Queiroz (2008), eles também tornam possível “experimentar sensações e viver situações sem as ‘partes chatas’ da vida real”. Quando jogamos o jogo Paciência em um computador, por exemplo, não temos que embaralhar as cartas ou contar os pontos, desfrutando apenas a "parte mais divertida". 6.1.5. Narrativa nos Videogames O autor de um filme ou um livro tem um alto grau de controle sobre os pedaços de informação específicos que recebemos sobre a história (JENKINS, 2004, p. 126). Para Ken Perlin (2004, p. 12-14), em narrativas tradicionais nós abdicamos do nosso poder de fazer escolhas e permitimos que a narrativa nos leve aonde quiser, deixando nossa agência de lado para que a agência do protagonista tome controle da situação. A narrativa que se desenvolve nos games, no entanto, não nos força a abrir mão de nossa agência, pelo contrário, ela depende disto, pois o videogame é uma estrutura interativa, que como tal, depende do controle do jogador. Nesse sentido, é importante notar que a narrativa de um jogo é, por definição incompleta, já que é necessário deixar espaço para a atuação do jogador (PEARCE, 2004, p. 146) A estrutura criada pelo designer de games pode orientar e estimular a jogabilidade, mas a interação não pode ser completamente determinada, porque o jogo em si emerge do sistema em tempo real, enquanto o jogador navega por ele. Segundo Jenkins (2004, p. 126), o designer de games pode controlar o processo narrativo até certo ponto, distribuindo informação através do cenário do jogo. Sendo assim, quando tratamos de histórias de videogame podemos considerar, pelo menos, dois tipos diferentes de narrativas. Uma delas é pré-estruturada e embutida dentro do gameworld, esperando sua descoberta pelo jogador. Esta narrativa equivaleria a uma história de pano de fundo proposta pelo designer de games. Já o outro tipo de narrativa é relativamente não-estruturado e é desenvolvido pelo jogador à medida que ele interage 11 com o sistema, explorando sua estrutura de regras (JENKINS, 2004, p. 126). Em outras palavras, trata-se de uma narrativa não linear que corresponde ao percurso do jogador em tempo real. Uma das questões centrais na discussão sobre a união entre games e histórias é a idéia de que a participação do jogador representa uma ameaça para a construção narrativa, ao passo que a estrutura rígida do enredo pode restringir a liberdade e o poder associados à interatividade (ADAMS, 1999, apud JENKINS, 2004, p. 125). Para Pearce (2004, p. 146), o controle autoral na criação de um game tende a prejudicar a qualidade da experiência do jogador. E para compreender onde a narrativa dos games diverge de outras linguagens narrativas é importante nos atentarmos para a noção de “abdicação autoral” (PEARCE, 2004, p. 152). Nos videogames, o jogador torna-se também um autor, um criador, um consumidor/produtor - e isto é um elemento recente. A questão central, portanto, é saber como equilibrar as restrições do enredo com a liberdade de jogar. Game designers tentam então determinar “quanto” enredo irá criar um sistema de jogo estimulante e “quanta” liberdade os jogadores podem desfrutar, sem modificar completamente a trajetória narrativa (JENKINS, 2004, p. 126). A combinação desses dois elementos deve estabelecer uma harmonia entre a flexibilidade da interatividade e a coerência de uma narrativa pré-concebida. 6.1.6. Liberdade do Jogador Nos games, podemos decidir se viramos à direita ou à esquerda, ou em qual inimigo atirar primeiro, mas quando começamos a tratar de elementos narrativos mais profundos, a questão se torna mais complicada. Nos jogos de hoje, o conteúdo narrativo corresponde, em grande parte, a decisões prévias do game designer, e na maioria das vezes são expostos por meio de textos ou cut-scenes – cenas de animação ou vídeo, não interativas. Muitos teóricos vêm questionando este modelo. Chris Crawford (2003, p. 260), por exemplo, não acredita que jogos utilizam textos e cut-scenes como recurso para mover o enredo adiante, sejam de fato narrativas interativas. Para ele, nesses jogos, a história em si não é interativa e o jogo em si carece de conteúdo dramático, resultando apenas em uma combinação de duas estruturas diferentes, mas que permanecem separadas. Além disso, também devemos considerar o fato de que a exposição narrativa pode ser experimentada como uma interrupção indesejada ao prazer da performance, ou seja, da 12 parte “jogável” em si (JENKINS, 2004, p. 126). É cansativo, por exemplo, quando um game oferece uma quantidade de texto muito grande para ler ou leva um longo tempo antes que possamos começar a jogar. Uma observação interessante feita por Jenkins (2004, p. 126) é a percepção de como a exposição mecânica através de cut-scenes nos videogames pode ser comparada às cartelas de texto que foram usadas pelos cineastas no início do cinema para transmitir ao espectador os elementos narrativos que eles não sabiam como transmitir visualmente, quando a linguagem cinematográfica não era tão desenvolvida. Assim, contar histórias pela exposição narrativa explícita nos games pode ser apenas um recurso temporário que virá a ser substituído mais tarde, quando as bases da linguagem do videogame forem melhor compreendidas. O fato é que a grande razão pela qual os jogadores não têm tanta liberdade narrativa nos jogos atuais é a falta de uma solução tecnológica para isso. Quando lidamos com interatividade, precisamos estar atentos para o fato de que quanto maior o universo de escolhas dramáticas, mais difícil fica criar um sistema de codificação capaz de gerenciá-lo. Nós precisamos, portanto, elaborar um esquema para reduzir a lista de opções dramáticas para algo controlável (CRAWFORD, 2003, p. 263). Hoje em dia não é possível para o jogador agir totalmente livre e realizar escolhas não previstas pelo game designer, como sair digitando qualquer comando e decidir o que ele, como personagem, quer fazer. Considerando a tecnologia atual, isto é algo fora de questão, pois exigiria um conjunto infinito de opções dramáticas e não há sistema que consiga gerenciá-lo. Além disso, as leis do drama também não permitem comportamento arbitrário. Segundo Crawford (2003, p. 263), “Romeo discovering the apparently dead Juliet do not have the option to say, ‘Bummer. I think I’ll go play badminton’.”4 O jogador sempre deverá, portanto, escolher entre uma lista de opções préestabelecidas que o game designer coloca à sua disposição. Em um filme, tudo o que está fora de quadro pode ser falso, pois o espectador nunca terá acesso real àquele espaço. Ao jogar um jogo 3D de exploração, no entanto, o jogador pode controlar seu personagem pelo cenário e está livre para olhar em todas as direções. 4 Romeo ao descobrir Julieta aparentemente morta não tem a opção de dizer, "Droga. Acho que vou jogar badminton" (tradução nossa). 13 Em uma narrativa linear, não precisamos criar ou planejar mais de uma possibilidade de caminhos para o protagonista. Mas quando seguimos o caminho da não linearidade, a quantidade de material a ser criada é muito maior (QUEIROZ, 2008), e torna-se exponencialmente mais difícil à medida que oferecemos mais liberdade ao jogador. Conversar, por exemplo, ainda é um grande problema para os personagens virtuais, porque a simulação de nossa língua natural é uma tarefa muito complexa (ANZUATEGUI, 2002, p. 14). Hoje ainda não é possível para o jogador falar com total liberdade com um personagem artificial. Muitos jogos usam, portanto, textos pré-escritos, oferecendo ao usuário uma quantidade finita de opções de fala. 6.1.7. O Trabalho do Game Designer Criar um jogo é projetar um gameworld e um conjunto de regras, sendo que, para Zimmerman (2004, p. 160), o desafio para o criador de uma narrativa interativa é criar potencial para jogabilidade dentro da estrutura da experiência. Segundo Crawford (2003, p. 262), a primeira questão em todo design interativo é: "o que o usuário faz? E que tipo de escolhas que ele pode fazer?" Game designers precisam tomar decisões sobre que tipo de ações são e não são possíveis no universo do jogo. Através da programação, eles especificam os resultados de determinadas ações e determinam quais escolhas um personagem poderá fazer em resposta a cada evento (CRAWFORD, 2003, p. 269). E em se tratando de jogos narrativos, é esperado que o jogador seja capaz de fazer escolhas interessantes do ponto de vista dramático (CRAWFORD, 2003, p. 262-263). Em outras palavras, o design de games está relacionado à tomada de decisões estratégicas sobre o quanto e que tipo de liberdade deixar para o jogador (PEARCE, 2004, p. 147-148), sendo importante encontrar um equilíbrio entre liberdade e restrições. 6.1.8. Considerações Finais Contar histórias é importante para a experiência humana. Nós nos expressamos e nos compreendemos através da narrativa. Para Murray (2004, p. 8), as histórias que contamos refletem e determinam como pensamos sobre nós mesmos e sobre os outros. 14 E os videogames, como um novo meio de comunicação, nos possibilitam contar (e mais do que contar, vivenciar) histórias de uma maneira que não podíamos fazer antes. Através dos games podemos exercer comportamentos e modos de ser e viver que vão além de nosso dia-a-dia “real”. Mas Jenkins (2004, p. 119-120) também é muito sensato quando diz que a experiência de um videogame não pode ser reduzida à experiência de uma história. Os games continuam jogos, e a história não deve ser considerada mais importante do que a experiência de jogo. Mesmo assim, os games são capazes de contar histórias divertidas e ricas, sem que o aspecto narrativo tenha um efeito negativo sobre os outros elementos do jogo. A arte é a ferramenta que usamos para refletir sobre nós mesmos e expressar esta reflexão para os outros. E apesar de envolver uma discussão enorme, que será aprofundada posteriormente, defendemos que os videogames enquadram-se sim dentro do campo das artes, sendo uma das maneiras de nos expressarmos no século XXI. 6.1.9. Bibliografia consultada: AARSETH, Espen. “Genre Trouble: Narrativism and the Art of Simulation”, in: WARDRIPFRUIN, Noah; HARRIGAN, Pat. First Person: New Media as Story, Performance, and Game. Cambridge, MIT Press, 2004. ANZUATEGUI, Sabina. Dramaturgia interativa e novas tecnologias. Dissertação (Mestrado) – Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002, p. 5-22. CRAWFORD, Chris. “Interactive Storytelling”, in: WOLF, Mark J. P.; PERRON, Bernard. The Video Game Theory Reader. New York, Routledge, 2003. JENKINS, Henry. “Game Design as Narrative Architecture”, in: WARDRIP-FRUIN, Noah; HARRIGAN, Pat. First Person: New Media as Story, Performance, and Game. Cambridge, MIT Press, 2004. MURRAY, Janet. Hamlet no Holodeck: o futuro da narrativa no ciberespaço. São Paulo, Ed. UNESP: Itaú Cultural, 2003. _____. “From Game-Story to Cyberdrama”, in: WARDRIP-FRUIN, Noah; HARRIGAN, Pat. First Person: New Media as Story, Performance, and Game. Cambridge, MIT Press, 2004. PEARCE, Celia. “Towards a Game Theory of Game”, in: WARDRIP-FRUIN, Noah; HARRIGAN, Pat. First Person: New Media as Story, Performance, and Game. Cambridge, MIT Press, 2004. 15 PERLIN, Ken. “Can there be a Form between a Game and a Story?”, in: WARDRIP-FRUIN, Noah; HARRIGAN, Pat. First Person: New Media as Story, Performance, and Game. Cambridge, MIT Press, 2004. QUEIROZ, Arthur Bobany de. A importância do videogame arte – parte I, 2008, disponível em: <http://designdejogos.wordpress.com/2008/03/12/a-importancia-do-videogame-arte-parte-i/>. Acesso em: 26 jan 2012. 6.2. Pesquisa Experimental 6.2.1. Pesquisa de Repertório Poético – Diferentes Tipos de Jogos Pensar os jogos de videogames nos dias de hoje implica pensar numa variedade enorme de temas, estilos, plataformas e tecnologias. Assim como ocorre em outras mídias narrativas, como o cinema ou a literatura, a divisão por gêneros nos jogos de videogame é hoje popularmente conhecida e estabelecida. No entanto, o fato desta classificação se basear em diversos tipos de critérios diferentes torna um pouco confuso e questionável o quanto um jogo pode ser enquadrado dentro de um gênero ou outro, ou mesmo, o quanto dois jogos com “jogabilidades” diferentes fazem parte do mesmo gênero apenas por abordarem temas parecidos. Isto acontece porque os games, sendo uma linguagem interativa, não se diferenciam apenas pelo tema, mas também por caracteristicas diversas de jogabilidade, como sistema de regras, número de jogadores, ou até mesmo ponto de vista do jogador: o First Person Shooter (jogo de tiro em primeira pessoa), por exemplo, leva em conta a visão em primeira pessoa como característica básica do gênero. Sendo assim, a pesquisa de repertório poético tentou apontar alguns critérios de diferenciação para games que poderiam ser relevantes na definição do estilo de jogo que se criaria como projeto prático: - DIVISÃO POR TEMA – Grande parte dos jogos é baseada na criação de mundos ficcionais e tais universos podem abordar uma quantidade infinita de assuntos diferentes dentro de grandes temas como: fantasia, terror, ficção científica, medieval, guerra, etc. Dois jogos com uma jogabilidade muito parecida podem abordar temas completamente diferentes. 16 - DIVISÃO POR MECÂNICA DE JOGO – Por “mecânica de jogo”, estamos definindo todo o conjunto de regras que define a jogabilidade do game, definindo o estilo do jogo em termos funcionais. Jogos de luta ou jogos de corrida, por exemplo, apresentam elementos muito característicos de funcionamento do jogo. Além disso, jogos com o mesmo tema podem ter mecânicas de jogo muito diferentes. - DIVISÃO POR PAPEL DO JOGADOR – Tratando de jogos explicitamente narrativos, podemos dizer que ou o jogador assume o papel de um personagem (grande maioria dos casos), ou, como acontece nos god games, que são basicamente jogos de simulação e criação de mundos, o jogador assume uma postura de criador, uma espécie de “ponto de vista de Deus” a partir do qual utiliza diversos recursos para modelar um determinado sistema ou universo. O mais famoso exemplo de god game é o The Sims, um jogo que simula a vida cotidiana, possibilitando ao jogador a criação de uma família numa casa, nutrindo essas pessoas fictícias física e emocionalmente. - DIVISÃO POR NÚMERO DE JOGADORES – Os games também podem se diferenciar com relação ao número de participantes. A maioria dos jogos é singleplayer, ou seja, feita para apenas um jogador. Existe, porém, uma variedade de jogos multiplayer, como jogos de mini-games (joguinhos curtos de competição), jogos de luta, corrida ou esportes, entre outros. A maior parte dos jogos multiplayer foca a competição entre os jogadores, priorizando a jogabilidade e não a narrativa. Alguns jogos, no entanto, possibilitam também esquemas de cooperação entre os jogadores. Também é importante notar a existência dos jogos online massivos, em quem milhares de pessoas podem jogar ao mesmo tempo. - DIFERENTES GRAUS DE IMPORTÂNCIA DA NARRATIVA – Os jogos também se diferenciam por serem mais ou menos narrativos. Tetris e outros jogos puzzle (jogos mais abstratos cujo foco principal é utilização de raciocínio lógico para a resolução de um quebra-cabeça, ou seja, de um problema proposto), por exemplo, podem ser considerados não narrativos ou no máximo, com narrativas abstratas ou metafóricas. Alguns games, como os jogos de plataforma do tipo Sonic ou Super Mario, chegam a apresentar uma história de pano de fundo, geralmente simples ou mal resolvida, de modo que sua prioridade continua sendo a jogabilidade. Jogos abertos como Grand Theft Auto, valorizam a narrativa emergente (narrativa que corresponde ao percurso do jogador em tempo real), possibilitando uma maior liberdade de escolhas narrativas ao jogador. Outros jogos como Rule of Rose ou Silent Hill valorizam a narrativa em termos da história de pano de fundo, 17 apostando num alto grau de envolvimento emocional do jogador com a história de seu protagonista. 6.2.2. Pesquisa de Repertório Tecnológico A primeira etapa para a construção da experimentação prática foi a verificação dos instrumentos tecnológicos necessários à sua realização. Nesse sentido, concluiu-se a necessidade de utilização de pelo menos dois tipos de softwares. O principal deles seria uma “engine de criação de jogos” ou “motor gráfico”, um programa próprio para desenvolvimento de jogos, com vários recursos facilitadores da integração dos diversos elementos necessários para a construção dos jogos. O outro software seria um programa de modelagem 3D para construção e animação dos elementos gráficos a serem utilizados. Algumas engines incluem ferramentas para a modelagem e animação 3D, mas não apresentam a mesma variedade de recursos que um programa específico nesta área, portanto preferiu-se utilizar a segunda opção. Após uma pesquisa a respeito de algumas opções de programas, a engine gráfica escolhida para a realização da atividade prática foi o Unity, por conta das seguintes vantagens: - o software é livre - suporta três tipos de linguagem de programação (JavaScript, C# e Boo, um dialeto da linguagem Python) - importa modelos 3D criados em outros programas (3D Studio Max e Maya, entre outros) - permite a criação de jogos com uma boa qualidade - sua interface não parece ser tão complexa - existe uma grande quantidade de tutoriais disponíveis na internet para este programa Com relação ao programa para modelagem 3D, optou-se pelo programa 3D Studio Max, em razão da existência de um conhecimento técnico básico, anterior à pesquisa, referente a este programa. A partir da escolha do Unity, também se verificou a necessidade de utilização de um terceiro tipo de programa: o chamado “IDE” (Integrated Development Environment), uma 18 espécie de editor e compilador de código, que possibilita a escrita de scripts de programação e realiza a sua “tradução” para a linguagem de máquina. Com relação ao editor de script, algumas opções foram consideradas: UniSciTE, um IDE simples que vem com o próprio Unity, UnityScript Editor e Unity Develop, IDEs um pouco mais complexos que apresentam maior quantidade de recursos. Optou-se pelo Unity Develop, mas a escolha deste programa não deve interferir no resultado final do projeto, já que se trata apenas de uma questão de facilidade no trabalho de programação. Além disso, também é importante notar que a linguagem de programação escolhida foi o JavaScript, por ser uma linguagem muito conhecida e que também apresenta muitos tutoriais disponíveis online. Definidos os instrumentos tecnológicos, a etapa seguinte foi adquirir alguns conhecimentos básicos em relação ao software principal, Unity, em termos de interface e ferramentas disponíveis. Esta aprendizagem se deu a partir do estudo de tutoriais em texto ou vídeo, e foi importante tanto como introdução a uma ferramenta completamente nova quanto para a criação de um conhecimento geral a respeito das potencialidades do programa. Os principais materiais utilizados (com seus respectivos links) foram os seguintes: - Conjunto de 60 vídeos tutoriais (parte do curso Online Walker Boys) a respeito da interface do programa, com uma abordagem básica referente a menus, janelas, ferramentas e navegação: http://walkerboystudio.com/html/unity_training___free__.html#unity3software - Conjunto de vídeos curtos, do próprio site oficial do Unity, referente a recursos básicos do programa: http://unity3d.com/support/documentation/video/ - Tutorial em texto (produzido por uma equipe do MediaLab da UFF) que expõe de maneira introdutória e simplificada as principais funcionalidades do programa: http://usuarios.rdc.puc-rio.br/sbgames/09/_proceedings/dat/_pdfs/computing/tutorialComputing2.pdf Em seguida, buscou-se também a apreensão de conhecimentos básicos em JavaScript, a partir de um conjunto de 26 vídeos tutoriais sobre o assunto (também do curso Walker Boys, e podendo também ser acessados através do primeiro link, disponível acima). Tal estudo foi importante para a criação de uma familiaridade com a linguagem de programação escolhida, já que não havia conhecimento anterior algum em programação. 19 6.3. Pesquisa de Laboratório 6.3.1. Definição da Atividade Prática A criação de um jogo de videogame, pensando no nível dos jogos comerciais atuais, envolve uma complexa integração entre uma série de elementos como: objetos 3D (personagens e cenários), texturas, iluminação, animações, imagens estáticas, sons, textos, sistema de colisões, efeitos de física, controle de personagem, inteligência artificial, etc. Por um lado, tentar realizar um jogo completo neste nível de complexidade seria absolutamente inviável. Por outro, restringir a atividade prática à realização de um jogo simples o suficiente para que a sua conclusão seja possível dentro do prazo de pesquisa poderia reduzir demais as possibilidades criativas permitidas por essa nova linguagem, além de desviar o objetivo principal da criação artística para um enfoque muito grande na busca de resoluções técnicas. Por esse motivo, as implicações das variáveis “tamanho do projeto”, “viabilidade de realização” e “possibilidades criativas” foram pensadas e repensadas durante todo o processo de desenvolvimento da atividade prática. Num primeiro momento foram desenvolvidas algumas ideias iniciais em torno de um projeto pequeno, mas em seguida pensou-se a possibilidade de criação de um projeto maior, dada a maior abertura para possibilidades criativas, porém sem pretensões de realizar sua totalidade em termos de realização prática. Nesse sentido, uma primeira tentativa de contornar as limitações foi então a divisão da atividade prática em duas partes diferentes: uma referente ao desenvolvimento de um projeto de jogo, com enfoque no processo criativo de idéias para a definição de suas características gerais (em termos de jogabilidade, narrativa e estética visual); e a outra voltada para a execução efetiva de uma pequena experimentação prática. A ideia principal era que a criação artística não precisasse se limitar pela condição de sua resolução técnica, enquanto a experimentação prática seria um meio de pesquisa das soluções técnicas básicas para a criação de um jogo no modelo pretendido, mas sem prever a resolução total das características do jogo criado. No entanto, constatou-se que, dada a complexidade e a variedade das implicações técnicas envolvidas no desenvolvimento da experimentação prática, ainda assim seria complicado realizar as duas partes de forma satisfatória. 20 A nova solução foi então partir de um projeto de jogo já existente e manter todo o esforço de pesquisa focado na realização da experimentação prática, adaptando a mesma para que ela pudesse manter algum sentido em si mesma (com começo, meio e fim) e ao mesmo tempo ser percebida como parte deste projeto maior. 6.3.2. Projeto de Jogo – Dreamland O projeto de jogo que serviu como base para a criação da experimentação prática foi criado anteriormente como trabalho final na disciplina Roteiro III, disciplina curricular do Curso Superior do Audiovisual. O mesmo projeto também foi trabalhado na disciplina Direção de Arte, do mesmo curso. Dreamland é um jogo de exploração em terceira pessoa que, em termos de gênero e atmosfera, se encaixa perfeitamente com as intenções pré-definidas para o projeto prático desta pesquisa. O projeto completo se encontra em anexo (ver página 52). 6.3.3. O Gênero Survival Horror Apesar da inclusão do projeto Dreamland como referência geral para a realização da experimentação, as primeiras intenções para a criação da proposta prática permaneceram. No que se refere ao processo criativo, o primeiro elemento definido havia sido a atmosfera que se queria criar: algo voltado ao drama e terror, explorando a contraposição entre uma temática violenta e um clima geral de mistério, beleza e melancolia. Nesse sentido, o projeto buscou se aproximar em grande parte do gênero de videogame conhecido como “Survival Horror”, estilo de jogo que se baseia na luta por sobrevivência em um cenário de horror. Apesar de haver uma grande quantidade de tipos de jogo, é importante notar que certos gêneros narrativos são mais “naturalmente adequados” para games do que outros. No caso do terror, a combinação se torna muito interessante, uma vez que a inserção do jogador/protagonista num ambiente ameaçador é uma situação dramática por si só. A linguagem dos games, baseada em agência e imersão, potencializa em muito as características do gênero, criando experiências muito mais assustadoras e angustiantes do que é possível, por exemplo, no cinema, uma linguagem não interativa. Nos games de terror, 21 o jogador sai da posição segura e confortável de espectador e passa a vivenciar a história a partir de suas próprias ações e decisões, percorrendo corredores escuros e abrindo portas suspeitas. A maioria dos jogos Survival Horror são jogos de exploração em terceira pessoa, nos quais, apesar de haverem combates e inimigos pelo caminho, boa parte do objetivo do jogo consiste em explorar o cenário à procura de itens que possibilitarão a abertura de novos caminhos e, conseqüentemente, o avanço da narrativa. Ao contrário do que muitos possam pensar, a maioria dos games de terror não está baseada numa violência gratuita. No geral, jogos de ação podem ser muito mais violentos que jogos de terror, exatamente porque são baseados na ação, no movimento, no combate. Jogos que podem ser considerados genuinamente Survival Horror priorizam o clima de terror em si, que na realidade diverge em muito do clima agitado de ação, uma vez que busca a criação de atmosferas de tensão e perigo iminente. Sendo assim, a sobrevivência em si é muito mais importante do que o combate, sendo que alguns jogos, como Haunting Ground ou Clock Tower 3, utilizam inclusive a temática da perseguição, obrigando o jogador a permanecer a maior parte do jogo apenas fugindo dos perseguidores, sem ter meios de combatê-los. Vale notar que Dreamland foi criado a partir destas referências, se encaixando nesse mesmo estilo do jogo de perseguição. Além disso, jogos de terror também exigem habilidades de raciocínio e proporcionam o prazer da resolução de problemas, além de fornecerem muitas possibilidades em termos do envolvimento emocional do jogador com a história do jogo. 6.3.4. O Espaço Sobrenatural Desde o princípio, a experimentação prática foi pensada como um ambiente de navegação 3D em que se pudesse verificar o controle de um personagem por um determinado espaço sobrenatural. Apesar de Dreamland ser um jogo especialmente focado na situação de perseguição, optou-se por não incluir este aspecto na experimentação, uma vez que inserir um inimigo perseguidor envolveria um volume de trabalho muito maior em termos de modelagem, animação, programação, e todas as outras etapas intermediárias. O foco da experimentação se manteve então direcionado para a questão da exploração do espaço navegável, de acordo com as intenções originais. Nesse sentido, o 22 conceito principal continuou sendo a noção de “inferno” como uma espécie de labirinto espacial, isto é, o sentimento de “estar no inferno” seria traduzido como o sentimento de estar encurralado em espaços sobrenaturais que não seguem a lógica da vida real. Neste jogo, o espaço seria então um inimigo a mais, que tem o poder de se transformar e assumir vida própria, buscando confundir o jogador. É importante observar que Dreamland já apresentava o elemento da confusão espacial, mais ao final do jogo, apesar de não ter as situações espaciais desenvolvidas de forma específica. A seguir estão alguns exemplos de situações que este universo poderia compreender: a experiência de subir ou descer uma escada e chegar sempre ao mesmo andar (o mesmo pode acontecer com a passagem por salas ou corredores que voltam sempre ao mesmo lugar); salas que mudam de posição, como na situação de passar por uma porta e ao tentar voltar, verificar que do outro lado não existe mais a sala por onde se passou e sim um novo ambiente; espaços em que se consiga andar no teto ou nas paredes; ambientes com paredes invisíveis; ambientes com espelhos sobrenaturais que mostram realidades diferentes; espaço que visto de fora parece ter um tamanho pequeno e visto de dentro parece muito maior, etc. 6.3.5. Roteiro da Experimentação Prática Dadas as limitações de tempo, procurou-se criar para a experimentação um roteiro que estabelecesse o mínimo necessário (em termos de tempo e volume de pesquisa) para construir uma obra que apresentasse algum sentido em si mesma. Os elementos considerados essenciais foram os seguintes: - Uma situação espacial sobrenatural. - A necessidade de que o jogador realize pelo menos uma ação para que consiga chegar ao fim da interação, já que não faria sentido um jogo sem obstáculos ou ações a serem realizadas. - Duas cutscenes (cenas não interativas), uma inicial e outra final, para construir a noção narrativa de começo e conclusão de uma determinada “parte”, ainda que inserida dentro de um contexto maior. A situação elaborada foi então a de que a movimentação pelo espaço, através da passagem por portas, faz a protagonista voltar sempre ao mesmo lugar. Para sair do loop 23 espacial e chegar ao final da interação, o jogador deve então pegar um item e encaixá-lo em um determinado lugar, o que modificará a lógica do cenário, abrindo uma passagem para um novo espaço. A seguir está o roteiro específico da experimentação: CUTSCENE INICIAL (Cena não interativa) INT – SALA 1B – NOITE Agatha, desacordada, está sentada numa cadeira no centro de um cômodo espaçoso de decoração excêntrica. Pessoas “sem rosto” (com uma forma arredondada e lisa no lugar da face) fazem uma roda em torno da garota. O cômodo tem formato circular (ou facetado como um octógono) e cortinas nas paredes. INT – SALA 1A – NOITE Agatha acorda num sobressalto, numa cadeira, em um cômodo semelhante ao primeiro. Na parede à sua frente, existe um espelho (ou janela de vidro) e o seu reflexo a mostra ainda desacordada, sentada na cadeira. PARTE INTERATIVA A parte interativa da experimentação começa com a protagonista já em pé, em frente à cadeira (SALA 1A). O jogador deve sair da sala (a única porta se localiza na parede oposta ao espelho), passar por um corredor e chegar a outro cômodo (SALA 2), uma sala em formato quadrado, com quatro portas, uma em cada parede. No centro da sala existe uma mesa com uma maquete simples de brinquedo. A maquete mostra uma boneca sem cabeça sentada numa cadeira. Cada uma das portas leva a um corredor diferente. Qualquer um dos corredores acaba levando de volta à SALA 2. Em um dos corredores existe um item que o jogador pode pegar: uma cabeça de brinquedo. O jogador deve pegar este item e usá-lo na maquete da SALA 2. Após ter feito isto, qualquer uma das portas vai levar a um novo e único corredor, que levará ao cenário final (SALA 1B). A SALA 1B é um cômodo praticamente igual à sala 1A, porém com cores diferentes. Uma garota igual a Agatha está sentada numa cadeira, de costas para a porta. O jogador deve avançar em direção à cadeira até uma determinada área do cenário para ativar uma cutscene. 24 CUTSCENE FINAL (Cena não interativa) INT – SALA 1B – NOITE A garota sentada se levanta com a cabeça baixa, torcendo o pescoço estranhamente. Ela se vira lentamente. É exatamente igual a Agatha, só que “sem rosto”, e segura uma “arma” (pode ser um machado). Pensando na experimentação dentro do projeto maior, esta parte foi pensada de modo a acabar no momento em que se iniciaria um confronto com um “chefe” ou inimigo de maior porte. Além disso, a ideia de Agatha enfrentar o seu duplo se encaixa com o sentimento de culpa existente na narrativa de Dreamland. 6.3.6. Execução da Experimentação Após os primeiros estudos de conhecimentos básicos, iniciaram-se as pesquisas específicas a respeito dos recursos necessários à construção da experimentação prática. Num primeiro momento, alguns testes foram realizados com um boneco provisório de modelagem simples e um cenário vazio, para uma constatação geral mais rápida do que se poderia realizar. Nesse estágio, pesquisou-se de forma geral as seguintes etapas: a construção de bones, o processo de rigging, o processo de skinning, as animações básicas walk/idle (andar e “ficar ocioso”), a programação dos elementos mais básicos, e o sistema de colisões. Como resultado, foi possível fazer o boneco se mover através do controle das setas do teclado, com as respectivas animações de walk e idle funcionando no momento correto. Além disso, também foi possível fazer o boneco colidir com o cenário, isto é, não atravessar o limite de chão e paredes. 25 Figura 1: Teste com boneco provisório no Unity: momentos de walk e idle, respectivamente Após esse teste, iniciou-se então a construção da experimentação final, cujas etapas serão melhor detalhadas nos itens a seguir: 6.3.6.1. Modelagem Uma vez que a criação tanto estética quanto narrativa é definida, a modelagem tridimensional se configura como o primeiro passo na realização efetiva de um jogo 3D, já que ela representa a construção digital de todos os objetos que estarão presentes tanto nas partes “jogáveis" quanto nas cenas animadas não-interativas. Em termos práticos, a experimentação apresenta três personagens: Agatha, “Agatha sem rosto” (o duplo), e uma “figura sem rosto geral”, que seria multiplicada em número. Neste caso o processo de modelagem se iniciou então com a construção de um corpo feminino geral (nu), que serviria de base para a modelagem de Agatha. No geral, a modelagem foi realizada a partir da modificação de um objeto simples (box), com a utilização de extrusões e outros recursos de manipulação, criação ou remoção de vértices e arestas. Também foram utilizadas imagens de referência (desenhadas a mão) que serviram como guia para a modelagem tanto do corpo quanto do rosto. O principal tutorial estudado nesse estágio encontra-se no link a seguir: http://www.escultopintura.com.br/Tutoriais/Tutorial_Modelagem_Corpo_Humano/Sumario/Sumario_Corpo_Hum ano.htm 26 Figura 2: Modelagem do corpo feminino geral, em forma poligonal e com Mesh Smooth aplicado (modificador que suaviza as formas, criando curvas) Figura 3: Imagens de referência para a modelagem do corpo Figura 4: Corpo geral com as imagens de referência posicionadas para o auxílio da modelagem 27 A partir do corpo geral, algumas proporções e detalhes foram modificados a fim de criar o modelo de Agatha. O cabelo foi criado como um objeto separado e em seguida anexado ao corpo. Em vez de buscar a criação de uma modelagem realista dos fios, optouse, para fins de simplificação, por modelar o cabelo como um objeto inteiro, a partir de um processo intuitivo baseado em extrusões e manipulação de vértices e arestas. Com relação à modelagem das roupas, vale notar que num primeiro momento foi considerada a possibilidade de criação das roupas como objetos separados, a partir da utilização dos modificadores Garment Maker e Cloth, que simulariam as costuras e o caimento do tecido. Alguns testes foram feitos nesse sentido, mas ao se considerar que a utilização de objetos separados e sobrepostos pudesse dificultar a realização do skinning (ver página 37), por fim optou-se por modificar a modelagem do corpo nu de forma a criar o volume das roupas “embutido” no mesmo objeto. Para isto, foi realizada uma simplificação do figurino original, reduzindo os detalhes do pijama (blusa e calça), e substituindo os chinelos por meias. Figura 5: Teste com Garment Maker e Cloth Figura 6: Etapas de transformação do corpo geral em Agatha 28 Figura 7: Modelagem final de Agatha Para a construção da “figura geral sem rosto”, aproveitou-se também o modelo geral de corpo feminino e modificou-se a modelagem da face, a partir da manipulação de vértices e arestas, de modo a eliminar o volume dos olhos, boca e nariz e obter uma espécie de volume ou contorno arredondado sobre a face. A princípio, o figurino da figura sem rosto foi pensado como uma capa fechada com capuz, porém dadas as limitações de tempo, prefiriu-se utilizar o modelo nu, o que não foi prejudicial, pelo contrário, criou-se outro tipo de estranhamento e as figuras ficaram mais próximas de “manequins”, o que se encaixa no universo de Dreamland. Foi necessário, no entanto, modelar detalhes do corpo a mais, como joelhos e dedos dos pés, que não haviam sido modelados anteriormente por não serem necessários para a criação do modelo de Agatha. O próximo passo foi aproveitar a cabeça sem rosto já criada para substituir a cabeça do modelo de Agatha (com as devidas adaptações e a soldagem dos vértices das partes separadas) e assim construir o modelo da “Agatha sem rosto”. Para a arma da personagem, utilizou-se, provisoriamente, um modelo pronto, baixado gratuitamente da internet. Posteriormente, este modelo deve ser substituído por uma modelagem própria. 29 Figura 8: “Figura geral sem rosto” e “Agatha sem rosto” No que se refere ao cenário, é importante notar que dado o tempo disponível insuficiente para a conclusão da experimentação em sua proposta original, procurou-se reduzir o volume de modelagem ao máximo e criar uma versão que contivesse apenas os objetos mais essenciais. Pelo menos neste momento, decidiu-se retirar da experimentação inclusive o espelho, que é um objeto importante em termos narrativos. A modelagem do cenário ficou concentrada na construção de alguns objetos como a cadeira/poltrona, a mesa e a porta. Para a criação dos cômodos (chão e paredes) utilizou-se polígonos simples (box e cilíndro) com as faces viradas ao contrário, isto é, para dentro. Para a modelagem da maquete de brinquedo, aproveitou-se como base uma modelagem criada anteriormente, como trabalho de Computação Gráfica, disciplina do curso de Artes Plásticas, cursada como optativa livre. A partir dos bonecos criados nesse trabalho, modificou-se a modelagem de forma a construir a boneca que representa Agatha. 30 Figura 9: Imagens de referência para a modelagem da poltrona e da mesa A B C E D F Figura 10: Modelagem do cenário A – Sala 1A/B D – Porta B – Corredor E – Mesa com maquete de brinquedo C – Sala 2 F – Poltrona da sala 1A/B, também usada na maquete 31 Vários tutoriais foram estudados a fim de buscar técnicas de modelagem que pudessem ser úteis para o que se pretendia criar, mas nenhum deles foi seguido à risca. Os principais deles estão nos links a seguir: http://www.cgarena.com/freestuff/tutorials/max/sofamodeling/sofa_modeling.html http://www.youtube.com/watch?v=xjcm9fA9TD0&feature=related http://www.youtube.com/watch?v=BrPvGXmkTqg&feature=fvwrel http://www.youtube.com/watch?v=Da4ABAsFk90&list=UUZPYHwXY4L180_UOhZHM9_w&index=1&feature=plcp http://www.youtube.com/watch?v=rA0FaTh1Mcw http://www.youtube.com/watch?v=woVxy6Og5Jw http://viscorbel.com/3ds-max-tutorials/classic-coffee-table-tutorial-part-i/ http://viscorbel.com/3ds-max-tutorials/neoclassical-table-tutorial/ http://www.youtube.com/watch?v=DkYifwO-7w0 6.3.6.2. Textura Após a modelagem realizou-se um processo de texturização provisório e simplificado, uma vez que esta etapa, apesar de importante, não estava entre as prioridades deste plano de trabalho. O processo de texturização pode ser dividido em pelo menos duas partes principais: uma seria o mapeamento da textura na superfície do objeto modelado, e a outra seria a criação de texturas (imagens 2D) em si. No caso desta experimentação, focou-se mais na configuração do mapeamento do que na criação de texturas, uma vez que o primeiro se faz necessário para evitar distorções na aplicação das imagens bidimensionais sobre as áreas modeladas. O processo de mapeamento foi realizado através dos modificadores UVW Map e Unwrap UVW. O UVW Map apresenta opções simples de mapeamento como, por exemplo, planar ou cilíndrico. Esta escolha determina como a textura, que é uma imagem 2D, deve ser disposta na superfície 3D. O Unwrap UVW permite, através de diferentes processos, o desdobramento da superfície 3D em uma imagem plana, inclusive com a possibilidade de editar manualmente a posição dos vértices e arestas. Além disso, conforme a necessidade também foram criados materiais multi-objeto, que permitem incorporar diferentes texturas em diferentes áreas do objeto modelado. Este 32 tipo de material se faz muito útil quando se quer texturizar um objeto complexo que é modelado inteiro, sem separações. A B C D Figura 11: Texturização de Agatha A – Agatha com material multi-objeto: as diferentes cores representam as áreas que receberão texturas diferentes e podem ser mapeadas separadamente. B – Agatha com textura mapeada: as cores foram substituídas pelas texturas específicas de cada área C – Agatha já com textura aplicada, porém sem mapeamento D – Agatha com textura e mapeamento Os principais tutoriais estudados no que se refere ao mapeamento de textura foram os seguintes: http://www.republicofcode.com/tutorials/3ds/texture_stealth/ http://www.youtube.com/watch?v=PH5LcZlKyhA&feature=related http://www.polygonblog.com/unwrapping/ http://www.todo3ds.com/perfect-uvs-by-pelt-mapping-in-3ds-max/ 33 Para as imagens de textura, procurou-se aproveitar, quando possível, imagens prontas ou cores chapadas. Para o rosto e olhos de Agatha, foram realizados os primeiros testes, com a criação de imagens no programa Photoshop. Figura 12: Imagens do cenário texturizado (ao final, boneca da maquete sem e com cabeça) 34 6.3.6.3. Construção de Bones e Rigging O Rigging é um processo essencial para a animação de personagens complexos, geralmente modelados inteiramente num só “mesh” ou objeto. Esta técnica permite a construção de uma espécie de esqueleto, fácil de ser manipulado em termos da criação de poses (no caso de personagens humanos, poses corporais ou faciais). Com a modelagem de Agatha terminada, iniciou-se primeiramente a construção de seu esqueleto, a partir da criação de bones (ao pé da letra, “ossos”), um recurso específico do programa 3D Studio Max para esta finalidade. Os bones são criados em correntes ou cadeias, formando uma hierarquia, na qual a transformação (em termos de posição ou rotação) do bone “pai” é aplicada também ao bone “filho”, sendo que o contrário não é valido. O processo de rigging, no entanto, vai além da simples construção de bones, envolvendo uma série de ajustes necessários para a criação de um esqueleto com comportamento próximo do pretendido, no caso desta experimentação, próximo da movimentação do corpo humano. Nesse sentido, um dos recursos utilizados são os Inverse Kinematics (IKs). Esta pesquisa não pesquisou a fundo este recurso, mas no geral, eles ajudam a criar articulações, dobras ou curvas numa corrente de bones. Além disso, o rigging geralmente envolve a criação de “controllers”, objetos simples que, como o próprio nome sugere, auxiliam no controle da movimentação do esqueleto, de modo que ao invés de movimentar uma série de bones e IKs, muitas vezes difíceis de selecionar por estarem posicionados dentro do mesh, o animador interage diretamente com esses “controladores de animação”, que por sua vez movimentam correntes de bones ou mesmo outros controllers. Os controllers são geralmente criados a partir de splines, objetos do 3D Studio Max que correspondem a “linhas”, como círculos, arcos, linhas retas, etc., e que podem ou não ser habilitados (transformando-se em objetos com volume) tanto no viewport quanto no render. No caso dos controllers, este recurso se faz muito útil, pois permite que eles sejam configurados para aparecer no viewport, permitindo que o animador os manipule melhor, mas não apareçam no produto final. A lógica para o funcionamento do esqueleto se baseia basicamente num sistema de hierarquia. No 3D Max é possível “linkar” objetos, estabelecendo relações parentais entre eles. Deste modo, IKs ou bones podem ser linkados a esses controllers. 35 Figura 13: Rigging de Agatha: bones em azul e controllers em amarelo (Agatha em modo See-Through, transparente) Os principais tutoriais estudados para a construção do rigging se encontram nos links a seguir: http://www.youtube.com/watch?v=qPqITdvLRWs http://www.youtube.com/watch?v=MRikV-jTFfc http://www.lynda.com/home/Player.aspx?lpk4=12710&playChapter=False http://paulneale.com/tutorials/trippleIKLeg.htm http://www.youtube.com/watch?v=pM_CXzObMGo http://www.youtube.com/watch?v=DJhMJhnFtxk&feature=related http://www.youtube.com/watch?v=hRzbtkA4QnU&feature=related http://www.benbryan.net/tutorials/3d-character-rigging/ http://www.traptcg.com/tutorials/3d-studio-max/advanced-hand-rig-part-1 6.3.6.4. Skinning Uma vez que se coloca o esqueleto para funcionar, o próximo passo é fazer o mesh do personagem acompanhar o movimento do esqueleto, uma vez que a princípio tratam-se de objetos separados. Este processo pode ser chamado de skinning, que seria uma espécie de incorporação da “pele” ao esqueleto. No 3D Max, este processo é feito a partir de um modificador específico chamado Skin, que deve ser colocado sobre o mesh ou objeto modelado, neste caso o corpo modelado de Agatha. Neste modificador é possível então adicionar todos os bones que poderão transformar o objeto. Em seguida é preciso então ajustar os envelopes, que seriam as áreas de influência (em termos de vértices do mesh) de cada um dos bones sobre o objeto. As divisões de influência criadas pelos envelopes, no entanto, não permitem um ajuste muito preciso em regiões que sofrem influência de mais de um bone, como as áreas de articulação. Isto pode ser então ajustado com a utilização do Weight Tool, outra 36 ferramenta presente no modificador Skin, que permite determinar a proporção do peso de cada bone em cada vértice do mesh. Figura 14: Envelope do bone da coxa: em vermelho, área de influência máxima, do amarelo para o azul, influência diminui, em cinza, influência 0 Para a realização do skinning, estudou-se principalmente o tutorial a seguir: http://www.kxcad.net/autodesk/3ds_max/autodesk_3ds_max_9_tutorials/tut_applying_skin_to_the_alien.html Quando se está trabalhando com um objeto complexo, o skinning se torna um processo muito trabalhoso e demorado, uma vez que é possível selecionar vértice por vértice para configurar o peso dos bones. E dependendo da estrutura do mesh, o próprio processo de seleção dos vértices acaba sendo muito complicado. No caso de Agatha, o processo de skinning foi realizado de forma parcial, pois o processo estava consumindo muito tempo. O peso dos vértices foi ajustado na maior parte do corpo, mas na região do cabelo o processo ainda está incompleto, o que gera grandes deformações nas animações. Figura 15: Deformações na região do cabelo 37 Mesmo quando se distribui o peso dos bones nos vértices do mesh da melhor forma possível, certas áreas de articulação muitas vezes ainda apresentam deformações indesejadas. Para realizar esse tipo de conserto, o 3D Max possui outro modificador chamado Skin Morph, que permite editar manualmente a posição dos vértices desejada. Pesquisou-se um pouco deste modificador no momento dos primeiros testes com o boneco provisório, inclusive com a verificação de bons resultados, mas em seguida percebeu-se que não é possível exportar as transformações do mesmo para o Unity, de modo que esta solução não serve no caso desta experimentação. 6.3.6.5. Animação Realizados os processos de rigging e skinning, iniciou-se o processo de animação. Na experimentação prática, tanto a parte “jogável” quanto as cenas não interativas necessitam de um mínimo de animação. É importante notar que também nesta etapa a intenção foi tentar simplificar o processo e reduzir ao máximo a quantidade de movimento necessário. No caso da parte interativa, a animação foi restringida a dois movimentos básicos que estão presentes em praticamente todos os jogos com visão em terceira pessoa. Seriam eles o walk, andar, e o idle, “ficar ocioso”, que seria qualquer movimento que o personagem faz quando o jogador deixa de interagir com o jogo e permanece um determinado tempo sem apertar nenhum botão que controle o personagem. A partir dos controllers criados no rigging, criou-se um walk cycle (animação em que o personagem anda sem sair do lugar, formando um ciclo ou loop) e uma animação para o idle, com Agatha a princípio parada, em posição neutra, e em seguida jogando o peso sobre uma das pernas, colocando uma mão na cintura, olhando ao redor, e por fim, voltando à posição inicial, de modo a construir outro loop. Essas duas animações foram criadas dentro do mesmo arquivo no 3D Max, uma em seguida da outra na timeline. 38 Figura 16: Frames da animação de walk Figura 17: Frames da animação de idle No caso das cutscenes, buscou-se principalmente explorar os movimentos de câmera, alongando os momentos sem animação dos personagens. No caso da cutscene inicial, a animação se resume a Agatha abrindo os olhos assustada e em seguida se levantando da cadeira. A cena com as figuras sem rosto é completamente estática, apresentando apenas animação nas câmeras. Como as figuras fazem uma roda em torno de Agatha, apostou-se principalmente em movimentos de câmera circulares, usando pontos de vista tanto de fora quando de dentro da roda. Para isso utilizou-se o Path Constraint, um recurso do 3D Max que permite restringir o movimento dos objetos a um determinado “caminho”. Nesse caso, restringiu-se o movimento das 39 câmeras ao caminho de círculos criados e posicionados de acordo com os enquadramentos que se buscava obter. No caso da cutscene final, a animação se resume a Agatha sem rosto se levantando e dando passos até se virar para Agatha. As câmeras também se movimentam e foram pensadas de modo a enquadrar detalhes (como os pés de Agatha sem rosto) antes do momento em que o “rosto sem rosto” é revelado. 6.3.6.6. Construção do Jogo no Unity e Programação Com os objetos devidamente modelados e animados, iniciou-se a construção efetiva do jogo dentro da engine gráfica Unity. O primeiro passo foi importar os modelos e suas texturas para o projeto do programa. Os projetos de jogo do Unity não são salvos como arquivos, mas sim como pastas que incluem todos os “assets”, ou seja, todos os elementos necessários para a construção do jogo, como modelos 3D, imagens 2D, scripts, sons, etc. Qualquer mídia interativa, que necessita de uma resposta da máquina ao usuário, precisa ser programada, para reagir de determinada maneira de acordo com os inputs realizados pelo usuário. O funcionamento de um jogo de videogame está, portanto, completamente baseado em scripts de programação, que determinam a lógica do que pode acontecer em tempo real, enquanto “o jogador joga o jogo”. - Movimento da Personagem No caso da experimentação prática, o primeiro elemento programado foi o movimento da personagem Agatha, que é controlada pelo jogador. Nesse caso, duas questões precisaram ser resolvidas: uma foi fazer o modelo da personagem (que no Unity vira um gameobject) ter sua posição espacial modificada de acordo com o pressionamento das setas do teclado. A outra foi fazer as animações de walk e idle rodarem no tempo adequado. Para isso foi necessário definir nas opções de importação do modelo de Agatha os nomes das animações (walk e idle) e os respectivos frames que correspondem a elas. Em seguida, no script de programação definiu-se que caso alguma seta do teclado seja pressionada, a animação walk deve ser rodada, caso contrário, a animação idle deve ser rodada. 40 Figura 18: Agatha interagindo dentro do Unity: walk e idle (cenário ainda sem textura) - Sistema de Colisões Além de fazer a personagem se movimentar, também foi necessário criar um sistema de colisões para que a personagem consiga interagir com o cenário de forma a não ultrapassar os limites do chão e paredes. No Unity existe um componente chamado collider que pode ser adicionado aos gameobjects, criando essa propriedade da colisão física. No caso dos cenários, modificaram-se as configurações de importação para que os colliders fossem gerados automaticamente a partir da geometria dos objetos modelados. Já para a personagem Agatha, criou-se um componente especial chamado Character Controller, que apresenta uma série de características específicas para personagens controláveis, incluindo um collider próprio. - Câmera Em um jogo com visão em terceira pessoa, ou seja, com ponto de vista externo ao personagem, o enquadramento que vemos é o resultado do comportamento de uma 41 câmera, que pode ser programada de diversas maneiras. Na maioria dos casos, a câmera segue o personagem controlado pelo jogador, o que não é muito difícil de construir. Existem, porém, situações que complicam um pouco a questão, como no caso de algum objeto ficar entre a câmera e o personagem, ou então o personagem ficar de costas encostado a uma parede. Nesses casos, a câmera deve ser programada para se comportar de forma diferente e continuar estabelecendo um ponto de vista satisfatório. Uma pesquisa foi realizada no que se refere a scripts que pudessem solucionar essas questões, mas até o momento não foi possível encontrar um adequado. Por ora, apenas definiu-se a câmera como child da personagem, definindo uma relação de hierarquia que faz a câmera seguir a personagem. Sem as correções, no entanto, a câmera ainda atravessa paredes e fica para fora do cenário quando a personagem está muito próxima da parede. Figura 19: Momento do jogo em que a câmera vai para fora do cenário. A pesquisa para a construção de uma câmera mais eficiente deve continuar posteriormente, pois um comportamento adequado, sem a ultrapassagem dos limites do cenário, é especialmente importante para a experimentação proposta, uma vez que a visão da ausência de continuação espacial fora do cômodo (espaço azul) atrapalha a construção da sensação de continuidade espacial sobrenatural. - Passagem por portas Uma vez que a experimentação prevê a movimentação por ambientes internos fechados, iniciou-se em seguida a pesquisa a respeito da passagem da personagem através de portas, para cômodos diferentes. Em alguns jogos, esta interação se dá de modo que o personagem pode abrir e fechar portas passando continuamente de um cômodo a outro, ou seja, o espaço é 42 modelado em continuidade e tudo se encontra dentro do mesmo level ou cena. Outros jogos, no entanto, não mostram a passagem por portas, de modo que a passagem de um cômodo a outro se dá por meio de um fade out/fade in e de um som de porta abrindo e fechando, que ajuda a criar a sensação de passagem. Nesse caso, provavelmente os cenários de cada cômodo são construídos em cenas diferentes, e as passagens são definidas por programação. Muitas vezes, a passagem também apresenta uma imagem, estática ou animada, que caracteriza o load (carregamento) da nova cena. Para fins de simplificação e principalmente por conta da intenção de criar uma continuidade espacial sobrenatural (com a passagem por portas nem sempre levando ao mesmo lugar), optou-se pela segunda opção. Sendo assim, cada cômodo da experimentação foi construído em uma cena diferente, e as passagens entre eles foram programadas. No Unity, os colliders podem ser definidos como triggers, que seriam “acionadores“ de um determinado evento. Em outras palavras, podemos dizer que é possível programar para que quando determinado objeto entre na área de colisão de um determinado collider (uma área invisível e agora possível de “atravessar”, uma vez que o collider deixa de ter a propriedade de colisão física quando definido como trigger) algo aconteça. No caso da experimentação, criaram-se em frente a cada porta objetos vazios (objetos sem mesh ou geometria, mas que podem carregar componentes como colliders ou scripts) com colliders em forma retangular. Em seguida, colocou-se um script de programação em cada um desses objetos, definindo que se a personagem controlada pelo jogador entrar em sua área de colisão, e, além disso, apertar determinada tecla do teclado (no caso “o”, de open) uma nova cena deve ser carregada, isto é, a cena que contém o cômodo ao qual aquela porta levará. Figura 20: Collider da porta: retângulo verde, Agatha precisa estar dentro da área do retângulo para, ao apertar a tecla correta, conseguir passar para outro cômodo 43 - Puzzle Em seguida, iniciou-se então a pesquisa de funcionamento do puzzle. Em jogos de exploração, puzzles ou riddles geralmente correspondem a enigmas que precisam ser resolvidos pelo jogador para que ele consiga prosseguir no jogo, avançando na narrativa ou abrindo novas áreas do cenário. No caso da experimentação, optou-se pela definição de um “puzzle” que fosse o mais simples possível, uma vez que a princípio não se tinha conhecimento do quão complexa seria a programação envolvida. Definiu-se então que, para que o jogador conseguisse prosseguir no cenário, seria necessário que ele pegasse um item, no caso uma cabeça de boneca, e o usasse em determinada área do cenário, no caso na maquete da boneca sem cabeça. A programação então foi realizada a partir de vários scripts: - O primeiro determina a existência de duas variáveis importantes, que foram chamadas “isHolding” e “activated”. Essas variáveis são do tipo “boleanas”, ou seja, carregam a informação true ou false (verdadeiro ou falso), sendo que “isHolding” se refere à informação de se Agatha está ou não segurando o item, e “activated” se refere à informação de se a saída foi ou não ativada. Este script foi associado a um objeto vazio e apresenta a função “DontDestroyOnLoad”, determinando que este objeto (e junto com ele suas variáveis) não seja destruído quando ocorrer o carregamento de uma nova cena. É importante notar que sem essa função as informações “isHolding” e “activated” seriam perdidas quando Agatha passasse por uma porta, já que os cômodos foram criados em cenas diferentes e ao fazer o load de uma nova cena, as informações da cena anterior são destruídas. - O segundo script foi associado ao item a ser pego, ou seja, à cabeça de boneca, na qual também foi criado um collider definido como trigger. O script determina que se Agatha estiver dentro da área de colisão e a tecla “p” (de “pick item”) for apertada, “isHolding” deve se tornar verdadeiro, e além disso, o próprio objeto deve ser destruído. Em outras palavras, se Agatha estiver próxima do item e a tecla “p” for apertada, o item desaparecerá e o jogo entenderá que Agatha pegou o item. 44 Figura 21: Agatha próxima ao item a ser pego (cabeça de boneca) - O terceiro script foi associado a uma outra cabeça de boneca que já está posicionada na maquete, mas que por default encontra-se invisível (com render desabilitado). Este objeto também apresenta um collider com trigger. O script determina que se Agatha estiver dentro da área de colisão, e “isHolding” for verdadeiro, e a tecla “p” (de “place item”) for apertada, “activated” deve se tornar verdadeiro e o render do objeto deve ser habilitado. Em outras palavras, se Agatha tiver pegado o item, estiver próxima da maquete e a tecla “p” for apertada, a cabeça aparecerá na maquete e o jogo entenderá que a saída foi ativada. - Por fim, outro script necessário para a programação do puzzle é o que foi associado ao objeto que fica posicionado na porta ao final de cada corredor. Este script determina qual cena deve ser carregada quando Agatha aperta “o” dentro da área de seu collider. Se “activated” for falso, a cena a ser carregada deve ser a cena com a sala 2 (cenário com a maquete), se for verdadeiro, a cena a ser carregada deve ser a cena com a sala 1B (cenário final, onde está Agatha sem rosto). Em outras palavras, se Agatha não ativou a saída, a passagem pela porta deve fazê-la voltar ao mesmo lugar. Já se a saída foi ativada, a passagem pela porta deve levar ao cenário final. Figura 22: Collider da cabeça posicionada na maquete, Agatha precisa estar dentro da área do quadrado para colocar o item e ativar a saída 45 Para a realização do puzzle, o material de pesquisa mais útil foi um conjunto de vídeos tutoriais do site “3D Buzz”, que estão disponíveis para download no link a seguir: http://www.3dbuzz.com/vbforum/content.php?225-Unity-3rd-Person-Platformer-Game Este tutorial é focado no desenvolvimento de um jogo em terceira pessoa e apresenta uma seção inteira voltada só para programação. Os vídeos “Pickup” e “PlaceItem” foram os mais utilizados. É importante notar, no entanto, que este tutorial apresenta programação em linguagem C#, de modo que foi necessário buscar, intuitivamente, a tradução do conhecimento adquirido para a linguagem JavaScript. Além disso, a pesquisa de questões referentes ao assunto, em fóruns de discussão, também ajudou na construção dos scripts. - Som Apesar de o som ser um elemento muito importante em qualquer linguagem audiovisual, e especialmente no gênero terror, por conta das limitações de tempo ainda não foi possível aprofundar a pesquisa no assunto. Por ora, realizou-se um teste com a inserção de uma trilha sonora programada para tocar durante toda a interação, continuando através das cenas. O processo foi adicionar um componente chamado “audio source” a um objeto vazio e especificar por programação que este objeto não fosse destruído ao carregar uma nova cena. Os materiais de pesquisa utilizados encontram-se nos links a seguir: http://docs.unity3d.com/Documentation/Components/class-AudioSource.html http://answers.unity3d.com/questions/59135/playing-music-while-scenes-change.html - Iluminação No que se refere à iluminação, pesquisou-se brevemente como se dá o processo de lightmapping dentro do Unity. Lightmap seria uma espécie de textura que guarda informações de claro e escuro, de modo que quando mesclada à textura normal do objeto, promove as alterações de luz e sombra que seriam causadas por um determinado set de iluminação. Este processo é utilizado na construção de jogos, pois facilita a renderização, permitindo que o resultado da iluminação não precise ser calculado em tempo real, sendo “pré-definido” através desses mapas de luz, que são apenas multiplicados às texturas. 46 Verificou-se, no entanto, que a versão gratuita do Unity (utilizada nesta pesquisa) apresenta poucos recursos de lightmapping se comparada à versão profissional, e inclusive não permite a criação de sombras. Como de qualquer forma seria então complicado criar uma iluminação realista, definiu-se que esta etapa não seria uma prioridade no desenvolvimento da experimentação prática. Tanto dentro do Unity quanto no 3D Max, buscou-se então criar uma iluminação simples, utilizando os recursos de forma intuitiva. - Cutscenes No que se refere à criação das cutscenes, o objetivo inicial era criar e manipular as câmeras dentro do 3D Max, renderizar os planos em arquivos de vídeo, realizar a montagem tanto da imagem quanto do som em um software de edição de vídeo, e por fim programar os vídeos já montados para rodar dentro do Unity. Pesquisando o assunto, no entanto, verificou-se que a versão gratuita do Unity não roda arquivos de vídeo, o que criou um obstáculo a mais no processo. As opções de solução encontradas foram então: ou pesquisar uma forma de criar as cutscenes dentro do próprio Unity, programando as trocas de câmeras para criar a montagem, ou transformar os vídeos montados em seqüências de imagens e tentar programá-las para que sejam trocadas com determinada velocidade, criando a ilusão do vídeo. Por conta das limitações de tempo, optou-se, neste momento, pela realização das cutscenes sem a sua integração com a parte interativa, o que deve ser pesquisado com mais calma num momento posterior. De qualquer forma, pretende-se utilizar a solução das seqüências de imagens, e uma primeira versão das cutscenes já começou a ser renderizada e montada. 47 Figura 23: Imagens renderizadas da cutscene inicial 48 49 Figura 24: Imagens renderizadas da cutscene final 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS O potencial artístico e narrativo dos jogos de videogame parece inegável. Mas ao mesmo tempo fica evidente o grande trabalho envolvido na construção de jogos que exploram esses elementos. Através da pesquisa de laboratório, foi possível apreender uma noção geral do processo de desenvolvimento de games, além de verificar as complexidades de cada etapa. Por conta da complexidade técnica envolvida na criação de um jogo de videogame, o esforço maior deste trabalho foi tentar adequar o tamanho da proposta prática de forma que a realização do ponto de vista técnico fosse possível e ao mesmo tempo se obtivesse um resultado satisfatório do ponto de vista artístico/narrativo. Algumas dificuldades foram encontradas no que se refere a questões técnicas, como dificuldades na busca de soluções para erros ou problemas específicos nos softwares utilizados, e dificuldades na criação e modificação de scripts de programação, uma vez que tais manobras demandam conhecimentos técnicos muito específicos. Considerando-se as limitações de tempo, a estratégia geral durante todo o processo foi a de primeiro tentar resolver as questões básicas de cada etapa, para depois voltar e melhorar detalhes conforme sobrasse tempo disponível. Vários detalhes continuam inacabados e pretende-se dar continuidade a esses estudos num momento posterior. Por ora, os resultados atingidos parecem satisfatórios considerando-se que o projeto era desde o princípio ambicioso na medida em que previa que uma série de especialidades fosse executada por uma só pessoa. 50 8. LOCAL: DATA: ASSINATURA DO ORIENTADOR: 51 ANEXO Trabalho Final - Roteiro III Prof. Roberto Moreira Data: 04/08/09 Dreamland (Argumento de Jogo) Thamilin Aso Introdução Dreamland é um jogo de terror em que o jogador controla uma jovem garota perdida num mundo fantástico de brinquedos assustadores. O jogo seria um “survival horror”, gênero de videogame em que a questão central, como o próprio nome diz, é terror e sobrevivência. O objetivo do protagonista/jogador é basicamente sobreviver ao “terror” que encontra no ambiente criado pelo game designer, além de avançar no cenário e interagir com a narrativa que vai acontecendo em tempo real (e claro, ir aos poucos desvendando os mistérios da situação em que se encontra). O jogo começa com a protagonista, Agatha, uma jovem garota, dormindo inquieta, tendo um pesadelo. No pesadelo, ela aparece como criança, na cama, amedrontada debaixo de um cobertor, num quarto escuro. Algo parece se mover pelo quarto, mas quando espia para fora do cobertor, Agatha não vê nada. De repente, ela é então colocada dentro de um saco e é raptada por uma figura que não se consegue identificar. Agatha então acorda (com a idade atual) num cômodo estranho e se vê presa numa mansão de piso xadrez e decoração excêntrica, um mundo estranhamente sombrio no qual personagens bizarros a perseguem e que aos poucos vai se revelando muito familiar à garota. Personagens AGATHA - Protagonista controlada pelo jogador, é uma garota de 17 anos, com olheiras profundas e cabelos despenteados. Costuma ter crises de insônia. O figurino normal que usa durante o jogo é um pijama de bolinhas (camisa de gola redonda e calça) e pantufas de coelhinho. BONECA DE CORDA maligno no rosto. apresenta falhas, parar. Comanda um Boneca cruel, que sempre está com um sorriso Possui um corpo mecânico que por vezes causando piripaques como virar a cabeça sem exército de bonecos menores e puramente 52 mecânicos (sem consciência ou personalidade), que aparecem para atacar e atrapalhar o percurso da protagonista. Usa como arma uma marreta gigante e barulhenta de brinquedo. BAILARINA - Boneca de caixinha de música. É a boneca mais delicada e melancólica. A princípio parece inofensiva, mas adquire um aspecto macabro/sanguinolento no meio do jogo, tornando-se mais uma vilã perseguidora. Usa um guarda-chuva de babados. No momento em que a boneca se transforma na sua personalidade maligna, a garota encontra ela caída, toda retorcida, com membros fora de lugar e sangue por toda parte. A cena é a boneca se desvirando e se reconstituindo até ficar em pé e falar algo sinistro. Quando acaba a cena não interativa, o jogador já nota que é preciso fugir em seguida. VELHA MARIONETE - Boneca marionete de uma velha costureira. Ranzinza, costuma resmungar coisas para si mesma, ignorando a presença de outros. Trabalha em sua máquina de costura e ignora a protagonista. Tem um gordo gato de pelúcia inanimado com quem conversa como se estivesse vivo. É quase cega e usa óculos fundo de garrafa. Em sua batalha final com a protagonista, usa como arma agulhas gigantes. “Cai” do teto de surpresa (que é todo escuro e não se enxerga o fim), pendurada pelos fios da marionete. Quando é derrotada, uma mão gigante de criança solta os fios da marionete, que fica caída no chão. BONECA DE PANO – Foi costurada pela velha marionete, que, obsessiva, não soube quando parar de colocar enchimento e tecido. Eufórica e excessivamente doce, possui uma gargalhada sinistra. Possui um forte instinto materno e tenta a todo momento engordar seus “filhos” (bonecos inanimados sentados em cadeirões de bebê) com uma terrível gororoba, deixando-os completamente encardidos de gororoba. Persegue a protagonista, para que ela brinque com ela de “mamãe e filhinha”. Na batalha final, uma das estratégias de luta é aproveitar quando ela tropeça na própria capa. A velha a costurou obsessivamente e colocou tecido demais. À medida que o jogador vai golpeando a boneca de pano, ela vai descosturando e soltando trapos que vão se espalhando pelo chão e funcionando como obstáculos a mais para a protagonista. A boneca de pano usa uma colher gigante e também costuma atirar colheradas de gororoba, que grudam na protagonista e a deixam imobilizada por um tempo. MÁGICO – Humano, jovem, misterioso. Muitas vezes, surge e desaparece do nada. Sempre fala coisas que fazem todo o sentido e parece adivinhar os pensamentos da protagonista. Faz 53 pequenos truques de mágica. Fala em tom calmo e levemente irritante, por saber demais e não revelar nada. No final, se revela como chefe de todos os bonecos, representante daquele mundo sobrenatural. ALICE – Irmã mais nova de Agatha. Não a conhecemos no início do jogo. É o elo de ligação entre Agatha e aquele mundo. Descrição/Lógica do Mundo A parte interativa do jogo se passa numa mansão excêntrica, um mundo paralelo onde brinquedos ganham vida. Eventos sobrenaturais e uma atmosfera de pesadelo se sobrepõem à lógica do mundo real. Ambientes Dentro da mansão, os ambientes incorporam muitos elementos com clima de espetáculo (teatro, circo), parque de diversões e elementos relacionados à infância. Exemplos de ambientes possíveis: Sala de teatro (palco e platéia); salão de dança; labirinto de espelhos; playground (ambiente “externo” falso, com uma área verde cenográfica); sala de vitrines (com manequins); refeitório; despensa falsa; corredor com cabeças de animais penduradas (que viram os olhos e murmuram entre si à medida que a protagonista passa); sala de costura; sala do carrossel; piscina de bolinhas gigante; além de outros vários corredores e cômodos bizarros. Boa parte dos objetos e dos elementos do cenário são de mentira, de brinquedo. Funcionamento do Jogo Este é um jogo de exploração e sobrevivência em terceira pessoa. O objetivo do jogador é escapar das vilãs perseguidoras e avançar no cenário do jogo a partir da exploração e aquisição de itens que permitem abrir caminho para novas áreas do cenário. A cada momento do jogo, a protagonista é perseguida por uma boneca vilã diferente. Ao derrotar a primeira vilã, uma nova aparece, e assim por diante, até derrotar as 4 bonecas perseguidoras. A ordem em que as bonecas se tornam perseguidoras é: boneca de pano; velha marionete (que fica furiosa quando vê a boneca de pano destruída); bailarina (que age num momento em que as luzes se apagam na mansão e o jogo 54 adquire aspecto mais sombrio); e boneca de corda (que age num momento em que o universo começa a se desestabilizar, engrenagens começam a funcionar, e todo o mapa do cenário começa a ficar confuso, com cômodos trocando de lugar, de modo que o jogador não sabe mais que cômodo vai encontrar atrás de cada porta). O jogador só pode derrotar uma vilã num momento específico do jogo – o “embate final”. Neste estágio, o jogador possui meios específicos de golpear a vilã e fica trancado com ela num determinado ambiente, de modo que precisa necessariamente derrotá-la antes de prosseguir no jogo. Nos estágios normais de exploração, em que o jogador é perseguido por uma determinada vilã, é possível golpeá-la utilizando os itens “arma” coletados, no entanto esses golpes só atrasam a perseguidora, que fica nocauteada ou lenta por um determinado tempo e retorna em seguida intacta para perseguir a protagonista. Neste estágio, não é possível causar danos progressivos a uma vilã até derrotá-la. Cada vilã possui determinados tipos de golpes, de acordo com a sua arma, e tentará de todo modo atingir a protagonista. Se a protagonista for atingida 5 vezes sem usar nenhum tipo de “remédio”, isto determinará a sua morte e conseqüentemente o fim do jogo. Quando o jogador perde o jogo, a cena que aparece é uma mão de criança fazendo um estalo com os dedos e derrubando uma bonequinha-estátua de Agatha, que fica caída rolando pra lá e pra cá, com uma música sinistra de fundo. À medida que vai ficando mais machucada, a protagonista passa a andar com maior dificuldade e passa a responder mais lentamente aos comandos do protagonista, de modo que fica cada vez mais difícil escapar dos ataques das perseguidoras. Quando o jogador foge e ganha distancia suficiente da perseguidora, esta desaparece e o jogador tem um momento temporário de paz para explorar os ambientes. A presença ou ausência da ameaça de uma perseguidora é determinada pela música. Cada perseguidora tem uma música característica que expressa a atmosfera frenética de perseguição. Quando a música inicia, o jogador já fica alerta de que a perseguidora está próxima; quando a música vai embora, o jogador pode respirar aliviado momentaneamente, pois a perseguidora não vai aparecer por algum tempo. 55 Espalhados pelo cenário, existem “save points” na forma de janelas iluminadas, que representam a saída do pesadelo. Toda vez que encontrar uma janela iluminada o jogador poderá salvar o seu progresso no jogo. Ações do jogador: - Locomover-se pelo espaço (andar/correr). - Examinar o ambiente – Desse modo é possível encontrar itens úteis como doces, armas, chaves. Ao investigar algumas áreas do ambiente o jogador obtém o pensamento da protagonista a respeito daquela área na forma de texto. Esses pensamentos podem dar pistas do que é necessário fazer para prosseguir no jogo ou fornecer elementos que contribuem para a construção da memória perdida da personagem. - Golpear as vilãs – Durante os estágios de perseguição é possível atacar as vilãs, deixando-as temporariamente nocauteadas ou lerdas (o que é útil para ganhar vantagem de tempo na fuga). - Utilizar itens. ITENS Os itens que o jogador encontra durante o jogo podem se dividir em 3 categorias: DOCES – Servem como remédio, curando os danos causados pelos vilões ou obstáculos no caminho. Há três tipos de doces de acordo com a sua eficiência: os que recuperam ¼ da energia (saquinho de balas coloridas de goma, pirulito em caracol, saquinho de amendoim); os que recuperam ½ da energia (rosquinha com açúcar, saco de pipoca doce, saco de marshmellows); e os que recuperam total energia (manjar com calda vermelha; pedaço de bolo de chocolate). Quanto maior a eficiência do doce mais difícil encontrá-lo no ambiente. ARMAS – Servem para atacar as bonecas perseguidoras ou os brinquedos sem consciência que aparecem para atrapalhar. Também é possível degradar partes do cenário e destruir objetos para acessar itens que se encontravam escondidos dentro deles. As armas que a protagonista pode manejar também expressam aquele universo de brinquedos. As principais são: pistola de água (que necessita ser reabastecida em uma fonte ou pia, quando a água acaba) e estilingue (que pode usar como “munição” diferentes objetos como pedrinhas, bolinhas de 56 plástico, bolinhas de gude), e armas mais improvisadas como pedaços de manequim. Além disso, existem as ARMAS ESPECIAIS, que golpeiam a perseguidora e a deixam desacordada por todo o tempo em que o jogador permanecer naquele ambiente. Se o jogador sair do ambiente e voltar, a perseguidora não estará mais lá e a qualquer momento poderá aparecer de novo para infernizar a vida do jogador. Cada uma dessas armas, no entanto, só pode ser usada uma vez. Enquanto a perseguidora permanece desacordada, é possível examinar seu corpo e encontrar nele itens especiais. ITENS “CHAVE” – Itens necessários para avançar no cenário do jogo. Não precisam necessariamente ser uma chave para abrir uma porta, podem ser diferentes tipos de objeto como um alicate para abrir uma passagem cercada de arame. Narrativa À medida que o jogador avança no jogo, ele vai descobrindo o que está acontecendo naquele universo inicialmente misterioso e começa a compreender a relação entre a protagonista e aquele lugar. Aquele universo sobrenatural de terror está todo relacionado à infância da protagonista. E essas relações vão sendo contadas através de pensamentos da protagonista ao analisar objetos ou cenários que lhe parecem familiares (na forma de texto ou voz over); através de documentos (diários, cartas, matérias de jornal) que fornecem pistas do passado ao jogador; e através de cenas não interativas (flashbacks ou não). A história passada de Agatha (que o jogador deve entender perfeitamente apenas no final) está totalmente relacionada à sua irmã mais nova, Alice. Quando Agatha tinha 7 anos e Alice 5, as garotas se mudam com a família para uma casa antiga. Nessa nova casa, Agatha e Alice descobrem um sótão sombrio, cheio de brinquedos empoeirados. Alice era medrosa e chorona e achava que aquele lugar era mal assombrado. Já Agatha, que era uma garota esperta e geniosa, costumava tirar sarro da irmã e chamá-la de “bebezona”. Certo dia, as garotas brigam e Agatha tranca Alice no sótão. Por acidente (ou não) justo nesse dia a casa pega fogo e Alice não sobrevive, pelo menos não de modo natural. Agatha não conta aos pais que havia trancado a irmã, e guarda sozinha um enorme sentimento de culpa. O trauma faz com que 57 Agatha bloqueie e esqueça esse evento do passado, e o percurso do jogo é o momento de confrontação da garota com os seus atos do passado. Ao se ver trancada no sótão com a casa pegando fogo, Alice se desespera e chora. Porém, brinquedos vão saindo das sombras e começam a se mover sozinhos em direção a ela (inclusive as 4 bonecas perseguidoras). Alice pára de chorar e percebe o aspecto mágico daquele lugar. Nesse momento ela faz uma espécie de pacto com essa força sobrenatural. As 4 bonecas perseguidoras devem expressar características de Alice (que Agatha deve ir percebendo com o tempo). Por exemplo, a boneca de pano gosta de brincar de “mamãe e filhinha”, e esta era a brincadeira preferida de Alice. A mansão excêntrica é uma espécie de casa de bonecas controlada por Alice. As mãos de criança que soltam a boneca marionete e que derrubam a boneca de Agatha na cena de fim de jogo pertencem à Alice. Na realidade, seria interessante as mãos aparecerem em outros momentos ao longo do jogo, por exemplo tombando uma fileira de peças de dominó que vão caindo até chegar em Agatha e golpeá-la. A idéia do jogo é que se possa chegar em desfechos diferentes, dependendo das escolhas do jogador durante momentos específicos do jogo. O passado de Agatha não vai mudar, porém é possível explorar diferentes aspectos desse passado. O universo fantástico que ela adentrou tem mais a ver com a vingança da irmã que se tornou uma entidade maligna ou é mais a expressão do sofrimento que o sentimento de culpa tem gerado por muito tempo na própria protagonista? Questões como essa devem ser exploradas na criação dos diferentes finais do jogo. Direção de Arte O universo do jogo está relacionado a bonecos e brinquedos, elementos que podem ser ao mesmo tempo bonitinhos e sombrios. Essa dualidade é a questão central a ser explorada pela direção de arte. Também é interessante incorporar elementos circenses e de época (bobos da corte, arlequins, visual conto de fadas). No que se refere ao clima do jogo, a direção de arte deve apostar na atmosfera de espetáculo e parque de diversões, utilizando uma fotografia de alto contraste; alta saturação em certos tons de cores (como por exemplo, o vermelho); luzes coloridas; focos de luzes; letreiros luminosos. 58 No figurino dos personagens, imagino a ampla utilização de listras, xadrez e bolinhas. O objetivo é criar um visual excêntrico tanto para os cenários quanto para os personagens macabros. Conclusão Em termos de diversão e jogabilidade, o jogo pretende apostar numa grande variedade de itens que o jogador pode experimentar, e em diferentes possibilidades de interação com o ambiente (mesmo que em termos de progresso no jogo isto não mude em nada, é divertido poder manipular objetos e fazer coisas “a mais”). Em termos de narrativa, o jogo pretende contar a história aos poucos, à medida que o jogador vai encontrando pistas que vão solucionando o mistério daquele ambiente estranho, deixando a surpresa de que Agatha havia trancado a irmã no sótão para o final. Além disso, o fato das escolhas do jogador determinarem o rumo da história torna a experiência mais interessante. E além de tudo, trata-se de um jogo que aposta numa boa dose de terror, acompanhado de certos elementos esdrúxulos, que rendem também uma pitada de humor, o que torna a experiência do jogo mais divertida. Esboços - Personagens Agatha 59 Boneca de corda Bailarina Boneca de pano Mágico Velha Marionete 60