Antiga Física Quântica 2010 Antiga Física Quântica Notas de aulas (rascunho) Introdução Capítulo 1. Radiação térmica e o Corpo Negro Secção 1.1 - O corpo Negro Secção 1.2 – Teoria clássica da Radiação de Cavidade de Rayleigh – Jeans Secção 1.3 – Teoria de Planck da Radiação de Cavidade Introdução O início do século XX foi marcado pelas grandes descobertas da física contemporânea. A física clássica tornou-se limitada do ponto de vista de suas aplicações. Na primeira década do século XX surgiu a teoria da relatividade especial e o início da teoria quântica. O problema envolve velocidades muito grandes no primeiro caso, e corpos de dimensões extremamente pequenas no segundo. O objetivo aqui é a apresentação de tratamentos elementares das propriedades de quase todos os sistemas quânticos. Para isso, inicialmente abordaremos uma introdução dos vários fenômenos do inicio da física quântica e desenvolveremos as idéias essências da dita antiga teoria quântica. Em seguida, veremos os fundamentos da Mecânica Quântica e as aplicações a átomos monoeletrônicos e polieletrônicos. O nível desta abordagem de física quântica é intermediário entre os de física básica e um rigoroso de Mecânica Quântica. Vários detalhes matemáticos serão omitidos para que os conceitos físicos sejam enfatizados. Capítulo 1 – Radiação Térmica e Corpo negro Um trabalho apresentado por Max Planck (1858-1947) em 14 de dezembro de 1900 de título “Sobre a Teoria da lei de Distribuição de Energia do Espectro Normal”, onde as concepções clássicas não estavam sendo verificadas, marcou um início de uma revolução na física. Esta data é considerada como sendo a do nascimento da física quântica. A física quântica não substitui a clássica, mas representa uma generalização, que inclui as leis clássicas como casos especiais. 1 Antiga Física Quântica 2010 A radiação emitida por corpos aquecidos é denominada radiação térmica. A matéria em estado condensado (isto é, sólido ou líquido) emite um espectro contínuo de radiação. À temperatura normal, um corpo pode ser visto não por emissão, mas por reflexão de luz. No entanto à temperaturas altas os corpos podem emitir luz própria, embora mais de 90% esteja na região do infravermelho do espectro eletromagnético. Exemplos de corpos que radiam no visível são carvão em brasa, filamento de lâmpadas e estrelas. A relação entre a temperatura de um corpo e a freqüência, ou cor, que emitem pode ser utilizada como um espectrômetro, conhecido como pirômetro óptico. Com um instrumento como este é possível estimar a temperatura de um corpo aquecido, como por exemplo, uma estrela distante, observando simplesmente a cor, ou distribuição de freqüência, da radiação térmica por ela emitida. Secção 1.1 – O Corpo Negro Em geral, o espectro da radiação térmica emitido por um corpo aquecido depende da sua composição. Entretanto, a experiência mostra que é possível idealizar um corpo aquecido que emite espectro térmico de caráter universal. Trata-se do chamado “corpo negro” que são corpos cuja superfície absorve toda a radiação térmica incidente sobre ela. Todos os corpos negros, à mesma temperatura, emitem radiação térmica de mesmo espectro. Um corpo negro pode ser representado convenientemente por uma cavidade, dotada de um pequeno orifício, como mostra a fig. (1.1). Praticamente, toda a radiação vinda do exterior que passa pelo orifício, entra na cavidade, dificilmente consegue sair dela, e termina por ser absorvida. Assim esse orifício se comporta como um corpo negro. Fig. (1.1) – Cavidade com um pequeno orifício que se comporta como um corpo negro. O parâmetro utilizado para descrever a distribuição espectral da radiância de um corpo negro, a uma temperatura absoluta T é a radiância RT, 2 Antiga Física Quântica 2010 que se refere a energia total radiada pelo objeto por unidade de área e tempo, definida por, ∞ RT = ∫0 RT (𝜈) 𝑑𝜈 (1.1) onde, RT (𝜈) é a radiância por unidade de intervalo de freqüência 𝑑𝜈, denominada de radiância espectral, e dá a distribuição de radiância de um corpo negro, definida de forma que, RT (𝜈) 𝑑𝜈 seja a energia emitida por unidade de área e tempo com freqüências no intervalo entre 𝜈 e 𝜈 + 𝑑𝜈. Em 1879, Josef Stefan (1835-1893) usando argumentos empíricos, demonstrados teoricamente mais tarde por Ludwig Boltzmann (1844-1906), propõe que a radiação seja proporcional a quarta potência de temperatura, isto é, RT = 𝜎 T4 (1.2) onde, 𝜎 = 5,67 x 10-8 w/ m² . k4 é chamada de constante de StefanBoltzmann, e a equação (1.2) é conhecida como lei de Stefan- Boltzmann. A fig. (1.2) mostra a radiância espectral RT (𝜈) de um corpo negro para diferentes temperaturas, obtida experimentalmente por O. R. Lummer (18601925) e, E. Prungshein (1859-1917) em 1899. Fig. (1.2) – Radiância espectral de um corpo negro em função da freqüência e temperatura. A fig.(1.2) mostra que o espectro se desloca para as freqüências máximas 𝜈máx à medida que a temperatura aumenta. Este comportamento é linear, isto é, 3 Antiga Física Quântica 2010 𝜈máx ∝ T (1.3) e já tinha sido demonstrado por Wilhelm Wien (1864-1928) em 1893, usando argumentos de termodinâmica, e por isso ficou conhecido como lei do deslocamento de Wien. A distribuição espectral da radiação de um corpo negro pode ser eventualmente descrita em termos de comprimentos de onda 𝜆. A radiância RT na equação (1.1) pode ser escrita nas duas formas seguintes: ∞ RT = ∫0 ∞ RT (𝜈) 𝑑𝜈 = ∫0 RT (𝜆) 𝑑𝜆 (1.4) A segunda integral RT (𝜆) descreve a radiação espectral distribuída em comprimentos de onda. Podemos transformar uma integração sobre 𝜈 em uma integração sobre 𝜆, utilizando-se a seguinte regra: ∞ RT = ∫0 0 𝑑𝜈 𝑑𝜆 RT (𝜈) 𝑑(𝜈) = ∫∞ RT (𝜈) ∞ 𝑑𝜆= - ∫0 RT (𝜈) 𝑑𝜈 𝑑 𝑑𝜆 (𝜆) (1.5) Note que os limites de integração é invertido para acomodar a relação inversa entre 𝜈 e 𝜆, dada por, 𝜈= 𝑐 𝜆 (1.6) Comparando-se as últimas integrais das equações (1.4) e (1.5), e 𝑑𝜈 −𝑐 notando que da equação (1.6), 𝑑𝜆 = 𝜆² , obtemos: RT (𝜆) = - RT (𝜈) 𝑑𝜈 𝑑𝜆 = 𝑐 𝜆² RT (𝜈) (1.7) Note que a dependência de RT (𝜆) com 𝜆, não é o mesmo que a dependência de RT (𝜈) com 𝜈. Em particular a lei do deslocamento de Wien, pode ser reescrita, utilizando-se 𝜈máx = c/𝜆máx, como: 𝜆máx ∝ 1 𝑇 (1.8) ou seja, agora os valores de 𝜆 para máximos de radiância, diminuem com o aumento da temperatura. A constante de proporcionalidade na equação (1.8), conhecida como constante de Wien, foi determinada empiricamente e vale, 4 Antiga Física Quântica 2010 λmáx T = 2, 898 x 10-3 m . k (1.9) Exemplo 1.1 Supondo-se que as superfícies das estrelas se comportem como corpos negros, pode-se obter uma boa estimativa de suas temperaturas medindo-se 𝜆máx. Para o Sol, 𝜆máx = 5100 Å, enquanto que para a estrela do norte (Estrela Polar) 𝜆máx = 3500 Å. (a) Achar a temperatura da superfície dessas estrelas e, (b) determinar a radiância dessas estrelas. Solução (a) De acordo com a lei de deslocamento de Wien, λmáx T = 2, 898 x 10-3 m . k Para o Sol, λmáx = 5100 Å = 5,1 x 10-7 m , logo, 5,1 x 10-7. T = 2, 898 x 10-3 ⇒ T = 5700 k Para a estrela polar, λmáx = 3500 Å = 3,5 x 10-7 m, logo, 3,5 x 10-7 . T = 2,898 x 10-3 ⇒ T = 8300 k Observe que, pelo fato da Estrela Polar emitir mais no ultravioleta, ela é mais quente do que o Sol. O Sol emite mais intensamente na região visível do espectro, sugerindo que, durante a evolução humana, nossos olhos tornaramse mais sensíveis aos comprimentos de onda desta região do espectro. (b) Pela lei de Stefan–Boltzman, RT = 𝜎 T4, assim, Para o Sol, RT = 5,67 x 10 x 10-8 x (5700)4 ⇒ RT = 5,9 x 107 w/m2 ou, RT ≅ 6000 w/cm2 Para a Estrela do Norte, RT = 5, 67 x 10-8 x (8300)4 ou, 5 ⇒ RT = 2,71 x 108 w/m2 Antiga Física Quântica 2010 RT ≅ 27000 w/cm2 Secção 1.2 – Teoria clássica da Radiação de Cavidade de Rayleigh – Jeans No início do século XX, John Rayleigh (1842-1919) e James Jeans (18771946), utilizaram a teoria clássica para estudar a densidade de energia da radiação de cavidade, ou de corpo negro, que resultou em sérias divergências com resultados experimentais. Estas divergências revelam-se como uns dos fatos históricos mais importantes para o nascimento da teoria quântica. Nesta secção, vamos apresentar os cálculos feitos por Rayleigh e Jeans e discutir as divergências observadas. Na secção seguinte, discutiremos a teoria de Planck para a radiação de cavidade, que introduziu a quantização da energia. Se as paredes internas da cavidade da fig.(1.1), estiverem uniformemente aquecidas a uma temperatura T, o orifício atua como um emissor de radiação, como mostra a fig. (1.3). Fig. 1.3 – cavidade uniformemente aquecida emissora de radiação Como o orifício tem propriedade de uma superfície de corpo negro, a radiação emitida por ele deve também ter um espectro de Corpo Negro. O espectro emitido pelo orifício na cavidade será especificado também por uma radiância espectral RT (𝜈). No entanto, é mais útil, especificar o espectro da radiação dentro da cavidade, conhecida como radiação de cavidade, em termos de uma densidade de energia ϱT (𝜈). Evidentemente, essas quantidades são proporcionais entre si. A relação entre a radiância RT e a densidade de energia 𝜚T, pode ser encontrada com a ajuda de uma esfera imaginária com o orifício da cavidade em sua superfície, como mostra a fig.(1.4). 6 Antiga Física Quântica 2010 Fig.(1.4) – Esfera imaginária com orifício da cavidade. Devemos notar que, como somente um dos hemisférios 𝑑𝐴 contém o orifício, então num intervalo de tempo ∆t, a energia radiada ∆ER será metade da energia ∆EC da cavidade. Além disso, somente radiação com cavidade <cZ> atravessam o furo. Evidentemente, a média <cZ> pode ser ponderada em 𝜋 𝜋 qualquer intervalo do hemisfério [ - , ]. Em particular, pode-se ponderá-la 2 𝜋 2 no octante [0, 2 ]. Com essas considerações, obtém-se: RT = ∆𝐸𝑐 ∆𝑡 . 1 ∆𝑡 . <∆𝑧> <∆𝑧> = 1 2 <cZ> ∆𝐸𝑐 ∆𝑉 = 1 2 <cZ> 𝜚T com, <cZ> ponderada na área da semi- esfera: <cZ> = 𝜋/2 ∫0 (𝑥 𝑐𝑜𝑠𝜃)2𝜋𝑟² 𝑠𝑒𝑛𝜃 𝑑𝜃 𝜋/2 ∫0 2𝜋𝑟² 𝑠𝑒𝑛 𝜃 𝑑𝜃 = 0 2𝜋𝑟² 𝑐 ∫1 𝑥 𝑑 𝑥 2𝜋𝑟² 0 ∫1 𝑑𝑥 = 𝑐 2 onde, adotou-se a mudança de variável 𝑥 = 𝑐𝑜𝑠 𝜃. Assim, a radiância e a densidade de energia na cavidade se relacionam por, RT = 𝑐 4 𝜚T ou, num intervalo de freqüências entre 𝜈 e 𝜈 + 𝑑𝜈, RT (𝜈)𝑑𝜈 = 𝑐 4 𝜚T (𝜈) 𝑑𝜈 (1.10) ou ainda, em termos de comprimento de onda, RT (𝜆) 𝑑𝜆 = 7 𝑐 4 𝜚T (𝜆) 𝑑𝜆 (1.11) Antiga Física Quântica 2010 pois, como c = 𝜆𝜈 , 𝑑𝜈 𝑑𝜆 = −𝑐 𝜆² , e portanto 𝑑𝜈 é proporcional a – 𝑑𝜆 . Pode-se considerar as paredes internas da cavidade perfeitamente condutra, tal que, os campos sejam confinados, e que a energia seja armazenada na forma de ondas eletromagnéticas estacionárias de modos discretos para qualquer freqüência 𝜈. Podemos então, determinar a densidade de energia espectral 𝜚T (𝜈) 𝑑(𝜈) num intervalo de freqüência entre 𝜈 e 𝜈 + 𝑑 (𝜈), simplesmente contando o número de modos 𝑁 (𝜈) 𝑑𝜈 no mesmo intervalo de freqüências e multiplicando pela energia total média < ℇ > de cada modo: ϱT (𝜈) 𝑑(𝜈) = 𝑁(𝜈)𝑑(𝜈) 𝑉 < ℇ > (1.12) onde, V é o volume da cavidade. O problema se reduz então na determinação dos fatores 𝑁 (𝜈) 𝑑(𝜈) e < ℇ >. Para simplificação matemática na determinação de 𝑁(𝜈) 𝑑(𝜈), assumiremos que a forma da cavidade seja cúbica de dimensões L, como mostra a fig.(1.5). Nesse caso, as componentes dos campos elétricos 𝐸⃗ e ⃗ , podem ser tratadas separadamente, por causa do paralelismo magnético 𝐵 das paredes. Fig.(1.5) – Cavidade cúbica perfeitamente condutora. A radiação eletromagnética é uma vibração transversal, com vetores 𝐸⃗ e ⃗ perpendiculares à direção de propagação como também mostrado na 𝐵 fig.(1.5). ⃗ é obtido O comportamento espacial e temporal dos campos ⃗⃗⃗ 𝐸 e 𝐵 através das equações de J. C. Maxwell (1871-1879). Entretanto, por causa da natureza vetorial desses campos, o tratamento matemático envolvido na solução geral do problema é bastante tedioso. Ao invés de fazê-lo, vamos optar inicialmente, por resolver uma situação hipotética simplificada, onde a cavidade seja unidimensional de comprimento L, de modo que a natureza vetorial dos campos possam ser ignoradas. Uma vez resolvido este problema 8 Antiga Física Quântica 2010 simples, vamos generalizá-lo ao caso tridimensional utilizando argumentos geométricos simples. Ao longo do eixo-x, os campos E (x, t) e B (x, t), satisfazem a equação de onda semelhantes ao caso de cordas vibrantes presas pelas extremidades, isto é, 𝜕² 𝐸(𝑥,𝑡) 𝜕𝑥² = 1 𝜕² 𝐸(𝑥,𝑡) 𝑐² 𝜕𝑡² (1.13) e uma equação similar para B (x,t); que não será explicitada aqui. Nesta equação 𝑐 = 𝜆𝜈, é a velocidade da luz (c = 3,00 x 108 m/s). A solução da equação (1.14) para uma onda estacionária (resultante da soma de onda para direita e esquerda), será: E (x,t) = E0 [sen (kx + wt) + sen (kx - wt)] = E0 sen kx sen wt (1.14) onde, 2𝜋 𝜆 k= e, w = 2𝜋𝜈 (1.15) são, respectivamente, o numero de ondas e a freqüência angular. A identidade na equação (1.14) pode ser verificada usando-se a relação, sen 𝛼 + sen 𝛽 = 2 1 1 sen 2 (𝛼 + 𝛽) cos 2 (𝛼 − 𝛽). A equação (1.14), descreve o comportamento de uma onda cuja amplitude varia senoidalmente, no espaço e no tempo, ao longo do eixo-x e com freqüência 𝜈. Esse comportamento deve ser espacialmente localizado, como ondas estacionárias, exibindo nódos em 𝑥 = 0 e 𝑥 = L. Para que o campo E (x, t) seja nulo nesses pontos, de acordo com a equação (1.14), sen (2𝜋𝐿/𝜆) = 0, ou 2𝜋𝐿/𝜆 = 𝑛𝜋 onde, n = 0, 1, 2,..., ou seja, o comprimento de onda λ deve assumir valores dados por, λ= 2𝐿 𝑛 ; n = 0, 1, 2, ... (1.16) ou ainda, em termos de freqüência, 𝜈= 9 𝑐 𝜆 = 𝑐 2𝐿 n; n = 0, 1, 2,... (1.17) Antiga Física Quântica 2010 Esta condição determina um conjunto de valores possíveis de comprimentos de onda, ou freqüências, que devem se propagar na cavidade unidimensional. A figura (1.16) mostra ondas estacionárias para n = 1, 2, 3. Fig.(1.6) – Ondas estacionárias para n = 1, 2 e 3. Um comportamento similar se obtêm quando se considera as dimensões y e z individualmente, isto é, as radiações se propagam de modo que suas três componentes espaciais são ondas estacionárias. Para generalizar o problema ao caso tridimensional, consideremos uma radiação de comprimento de onda λ, propagando-se numa direção definida pelos três ângulos diretores 𝛼, 𝛽 𝑒 𝛾, como mostra a figura (1.7). Obviamente, as radiações devem ser ondas estacionárias já que suas componentes espaciais o são e, neste caso, os nódos são planos distanciados de 𝜆/ 2. Fig.(1.7) – Planos nodais que se propagam numa certa direção na cavidade cúbica. Como na equação (1.16) os comprimentos de onda associados a cada coordenada espacial, serão, 10 Antiga Física Quântica 2010 λx = 2L/ nx; λy = 2L/ ny ; λz = 2L/ nz (1.18) onde, nx , ny , nz = 0, 1, 2, ... . Estas componentes podem ser escritas em termos do comprimento de onda λ, como sugere a figura (1.7), cos 𝛼 = λ/ λx ; cos 𝛽 = λ/ λy ; cos 𝛾 = λ/ λz (1.19) que relacionadas com as equações (1.18), fornecem, 2𝐿 𝜆 cos 𝛼 = nx ; 2𝐿 𝜆 cos 𝛽 = ny ; 2𝐿 𝜆 cos 𝛾 = nz Elevando-se ambos os membros destas equações ao quadrado e, em seguida somando-os, obtemos 2𝐿 𝜆 ( )² (cos² 𝛼 + cos² 𝛽 + cos² 𝛾 ) = nx² + ny² + nz² O segundo termo entre parênteses, define a soma dos co-senos diretores dada por, cos² 𝛼 + cos² 𝛽 + cos² 𝛾 = 1 (1.20) e, então, 2𝐿 𝜆 = (nx² + ny² + nz²)1/2; nx, ny, nz = 0, 1, 2, ... (1.21) Em termos de freqüência, a equação (1.21) pode ser escrita como, ν = 𝑐 𝜆 = 𝑐 2𝐿 (nx² + ny²+ nz²) ; nz , ny , nz = 0, 1, 2, ... (1.22) Essas equações descrevem novamente um conjunto de valores possíveis de comprimento de onda e freqüência, agora para o caso geral da cavidade cúbica condutora. Vamos agora contar o número de modos 𝑁 (𝜈) 𝑑𝜈, no intervalo de freqüência entre 𝜈 e 𝜈 + 𝑑𝜈, construindo uma esfera de raio r = (nx² + ny² + nz²)1/2 (1.23) 11 Antiga Física Quântica 2010 em coordenadas retangulares, tal que o conjunto de inteiros nx , ny e nz definem pontos no interior de um octante do sistema de coordenadas, fig. (1.8). Fig.(1.8) – Espaço (nx, ny , nz ) definindo um octante esférico de raio r = (nx² + ny² + nz²)1/2. O volume total do octante esférico pode ser dividido em volumes unitários, contendo cada um, apenas um ponto (nx, ny , nz). Esta construção permite definir a densidade de pontos como, ϱ = 1 ponto/ unidade de volume (1.24) Cada ponto (nx, ny, nz ) corresponde a uma freqüência possível 𝜈, que se relaciona ao raio r, de acordo com as equações (1.22) e (1.23), como r= 2𝐿 𝑐 𝜈 (1.25) Assim, calcular o número de modos N (𝜈)𝑑𝜈 entre 𝜈 e 𝜈 + 𝑑 𝜈, é equivalente a calcular o número de pontos N (𝑟) 𝑑𝑟, contidos entre as cascas esféricas entre 𝑟 e 𝑟 + 𝑑𝑟. O valor de N (𝑟) 𝑑𝑟 pode ser calculado simplesmente, multiplicando o volume da camada entre 𝑟 e 𝑟 + 𝑑𝑟 pela densidade de pontos, isto é, 1 1 𝑁 (𝜈) 𝑑𝜈 = 𝑁 (𝑟) 𝑑𝑟 = (8 4πr²) 𝑑𝑟 𝜚 = 2 πr² 𝑑𝑟 pois, 𝜚 = 1. Utilizando a equação (1.25) e sua derivada, 𝑑𝑟 = (2𝐿/𝑐) 𝑑𝜈, na equação anterior obtém-se: 𝑁 (𝜈) 𝑑𝜈 = ½ π ( 2𝐿 𝑐 𝜈)² ( 2𝐿 ) 𝑐 𝑑𝜈 = 4𝜋𝜈² 𝑐³ onde, usamos o volume da cavidade como, V = L³. 12 V 𝑑𝜈 (1.26) Antiga Física Quântica 2010 Finalmente, devemos multiplicar o resultado da equação (1.26) por um fator 2, pois, para cada freqüência possível 𝜈, há, na verdade, duas ondas independentes correspondentes aos dois possíveis estados de polarização da radiação eletromagnética, que podem estar ou não em fase, isto é, 𝑁 (𝜈) 𝑑𝜈 = 8𝜋𝑉 𝑐³ 𝜈² 𝑑𝜈 (1.27) Apesar de nossos cálculos terem sido feitos para uma cavidade, pode-se mostrar que N (𝜈) depende apenas do volume da cavidade e não de sua forma. Relacionando-se a equação (1.27) com a equação (1.12), obtém-se: ϱT (𝜈) 𝑑𝜈 = 8𝜋𝜈² 𝑐³ < ℇ > 𝑑𝜈 (1.28) Classicamente, as ondas estacionárias de freqüência 𝜈 são geradas por oscilações de partículas carregadas das paredes da cavidade, como se fossem pequenos corpos presos a molas, mantidos em equilíbrio térmico a uma temperatura T. Baseando-se no modelo clássico da teoria cinética dos gases, na qual um sistema de moléculas em equilíbrio térmico a uma temperatura T, o princípio da eqüipartição da energia, afirma que a energia cinética média de uma molécula por grau de liberdade é, 1 2 𝐾𝑇 onde, 𝐾 = 1,38 𝑥10 − 23 𝐽/ 𝑘, é a constante de Boltzmann. Podemos aplicar este princípio à partículas oscilantes das paredes da cavidade desde que consideremos também a energia potencial dessas partículas. No equilíbrio térmico, em média, as contribuições da energia cinética e potencial 1 para a energia total, são iguais a 𝐾𝑇. Logo, nessas condições, a energia total 2 média será 𝐾𝑇. No nosso caso, as ondas estacionárias tem somente um grau de liberdade dada pela direção da oscilação das partículas, associadas ás vibrações transversais do campo 𝐸⃗ da onda estacionária. Conclui-se, portanto, que cada onda estacionária tem energia total média, < ℇ > = 𝐾𝑇 (1.29) 13 Antiga Física Quântica 2010 é importante notar que a energia total média tem o mesmo valor para todas as ondas estacionárias na cavidade, independentemente de suas freqüências. Substituindo-se a equação (1.29) na equação (1.28), obtém-se a densidade de energia no intervalo de freqüência entre 𝜈 e 𝜈 + 𝑑𝜈, de acordo com previsões clássicas: Esta relação é conhecida como a fórmula de Rayleigh-Jeans para radiação de corpo negro. A fig.(1.9) mostra o comportamento da equação (1.30), e o resultado experimental. A discordância é evidente. O espectro clássico se aproxima dos resultados experimentais, somente no limite de baixas freqüências. A medida que a freqüência cresce, o resultado teórico tende ao infinito. Fig.(1.9) – Resultado de Rayleigh - Jeans para a radiação de um corpo negro comparado com os resultados experimentais. A tendência ao infinito para altas freqüências na teoria de Rayleigh - Jeans, é conhecido como catástrofe do ultravioleta. A experiência mostra que, na realidade, a densidade de energia vai a zero para altas freqüências. O problema da radiação de cavidade foi resolvido por Planck, assumindo uma hipótese sobre a eqüipartição da energia até então desconhecida. Na secção seguinte vamos discutir essas idéias e mostrar sua importância para o surgimento da física quântica. 1.3 – Teoria de Planck da Radiação de Cavidade Na tentativa de solucionar a discordância entre a teoria clássica e a experiência, para a radiação de cavidade, Planck considerou uma hipótese que 14 Antiga Física Quântica 2010 violava o princípio da eqüipartição da energia. Planck observou que o resultado experimental seria reproduzido quando, 𝑙𝑖𝑚 < ℇ > = 𝐾𝑇 e, 𝑙𝑖𝑚 < ℇ > = 0 (1.31) 𝜈→0 𝜈→∞ isto é, a energia total média tende a KT, como na teoria clássica, quando a freqüência tende a zero, mas tende a zero quando a freqüência tende a infinito. Assim, Planck supõe que a energia média das ondas estacionárias seja uma função da freqüência < ℇ > = < ℇ (𝜈) >, contradizendo o princípio da equipartição da energia. O princípio da equipartição da energia, tem a sua origem na distribuição de Boltzmann, para a teoria cinética clássica. A distribuição de Boltzmann dá a probabilidade de encontrar um sistema físico, em equilíbrio térmico a uma temperatura T, com energia entre ℇ e ℇ + 𝑑ℇ, escrita aqui sem demonstração, como, P (ℇ) 𝑑ℇ = 𝑒 −ℇ/𝐾𝑇 𝐾𝑇 𝑑ℇ (1.32) A energia média < ℇ > pode ser calculada da distribuição de Boltzmann por, < ℇ >= ∞ ∫0 ℇ 𝑃(ℇ)𝑑ℇ ∞ ∫0 𝑃(ℇ)𝑑ℇ ∞ = ∫0 ℇ 𝑃(ℇ)𝑑ℇ = ÁREA (1.33) O denominador é a probabilidade de encontrar a entidade com qualquer energia, sendo portanto igual a unidade. A integral na equação (1.33) pode ser calculada utilizando a equação (1.32), e o resultado reproduz o princípio da equipartiação da energia, isto é, < ℇ > = 𝐾𝑇 (1.34) A equação (1.33) mostra que < ℇ > = 𝐾𝑇 é representado pela área abaixo do gráfico de ℇ 𝑃(ℇ) em função de ℇ, como mostra a fig. (1.10). A função ℇ P(ℇ) foi obtida diretamente da equação (1.32). O ponto de máximo desta função corresponde a ℇ = 𝐾𝑇 = < ℇ >. 15 Antiga Física Quântica 2010 Fig. (1.10) – Gráfico de ℇ 𝑃(ℇ) em função de ℇ. A grande contribuição de Planck se deu quando ele descobriu que a condição 𝑙𝑖𝑚 < ℇ > = 0, poderia ser alcançada, se fosse modificado o cálculo de < ℇ > a partir de 𝑃(ℇ) 𝑑ℇ. Planck supôs que a energia ℇ poderia ter apenas valores discretos, em vez de qualquer valor como utilizado na teoria clássica, e que, os valores discretos fossem uniformemente distribuídos, isto é, ℇ = 0, ∆ℇ, 2∆ℇ, 3∆ℇ, . .. (1.35) Nesse caso, ∆ℇ seria o intervalo constante entre os valores discretos da energia. Com a hipótese discreta da energia, as integrais na equação (1.33), usadas para calcular < ℇ >, devem ser substituídas por somatórios, isto é, <ℇ> = ∑∞ 0 ℇ𝑛 𝑃(ℇ𝑛) ∑∞ 0 𝑃(ℇ𝑛) (1.36) A fig.(1.11) mostra cálculos gráficos de < ℇ > a partir de ℇ 𝑃(ℇ) para os casos, (a) ∆ℇ <<< 𝐾𝑇; (b) ∆ℇ ≈ 𝐾𝑇 e (c) ∆ℇ >> 𝐾𝑇. Fig.(1.11) – Comportamento gráfico de <ℇ> de acordo com a equação (1.36). O valor de 𝐾𝑇 será a área abaixo da curva suave. Observe que quando ∆ℇ <<< 𝐾𝑇, o valor de < ℇ > ≈ 𝐾𝑇, ou seja, praticamente igual ao resultado clássico. Entretanto, quando < ℇ > ≈ 𝐾𝑇 ou, ∆ℇ >> 𝐾𝑇, o valor < ℇ > será menor que 𝐾𝑇, pois a redução da área definida pelos elementos discretos começa a 16 Antiga Física Quântica 2010 tornar-se evidente, quando comparamos com área definida pelos contínuos. Conclui-se então que: <ℇ> ≅ 𝐾𝑇 se, ∆ℇ for pequeno e, <ℇ> ≅ 0 se, ∆ℇ for grande Como Pkanck precisava obter o primeiro resultado para baixas freqüência 𝜈, e o segundo para altos valores de 𝜈, então o valor ∆ℇ deveria ser proporcional a 𝜈, isto é, ∆ℇ = ℎ𝜈 (1.37) onde, ℎ é a constante de proporcionalidade. Cálculos posteriores permitiram a Planck determinar o valor de ℎ, ajustando resultados teóricos com dados experimentais, obtendo, ℎ = 6,63 𝑥 10 − 34 𝐽. 𝑠 (1.38) Esta constante ficou conhecida como a constante de Planck. Vamos agora calcular a energia média utilizando a equação (1.36) e equação (1.32), considerando nessas fórmulas a energia ℇ = 𝑛ℎ𝜈, n = 0, 1, 2, 3, ... (1.39) isto é, 𝑛ℎ𝜈 <ℇ>= − ∑𝑛ℎ𝜈 𝐾𝑇 𝑒 𝐾𝑇 𝑛ℎ𝜈 1 − ∑∞ 0 𝐾 𝑒 𝐾𝑇 = KT onde, 𝛼= podemos notar que, −𝛼 𝑑 −𝑛𝛼 ln ∑∞ 0 𝑒 𝑑𝛼 17 = ℎ𝜈 𝐾𝑇 (1.40) −𝑛𝛼 ∑∞ 0 𝑛𝛼 𝑒 −𝑛𝛼 ∑∞ 𝑒 0 Antiga Física Quântica 2010 de forma que, onde usamos o valor de dado por (1.40). Mas, onde, , de forma que, 18 Antiga Física Quântica 2010 19