ABSTRACT: Following the tradition of English grammar, some

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ABSTRACT: Following the tradition of English grammar, some authors have
distinguished between count and non-count nouns in Portuguese. The present paper
resumes this discussion and develops the hypothesis that contemporary Brazilian
Portuguese does not have count nouns, but only non-count nouns and nouns that are
neutral in relation to countability.
CAMACHO & PEZATTI, em urn artigo dedicado it natureza da propriedade
[±contavel] dos substantivos do portugues brasileiro falado (1996), observam diversos
fatores que sugerem diferen~as entre 0 Ingles e 0 portugues em rela~ao a essa
propriedade. Mesmo assim, mantem, em principio, a distin~ao entre duas classes de
substantivos: conmveis e nao-contaveis. A combina~ao de substantivos com certos
quantificadores pode levar a recategoriza~oes (ib.: 161), p.ex., Ii conversao de conmveis
em nao-conmveis, como em (1), ou de nao-contaveis em contaveis, como em (2):
(1)
(2)
Ha muita cadeira na sala.
Tres cafes por favor.
Por contabilidade de substantivos entende-se uma caracteristica gramatical de
fundamenta~ao ontologica (cf. QUIRK et al. 1985: 246). Sabemos que existem
entidades individuadas, como cadeiras, e entidades massivas, como cafe. Se dividirmos
urna cadeira em duas partes, ambas deixarao de ser cadeiras e, se juntarmos duas
cadeiras, 0 resultado nao sera uma cadeira. Se, ao contrlirio, dividirmos uma
determinada quantidade de cafe em duas partes, ambas continuarao sendo cafe e, se
juntarmos duas quantidades de cafe, 0 resultado sera tambem cafe. Em principio, os
substantivos designadores de entidades individuadas sao conmveis e os designadores de
entidades massivas sao nao-conmveis. 0 problema e que as categorias gramaticais nem
sempre sao congruentes com a realidade extra-linguistica.
No presente artigo, pretendemos retomar a discussao sobre a contabilidade de
substantivos da lingua portuguesa. Primeiramente, discutiremos 0 comportamento
distribucional de quantificadores nominais. Em seguida, desenvolveremos urn modelo
composicional da propriedade [±conmvel] no sintagma nominal do portugues brasileiro.
Entre os elementos adnominais tradicionalmente denominados quantificadores
encontram-se cada e tOdD, os quais chamaremos de totalizadores nominais (cf.
BLUHDORN & NOMURA 1999). 0 totalizador distributivo cada pode ser combinado
com substantivos que denotam massas (3.a) e com substantivos que denotam individuos
no singular (3.b), mas nao com substantivos no plural (3.c):
cada agua, cada pao, cada esperan~a
cada estudante, cada familia, cada festa
*cada estudantes, *cada familias, *cada festas
Em combina~oes de cada com substantivos de massa, faz-se necessaria a
interpreta~ao da entidade designada como individuo.
o totalizador todo apresenta a mesma distribui~ao formal:
toda agua, todo pao, toda esperan~a
todo estudante, toda familia, toda festa
*todos estudantes, *todas familias, *todas festas
Mas, diferentemente de cada, todo nao e~ige a interpreta~ao de substantivos de
massa (4.a) como individuativos. Ao contrario, parece sugerir urna interpreta~ao de
substantivos individuativos (4.b) como designadores de massas.
Em combina~ao com 0 artigo definido, todo e compativel com substantivos de
massa (5.a) e individuativos (5.b), inclusive no plural (5.c):
toda a agua, todo 0 pao, toda a esperan~a
todo 0 estudante, toda a familia, toda a festa
todos os estudantes, todas as familias, todas as festas
(i) TodD em frente a urn substantivo no singular, sem artigo, totaliza urna massa
nao~identificada. Essa constru~ao nao indica individua~ao. Com freqiiencia, e
combinada com predicados genericos:
. (6)
(7)
Todo gada da came. (gado em geral)
Todo cachorro gosta de latir. (cachorro em geral)
(ii) TodD em frente a urn substantivo no singular, com artigo definido, pode
totalizar uma massa ou urn individuo identificados. Neste uso, devemos ter urn
predicado individual (nao-generico):
(8)
(9)
Toda a agua estava turva. (a quantidade identificada inteira)
As pulgas cobriram todo 0 cachorro. (0 cachorro identificado inteiro)
(iii) Todo em frente a um substantivo no plural com artigo definido totaliza um
grupo de individuos identificados. Neste caso, 0 predicado pode ser coletivo, como em
(10) e (11) ou distributivo, como em (12) e (13):
(10)
(11)
(12)
(13)
Todas as cervejas estao guardadas no porno. (todas juntas)
Todos os cachorros fizeram urna fila. (todosjuntos)
Todas as aguas que eu bebi estavam quentes. (cada urna individualmente)
Todos os cachorros comeram sua ra~llo.(cada urn individualmente)
Em combina~oes de todos os com substantivos de massa, como agua, as
entidade designadas devem ser interpretadas como individuos, p.ex., unidades de
medil;:aoou subtipos. Nesse caso, todos os comporta-se como cada.
Entre os constituintes de sintagmas nominais, podemos observar que
quantificadores de medi~ao (cf. ESCHENBACH 1995: 48 ss.), como muito, pouco,
tanto, etc., comportam-se no singular como todo e no plural, como todo 0, Le., podem
ser combinados com substantivos de massa (14.a), substantivos individuativos (14.b) e
substantivos no plural (14.c). Substantivos individuativos no singular devem ser
interpretados nessa constru~ao como massivos:
muita agua, muito pao, muita esperan~a
muito estudante, muita familia, muita festa
muitos estudantes, muitas familias, muitas festas
Neste item, desenvolveremos a hip6tese de que a contabilidade nllo e
simplesmente urna propriedade lexical do substantivo, transferida ao sintagma nominal,
mas urna propriedade composicional do sintagma, formada com base nos valores de
contabilidade de seus diversos constituintes. A observa~ao crucial para essa hip6tese em
rela~llo it lingua portuguesa e 0 fato de que 0 totalizador coletivo todo e os
quantificadores de medi~ao possuem liberdade de combina~ao com substantivos
individuativos:
(15)
(16)
Um dia, todo carro quebra.
Em Sao Paulo, tem muito carro andando na rua.
Na perspectiva inversa, os substantivos individuativos, como carro, podem ser
combinados com qualquer tipo de quantificador, 0 que sugere que eles sejam neutros em
rela~ao it contabilidade. Atribuimos, portanto, a eles a marca [±contavel].
Substantivos como gado, por outro lado, podem ser livremente combinados
com quantificadores de mediyao, mas nao com quantificadores de contagem. Tambem
nao formam 0 plural. Esses tem, portanto, 0 valor [-contavel]:
c
Quando urn substantivo com 0 valor [4:ontavel] forma 0 plural e/ou
combinado com urn quantificador de contagem,
obrigatoriamente reinterpretado como
designador de individuo(s) (unidade(s) de medicao ou subtipo(s». Nesse caso, 0
substantivo adquire 0 valor [±contlivel]:
e
o plural como categoria gramatical exige a interpretacao do substantivo como
individuativo e possui,portanto, 0 valor [+contavel].1
Para analisar melhor a composicao da contabilidade no sintagma nominal,
dividiremos 0 sintagma em dois dominios: 0 dominio do substantivo (dominio N) e 0
dos demais constituintes (dominio extra-N)o Dentro do dominio N, urn substantivo [contavel] pode ser antecedldo por urn substantivo [±contavel] que designa uma unidade
de medicao:
o primeiro desses substantivos atribui seu valor [±contavel] a combinacao
como urn todo, 0 que fica nitido na combinabilidade do conjunto com quantificadores:
o
plural como categoria gramatical
atribui ao dominio N inteiro
0
valor
[+contavel]:
Em suma, podemos distinguir tres possiveis componentes do dominio N que
contribuem para a composicao do seu valor de contabilidade:
•
•
substantivos com 0 valor [4:ontlivel],
substantivos com 0 valor [±contavel] e
0 plural, com 0 valor [+contavel].
•
e
I Esse ndo
0 caso dos plura/ia tantum como cHimes, nupcias, trevas, tripas etc. Nesses substantivos,
ndo tern valor proprio de contabilidade, pois e uma forma lexicalizada, sem oposi~o ao singular.
0
plural
No dominio extra-N, temos os totalizadores nominais, os quantificadores de
contagem e de medicao e os determinantes.
Ja vimos que 0 totalizador distributivo cada exige a interpretacao do
substantivo como individuativo. Seu valor de contabilidade deve, portanto, ser
[+contavel]. Todo exige a interpretacao do substantivo como massivo. Seu valor de
contabilidade e [-contavel]. Todo 0 e composto de todo, com 0 valor [-contavel], e do
artigo definido. 0 artigo pode ser combinado com qualquer tipo de substantivo sem
exigir interpretacoes particulares em relacao it individuacao. Ele deve, portanto, ser
[±contavel]. Seu valor de contabilidade e atribuido ao conjunto todo o. Todos os integra
ainda 0 plural, com 0 valor [+contlivel],e adquire esse valor.
Os quantificadores de contagem (numerais), como um, tres, vinte etc., sao
marcados com 0 valor [+contavel]. Assim como cada, exigem uma interpretacao
individuativa dos substantivos com que se combinam. No caso de combinacoes com
substantivos [-contavel], 0 resultado sera a reinterpretacao do substantivo como
[±contavel], designador de uma unidade de medicao ou de um subtipo.
Os quantificadores de medicao, como muito, tanto, quanto, bastante etc., tem 0
valor [-contavel], por exigirem uma interpretacao massiva do substantivo. Eles podem
tambem ocorrer no plural: muitos, tantos, quantos, bastantes etc. Neste caso, sao
numerais relativos e adotam 0 valor [+contavel] do plural.
Em suma, distinguimos entre cinco possiveis componentes do dominio extra-
•
•
•
•
•
os totalizadores cada, com 0 valor [+contavel], e todo, com 0 valor [-contavel],
os quantificadores de contagem, com 0 valor [+contavel],
os quantificadores de medicao, com 0 valor [-contavel],
os artigos, com 0 valor [±contavel] e
0 plural, com 0 valor [+contavel].
Enquanto os valores de contabilidade dentro de cada dominio do sintagma
nominal sao formados composicionalmente, de maneira que 0 valor mais alto sempre
passa a ser 0 valor do dominio como um todo, a combinacao dos dois dominios entre si
exige concordancia dos valores de contabilidade. Isso significa que um dominio N com
o valor [-contavel] e compativel com um dominio extra-N [-contavel] e um dominio N
[+contavel], com um dominio extra-N [+contavel]. Porem, um dominio N [-contavel]
nao e compativel com um dominio extra-N [+contavel] e vice-versa. Um dominio
[±contavel] e compativel com um outro [+contavel], [±contavel] e [-contavel]. Para que
o sintagma como um todo seja contavel, e necessario que pelo menos um de seus
dominios tenha 0 valor [+contavel].
Concluimos que a divisao dos substantivos em contliveis e nao-contliveis nao
se aplica adequadamente ao portugues brasileiro. Particularmente, a existencia de
substantivos contliveis em portugues parece ser incompativel com as evidencias
distribucionais. Portanto, sugerimos que 0 portugues brasileiro nao possui substantivos
contaveis, mas apenas substantivos nao-contliveis e neutros. Substantivos nao-contliveis
combinam-se com os totalizadores todo e todo 0 e com quantificadores de medi~ao, mas
nao com quantificadores de contagem nem com 0 totalizador distributivo cada.
Substantivos neutros sao combinaveis com qualquer elemento extra-No
RESUMO: Seguindo 0 modelo da gramatica do ingles, os substantivos da lingua
portuguesa foram divididos, por alguns autores, em contliveis e nao-contliveis. 0
presente trabalho retoma essa discussao e desenvolve a hip6tese de que 0 portugues
brasileiro contemponineo nao possui substantivos contliveis, mas somente nao-contliveis
e neutros em rela~ao a contabilidade.
BLUHDORN, Hardarik; NOMURA, Masa. Observa~oes sobre 0 uso de totalizadores
nominais no alemao e no portugues do Brasil. Pandaemonium Germanicum 3.1, p.
185-227, 1999.
CAMACHO, Roberto Gomes; PEZATTI, Erotilde de Goreti. As subcategorias
nominais contlivel e nao-contavel. In: KATO, Mary A. (org.). Gramatica do
Portugues Falado. Vol. 5. Campinas: Editora da Unicamp, p. 155-183, 1996.
ESCHENBACH, Carola. Ziihlangaben - MajJangaben. Bedeutung und konzeptuelle
Interpretation von Numeralia. Wiesbaden: Deutscher Universitiits-Verlag, 1995.
QUIRK, Randolph et al. A Comprehensive Grammar of the English Language. London:
Longman, 1985.
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