ESTRUTURAS, ALIANÇAS E REGIMES congruente com uma estratégia de subordinação de Portugal, que reforçaria a posição da Espanha na coligação revisionista. Da parte portuguesa prevalecia uma dupla determinação de resistir à hegemonia espanhola e de a vincular a uma posição comum de neutralidade, indispensável para assegurar a paz peninsular na guerra europeia. Nesse sentido, era preciso · limitar os termos dos acordos bilaterais, evitando uma aliança militar, e reafirmar, paralela­ mente, a aliança com a Grã-Bretanha, que partilhava a mesma orientação quanto à neutralidade peninsular. Desse modo, o tratado bilateral seria tanto um modo de preservar os equilíbrios intra-peninsulares, como um ins­ trumento crucial para a estabilidade da posição externa dos dois Estados numa fase de crescente instabilidade europeia, marcada pela polarização dos alinhamentos regionais . A fórmula implícita previa que as alianças do par peninsular - os seus respectivos aliados eram inimigos entre si - se contraba­ lançariam, dando a ambos uma margem de autonomia relevante. O tratado de amizade e não-agressão foi finalmente assinado em Lisboa, a 1 7 de Março de 1 939, nas vésperas da vitória franquista, que era também a da estratégia de Salazar - "Vencemos, eis tudo" - ou, em todo o caso, a das suas previsões 9 1 • Seis meses depois, o princípio da guerra europeia iria pôr à prova a solidez dos pressupostos da aliança peninsular. Em Setembro, Portugal e a Espanha reiteraram a sua neutralidade. O pacto entre a Alemanha e a União Soviética e a invasão da Polónia - uma velha nação católica e um regime autoritário - perturbaram os meios mais conservadores, forçados a reconhecer a diferença de natureza que separava os regimes totalitários e autoritários na coligação revisionista. Theotónio Pereira tentou convencer Franco de que a aliança entre os rivais totalitários era "a prova real da total ausência de comunidade ideológica" entre os autoritarismos peninsulares e o regime nacional-socialista alemão, mas o generalisimo, confessando achar "esquisito sermos agora aliados dos russos" 9 2 , não se deixou impressionar e manteve o seu alinhamento passivo com as potências do Eixo. Enquanto durou a "drôle de guerre" persistiu uma calma tensa. Para a Espanha, em ruínas, era impensável intervir militarmente numa guerra contra a França e a Grã-Bretanha e, de qualquer modo, a prioridade do regime franquista continuava a ser a sua própria consolidação, com a "totalização da 3 vitória" 9 . Tudo mudou, abruptamente, com a invasão da França e a entrada da Itália na guerra, em Junho de 1 940. . Perante a iminência da vitória alemã, Franco proclamou a não­ beligerância da Espanha para consolidar a sua posição como parte do trio dos chefes - o Fuhrer, o Duce e o Caudillo que ia fundar a nova ordem europeia. Salazar, que não fazia parte dessa herética trindade, tinha boas razões para temer o pior: o equilíbrio de forças dentro do regime franquista tendia a fortalecer o partido intervencionista contra o partido neutralista e a entrada da Espanha na guerra não só arrastaria consigo Portugal, como podia pôr em causa a sua independência na revisão do mapa europeu. - 1 87