Educação para a tolerância: qual é o papel da escola?

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Bom dia !
Perante os acontecimentos dos últimos dias sobre o atentado à sede do Jornal Francês
“Charlie Hebdo” e os acontecimentos diários de violência nas escolas, envio o texto para
pensarmos e discutir com nossos colegas, alunos e familiares.
Fica a frase: “A educação é o ponto em que decidimos se amamos o mundo o bastante
para assumirmos a responsabilidade por ele.”
14/01/2015 – Jornal O Dia (PI)
Educação para a tolerância: qual é o papel da escola?
Maria Helena Braga
Supervisora Pedagógica de Programas
do IQE – Instituto Qualidade no Ensino
Nesses últimos dias, mais uma vez, nossos lares e mentes foram invadidos pela notícia
angustiante do atentado à sede do jornal francês “Charlie Hebdo”, que ocasionou a
morte de jornalistas, funcionários e policiais. Sem qualquer possibilidade de aceitação
do fato, vemo-nos também vítimas da intolerância, tanto física, como o atentado;
quanto simbólica, como a banalização da crença islâmica.
Fatos como esse nos levam fatalmente à reflexão sobre as condições da natureza
humana. O que somos? Nascemos intolerantes ao que não identificamos como
semelhante? Temos condições naturais que promovem, em nós, o desenvolvimento da
tolerância? Como explicar a destruição do ser humano por um igual, motivada pela
defesa extrema do próprio ponto de vista? O que leva um ser a concluir que tem
direito sobre outro ser?
São questões para as quais não há respostas únicas e definitivas. Não obstante, a
observação e a reflexão sobre as circunstâncias em que atrocidades como essa
ocorrem, podem nos auxiliar na compreensão do papel que temos como seres
humanos, no sentido de fomentar e cultivar valores que são preconizados a fim de
tornar a convivência humana a melhor possível.
Freud, fundador da Psicanálise, diante da decepção frente ao impulso destrutivo que
aflorou durante a Primeira Guerra Mundial, considerou que somos constituídos por
duas pulsões – a de vida e a de morte – e que o equilíbrio entre elas é fundamental
para a sobrevivência do indivíduo e da sociedade. Podemos considerar, então, que
somos todos dotados de forças psíquicas internas que são a base das ações
construtivas e das destrutivas.
Para Freud, esse equilíbrio é resultado do embate entre os impulsos individuais e as
pressões exercidas pela cultura, pela coletividade. Se Freud tem razão, e acredito
fortemente que sim, a educação é o meio pelo qual a tolerância pode ser
desenvolvida, desde que se cultivem, efetivamente, valores de preservação da vida, do
cuidado consigo e com o outro. É a educação que exerce a pressão civilizatória para
que o sujeito se constitua como um ser coletivo, pertencente e semelhante ao grupo,
mas, ao mesmo tempo, singular, único.
Educação, por sua vez, é exercida ininterruptamente, por instituições e pessoas. Todos
os atos que executamos ou a que somos submetidos nos ensinam sobre as formas de
funcionamento do mundo e da sociedade, como também sobre sua imensa
diversidade.
Interessante observar a grande preocupação que há em torno do tema. Entre os
quatro pilares da Educação, apregoados pela UNESCO, um deles se refere à
aprendizagem da convivência. Tal fato demonstra que, além do desenvolvimento das
capacidades cognitivas, o foco da educação deve ser, também, promover a capacidade
de compartilhar, cooperar, estabelecer relações sociais saudáveis para o sujeito e para
a coletividade.
Nos documentos em que são registradas as intenções educativas escolares, podemos
encontrar fartamente a tomada desse pilar como referência, como também a menção
de ações que alimentem o espírito cooperativo em seus alunos. Criam-se espaços e
tempos para o desenvolvimento de aulas especificamente destinadas ao incentivo da
convivência. As aulas de ética são um exemplo disso.
No entanto, essas ações são insuficientes. Aprender a viver na diversidade requer
ações práticas de cooperação, de não violência. Não há como pregar a paz, se o
ambiente escolar não a cultiva nos mínimos atos. A cultura escolar é permeada por
vários tipos de violência – sendo a mais comum, a simbólica – que nem sempre são
vistos como tais. Podemos observar desde a falta de respeito pelo trabalho dos
educadores, a intolerância com os alunos e profissionais que enfrentam mais
dificuldades para desempenhar suas funções, até a inflexibilidade com as famílias.
Escolas que têm mostrado bons resultados na formação de pessoas críticas, criativas e
cooperativas são exatamente as que colocam a cooperação e o atendimento às
diferenças como foco de seu trabalho. São as que constroem coletivamente seus
projetos pedagógicos; que reconhecem os talentos individuais e os fazem aflorar nas
situações em que são requisitados; que inserem alunos e familiares nas decisões
quanto aos caminhos a tomar para garantir a qualidade da aprendizagem; que
conseguem incluir e demonstrar a existência de diferentes pontos de vista. Nessas
escolas, a cooperação não está circunscrita aos espaços da aula; está presente nas
ações e nas reflexões sobre a forma de desenvolvê-la em seus alunos e profissionais.
Hanna Arendt, filósofa alemã de origem judaica, que presenciou a violência reinante
durante a Segunda Guerra Mundial, faz-nos refletir sobre o que é educar e ser
educador. Afirma “A educação é o ponto em que decidimos se amamos o mundo o
bastante para assumirmos a responsabilidade por ele.”
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