Macro Visão terça-feira, 28 de janeiro de 2014 Desvalorização do peso argentino: impactos na Argentina e no Brasil Um ajuste bem-sucedido exige uma política monetária mais apertada A Argentina já vem enfrentando uma sobrevalorização cambial há alguns anos. Desde 2011 até pouco tempo atrás, as autoridades vinham tentando solucionar o problema do balanço de pagamentos (isto é, a perda de reservas) por meio de uma série de controles cambiais, quando a resposta mais adequada teria sido a desvalorização do peso e políticas macroeconômicas mais austeras. Esses controles prejudicaram a atividade (os níveis de confiança de consumidores e empresários caíram e a indústria sofreu com a falta de bens intermediários e de bens de capital importados), sem proporcionar alívio às reservas internacionais, já que rapidamente brechas no sistema cambial foram encontradas. Outra consequência dos controles cambiais foi a acentuada desvalorização do peso nos mercados paralelos de dólar. Com a ineficiência dos controles, o governo agora está mudando sua estratégia. Na semana passada, o banco central permitiu uma desvalorização abrupta (de aproximadamente 17%), para 8 pesos por dólar. O governo anunciou ainda o fim da proibição aos argentinos de adquirirem dólares para poupança. Agora, cada argentino poderá comprar até 2 mil dólares por mês, desde que a quantia seja consistente com sua declaração de imposto de renda. Ainda não é claro o que acontecerá com as outras restrições cambiais (para remessa de lucros e para importar). Um relaxamento dessas restrições também é possível, considerando que há membros do alto escalão do governo que parecem estar cientes do estrago que os controles causam na economia. A depreciação cambial e a maior liberdade no mercado de câmbio são medidas positivas para lidar com a sobrevalorização do peso, mas uma política monetária mais apertada (a Argentina hoje tem juros reais negativos) também é necessária, para que a desvalorização não aumente a inflação ainda mais e para incentivar os argentinos a venderem dólares. Nesse sentido, o banco central anunciou na sexta-feira passada que irá aumentar a taxa de juros nas suas operações de mercado aberto para 25,5% (de 19,6% anteriormente). Nosso cenário básico assume que o governo permitirá que as taxas de juros subam ainda mais. Antes dos eventos dessa semana, estávamos esperando crescimento zero para o PIB deste ano. O risco de uma recessão este ano agora é alto. Entretanto, taxas de juros mais altas ajudariam a alcançar um ambiente macroeconômico melhor no médio prazo. Impactos sobre o Brasil: condições financeiras e contas externas; consequências para atividade e inflação A Argentina é o terceiro maior mercado para as exportações brasileiras (depois da China e dos EUA) e nosso maior mercado para produtos manufaturados. Em 2013, o país vizinho foi destino de 8% das exportações brasileiras (US$ 19,6 bilhões). Portanto, a desvalorização do peso argentino tende a impactar a moeda brasileira e outros indicadores financeiros. A perspectiva negativa para as exportações para a Argentina devido à queda recente do peso e à fraqueza da atividade econômica por lá exercem pressão sobre o real. Além disso, os atuais fundamentos da economia brasileira — aumento do déficit em conta corrente, baixo crescimento, inflação elevada e política fiscal expansionista — elevam as chances de contágio. Assim, além da pressão causada pelo enfraquecimento do saldo comercial, os fundamentos menos favoráveis da economia brasileira tendem a intensificar a depreciação do real. Pode haver também impacto negativo sobre outros ativos, como as taxas de juros de longo prazo e o prêmio de risco medido pelo CDS. A atividade econômica seria afetada principalmente via dois canais: (i) A última página deste relatório contém informações importantes sobre o seu conteúdo. Os investidores não devem considerar este relatório como fator único ao tomarem suas decisões de investimento. Macro Visão – terça-feira, 28 de janeiro de 2014 a queda das exportações para a Argentina; e (ii) as condições financeiras mais apertadas. Para cada 10% de queda nas exportações para a Argentina, o crescimento do PIB brasileiro pode diminuir 0,2 ponto percentual em 2014, levando em conta o aperto das condições financeiras. O maior efeito seria sobre a indústria. A inflação também seria impactada nesse cenário. Apesar do crescimento mais lento do PIB, uma desvalorização adicional da moeda aumentaria a pressão sobre a inflação, que tem ficado próxima do teto da meta do Banco Central. A falta de espaço para absorver choques cambiais é uma das principais consequências da inflação relativamente alta por um período prolongado. A reação da política econômica no Brasil A crise na Argentina constitui choques de oferta (real mais fraco) e demanda (queda nas exportações) para o Brasil. Mas como a inflação ao consumidor, em 5,9%, já está próxima do teto da meta do Banco Central (BC), acreditamos que a autoridade monetária será forçada a agir se o estresse continuar. Acreditamos que a primeira medida seria aumentar a intervenção no mercado de câmbio para evitar uma desvalorização para além do nível sugerido pelos fundamentos. Se mesmo sob forte intervenção do Banco Central a taxa de câmbio continuar se depreciando, digamos com o dólar passando de 2,55 reais (nossa projeção para o fim do ano), o Banco Central pode decidir continuar subindo a taxa Selic. Sob tais circunstâncias, a Selic passaria de 11% neste ano. Uma política fiscal mais rígida ajudaria no processo. Brasil e Argentina: Relações comerciais • Os manufaturados representaram 92% das exportações brasileiras para o país vizinho no ano passado. O setor automotivo é destaque: os automóveis representam quase um quarto das exportações totais, as autopeças quase 15%, e ônibus, caminhões e máquinas agrícolas, 8%. O resto é composto principalmente por produtos intermediários. • Quanto às importações, a Argentina é individualmente a terceira maior fornecedora do Brasil, responsável por 7% das importações totais. Os veículos também se destacam, com automóveis, caminhões, ônibus e autopeças equivalentes a 50% das importações totais. A Argentina também é uma das principais fontes de trigo do Brasil. Restrições comerciais • Em outubro de 2011, foram impostos diversos controles cambiais e, gradualmente, pessoas físicas e jurídicas foram sendo obrigadas a pedir autorização prévia ao Banco Central para comprar dólares. • Em fevereiro de 2012, o governo argentino começou a pedir informações passadas sobre todas as importações, a serem apresentadas à Receita Federal, que então emitiria um documento de autorização de importação conhecido como DJAI (Declaração Jurada Antecipada de Importação). • Ao longo de 2012, ocorreram contínuos atrasos e restrições sobre as DJAIs e o superávit do Brasil encolheu de US$ 6 bilhões em 2011 para US$ 2 bilhões em 2012, apesar da substancial desvalorização do real em relação ao peso. • Em 2013 venceu o acordo automotivo entre Brasil e Argentina, definindo cotas e tarifas para volumes de importação acima de certos limites. Por falta de acerto, começou a ocorrer livre comércio entre esses países no setor. Devido à valorização relativa da moeda oficial, a demanda por automóveis brasileiros subiu rapidamente e o superávit comercial brasileiro se recuperou para US$ 3 bilhões. • Em dezembro de 2013, o ministério argentino da Indústria anunciou uma meta para reduzir as importações automotivas em 20% na comparação anual no 1T14, prorrogável para o 2T14. Página 2 Macro Visão – terça-feira, 28 de janeiro de 2014 Desvalorização acelerada da taxa de câmbio: Consequências sobre o balanço de pagamentos brasileiro • É preciso considerar que existe uma “substituição” entre os controles de importação e a valorização artificial da moeda local. Com a convergência entre o peso oficial e o “blue”, os controles de importação podem deixar de ser necessários e isso pode suavizar o impacto do movimento do câmbio. Quando se trata de bens industriais intermediários, os controles de importação devem ser relaxados, a fim de evitar um prejuízo excessivo à produção industrial da Argentina. Quanto aos bens de consumo, a perda de reservas indica que isso só acontecerá mais adiante. • Já esperávamos desaceleração do saldo comercial brasileiro com a Argentina este ano, de US$ 3 bilhões no ano passado para US$ 2 bilhões em 2014. Mas com a desvalorização rápida, esse cenário pode piorar. Se houver déficit de US$ 1 bilhão com o país vizinho este ano, o saldo brasileiro total sairia de US$ 7 bilhões (nossa projeção atual) para US$ 4 bilhões. Equipe Macro Itaú Pesquisa macroeconômica – Itaú Ilan Goldfajn – Economista-Chefe Para acessar nossas publicações e projeções visite nosso site: http://www.itau.com.br/itaubba-pt/analises-economicas/publicacoes/ Informações Relevantes Este relatório foi preparado e publicado pelo Departamento de Pesquisa Macroeconômica do Banco Itaú Unibanco S.A. (“Itaú Unibanco”). Este relatório não é um produto do Departamento de Análise de Ações do Itaú Unibanco ou da Itaú Corretora de Valores S.A. e não deve ser considerado um relatório de análise para os fins do artigo 1º da Instrução CVM n.º 483, de 6 de Julho de 2010. 2. Este relatório tem como objetivo único fornecer informações macroeconomias, e não constitui e nem deve ser interpretado como sendo uma oferta de compra ou venda ou como uma solicitação de uma oferta de compra ou venda de qualquer instrumento financeiro, ou de participação em uma determinada estratégia de negócios em qualquer jurisdição. As informações contidas neste relatório foram consideradas razoáveis na data em que o relatório foi divulgado e foram obtidas de fontes públicas consideradas confiáveis. O Grupo Itaú Unibanco não dá nenhuma segurança ou garantia, seja de forma expressa ou implícita, sobre a integridade, confiabilidade ou exatidão dessas informações. 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Para qualquer dúvida entre em contato com o seu gerente de 1. Página 3 Macro Visão – terça-feira, 28 de janeiro de 2014 relacionamento. Para mais informações acesse: www.itaubba.co.uk. Itau BBA UK Securities Limited: Este material é distribuído e autorizado pelo Itau BBA International plc (Itau BBA UK) em conformidade com o Artigo 21 do Financial Services and Markets Act 2000. Este material é direcionado exclusivamente a contrapartes elegíveis e profissionais, definidas pela Autoridade de Conduta Financeira. O material que descreve os serviços e produtos oferecidos pelo Itaú Unibanco SA (Itaú) foi elaborado por aquela entidade. IBBA UK é uma filial do Itaú. Itaú é uma instituição financeira validamente existente sob as leis do Brasil e membro do Grupo Itaú Unibanco. Itau BBA UK Securities Limited sede 20 º andar, 20 de Primrose Street, London, Reino Unido, EC2A 2EW e é autorizado e regulado pela Autoridade de Conduta Financeira (FRN494837); (ii) EUA: A Itaú BBA USA Securities Inc., uma empresa membro da FINRA/SIPC, está distribuindo este relatório e aceita a responsabilidade pelo conteúdo do mesmo. O investidor americano que receber este relatório e desejar realizar uma operação com um dos valores mobiliários analisados neste relatório, deverá fazê-lo através da Itaú USA Securities Inc., localizada na 767 Fifth Avenue, 50th Floor, New York, NY 10153; (iii) Ásia: Este relatório é distribuído em Hong Kong pela Itaú Asia Securities Limited, autorizada a operar em Hong Kong nas atividades reguladas do Tipo 1 (operações com títulos e valores mobiliários) pela Securities and Futures Commission. A Itaú Asia Securities Limited aceita toda a responsabilidade legal pelo conteúdo deste relatório. 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