História local e ensino de História: múltiplos olhares a partir do litoral ao sertão sergipano Paulo Heimar Souto1 Rita de Cássia Dias Leal2 I – INTRODUÇÃO Dando relevância ao estudo das temáticas enfatizadas no ensino de História, o presente trabalho dá enfoque à investigação dos aspectos espaço – temporais presentes nos municípios localizados entre a capital sergipana e o sertão do baixo São Francisco como também, busca enriquecer o conhecimento sobre o processo histórico das localidades e suas diferenciações, tendo como público alvo os futuros professores do ensino fundamental dos primeiros e segundos ciclos. A partir das disciplinas, Fundamentos Teórico – Metodológicos e Prática do Ensino de História, que visam o entendimento sobre o processo histórico do Brasil e de Sergipe através de estratégias voltadas ao enriquecimento de atividades docentes, procuramos desenvolver um estudo mediante a compreensão da realidade relacionada ao ensino nas Séries Iniciais reforçado com leituras e fundamentações sobre os elementos a serem trabalhados. Dentro de uma perspectiva metodológica interdisciplinar e múltipla, alguns pressupostos são imprescindíveis para a construção do conhecimento científico: integração, relação teoria – prática, enfoque do todo e das partes que constituem o meio, entre outros. Estes pressupostos são considerados e afirmados por autores como Heloísa Dupas Penteado (1994), a qual contribui com suas fundamentações para o desenvolvimento deste trabalho. Além disso, esta pesquisa respalda-se em abordagens teóricas que enfatizam as possibilidades de intervenção metodológica para a construção do conhecimento numa perspectiva crítica. Tais abordagens são referendadas e detalhadas de acordo com a prática pedagógica, pelas autoras Circe Maria Bittencourt (1998) e Maria Tereza Nidelcoff (1987) 1 que relacionam o tempo e espaço transformado e adequado às necessidades dos homens das localidades. Com base nestes princípios, o trabalho proposto apresenta um cunho metodológico integrado e norteado também, por elementos valorizados na educação e ressaltados nos Parâmetros Curriculares Nacionais (1997), um referencial que vem dando significado ao ensino de História e das demais áreas de conhecimento. Neste sentido, é percorrendo o caminho do estudo integrado, da pesquisa e da prática, que esta proposta de investigação é realizada através da vivência e do contato direto dos alunos de Licenciatura em História e Pedagogia da Universidade Federal de Sergipe (U F S) com a história e as diversidades locais dos municípios sergipanos que representam um contexto amplo e caracterizado por aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais. Estes, analisados e fundamentados a partir de leituras feitas com o intuito de contribuir para o entendimento da sociedade e sua complexidade, como também ampliar o conhecimento, interesse e contextualização da prática docente dos futuros professores. II – OBJETIVOS A elaboração e o desenvolvimento deste trabalho tem como pressupostos básicos a integração, o conhecimento e a contextualização interdisciplinar dos diferentes aspectos locais. Para tanto, apresenta como principais objetivos: Enriquecer o conhecimento sobre o processo histórico das localidades e suas diferenciações; Enfatizar as possibilidades de intervenção metodológica para a construção do conhecimento numa perspectiva interdisciplinar e múltipla; Ampliar o interesse e o entendimento contextualizado dos futuros professores do Ensino Fundamental, a respeito da sociedade e sua complexidade; Incentivar a busca do enriquecimento das atividades docentes, a partir do resgate da história local e de reflexões históricas significativas que contribuem para o Ensino de História; Possibilitar a compreensão e análise dos aspectos metodológicos que viabilizam a identificação da relação entre espaço e tempo presente nas transformações sócio – culturais da capital ao sertão sergipano. 2 III – DESENVOLVIMENTO Respaldado nos princípios teórico – metodológicos que dão sentido e contextualizam o ensino de História, o estudo das localidades com suas transformações e contribuições para o processo histórico do contexto nacional, foi concretizado a partir da percepção da multiplicidade existente do Litoral ao Sertão Sergipano. Daí resulta o título do nosso trabalho – “História Local e Ensino de História: múltiplos olhares a partir do Litoral ao Sertão Sergipano”. A segurança de realizar uma metodologia significativa e enriquecedora para a prática dos futuros professores – estudantes dos cursos de História e Pedagogia – foi adquirida através de pesquisas e, dentre outras, uma fonte básica de leitura sobre o estudo do município voltado às perspectivas do ensino de História e Geografia integrado, ressaltando a importância sobre o entendimento a respeito de uma sociedade complexa, diferentemente estruturada e que passa por transformações histórico – geográficas, implicando nas características do tempo e do espaço que marcam o passado, o presente e o futuro. Estes pressupostos marcam a abordagem de Helena Callai (1998) quando esta afirma que “Estudar o município é a oportunidade que o aluno tem para estudar uma sociedade relativamente complexa.” (p.15) E ainda... “Estudar o município é o exercício teórico – metodológico para trabalhar o espaço e o tempo, possibilitando uma visão mais abrangente sobre os mesmos e sobre um contexto maior.” (p.80) Partindo destes pressupostos, o desenvolvimento deste trabalho concretiza-se com as informações oriundas das fontes encontradas nos municípios que se fizeram objetos da pesquisa: Aracaju, Nossa Senhora do Socorro, Laranjeiras, Areia Branca, Itabaiana, Ribeirópolis, Nossa Senhora da Aparecida, Nossa Senhora da Glória, Monte Alegre, Porto da Folha, Poço Redondo, Canindé de São Francisco, incluindo Xingó e Piranhas em Alagoas. 3 A realização de leituras acerca de recortes históricos e também geográficos dos referidos municípios situados nas três sub – regiões do estado (litoral, agreste e sertão), possibilitou uma atualização bibliográfica sobre a questão da terra e o cangaço em Sergipe, a arqueologia e a geomorfologia da área na explicação do cotidiano nestas regiões, o estudo da toponímia e religiosidade dos lugares e o papel histórico do Velho Chico (rio São Francisco considerado como fonte de desenvolvimento para o sertão). Além do levantamento de vasta bibliografia, foram colhidos dados na Enciclopédia dos Municípios Brasileiros (I B G E), em materiais informativos produzidos pela Companhia Hidrelétrica do São Francisco – CHESF, na exibição de documentário e panfletos sobre a arqueologia em Xingó (Museu Arqueológico), em jornais, revistas e informações coletadas pelos discentes e pelo professor das disciplinas de Fundamentos e Prática do Ensino de História. Através destes dados, foi possível traçar um histórico significativo e uma atualização teórica a respeito dos municípios e seus aspectos principais, que constituem a história dos mesmos. Dando continuidade ao processo de investigação dos elementos históricos das já referidas regiões sergipanas, realizamos uma excursão com saída da capital (Aracaju) e com chegada ao sertão e região do Baixo São Francisco (municípios de Sergipe e Alagoas), ocasionando uma situação de vivência relacionada à teoria estudada. No decorrer do percurso, os alunos fizeram exposição de materiais pesquisados e produzidos, com discussões sistemáticas sobre as descobertas feitas. As observações foram realizadas em paradas previamente definidas pela equipe docente, a qual fez o mesmo percurso anteriormente a título de identificação e organização metodológica. Alguns temas da pesquisa foram apresentados pelos alunos, durante a excursão, nas visitações ao Museu Arqueológico, ao Museu do Cangaço, à Companhia Hidrelétrica do Vale do São Francisco (CHESF), a Piranhas em Alagoas e aos municípios que marcam a história e a economia em Sergipe (Laranjeiras, Itabaiana e Canindé, por exemplo). Nas paradas e discussões durante a viagem, os alunos tiveram a oportunidade de observar e analisar as transformações relativas ao tempo e espaço que foram sendo 4 identificadas (presença de cultivos, latifúndios, ocupação populacional e transição da zona urbana para rural), as quais constituem as diversidades locais. A excursão foi realizada nos dias 29 e 30 de julho de 2000, com saída da capital sergipana, obedecendo, o seguinte trajeto: de Aracaju ao entroncamento que dá acesso ao município de Itabaiana, através da rodovia Federal (BR) 101; de Itabaiana ao município de Ribeirópolis, pela rodovia Federal 235; de Ribeirópolis ao município de Nossa Senhora da Glória, percorrendo a rodovia Estadual 614; e finalmente, de Nossa Senhora da Glória ao município de Canindé de São Francisco, através da rodovia Estadual 208, chegando a Xingó e Piranhas em Alagoas, sendo estes, pontos conclusivos da viagem. No tocante às visitações já citadas, a equipe de alunos e professores foi orientada por uma programação seqüenciada: saída às 6 horas do dia 29 de julho, com paradas breves em Laranjeiras, Itabaiana, Nossa Senhora da Glória e Canindé do São Francisco; ás 10 horas, chegada em Xingó – AL com visita ao Museu de Arqueologia de Xingó (M A X), onde houve exposição de vídeo e apresentação de trabalhos produzidos por alunos de História da UFS; às 14 horas foi realizada a visita à CHESF – Companhia Hidrelétrica do São Francisco (um momento de descoberta e análise da situação do passado e do presente, diante da tecnologia e ação do homem); às 18 horas as atividades foram encerradas, sendo retomadas no segundo dia (30 de julho) às 8 horas com a visita à cidade de Piranhas em Alagoas às margens do rio são Francisco, onde teve continuidade a apresentação de trabalhos pesquisados e escritos sobre os municípios do sertão sergipano e da região do Baixo são Francisco; às 11 horas aconteceu a visita ao Museu do Cangaço (ainda em Piranhas), onde se deu a concretização do conhecimento com apresentação de pesquisas feitas por alunos, sendo relacionadas aos aspectos presentes no Museu, os quais marcaram a história do Cangaço no Brasil e influenciaram comportamentos do povo da localidade do sertão. A partir daí, pôde-se contextualizar os fatos e encerrar as visitações programadas, resultando numa preparação para o retorno à capital sergipana. Estes procedimentos reforçaram e concretizaram uma proposta metodológica marcada por princípios interdisciplinares, múltiplos que contextualizam e integram o processo de ensino. Ou seja, a partir da observação e vivência do concreto, o aluno amplia sua percepção de totalidade e concretiza o processo de aprendizagem. 5 É neste sentido que se faz imprescindível entender que: “Cultivar o professor num projeto interdisciplinar é, antes de mais nada, ajuda-lo a perceber-se interdisciplinar. (...) Dessa vivência entre um homem e conhecimento emerge o símbolo que desencadeará todo processo interdisciplinar. É, sobretudo um trabalho de explicitação simbólica da experiência vivida.” (FAZENDA, 1995: 135) Vale, portanto, ressaltar que as características básicas do desenvolvimento deste trabalho foram conduzidas pelos objetivos propostos e deram sentido ao estudo das localidades dentro do ensino de História. IV – CONCLUSÃO O trabalho desenvolvido a partir de uma perspectiva metodológica interdisciplinar e múltipla, comprovou efetivamente a relevância de atividades concretas e contextualizadas para a contribuição na aproximação dos alunos com o meio de vivência. Além disso, possibilitou a apreensão dos múltiplos olhares sobre as categorias espaço e tempo, promovendo as relações entre as teorias estudadas e o que foi vivenciado na excursão da proposta. Desta forma, intensifica-se a importância da realização de procedimentos como esses, proporcionados para o enriquecimento do processo de ensino – aprendizagem. Isto é enfatizado diante das descobertas e dos depoimentos feitos por alunos que participaram desta atividade metodológica. Os resgates da história local, realizados através desta prática, proporcionam aos discentes dos últimos semestres dos cursos de História e Pedagogia da Universidade Federal de Sergipe, reflexões históricas significativas, contemplando as propostas para a construção e compreensão do conhecimento e a identificação dos alunos enquanto sujeitos históricos. 6 Diante disso, é mister salientar que os pressupostos fundamentais para a construção do conhecimento – integração, relação teoria – prática, enfoque do todo e das partes que constituem o meio e os aspectos de multiplicidade – foram vivenciados e apreendidos pelo grupo de futuros professores, os quais, podemos acreditar, irão empregar os elementos indispensáveis à contextualização aprendizagem junto aos seus alunos, no cotidiano da trajetória interdisciplinar que faz concretizar o ensino de História. São elementos contidos no estudo dos municípios que viabilizam a descoberta dos alunos a respeito de caminhos que direcionam à cidadania e à compreensão do espaço, do tempo, da sociedade e do mundo. 1 Licenciado em História, Mestre em Geografia Agrária pela Universidade Federal de Sergipe e Docente das disciplinas Fundamentos Teórico-Metodológicos de História e Prática de Ensino de História da UFS. 2 Licenciada em Pedagogia pela Universidade Federal de Sergipe e Professora do Ensino Fundamental do Município de Lagarto/SE. 7 V – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BITTENCOURT, Circe Maria F. (Org.). O Saber Histórico na Sala de Aula. São Paulo: Contexto, 1998. BORGES, Vavy Pacheco. O que é História. São Paulo: Brasiliense,1981. CALLAI, Helena Copetti e ZARTH, Paulo Afonso. O estudo do município e o ensino de história e geografia. Ijuí – RS: UNIJUÍ, 1988. CHESF – Companhia Hidrelétrica do São Francisco. Ministério de Minas e Energia / Eletrobrás. Editoração: Assessoria de Comunicação Empresarial – ACE. ENCICLOPÉDIA DOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS. Vol XX. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dez 1959. FAZENDA, Ivani C. Arantes. Interdisciplinaridade: História, teoria e pesquisa. 2a. ed. Campinas, SP: Papirus, 1995. MAX – Museu de Arqueologia de Xingó. Universidade Federal de Sergipe / Unidade Museológica e Laboratório de Pesquisas Arqueológicas. Editoração: Gráfica Triunfo. NIDELCOFF, Maria Tereza. A Escola e a Compreensão da Realidade. São Paulo: Brasiliense, 1987. PENTEADO, Heloísa Dupas. Metodologia do ensino de História e Geografia. São Paulo: Cortez, 1994. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL. Parâmetros Curriculares Nacionais: história e geografia. Brasília: MEC/SEF, 1997. 8