controle social da saúde no brasil social control of health in

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CONTROLE SOCIAL DA SAÚDE NO BRASIL
SOCIAL CONTROL OF HEALTH IN BRAZIL
Renata Ulrich Finkler
Enfermeira, Especialista em Enfermagem do Trabalho – CBES, especialização em Saúde Pública com Ênfase
em Saúde da Família – Centro Universitário Uninter. [email protected]
Elaine Rossi Ribeiro
Enfermeira, Doutora em Medicina –orientadora de TCC do Centro Universitário Uninter
RESUMO
Este artigo tem a finalidade de realizar uma revisão bibliográfica a respeito do controle social da saúde no
Brasil nos últimos 12 anos. O procedimento metodológico utilizado foi do tipo exploratório-descritivo com
abordagem qualitativa. A partir de um levantamento histórico, são fornecidas informações a respeito do
funcionamento do controle social da saúde no país, sua legislação, resoluções, e portarias que a regem. É
de fundamental relevância o conhecimento a respeito do controle social, especialmente para dois grupos: o
dos trabalhadores da área da saúde e o dos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS). Para o primeiro
grupo, por ter que lidar com tal questão a qualquer momento em seu ambiente de trabalho. Já para o
segundo, faz-se necessário o conhecimento a respeito da existência e do funcionamento do controle social.
Desta forma, estarão aptos a lutar pelos seus direitos. Com este presente trabalho de pesquisa, pode ser
verificado o aumento da participação popular ao longo do tempo, por meio do controle social. Observou-se
que as necessidades da população puderam ser ouvidas e, em muitos casos, sanadas. O controle social da
saúde no Brasil é um importante movimento popular pelos direitos à participação dos indivíduos da
sociedade nas tomadas de decisões no âmbito da saúde e na melhoria da qualidade de assistência.
Palavras-chave: Controle social. Saúde. Brasil.
ABSTRACT
This article aims to present a literature review about the social control of health in Brazil in the past 12 years.
An exploratory-descriptive study with a qualitative approach was the methodological procedure used. From
a historical survey, information regarding the functioning of the social control of health in the country is
provided, as well as its laws, resolutions, and ordinances that govern it. It is of fundamental importance the
knowledge about the social control, especially for two groups: the health workers and the users of the
Unified Health System (hereby SUS). For the first group, to be able to deal with this issue at any time in
their working environment. For the second, it is necessary to know about the existence and operation of
social control. In this way, both groups will be able to fight for their rights. With this present research work,
it could be verified the increase of popular participation over time, by means of social control. It was
observed that the needs of the population could be heard and, in many cases, remedied. The social control
of health in Brazil is an important popular movement for the right of individuals to participate in making
decisions in the context of health care and its improvement of quality.
Key words: Social control. Health. Brazil.
CONTROLE SOCIAL DA SAÚDE NO BRASIL
INTRODUÇÃO
De acordo com a Constituição Federal de 05 de outubro de 1988, a saúde é um
direito de todas as pessoas, sendo que o Estado deve garantir a saúde da população,
reduzindo riscos de doenças e outros agravos e facilitando o acesso às ações e serviços
que visem promoção, prevenção e proteção à saúde por meio de políticas sociais e
econômicas (BRASIL, 2006).
Porém, o direito à saúde nem sempre fez parte dos direitos humanos, muito
menos esteve presente na Constituição Federal do Brasil.
O reconhecimento da saúde como bem-estar, satisfação do bem coletivo e
direito, configura um paradigma civilizatório da humanidade, construído num
processo de embates de concepções e de pressões dos movimentos sociais por
estabelecerem uma ruptura com as desigualdades e as iniqüidades das relações
sociais, numa perspectiva emancipatória, levando-se em conta, evidentemente,
as diferentes culturas e formas de cuidado do ser humano (Brasil, 2006, p. 18).
Conforme a Lei 8142 de 1990, o controle social é praticado pelos conselhos de
saúde que são órgãos deliberativos com situação constante, constituídos de usuários na
sua maioria (50%), profissionais de saúde (25%), prestadores de serviço e representantes
do governo (25%). As pessoas que atuam nos conselhos de saúde devem formular
estratégias e controlar a efetivação das políticas de saúde, incluindo aspectos financeiros,
nas três esferas de governo, ou seja, municípios, estados, Distrito Federal e Ministério da
Saúde (BRASIL, 2006).
O conselho de saúde, por meio da democracia participativa, permite que a
população acompanhe, fiscalize, pressione as ações do Estado, bem como exponha os
interesses da população (BRASIL, 2006).
Este artigo tem a finalidade de realizar uma revisão bibliográfica a respeito do
controle social da saúde no Brasil, baseada em referências dos últimos 12 anos, fazendo
um apanhado histórico inicialmente e após explicando como funciona o controle social da
saúde no país. Para tanto, serão identificadas leis, resoluções, portarias, revistas, artigos,
entre outros que falem sobre o assunto.
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Renata Ulrich Finkler e Elaine Rossi Ribeiro
O conhecimento a respeito do controle social é muito importante em dois pontos:
para os trabalhadores da saúde, que podem a qualquer momento ter que lidar com a
questão em seu ambiente de trabalho e para os usuários do Sistema Único de Saúde, pois
sabendo que existe e como funciona o controle social, poderão lutar pelos seus direitos.
UM POUCO DE HISTÓRIA
Como o Estado não atendia ao clamor da população por melhores condições de
acesso à saúde, igualitário e universal, várias classes assalariadas se uniram contra o
governo na busca por seus direitos (ESCOREL & DELGADO, 2008 apud MOISES, 1985).
A era pré-constituição, na área da saúde, era constituída de movimentos sociais
que preconizavam o indivíduo na tomada de decisões, participando e tornando-se ativo e
trabalhando coletivamente e não individualmente. Assim, houve a repolitização crítica
das políticas em saúde. Com o controle social, o Estado, que antes era lugar de poder
somente das elites e dos dominantes, passa a ser também um lugar público (BRASIL,
2006).
A mudança no sistema de saúde do Brasil na década de 80 tinha o objetivo de
introduzir a população, em seus diversos setores, nas decisões das políticas públicas de
saúde, com embasamento crítico e de oposição ao sistema dominante. E como produto
do trabalho desses movimentos sociais e da mudança acima exposta, a participação da
comunidade foi introduzida na Constituição Federal de 1988 como uma diretriz.
(ESCOREL & DELGADO, 2008).
Através das Leis 8080/90 e 8142/90 foram implementados os Conselhos de Saúde
e as Conferências de Saúde nas três esferas de governo, ou seja, municipal, estadual e
federal. Através dessas duas instâncias a população poderia participar no controle da
saúde (ESCOREL & DELGADO, 2008).
As Conferências Nacionais de Saúde acontecem desde 1941. As Conferências
Municipais de Saúde devem acontecer, no máximo, a cada dois anos. As Conferências
Estaduais de Saúde também a cada dois anos e as Conferências Nacionais de Saúde a
cada quatro anos (GUIRLANDA, 2003).
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CONTROLE SOCIAL DA SAÚDE NO BRASIL
A 1ª Conferência Nacional de Saúde teve como tema principal “A situação sanitária
e assistencial dos Estados”, em 1941. A 2ª Conferência Nacional de Saúde aconteceu em
1950. Com as propostas das duas conferências foi criado o Ministério da Saúde em 1953. A
3ª Conferência Nacional de Saúde aconteceu em 1963 com o tema central
“Descentralização na área da saúde” com vistas aos municípios, respeitando suas
realidades sociais. Após a 3ª Conferência Nacional de Saúde entrou a ditadura militar,
tempo em que aconteceram as conferências de saúde, mas com pouca participação
popular devido à pressão do governo militar, nos anos de 1966,1975, 1977 e 1980 (BRASIL,
2007).
A 8ª Conferência Nacional de Saúde foi um marco muito importante na história de
saúde do Brasil. O tema central foi “Saúde, direito de todos e dever do Estado”. A
participação popular nessa conferência foi decisiva para a conquista de muitas mudanças
no quadro da saúde brasileira. Nessa conferência foram aprovadas as diretrizes do
Sistema único de Saúde – SUS. Através das Leis 8142/90 e 8080/90, as conferências de
saúde se tornaram instâncias colegiadas de participação popular organizada, com
participação também de entidades ligadas à saúde, trabalhadores da área da saúde,
gestores, e prestadores de serviços de saúde. As conferências têm a incumbência de
avaliar e indicar diretrizes para formulação da política de saúde nos 3 níveis de governo
(BRASIL, 2007).
Em 1992 aconteceu a 9ª Conferência Nacional de Saúde aprovando estratégias de
descentralização e municipalização e houve a presença de 2000 delegados. A 10ª
Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1996, teve como tema "O SUS - Construindo
um Modelo de Atenção à Saúde para a qualidade de Vida", durante o qual foi bastante
discutido o financiamento do SUS e a Emenda Constitucional 29 aprovada em 2000
(BRASIL, 2007).
A 11ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 2000, teve como tema
"Efetivando o SUS: Acesso, Qualidade e Humanização na Atenção à Saúde, com Controle
Social", e questões aprovadas relativas aos conselhos de saúde. A 12ª Conferência
Nacional de Saúde, realizada em 2003, teve como tema "Saúde é um Direito de Todos e
Dever do Estado - A Saúde que Temos e o SUS que Queremos", sendo orientado o Plano
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Nacional de Saúde e garantido a democratização do Conselho Nacional de Saúde. Teve
grande participação popular, 5000 pessoas, sendo 3500 delegados (BRASIL, 2007).
A 13ª Conferência Nacional de Saúde aconteceu em 2007 com o tema “Sistema
Único de Saúde rumo a um século XXI justo e igualitário”, na qual compareceram 4700
pessoas, 5564 municípios (77%). Os principais temas foram aborto e fundação estatal de
direito privado. A 14ª Conferência Nacional de Saúde ocorreu em 2011 com o tema “Todos
usam o SUS! SUS na Seguridade Social, Política Pública, Patrimônio do Povo Brasileiro”,
com mais de 4000 participantes. Foram realizadas 4.347 conferências municipais e 27
estaduais. (PORTAL DA SAÚDE, 2012).
O CONTROLE SOCIAL E OS CONSELHOS DE SAÚDE
Conforme a Lei 8142 de 1990, o conselho de saúde é um órgão deliberativo com
situação constante, constituído de usuários na sua maioria, prestadores de serviço,
profissionais de saúde e representantes do governo.
As pessoas que atuam nos
conselhos de saúde devem formular estratégias e controlar a efetivação das políticas de
saúde, incluindo aspectos financeiros, nas três esferas de governo, ou seja, municípios,
estados, Distrito Federal e Ministério da Saúde (BRASIL, 2006).
O conselho de saúde, através da democracia participativa, permite que a
população acompanhe, fiscalize, pressione as ações do Estado, bem como exponha os
interesses da população (BRASIL, 2006).
A organização da sociedade civil, por meio dos conselhos de saúde, vai além de
partido político ou sindicalismo. Os conselhos lutam pela transformação das
desigualdades e iniquidades da população. A sociedade se organiza em movimentos
reivindicatórios com interesses coletivos e comuns de cada segmento. A democracia
participativa toma forma a partir de um poder popular, fiscalizatório, com voz, com
pressão popular, com confronto de interesses, os quais ao mesmo tempo em que
instigam o conflito, propõem soluções (BRASIL, 2006).
No controle social as divergências entre os diversos interesses são explicitados, os
conflitos são aceitos e as ideias formuladas para efetivação dos direitos conquistados.
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CONTROLE SOCIAL DA SAÚDE NO BRASIL
Visa sempre à melhoria e novos direitos com agendamento e institucionalização. Ele
avalia o que está sendo realizado e o que deve ser realizado, com vistas aos direitos que a
população possui em relação à saúde. O que dá força ao controle social é que ele é
regulado pela lei, e o governo é o responsável e a sociedade mostra seu interesse e sua
força, sendo protagonistas de suas conquistas (BRASIL, 2006).
A participação social por intermédio de Conselhos de Saúde na formulação e
acompanhamento das políticas públicas é ainda muito recente, assim como a
própria história do Sistema Único de Saúde. A busca pela consolidação do SUS
também envolve a consolidação da atuação dos Conselhos de Saúde. Estes ainda
encontram-se num processo de adequação do seu funcionamento, organização
e estrutura às diretrizes do CNS, e poderia ensejar a reflexão sobre suas práticas
e atuações. Tal processo, de certa forma, explica a alternância na atuação dos
Conselhos que ora se revela fiscalizatória, ora participativa (ESCOREL &
DELGADO, 2008, p. 76-77).
Através das plenárias dos conselhos de saúde, podem-se discutir as experiências
vivenciadas em cada conselho, verificando a efetividade de cada um e olhando um
aspecto mais global (BRASIL, 2006).
É necessário que os movimentos sociais estejam presentes em mobilizações,
fóruns, conferências e outros, trazendo a público as desigualdades e fragilidades
existentes na sociedade. O controle social influi também nos orçamentos, se articula com
o Ministério Público e os mecanismos de pressão sobre os partidos políticos, interesses
do povo, promoção de fóruns, debates da sociedade e acesso à justiça. Mobiliza a
sociedade através das conferências de saúde, nos níveis municipais, estaduais e nacional
(BRASIL, 2006).
Há um processo muito difícil entre o direito da sociedade e sua garantia de
efetividade e o capital, trabalho, Estado, sociedade e grupos de interesses. É nesse ponto
que o controle social deve interferir para ser um mediador nesse processo entre todos
esses atores (BRASIL, 2006).
Moreira et al (2008) diz que muitas vezes os Conselhos de Saúde para utilizar seu
direito de autonomia e participação devem se valer de mecanismos de pressão, de
articulação e sanção através do Ministério Público, Tribunais de Conta, Controladoria
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Geral da União e outros que são instituições públicas que os Conselhos podem se articular
conjuntamente e em rede.
Os Conselhos de Saúde realizam reuniões ordinárias e podem surgir reuniões
extraordinárias, grupos de trabalho e comissões para ampliação das discussões
(MOREIRA et al, 2008).
CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE
Moreira (2008) refere que para o exercício do controle social e do pleno
funcionamento, os Conselhos Municipais de Saúde enfrentam muitas dificuldades, como
reformar as políticas locais e os arranjos políticos, dividindo poder entre prefeitos,
secretários de saúde, vereadores, entre outros, fazendo com que esses atores prestem
contas de suas ações.
O mesmo autor destaca que o funcionamento do conselho deveria ser de
fiscalizador dos recursos públicos, diminuindo a corrupção, de participação dos usuários
do SUS no conselho e do conselho na formulação de políticas públicas de saúde, pois
democratizar é aumentar a participação das pessoas nas políticas públicas.
Labra (2005) sinalizou algumas dificuldades dos Conselhos Municipais de Saúde
por várias pesquisas realizadas, como: assimetria entre os participantes; burocratização
por falta de exercício de deliberação; o funcionamento dependendo de como as
autoridades se comportam; precariedade de operacionalidade e infraestrutura; não é
divulgado para população em geral as atividades dos Conselhos, eles são pouco
conhecidos pela população.
Escorel (2008) comenta sobre a apresentação do Participa Net-SUS que faz uma
crítica quanto aos conselheiros que tem seu papel apenas de homologação do que o
gestor traz para reunião, do que de definir as políticas públicas; também do gestor que
não aceita as resoluções e, muitas vezes, maneja e determina a pauta de discussões e
deliberações como melhor lhe convém, fazendo com que as reais necessidades e
interesses da população e comunidade não apareçam nas pautas das reuniões. A autora
refere ainda que falta capacitação para os conselheiros, pois muitos não sabem seu
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CONTROLE SOCIAL DA SAÚDE NO BRASIL
verdadeiro papel dentro dos Conselhos, nem o que é controle social e o papel do
Conselho.
Moreira et.al (2008) cita que a população em geral tem que se organizar para
poder ter voz e voto no conselho, pois a participação é somente através de entidades e
associações e as entidades de trabalhadores e prestadores de serviço são separadas dos
usuários, ficando cada segmento com vagas próprias nos conselhos.
O autor comenta ainda que os conselhos não possuem normatização unificada dos
Conselhos Municipais para eleição das entidades de usuários e quantos conselheiros,
cada Conselho cria as suas normas. Por vezes eleição de entidades, por vezes eleição de
candidatos ou ainda normas mais peculiares não citadas pelo autor.
Para um bom funcionamento do Conselho Municipal de Saúde existem alguns
elementos-chave como normas determinadas, infraestrutura, equipamentos, apoio
técnico e administrativo, capital próprio e independente, entre outros (MOREIRA et al,
2008).
Segundo pesquisa realizada por Moreira et al (2008) as entidades que
representam o segmento dos usuários nos Conselhos Municipais de Saúde com mais de
cem mil habitantes são: associações de moradores e comunitárias; trabalhadores
organizados; portadores de deficiências e patologias; grupos religiosos; segmentos
populacionais: etnia, gênero e faixa etária; entidades vinculadas à saúde; educação,
esporte e cultura; filantropia; entidades patronais; meio ambiente; poder público e
outras.
Quanto à participação na política de saúde, é necessário e adequado que os
Conselhos participem desde a elaboração, passando pela formação e formulação e após
pelo controle e fiscalização. O Plano Municipal de Saúde (PMS) é um instrumento que
contém a política de saúde do município e tem a participação do Conselho Municipal de
Saúde. Esse documento contém prioridades, estimativas de metas a serem alcançadas,
diretrizes, estimativa de recursos e despesas, estratégias de ação, objetivos e promessas
de governo para a saúde. Porém não são todos os municípios que têm o PMS (MOREIRA
et al, 2008).
A informação para a população sobre as políticas de saúde é uma das funções
principais do Conselho Municipal de Saúde. Ele deve informar sobre o funcionamento dos
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Renata Ulrich Finkler e Elaine Rossi Ribeiro
serviços de saúde, andamento das ações públicas, dados epidemiológicos, exposição de
resultados de licitações, dos preços cobrados por seus vencedores, entre outros
(MOREIRA et al, 2008).
Segundo a Resolução 333 de 2003, os conselhos de saúde, após o processo de
descentralização, estão se constituindo também em Conselhos Locais, Regionais e
Distritais Sanitários (inclusive Conselhos Distritais Sanitários Indígenas) dentro do
município.
CONSELHO ESTADUAL DE SAÚDE
Existem no Brasil 27 Conselhos Estaduais de Saúde (CES), um em cada estado
brasileiro. Em 1973 o Distrito Federal criou o CES. Em 1980, cinco estados criaram
(Sergipe, Pernambuco, Paraíba, Ceará e Mato Grosso) e entre 1990 e 1995 foram criados
os outros 21 CES (ESCOREL & DELGADO, 2008).
Segundo a pesquisa das autoras, todos os CES possuem regimento interno,
necessário à organização, pois orienta os conselheiros no processo de decisões e
estabelece regras aos procedimentos do CES. Realizam pelo menos uma reunião
ordinária mensal, registrando em ata, que é disponibilizada à população para aprovação
em plenária. Há penalidade ao conselheiro faltoso, (o número de faltas é determinado
pelo Conselho) que é o afastamento ou substituição.
As mesmas autoras comentam que a pesquisa realizada mostra que os
trabalhadores é a entidade que tem maior participação nos CES. Depois aparecem
portadores de deficiências e doenças, movimentos sociais e associações comunitárias,
específicos, religiosos, entidades patronais e poder público.
Quanto à atuação, os CES fazem homologação e publicação em Diário Oficial de
suas resoluções. Quando alguma resolução não é atendida pelo Executivo, o CES atua
juntamente com o Ministério Público (ESCOREL & DELGADO, 2008).
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CONTROLE SOCIAL DA SAÚDE NO BRASIL
CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE
O Conselho Nacional de Saúde (CNS) em 2006 publicou um instrumento com a
titulação “Coletânea de Normas para o Controle Social no Sistema único de Saúde” que
teve como objetivo disponibilizar um instrumento aos conselheiros de saúde com a
legislação federal relacionada ao controle social. Tal instrumento apresenta as seguintes
legislações: Constituição Federal de 1988 – parte da saúde; Lei 8080 de 19/09/1990; Lei
9836 de 23/09/1999; Lei 8142 de 28/12/1990; Lei 8689 de 27/07/1993; EC 29 de 13/09/2000;
Lei 9452 de 20/03/1997; Lei 8429 de 02/06/1992; Norma Operacional Básica do Sistema
Único de Saúde – SUS/1993; Norma Operacional Básica do Sistema Único de Saúde – SUS;
Noas – SUS 01/2001; Noas – SUS 01/2002; Resolução 322 de 08/05/2003 do CNS; Resolução
333 de 04/11/2003 do CNS e Diretrizes Operacionais para os Pactos pela Vida, em Defesa
do SUS e de Gestão.
O CNS passou por uma transformação organizacional em 2006, no que diz respeito
ao seu funcionamento. Houve um acréscimo na quantidade de cadeiras, fazendo com que
algumas entidades passassem a integrá-lo (como o Cebes e o Movimento Negro) e
também aumentasse o número de cadeiras para várias representações sexuais (gays,
lésbicas, bissexuais, transgêneros, travestis e entidades de distintas orientações sexuais).
O IDEC e a CUT também começaram a representar os usuários no CNS (BAHIA, 2008).
Outra mudança foi a modificação na representação em que as entidades científicas
elegeram a Cebes e a ABRASCO para representá-las. A terceira e principal alteração foi a
eleição de uma mesa diretora e de um presidente para o CNS, fazendo com que ele
assumisse o seu pleno funcionamento com autonomia, sem ter que prestar satisfação ao
gestor (BAHIA, 2008).
LEGISLAÇÃO DO CONTROLE SOCIAL
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 198 da saúde, cita as diretrizes para
organização da saúde, que é a descentralização, a integralidade de atendimento com
prioridade para prevenção e a participação da comunidade (BRASIL, 2006).
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Uma das leis que embasam o conselho de saúde é a Lei 8142 de 28 de dezembro de
1990, que “dispõe sobre a participação comunitária na gestão do SUS e sobre as
transferências Intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras
providências”. (BRASIL, 2006, p. 29).
Essa Lei define que a participação popular é partidária em relação aos gestores,
prestadores de serviços e trabalhadores de serviço, ou seja, os conselhos devem
funcionar com 50% de seus membros de usuários e os outros 50% divididos entre gestores
e prestadores de serviços (25%) e trabalhadores de saúde (25%) (MOREIRA et.al., 2008).
A referida Lei também fala dos repasses de recursos financeiros para cobertura de
ações e serviços para saúde e 70% ficam com os municípios e o restante do recurso com
os Estados. Para receberem tal recurso, os municípios devem ter Fundo de Saúde,
Conselho de Saúde, plano de saúde, relatórios de gestão, recursos para saúde no
orçamento e Plano de Carreira, Cargos e Salários (BRASIL, 2006).
A Lei 8080/90 “dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e
recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes, e
dá outras providências” (BRASIL, 2006, p. 10).
A referida Lei institui o Sistema Único de Saúde e, dentre os seus princípios e
diretrizes, está no art. 7º inciso VIII, a participação comunitária. Haverá regionalização e
hierarquização em complexidades crescentes nas ações e serviços de saúde. Os
Conselhos Nacionais de Saúde coordenarão comissões intersetoriais de âmbito nacional
para trabalharem políticas e programas de saúde, como vigilância sanitária, saúde do
trabalhador, saneamento, entre outros (BRASIL, 2006).
Segundo a Lei acima, os serviços privados podem participar do SUS de forma
complementar, sendo que as entidades filantrópicas e sem fins lucrativos têm
preferência. Para tanto, é feito contrato ou convênio, no qual os valores e critérios para
pagamento dos serviços e o atendimento assistencial é estabelecido pela direção
nacional do SUS e aprovado pelo CNS (BRASIL, 2006).
Quanto à elaboração dos planos de saúde, no art. 37 da Lei 8080/90, diz que o CNS
indicará as diretrizes, “em função das características epidemiológicas e da organização
dos serviços em cada jurisdição administrativa” (BRASIL, 2006, p. 24).
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CONTROLE SOCIAL DA SAÚDE NO BRASIL
Por meio da Resolução 333 de 04 de novembro de 2003 foi estabelecido normas
para criar, reformular, estruturar os conselhos de saúde e como deve ser o seu
funcionamento. Também fala da definição de conselho de saúde, da organização e das
competências dos conselhos de saúde. O documento destaca que o poder executivo
deverá executar as demandas advindas da sociedade através das conferências. Fala sobre
a paridade entre usuários, gestores, prestadores de serviço e trabalhadores de saúde.
Deverá ser eleito o Presidente do Conselho em reunião plenária. O conselheiro deverá ser
indicado por escrito pela entidade, sendo que a duração do mandato terá que ser
registrada em regimento interno, podendo o conselheiro ser reconduzido a critério das
entidades sem tempo estabelecido (BRASIL, 2003).
Conforme a Resolução acima, o município que não tiver Conselho Municipal de
Saúde, deverá realizar uma Conferência Municipal de Saúde, coordenada pelo Conselho
Estadual de Saúde e pelo executivo municipal e compor o Conselho Municipal de Saúde
(BRASIL, 2003).
O decreto 99.438/90 “dispõe sobre a organização e atribuições do Conselho
Nacional de Saúde (CNS), e dá outras providências”. Esse documento descreve todas as
competências do CNS como, por exemplo, “atuar na formulação da estratégia e no
controle da execução da Política Nacional de Saúde, em nível federal; acompanhar e
controlar a atuação do setor privado da área da saúde credenciado mediante contrato
ou convênio”, entre outros. Além disso, discorre sobre a composição do CNS, em que os
representantes são nomeados pelo Presidente da República. Não poderão faltar mais de
3 vezes consecutivas ou mais de 6 vezes intercaladas no ano, sem justa causa. Não serão
remunerados e, terminado o mandato do Presidente da República, os membros do CNS
também serão dispensados (BRASIL, 1990).
O documento acima também descreve que o CNS terá reuniões mensais
ordinárias. Quando convocadas pelo Presidente ou solicitadas pela maioria de seus
membros, extraordinárias. Serão criadas comissões compostas por pessoas habilitadas
para estudar as várias áreas da saúde, como alimentação e nutrição, saneamento e meio
ambiente, entre outros. Será estimulada a integração dos serviços de saúde com as
universidades para a capacitação e educação continuada de recursos humanos do SUS
(BRASIL, 1990).
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Renata Ulrich Finkler e Elaine Rossi Ribeiro
Foi criada, em 1993, a NOB – Norma Operacional Básica do SUS, que objetiva
“disciplinar o processo de descentralização da gestão das ações e dos serviços de saúde
na perspectiva de construção do Sistema Único de Saúde” (BRASIL, 2006, p. 49).
Essa NOB refere que o processo de descentralização e seu gerenciamento são
negociados e deliberados por Comissões Intergestores e Conselhos de Saúde em cada
esfera de governo. Todas as propostas para a implantação e operacionalização do SUS
passam por essas instâncias, nos níveis municipal, estadual (Comissão Intergestores
Bipartite) e Nacional (Comissão Intergestores Tripartite) (BRASIL, 2006).
Ainda segundo a NOB-SUS, se houver divergência na Comissão Bipartite, a
questão será levada ao Conselho Estadual de Saúde. Na inexistência deste, levada à
Comissão Tripartite. Caso alguma das partes se sinta lesada, poderá chegar até o CNS
para resolver o problema (BRASIL, 2006).
A Emenda Constitucional nº 29/2000, “altera os arts. 34, 35, 156, 160, 167 e 198 da
Constituição Federal e acrescenta artigo ao Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias, para assegurar os recursos mínimos para o financiamento das ações e
serviços públicos de saúde” (BRASIL, 2006, p. 36). O Conselho Nacional de Saúde,
através da Resolução 322, de 08 de maio de 2003, aprovou dez diretrizes no que diz
respeito à aplicação dessa Emenda, na 130ª reunião ordinária (BRASIL, 2006).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Weltman (2008) refere que aprendendo a atuar em benefício próprio,
empoderando-se de conhecimentos para tal, a população iria conseguir defender melhor
seus interesses podendo contribuir para a própria governabilidade. O controle social,
através da experiência da participação e da divulgação para outras pessoas dessa
experiência, faz com que a pessoa vá se empoderando aos poucos desses
conhecimentos.
Esse artigo nos mostrou que ao longo do tempo a população foi tomando seu
espaço dentro da gestão do SUS, inserida no planejamento, na execução e no controle
das políticas públicas de saúde. Esse processo fez com que a saúde no país fosse
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CONTROLE SOCIAL DA SAÚDE NO BRASIL
ganhando mais qualidade que na era pré-constituição, por exemplo, pois a população
começou a lutar pelas suas reais necessidades de saúde.
As Conferências de Saúde foram, e são atualmente, movimentos sociais de
democracia pelos direitos da população, nas quais são decididas políticas de saúde pelos
usuários, trabalhadores de saúde, gestores e prestadores de serviços.
“As conferências, assim como os conselhos de saúde, foram instituídas como
instâncias colegiadas do SUS pela Lei 8.142/90. Com este embasamento legal, as
conferências de saúde surgem como exercício do Controle Social, com o papel
de "formular diretrizes da política nas esferas federal, estadual e municipal"
(GUIRLANDA, 2003).
O artigo nos mostra que os conselhos de saúde atuam nas três esferas de
governo: municipal, estadual e nacional. Cada conselho tem seu regimento próprio.
O controle social foi legalmente imposto pela Lei 8142 em 1990, a qual instituiu-se
os conselhos de saúde e as conferências de saúde, e deu poder à população de intervir no
financiamento de recursos para saúde. A bibliografia comenta que é muito recente todo
esse processo e que tem muito para melhorar. Desde então surgiram muitas leis,
portarias, resoluções, decretos que embasam o controle social e seu poder perante a
saúde do país.
Dentro desta revisão, podemos nos sensibilizar como parte da população que
necessita de uma saúde com mais qualidade e com mais acessibilidade. Para tanto,
devemos, como cidadãos, ser engajados no controle social para luta dos direitos por uma
saúde cada vez melhor. O Sistema Único de Saúde é de todos e para todos e é através da
democracia e da participação popular que os princípios de universalidade, integralidade e
outros vão se tornando cada vez mais fortes na sociedade brasileira.
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Renata Ulrich Finkler e Elaine Rossi Ribeiro
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