Governos FHC e LULA: Diferenças e Continuidades na Política

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V CICLO DE PALESTRAS EM CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS – V CPCSA
Os setores econômicos, gestão e políticas públicas sustentáveis: oportunidades, perspectivas e desafios
na geração de vantagens competitivas para o estado de Mato Grosso.
Sinop, MT, Brasil, 26 a 30 de setembro de 2011.
GOVERNOS FHC E LULA: DIFERENÇAS E CONTINUIDADES NA POLÍTICA
MACROECONÔMICA
Adelcina Pereira da Silva de Faria (UNEMAT) [email protected]
Diogo da Rosa Fiel (UNEMAT) [email protected]
Luana Maria Fernandes Silva (UNEMAT) [email protected]
Resumo
Este artigo apresenta uma análise entre as políticas macroeconômicas adotadas na economia
brasileira, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso e três anos da presidência de
Luis Inácio Lula da Silva. Busca-se aqui confrontar as políticas econômicas praticadas e, a
partir daí, observar quais foram as mudanças ou continuidades de tais políticas. No cenário
político brasileiro de 1994 a 2009, é possível identificar altos níveis das taxas de juros, por
meio da manutenção das políticas de metas de inflação e das dificuldades na manutenção da
estabilidade da economia, por vezes, refém do conturbado mercado financeiro mundial. As
políticas de metas de inflação e os superávits primários, associados à política cambial e à
taxa Selic, todos relacionados ao PIB (Produto Interno Bruto) do País, revelaram a
dificuldade dos dois governos em promover o crescimento desse índice. Os resultados e
dados contidos neste estudo foram obtidos por meio de pesquisas bibliográficas em livros,
artigos e sites oficiais, que contribuíram para o desenvolvimento do tema abordado. O que se
percebe nos resultados dos dados pesquisados é a continuidade das políticas
macroeconômicas do governo de FHC no governo de Lula. O melhor desempenho do PIB no
governo de Lula só foi possível em virtude de a economia mundial se encontrar mais
favorável no período.
Palavras-Chave: Inflação; Taxa de Juros; Crescimento.
1. Introdução
O presente estudo aborda as medidas socioeconômicas adotadas nas duas gestões dos
presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva e procura confrontar tais
políticas e observar a ocorrência de mudanças ou continuidades em suas aplicações, no
contexto geral da política macroeconômica brasileira.
Ao analisar a gestão administrativa dos governos, destacam-se as questões que
envolvem o crescimento do Produto Interno Bruto brasileiro, a alta taxa de juros praticada
nesses períodos, e a incumbência de alcançarem as metas de inflação, mantendo a estabilidade
monetária. A política cambial côngrua como um do fator relevante a ser observado, ao
examinar o nível de exportações e importações ocorridas nos períodos em questão e verificar
os resultados obtidos nos saldos da conta de transações correntes com o resto do mundo.
O texto demonstra que ambos os gestores enfrentaram instabilidades econômicas
endógenas e exógenas, que trouxeram como resultado, uma elevação das dívidas interna e
externa do Brasil e contribuíram para a vulnerabilidade externa do país. Tais fatores
dificultaram o crescimento econômico do País, acima do que era propugnado. As taxas de
inflação, políticas cambiais e as taxas de juros compõem o estudo, por se tratarem de dados
essenciais para eficácia do tema abordado.
Este estudo será fragmentado em quatro seções. Na primeira em que se apresenta esta
breve introdução; a segunda parte se constitui da síntese do cenário político do governo
Fernando Henrique Cardoso (FHC). A terceira parte compõe uma prévia do governo Lula e
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na geração de vantagens competitivas para o estado de Mato Grosso.
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seus resultados, e por último, tem-se uma análise desses dois governos juntamente com as
considerações finais.
2. O governo FHC de 1995 a 2002
No inicio da década de 90, o Brasil ainda enfrentava um grave problema de controle
inflacionário e estabilização monetária. Inúmeras tentativas realizadas nos governos anteriores
com planos de combate à inflação e estabilização da economia não tiveram o êxito desejado.
Os últimos planos econômicos da nova republica - I PND – NR (Plano Nacional de
Desenvolvimento da Nova Republica), o Plano Cruzado, o Cruzado II, Bresser, Verão e
Collor I e II, entre os anos de 1985 e 1992, enfrentaram desafios que eram persistentes:
promover um ajuste estrutural e alcançar a estabilidade da economia brasileira, necessários
para retomada do crescimento e do desenvolvimento econômico, por meio do controle
inflacionário e da redução da pobreza. Contudo, poucos foram os resultados satisfatórios e
não se enquadram no objetivo deste estudo, apesar da sua relevância.
Em 1994, frente ao crescente cenário inflacionário, o então ministro da economia do
governo Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, implementa um plano de estabilização
econômica: “Plano Real”. Esse plano, ao contrário dos últimos, não incluía o congelamento
de preços, mas também tratava da inflação inercial como parte do problema. O plano foi
executado em três fases: estabelecimento do equilíbrio das contas do governo, promovendo
um ajuste fiscal, tendo por objetivo suprimir a inflação; adotar um padrão estável de valor, a
URV (Unidade Real de Valor) que era o novo indexador da economia e a emissão de uma
nova moeda nacional, de poder aquisitivo estável, o Real.
Ocorreram resultados satisfatórios, na queda da inflação e o panorama econômico
mais previsível, e foi considerado o melhor plano de estabilização econômico do País, até
então desenvolvido. O plano tinha pela frente o enfrentamento ao câmbio valorizado, utilizou
uma política de cambio fixo a “ancora monetária”, e a alta taxa de juros como instrumento de
controle inflacionário. Nesse contexto de melhoras nos índices inflacionários, o ex-ministro
FHC venceu as eleições para presidente, e deu continuidade às reformas estruturais
propugnadas. Com políticas ortodoxas, para a qual a inflação é um fenômeno puramente
monetário, o plano enfrentou correções a partir de março de 1995. Não se tratou de uma crise
inflacionária, segundo Luis Bresser Pereira, o maior problema que FHC teria de enfrentar
seria o segundo Consenso de Washington.
O equivoco em relação a definição do problema maior a ser enfrentado pelo governo
a partir de 1995, o segundo Consenso de Washington, de acordo com o qual
deveríamos nos desenvolver com poupança externa, e a falta de consciência de
nossas elites, que ao invés de aumentar seu grau de autonomia com a
industrialização, diminuíram-no ao buscar reproduzir os padrões de consumo dos
países desenvolvidos e particularmente dos Estados Unidos (PEREIRA, 2003, p.
336).
Os níveis de inflação passaram a alcançar um ritmo decrescente extremamente
significativo. Observa-se, no Gráfico 1, abaixo, a queda expressiva na taxa de inflação nos
anos subsequentes à implantação do Plano Real. O menor índice do período 1994 a 2002 se
encontra no ano de 1998, quando a inflação atingiu 1,66% ao ano. No ano de 2002, o índice
chegou ao seu ponto máximo com 12,53% ao ano, ainda assim, bem abaixo dos 916% de
1994. Essas variações foram decorrentes das expectativas do processo eleitoral, juntamente
com a insegurança de investidores na manutenção dos contratos internos e externos pelo
próximo governo.
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Gráfico 1 – Inflação - IPCA - (anual) de 1994 a 2002 – (%) (Fonte: http//www.almag.gov.br –
2004, elaborado pelos autores)
Outros instrumentos de controle inflacionário foram o corte no crédito ao consumidor,
redução da tarifa média de importação de cerca de 20,8% para 7%, com uma infinidade de
produtos com tarifas nulas, e a sobrevalorização artificial do Real mantendo uma paridade
com o dólar, por meio da “ancora cambial”. A quebra do domínio público sobre setores
estratégicos alienou parte do patrimônio nacional, visando redução de gastos do governo e
permitiu o avanço do capital estrangeiro no País, foi outro instrumento utilizado.
O sistema de metas de inflação se tornou regra na política monetária após o colapso
da âncora cambial, que era o sustentáculo do plano. A primeira correção foi uma
desvalorização de 5,16% no Real, em meados de 1995. As taxas mensais de inflação
oscilavam de acordo com as pressões de demanda e ocorrências de choques externos, porém
se mantinha a tendência de baixa.
De acordo com Pereira (2003, p. 339), “em 2000 o Brasil não estava pronto para uma
política de meta de inflação porque esta só tem sentido quando se parte de uma situação de
equilíbrio macroeconômico, que não era o nosso caso”.
Assim, no período de 1995 a 1998, o câmbio se mantinha sobrevalorizado e o Brasil
tinha uma taxa de juros artificialmente elevada, isso favorecia um aumento nas importações
de bens de consumo, gerando redução no nível das exportações. Essa política cambial,
atrelada a alta taxa de juros, impediu a estabilização das contas externas, retraiu os
investimentos internos e aumentou a dívida e o déficit público. Nesse quadro, o déficit
externo, incluindo a amortização da dívida, fechou o ano de 1996 em US$ 38,77 bilhões. O
déficit em transações correntes atingiu 3,27% do PIB em 1996 e 4,16% em 1997. Como
comparação, a Indonésia e as Filipinas, nesse período, foram assoladas por crises quando seus
déficits estavam na faixa dos 3,5% do PIB.
Com o câmbio valorizado e o aumento do consumo dos bens importados, a poupança
interna sofria também uma redução. Em de janeiro de 1999, o governo toma a decisão de
deixar o câmbio flutuar, substituindo sua âncora cambial pelas âncoras monetária e fiscal. Em
2001, a economia brasileira dava indícios de um pequeno aquecimento, nos Estados Unidos
iniciava-se uma recessão, a Argentina passava por uma crise e o câmbio sofria uma
depreciação.
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Para controlar a demanda e desestimular as especulações, o Banco Central aumentou a
taxa básica de juros de 22% para 43% e adotou uma política monetária contracionista,
limitando as operações de crédito e estabelecendo a elevação dos depósitos compulsórios nas
transações do sistema financeiro. O Brasil enfrentava mais uma vez uma crise de balanço de
pagamentos provenientes de tais políticas.
Em 1999, criou-se a taxa de juros SELIC com a finalidade de deixar mais transparente
e confiável a negociação de títulos públicos. A taxa SELIC se constitui um instrumento do
Banco Central usado para controle da demanda em períodos de aceleração ou desaceleração
da economia. A taxa reflete também impactos no nível do crescimento econômico como
estímulo ou retração deste, variando de acordo com o comportamento do consumo e
demanda.
A taxa de juros do Brasil é considerada uma das maiores praticadas no mundo, a partir
da década de 90 e, no governo de FHC, atingiu patamares acima de 20% ao ano, ocorrendo
leves quedas e logo retornaram a um nível maior.
Gráfico 2 – Taxa de Juros Selic de 1994 a 2002 (Fonte: http//www.almag.gov.br – 2004,
elaborado pelos autores)
A taxa de juros do período de 1994 a 2002 demonstra reduções em 1999, 2000 e 2001,
porém ainda permanecendo em nível superior ao do mercado mundial e de países com risco
semelhantes ao do Brasil. As perturbações externas, que afetavam o financiamento dos
déficits correntes, no caso da crise Asiática e Russa entre 1996 e 1997, alteraram para cima a
taxa no período.
A abertura econômica aliada à valorização do câmbio gerou um aumento considerável
das importações e refletiu em uma redução das exportações, o que contribuiu para os déficits
na balança comercial, desestabilizando boa parte de suas contas externas. A dívida mobiliária
federal saltou de US$ 62 bilhões para US$ 319 bilhões entre 1995 e 1999, o conjunto da
dívida líquida do setor público subiu de 29,35% do PIB para 50,49%. Ademais, a participação
das empresas estrangeiras nas vendas das 500 maiores empresas privadas e 50 maiores
estatais, instaladas no País, aumentou de 32% em 1994 para 43,5% em 1998. Assim, a
política de substituição de importações foi uma forma de incentivar a modernização do parque
industrial brasileiro, no entanto, muitas fábricas não tinham estrutura suficiente para competir
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com os produtos que vinham de fora e acabaram sendo sucateadas e outras fechadas, em
detrimento das novas empresas estrangeiras instaladas.
Nessa conjuntura, a dívida interna pública entra em um processo de agravamento, no
momento da desvalorização cambial e da alta na taxa de juros, pois grande parte dos títulos
públicos estavam firmados em dólar. A poupança interna tinha um volume mínimo, o que
resultava em uma dependência da poupança externa, dessa forma, o Brasil estava incorrendo
em uma progressão de sua vulnerabilidade externa. A dívida pública chegou a ser reduzida
com as receitas advindas das privatizações, contudo, outros fatores deveriam ser tratados com
cautela.
Com o volume de dívidas crescentes e a vulnerabilidade aos choques externos, o
Brasil avançava na taxa de desemprego, retração do produto, aumento do déficit público e
déficit das transações correntes. Diante desse contexto econômico, e da crise na Rússia, o
governo brasileiro, em 1998, recorre a um empréstimo junto ao FMI (Fundo Monetário
Internacional) no valor de US$ 42 bilhões. Para concretizar o acordo, o FMI exigia reformas
políticas na área fiscal e uma maior abertura comercial. Em 2001, frente a novas crises no
mercado internacional, FHC faz um novo acordo com o FMI no valor de US$ 15,650 bilhões.
Novamente em 2002, o Brasil pede um terceiro empréstimo de US$ 30 bilhões, reproduzindo
o aumento da dívida externa e do risco-país. Em apenas quatro anos, foram aproximadamente
US$ 85 bilhões em empréstimos, o que representava 6,5% do PIB, no mesmo ano, a carga
tributária brasileira, em relação ao produto interno, era de 35,65%.
Segundo Lacerda et al. (2005), “ durante os anos 1990, o desempenho do PIB foi
bastante irregular, crescendo mais vigorosamente no ano de 2000, mesmo assim abaixo do
observado no ano da implantação do real.” No primeiro mandato de FHC, a taxa média de
crescimento era em torno de 2,6% a.a, enquanto, no segundo mandato, essa média se reduzia
ainda mais, chegando a 2,1% ao ano. Em 2000, observou-se a maior taxa de crescimento que
chegou a 4,36% ao ano, e a menor taxa foi registrada em 2001 no valor de 1,3% ao ano,
conforme a tabela 1.
Tabela 1 - Evolução do Pib – Brasil (em R$ bilhões)
Ano
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
PIB
893,5
917,5
947,5
949,6
957,2
1.101,3
1.198,7
1.346,0
Variação anual (%)
4,22
2,66
3,27
0,22
0,80
4,36
1,31
1,93
(Fonte: LACERDA, et al. – 2005, elaborada pelos autores)
Um dos indicadores negativos no governo FHC foi a taxa de desemprego, com um
nível crescente em quase todo o período de seu governo, iniciando em 1995 no percentual de
4,7% ao ano, e chegando em 1999 a 7,6% ao ano. Esses números foram elevados nos períodos
em que ocorria as crises na Ásia, México e Rússia.
Outro fator de impacto significativo no crescimento econômico durante o governo de
FHC foi a crise energética em 2001 e 2002, decorrente de problemas climáticos, a falta de
planejamento e investimento no setor de energia. O reduzido nível de crescimento do setor
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energético está associado às medidas contracionistas adotadas para o controle inflacionário: a
política cambial, a alta taxa de juros, e o ajuste fiscal. Todos esses elementos eram
responsáveis pelas variações na redução do consumo, dos investimentos, da demanda e do
emprego.
Entre 1999 e 2001, o índice geral de preços, medido pela Fundação Getulio Vargas,
saltou de 19,98% e atingiu 26,41%. A meta de inflação oficial estabelecida para 2002 medida
pelo IBGE, que era de 3,5%, atingiu 12,53%.
Foi com esse cenário econômico que FHC deixou o governo. Havia grandes desafios
para o novo presidente no que se refere à estabilização da economia. O País já havia
conseguido reduzir seus níveis de inflação, no entanto, encontrava-se em meio a uma
economia estagnada e uma taxa de juros elevada que inibia o crescimento e desenvolvimento
do País.
3. Governo Lula, mudanças e continuidades.
Em 2002, o candidato Luiz Inácio Lula da Silva se elege como novo Presidente do
Brasil, depois de disputar cinco eleições e mudar seu discurso radical revolucionário para o
neoliberal. O novo chefe do executivo assumiu o compromisso de prosseguir com as políticas
de estabilidade, preservando os contratos, o ajuste fiscal, garantindo o pagamento das dívidas,
e, principalmente, mantendo o acordo com o Fundo Monetário Internacional firmado pelo seu
antecessor.
Com a sinalização do comprometimento em relação à estabilidade econômica, ocorreu
a redução no risco-país e uma melhoria das expectativas econômicas. A inflação, o câmbio e a
taxa de juros e um superávit primário superior aos 3,75% do PIB do governo anterior,
deveriam ser acompanhados de perto para que o País pudesse alcançar sua estabilidade
econômica.
O primeiro ano do governo Lula foi acompanhado por níveis de inflação em ritmo
decrescente. Todavia, somente nos anos de 2006, 2007 e 2009, as metas de inflação puderam
ser atingidas e ficaram menores do que o nível determinado pelo Banco Central de 4,5% a.a.
Gráfico 3 – Inflação IPCA (anual) (Fonte: Banco Central – 2011, elaborado pelo autor)
A desaceleração da inflação pode ser explicada pela valorização cambial, a retração da
demanda, a manutenção taxas de juros, e a elevação do superávit primário a partir de 2003.
Segundo Gremaud, et al. (2009), o novo governo formou uma nova equipe econômica,
adotando medidas para demonstrar o compromisso do ajustamento fiscal e da estabilidade.
Assim, elevou a meta de superávit primário para 4,25% do PIB nos quatro anos do governo,
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para estabilizar e buscar reverter o nível crescente da dívida pública e a manutenção da
política de elevação da taxa de juros.
A política cambial flutuante, iniciada no segundo mandato de FHC, foi mantida no
governo Lula, e a valorização cambial, associada à política monetária, foram importantes
fatores que resultaram na queda da inflação e da estabilidade durante o seu governo. A taxa de
juros do Brasil continuava a ser uma das mais altas do mundo, entretanto começou a declinar
a partir de 2006 e teve seu menor nível no ano de 2009, conforme se pode observar no gráfico
4.
Gráfico 4 – Taxa de Juros Selic de 2003 a 2010 (Fonte: Banco Central – 2011, elaborado pelos autores)
A taxa medida pelo IBGE fechou 2002 em 12,58%; 2003, em 9,33%; 2004, em
7,57%; 2005, em 5,88%. Entre dezembro de 2003 e dezembro de 2005, o aumento na taxa foi
de 12,5%, em um momento de ajustes monetários, vindo a se reduzir em aproximadamente
34% até dezembro de 2007, quando a taxa de juros chegou a 11,75%. A queda mais
acentuada dos juros no período ocorreu em 2008 e 2009, quando houve uma redução de 41%,
na casa dos 8,25% ao mês. Nos países desenvolvidos, a taxa real média não passa de 0,3%.
Ainda de acordo com Gremaud et al. (2009) “a valorização cambial foi a principal
responsável pela estabilização e possibilitou a redução da taxa de juros.” No mesmo contexto,
para Pereira (2003), “Uma economia está equilibrada macroeconomicamente quando tem
taxas de juros suficientemente baixas para poder investir e crescer.”
Em relação às vendas para o exterior, ocorreram melhoras decorrentes de alguns
fatores como: elevação do preço das commodities, desvalorização da moeda brasileira no
câmbio e algumas medidas de diminuição da tributação nas exportações. Isso favoreceu um
superávit nas transações correntes. As importações em 2003 permaneceram estáveis, voltando
a crescer em 2006 com o impacto da valorização real da taxa de câmbio. A desvalorização do
câmbio permaneceu até metade de 2004 retornando assim a apreciação do real.
Outros pesquisadores analisaram o período e, de acordo com Filgueiras e Gonçalves
(2007), a conta de transações correntes começa a ter saldo positivo a partir de 2001 com a
mudança do regime cambial ocorrida ainda no governo de FHC. O saldo positivo da balança
comercial passa a ser mais significativo em 2002-2003, tendo em vista que o panorama
econômico internacional se encontrava mais favorável. As exportações tiveram um
crescimento médio de 23% no período 2003-2006. Esse crescimento acontece pelo aumento
da demanda internacional por commodities, em destaque a China, que representou uma
melhora positiva no desempenho do PIB brasileiro.
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Dessa forma, o crescimento, nesse período, deixa evidente a sua dependência em
relação às exportações para obtenção de resultados positivos. Entre 2003-2006, a conta de
transações correntes obteve um superávit acumulado de US$41,8 bilhões. Os resultados
positivos da balança comercial e a melhora no cenário do mercado mundial contribuíram para
a redução da vulnerabilidade externa do País.
Em relação ao crescimento do PIB do País, no governo Lula, não houve sinais de
aumento expressivo, na média de 2,6% a.a no seu primeiro mandato, índice que ficou abaixo
da média de crescimento do PIB da economia mundial que foi de 4,85% ao ano.
O crescimento do País esteve ligado ao baixo nível de investimentos e à elevada taxa
de desemprego no período, que afetava diretamente na renda e no consumo das famílias. Em
2004, mesmo com uma redução, devido o crescimento do setor exportador e da diminuição
das restrições externas, possibilitando uma expansão no mercado interno, o índice de
desemprego ainda continuava elevado. Na região metropolitana de São Paulo, o índice de
desemprego médio foi de 17,8% a.a entre 2003-2006.
Conforme Gremaud et al. (2009), para melhorar o desempenho do consumo e do
investimento, o governo estabeleceu políticas para o micro crédito, com incentivo as
cooperativas de crédito. Disponibilizou o crédito consignado para pessoas físicas, como
funcionários públicos, aposentados e pensionistas. A ampliação dos programas de
transferência de renda também contribuiu para o aumento do consumo e consequentemente
permitiram a redução do desemprego.
Apesar da expansão do crédito, no sentido de aumentar o consumo e o investimento,
as importações crescentes restringiam o crescimento do produto que trouxe um fraco
desempenho para a economia neste período. O que motivou esse comportamento foi a alta
taxa de juros como principal instrumento da política monetária no controle inflacionário.
Dessa maneira, o País permanecia semi-estagnado em seu crescimento, permanecendo o
desafio de acertar o rumo para uma economia estabilizada e de crescimento sustentável nos
próximos governos.
Entretanto, a evolução da dívida líquida do setor público saltou de R$ 881 bilhões em
dezembro de 2002 para R$ 1.002 trilhões em dezembro de 2005, o que representou um
aumento de 13% no montante da dívida. Nesse ultimo ano, a dívida pública representava
51,6% do PIB, com crescimento acima do governo FHC, já que o PIB era maior, alavancado
pela elevação das exportações brasileiras. Mesmo realizadas amortizações da dívida pública
externa, no período, a parte da dívida mobiliária, integrante da dívida total, cresceu
violentamente 57,20%. Em síntese, o superávit primário gerado foi inteiramente utilizado para
pagar encargos financeiros da dívida total. A parte dos juros, que não foi coberta pelo
superávit primário, foi quitada com recursos obtidos com a emissão de novos títulos,
pressionando ainda mais a divida externa total.
4. Considerações Finais
Após a implantação do Plano Real, o Brasil conseguiu reduzir e manter seus níveis de
inflação bem abaixo do que os vividos nas décadas anteriores. O governo de FHC adotou
políticas macroeconômicas neoliberais e em diversos momentos medidas contracionistas
buscando alcançar a estabilidade econômica. Em ambos os governos, o controle inflacionário,
por meio da política monetária com alta taxa de juros e um câmbio ora fixo, ora flutuante,
aprofundaram a vulnerabilidade externa do País e permitiram o agravamento das dívidas
publicas e particulares tanto interna quanto externamente. Entre dezembro de 1994 e junho de
2002, a dívida líquida do setor público no Brasil passou de R$ 192 bilhões, 28,1 % do Produto
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Interno Bruto, para R$ 709 bilhões, ou 55,9 % do PIB, o que configura a continuidade do
modelo de política monetária e fiscal do governo FHC no governo de Lula.
Mesmo com a adoção do câmbio flutuante, a partir de 1999, a economia não obteve
resultados significativos em seu crescimento. Observa-se uma política voltada para atender os
interesses das economias externas e do capital financeiro especulativo, que serviu, em alguns
momentos, de lastro na política monetária ortodoxa. A economia brasileira se mostra
dependente do cenário internacional, sofrendo com choques externos, como ocorreu em 2001
na crise da Argentina e na crise cambial de 2002. Ademais, o Brasil se torna dependente das
poupanças externas, implicando em taxas de câmbio valorizadas, que acabou por atrair mais
capitais especulativos externos.
A política monetária e seu principal instrumento “a taxa de juros” no controle da
inflação gerou impactos negativos, como os baixos níveis de investimento e crescimento do
produto no governo de FHC. Mesmo com as metas de inflação, havendo a possibilidade da
redução dos juros, a Selic brasileira continuava a ser uma das maiores do mundo.
O que se pode destacar no governo de FHC é o controle da inflação, no entanto, as
baixas taxas de crescimento foram o maior desafio de seu governo, fazendo com que
ocorresse a necessidade de reestruturação interna, para acontecer um desenvolvimento
endógeno de suas forças produtivas, utilizando esses recursos de maneira mais eficiente.
Fica evidente que o governo Lula deu continuidade às políticas macroeconômicas de
seu antecessor. Obteve melhores resultados como o das contas externas (saldo positivo na
conta de transações correntes), no controle da inflação, na redução do endividamento externo.
A melhora nos indicadores da economia internacional propiciou um ambiente econômico
mais favorável, resultando em um melhor desempenho da economia brasileira a partir de
2003.
No que se refere ao crescimento econômico do PIB brasileiro, no governo Lula não se
obteve resultados expressivos em relação ao governo de FHC. O crescimento do Produto
Interno Bruto acontece em razão do aumento no volume de exportações, o que deixa claro a
dependência desse crescimento à demanda externa, consolidando o País como exportador de
produtos primários, com baixo valor agregado e mais vulnerável aos choques externos.
Na política cambial e monetária ocorreram poucas mudanças, continuando a taxa de
juros mais elevada que a de países com mesmo risco-país e de mesmo nível de
desenvolvimento, e que promoveu um desestímulo aos investimentos e à produção doméstica,
aumentando o déficit público e favorecendo apenas o mercado financeiro especulativo.
Em seu segundo mandato, o presidente Lula voltou a atender os interesses das classes
dominantes, o que o fez mudar seu discurso radical de oposição para um discurso de
manutenção da política neoliberal do governo de FHC. Ocorreu assim, a continuidade das
políticas econômicas, que foram favorecidas pelo bom desempenho da economia mundial.
A conclusão dessa breve análise econômica, dos governos FHC e do governo Lula é
que, ambos, priorizaram a economia de “mercado”, deixando como segundo plano uma
política de desenvolvimento. As políticas aplicadas levaram a economia brasileira estado de
semiestagnação. A ênfase desmensurada no superávit primário, para manter o “equilíbrio” e
garantir a solvência econômica, deu-se a custas do endividamento público, da queda nas taxas
de crescimento e no aperto dos assalariados. A era do “novoliberalismo” amarrou as
possibilidades de grandes mudanças nas políticas econômicas, praticadas em 16 anos de
governo no Brasil.
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V CICLO DE PALESTRAS EM CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS – V CPCSA
Os setores econômicos, gestão e políticas públicas sustentáveis: oportunidades, perspectivas e desafios
na geração de vantagens competitivas para o estado de Mato Grosso.
Sinop, MT, Brasil, 26 a 30 de setembro de 2011.
Referências
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Disponível em: <http://www.sep.org.br/artigo/9_congresso_old/ixcongresso55.pdf.>. Acesso em: 20 mar. 2011.
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