Importância da Avaliação da Função Renal em Felino Obstruído – Relato de Caso Maína de Souza Almeida1, Miriam Nogueira Teixeira2, Eneida Willcox Rêgo2, Telga Lucena Alves Craveiro de Almeida3, Simone Gutman Vaz4, Breno Menezes dos Santos4, Ana Katharyne Ferreira Fagundes4, Giselle Ramos da Silva4 Introdução A obstrução uretral é um sinal clínico comum da doença do trato urinário inferior dos felinos e, associada a outras alterações, leva o animal à dificuldade ou incapacidade de urinar, podendo, em casos mais graves, causar a morte do animal. A obstrução uretral é mais freqüente em felinos machos e pode ser mecânica ou funcional. Os tampões mucoproteináceos e urólitos são as duas causas mais comuns da obstrução uretral. Fatores como alimentação, obesidade, diminuição da freqüência e volume urinário, castração, pouca atividade física, enfermidades e estresse podem influenciar na formação dos tampões e urólitos. O animal pode apresentar disúria, anúria, hematúria, eliminação inadequada de urina, gemidos, vômitos, letargia, agressividade, dor quando o abdômen é palpado e lambedura do períneo [1]. Os felinos gravemente afetados são aqueles obstruídos por mais de 36 horas, profundamente deprimidos, que estão sem comer ou ingerir água por mais de 24 horas, apresentando vômito, desidratação grave, hálito urêmico. O proprietário percebe os sinais clínicos da obstrução quando o animal está sofrendo uma crise toxêmica devido à estase urinária, podendo desenvolver insuficiência renal aguda, apesar do tratamento. [2] A insuficiência aguda pós-renal indica obstrução ou desvio do fluxo urinário e o consequente acúmulo dos produtos de excreção no organismo. A azotemia pósrenal ocorre porque a uréia, que é filtrada nos glomérulos renais, por ser permeável em alguns segmentos dos túbulos, consegue difundir-se passivamente de volta ao sangue. A quantidade de uréia reabsorvida é inversamente proporcional ao débito do fluxo de urina, assim, quanto menor o fluxo, mais uréia será reabsorvida. A creatinina é afetada de maneira semelhante. Com a identificação precoce e a correção dos distúrbios primários, a azotemia é rapidamente controlada, sem causar dano morfológico permanente aos rins. Se o tratamento for retardado, o animal pode morrer em conseqüência da uremia aguda ou desenvolver dano estrutural secundário dos rins. [3,4] Nos exames laboratoriais realizados no animal obstruído com insuficiência renal aguda, os achados mais comuns incluem: acidose metabólica, discreta hiponatremia, hipercalemia, hipermagnesemia, hiperfosfatemia, hipocloremia, hiperglicemia, hiperproteinemia, hipocalcemia, hematúria, cristalúria e azotemia pós-renal. O pH urinário dos carnívoros, que em geral é ácido, pode estar elevado em casos de retenção urinária. [1,5] A base da terapia da obstrução uretral consiste em desobstrução da uretra e fluidoterapia parenteral, oscilando de acordo com a severidade dos sinais clínicos, que também variam com a intensidade e duração da obstrução. Se o gato ainda não apresentar azotemia a desobstrução é suficiente, porém, se já apresentar, a fluidoterapia será necessária. Alguns tratamentos para urolitíase são baseados na mudança do pH. O prognóstico da obstrução uretral é de bom a grave dependendo do tempo de duração da obstrução. Os testes de função renal podem ser usados como marcadores da função dos rins. A avaliação seqüencial pode ser usada para monitorar o tratamento e o progresso do quadro clínico. [2,5,6] O presente trabalho tem como objetivo avaliar a importância da avaliação da função renal em felino obstruído, bem como relatar o referido caso. . Material e métodos No mês de agosto de 2009 foi atendido no Hospital Veterinário da Universidade Federal Rural de Pernambuco, um felino macho, castrado, de aproximadamente quatro anos. O proprietário relatou que o animal apresentava dificuldade para urinar. No exame clínico constatou-se que o animal estava apático e desidratado. A palpação abdominal revelou que a bexiga urinária encontrava-se distendida. Foi então realizada a cistocentese como medida terapêutica com intuito de esvaziar a bexiga urinária, bem como para obtenção da urina para avaliação laboratorial. Posteriormente o animal foi sondado. O clínico então solicitou a mensuração sérica de uréia e creatinina, para a avaliação da função renal. ________________ 1. Discente do Curso de Graduação em Medicina Veterinária da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Av. Dom Manuel de Medeiros, S/N, Dois Irmãos- PE. CEP: 52-171-900. E-mail: [email protected] 2. Professor Associado do Departamento de Medicina Veterinária da Universidade Federal Rural de Pernambuco. 3. Médica Veterinária residente/ PPGCV/ Laboratório de Patologia Clínica/ Hospital Veterinário/DMV /UFRPE. 4. Discente do Curso de Graduação em Medicina Veterinária da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Resultados e Discussão Referências Na avaliação laboratorial da urina, constatou-se odor amoniacal, presença de sedimento e coloração avermelhada. Segundo Bicalho & Carneiro [5] o odor amoniacal sugere crise urêmica, que ocorre devido à incapacidade de excretar os produtos nitrogenados. A coloração avermelhada da amostra sugere hematúria ou hemoglobinúria. Segundo Meyer et al [6] a hematúria, que é a presença de hemácias na urina, pode indicar uma hemorragia ou inflamação no trato urinário. Quando há obstrução urinária, a distensão da bexiga leva ao rompimento dos vasos da mesma, o que causa o aumento de eritrócitos na urina. A hematúria também está associada a urólitos, neoplasias, infecções bacterianas, trauma, cistite estéril, nefrite, nefrose, parasitose urinária e trombocitopenia. A fita reagente, utilizada para o exame químico, indicou presença de sangue e pH 8,0. Bicalho & Carneiro [5] afirmam que a elevação do pH nos carnívoros pode significar retenção urinária vesical, hipótese que corrobora a suspeita clínica de obstrução e conseqüente retenção urinária. Posteriormente foi realizado o exame do sedimento, no qual foram visualizadas hemácias, cristais de estruvita e cristais de fosfato amorfo. Segundo Rabelo et al [1], a cristalúria está presente em muitos dos casos de urolitíase. A bioquímica sérica indicou que tanto a uréia como a creatinina encontravam-se acima do valor máximo aceitável para a espécie. Como foi afirmado por Castro & Matera [4], tanto a uréia quanto a creatinina são mais reabsorvidas quando o fluxo urinário diminui, o que ocorre em casos de obstrução. Sendo assim, é correto afirmar que o aumento desses dois compostos nitrogenados se deve à doença pós-renal. A azotemia pode evoluir para uremia, e quando isto ocorre aparecem os sinais clínicos relacionados ao aumento de uréia na circulação. Segundo Cowgill & Elliott [3] a identificação precoce da azotemia permite que medidas terapêuticas sejam tomadas rapidamente sem que ocorra dano morfológico nos rins, ou em outros órgãos. Conclui-se que os exames laboratoriais da função renal fornecem subsídios valiosos para o diagnóstico e prognóstico das alterações do funcionamento dos rins, sejam estas de origem renal ou não. A mensuração dos níveis de uréia e creatinina no animal com obstrução do fluxo urinário permite que o clínico identifique precocemente o quadro de azotemia e institua a terapêutica adequada, evitando assim o aparecimento da síndrome urêmica e o desenvolvimento de insuficiência renal crônica. [1] Agradecimentos Agradeço a Deus, aos técnicos administrativos e aos docentes pelo auxílio técnico-científico e a todos os colegas pelas oportunidades de estudo. [2] [3] [4] [5] [6] RABELO, R.C.; SOARES, J.A.; LEITE, R. M.C. 2004 [Online]. Aspectos Emergenciais na Síndrome Urológica Obstrutiva dos Felinos. Homepage: http://www.veterinariosnodiva.com.br/ books/Sindrome-do-Felino-obstruido.pdf PAULUKA, S. 2008. Obstrução Uretral em Felinos. Trabalho de conclusão de curso de especialização lato sensu em clínica médica e cirúrgica de pequenos animais da Universidade Castelo Branco. Curitiba. COWGILL, L.D.; ELLIOTT, D.A.; 2004. Insuficiência Renal Aguda. In: ETTINGER, S.J; FELDMAN, E.C. Tratado de Medicina Interna Veterinária: Doenças do Cão e do Gato. Ed. 5. São Paulo: Editora Guanabara Koogan. p.1702. CASTRO, P.F.; MATERA, J.M. 2005. Ureterolitíases obstrutivas em cães: Avaliação da Função Renal na Indicação da Ureterotomia ou Ureteronefectomia. Ver. Educ. Contin. CRMVSP, São Paulo, Vol. 8, n.1, pág 38-47. BICALHO, A.P.C.V.; CARNEIRO , R.A. 2006. [Online] Apostila de Patologia Clínica. Homepage: http://www.vet.ufmg.br/departamentos/clinica/clinica/documentos/ Apostila%20de%20patologia%20clinica.pdf MEYER, D.J.; COLES, E.H.; RICH; L.J. 1995. Medicina de Laboratório Veterinária. São Paulo: Editora Roca p. 308