ID: 53574890 23-04-2014 Universidades privadas perderam um quarto dos alunos em três anos Crise São menos 20 mil alunos desde 2010/11. O abandono por razões económicas é a grande causa. Instituições já dispensaram 1700 docentes. Ana Petronilho [email protected] A crise chegou em força ao ensino superior privado nos últimos três anos lectivos. Desde 2010/11, período que coincide com a intervenção da troika no país, as universidades privadas perderam mais de vinte mil alunos, o que representa um quarto do total da sua população estudantil. A perda resulta da soma de dois fenómenos: quebra do número de novos inscritos e abandono de estudantes a meio do percurso. Para ambas as situações, a crise é a grande justificação avançada pelos responsáveis do sector. Como consequência, nestes anos foram dispensados 1.700 docentes. Os dados pertencem ao Ministério da Educação e evidenciam uma tendência com mais de uma década, mas que se agravou drasticamente neste período. E embora resulte também da quebra demográfica, a crise parece ser mesmo a grande razão desta sangria. Até porque, neste período, o ensino superior público perdeu apenas 1,2% dos alunos (3.500), enquanto o privado perdeu quase tantos quantos em toda a década anterior (2000 a 2010) e regista agora a menor população dos últimos 20 anos: em 1995/1996, as privadas contavam mais de 114 mil alunos; hoje ficam-se pelos 67 mil, entre licenciaturas, mestrados e doutoramentos. Além do que possa dizer sobre os efeitos da crise nas famílias e nos jovens, esta desertificação traduz-se também num cenário de grandes dificuldades para as universidades privadas que, de acordo com os próprios reitores, terão sofrido neste período uma redução de cerca de 20% das receitas. A primeira consequência visível é a redução do número de professores: entre 2010/11 e 2012/13, as privadas cortaram o corpo docente em 14,5%. São menos 1.700 professores. É a “situação real do país” “É uma fotografia da situação real do país. Todos fomos afectados. A partir de 2011, a crise atingiu-nos em cheio e ainda não melhorou”, reconhece Manuel Damásio, presidente do Conselho de Administração da Universidade Lusófona, que neste período perdeu 3.300 alunos (24%). Mas a fotografia é de família: o Instituto Piaget caiu para metade dos alunos nas escolas superiores de Educação (51%) e nas escolas superiores de Saúde (48%); a Universidade Lusíada perdeu quase um terço (34%, menos 2500 estudantes); o ISPA perdeu um quarto (23%, menos 410 alunos). Os reitores das privadas reconhecem esta “perda significativa”, apesar dos esforços para tentar travar o abandono, através de bolsas de estudo e de mérito, ou facilidades no pagamento das propinas. Porque o abandono por Embora resulte também da quebra demográfica, a quebra explica-se sobretudo pela crise. Até porque, neste período, as públicas apenas perderam 1,2% dos alunos. razões económicas, garantem, é mesmo o grande problema. “A perda global de alunos é superior à perda da procura”, afirma João Redondo, presidente da Associação Portuguesa do Ensino Superior Privado, indicando que a quebra demográfica apenas justifica uma pequena parte da perda de alunos. “Nos últimos três anos, os jovens não têm vindo a investir na formação”, acrescenta o também reitor da Lusíada, adiantando que, “na hora da escolha entre entrar no mercado de trabalho ou prosseguir os estudos, os alunos acabam por escolher o trabalho”. A este quadro, o director-executivo da APESP, Miguel Copetto, acrescenta a falta de apoio financeiro aos alunos por parte do Estado. “O valor da bolsa é insuficiente porque é calculado segundo o valor da propina das universidades públicas”, salienta. Um valor que “é inferior ao das universidades privadas e não corresponde ao valor da despesa real dos estudantes”. Desta forma, “mesmo tendo aproveitamento escolar, os estudantes acabam por não ter alternativa a não ser abandonar os estudos”, lamenta Copetto. Também Reginaldo de Almeida, director de Comunicação e Relações Externas da Autónoma, aponta o dedo ao Estado, queixando-se da falta de medidas como o cheque-ensino que, acredita, iriam permitir “condições de sã concorrência” entre as universidades públicas e privadas. Porque “a ausência de sistemas paritários não privilegia a qualidade, ou outros factores de competitividade entre as instituições, promovendo a procura daquelas que ainda conseguem apresentar valores de propinas mais baixos”. ■ Tiragem: 17280 Pág: 10 País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 23,88 x 25,15 cm² Âmbito: Economia, Negócios e. Corte: 1 de 3 ID: 53574890 23-04-2014 Tiragem: 17280 Pág: 11 País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 24,32 x 24,78 cm² Âmbito: Economia, Negócios e. Corte: 2 de 3 TRÊS PERGUNTAS A... efeito” das dificuldades económicas das famílias. José Ferreira Gomes confessa ainda que a meta de termos 40% de diplomados dentro de seis anos é “muito ambiciosa”. JOSÉ FERREIRA GOMES Secretário de Estado do Ensino Superior “A meta de 40% de diplomados era muito ambiciosa” A forte redução de alunos nas universidades privadas é um “problema” que tem vindo a ser discutido entre as instituições e o Governo, estando prevista uma recuperação e “crescimento moderado” de alunos. O secretário de Estado do Ensino Superior aponta a “estabilização” da procura, em queda desde o ano 2000, mas reconhece “algum Infografia: Mário Malhão | [email protected] Como vê o Ministério da Educação a tendência de quebra de alunos nas privadas? É preocupante? A quebra é consequência da estabilização da procura estudantil desde o ano 2000 e da progressiva adap- “ A quebra é consequência da estabilização da procura desde o ano 2000 e da progressiva adaptação da oferta pública aos interesses dos estudantes. tação da oferta pública aos interesses dos estudantes. Várias políticas estão desenhadas no sentido de ser recuperado um crescimento lento. Prevê que a tendência se mantenha no futuro? Espera-se que possamos retomar um crescimento moderado. Estes números põem em causa o cumprimento da meta 20-20 em atingir 40% de diplomados entre os 30 e os 34 anos? A meta de 40% era muito ambiciosa no momento em que foi assumida. Todas a projecções apontam para que seja de facto atingida em 2020 ou pouco depois. As instituições privadas têm pedido ajuda ao MEC para ultrapassar esta situação? Nos muitos contactos com as instituições privadas (e também com as públicas) temos discutido este problema, sempre na perspectiva de melhorar o serviço de educação superior oferecido à nossa população. A.P. ID: 53574890 23-04-2014 Tiragem: 17280 Pág: 1 País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 16,87 x 6,22 cm² Âmbito: Economia, Negócios e. Corte: 3 de 3 Universidades privadas perderam um quarto dos alunos em três anos Desde 2010/11, período que coincide com a intervenção da ‘troika’ no país, as universidades privadas já perderam mais de 20 mil estudantes e dispensaram 1.700 docentes, estando hoje ao nível mais baixo dos últimos 20 anos. As dificuldades económicas são a principal razão para o abandono dos alunos. ➥ P10