direito das coisas

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Escola Superior da Magistratura do Estado de Goiás
DIREITO CIVIL
REAIS
Dr. Sebastião Neto
2011
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SUMÁRIO
1. Conceito..................................................................................................................
1.1. Distinções entre os direitos reais e os direitos pessoais.......................................
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2. Posse .......................................................................................................................
2.1. Teorias sobre a posse...........................................................................................
2.1.1. Teoria subjetiva.................................................................................................
2.1.2. Teoria objetiva..................................................................................................
2.2. Localização tópica da posse.................................................................................
2.3. Classificações da posse........................................................................................
2.4. Manutenção dos caracteres da posse....................................................................
2.5. Aquisição da posse...............................................................................................
2.5.1. Quanto à origem................................................................................................
2.5.2. Transmissão da posse........................................................................................
2.5.3. Acessio possessionis..........................................................................................
2.5.4. Atos de mera tolerância e presunção de posse das coisas móveis....................
2.6. Efeitos da posse....................................................................................................
2.6.1. Direito aos interditos possessórios....................................................................
2.6.1.1. Alegação de domínio na pendência do processo possessório........................
2.6.2. Direito aos frutos...............................................................................................
2.6.3. Perda ou deterioração da coisa..........................................................................
2.6.4. Direito às benfeitorias.......................................................................................
2.6.4.1. Noções............................................................................................................
2.6.4.2. Possuidor de boa-fé........................................................................................
2.6.4.3. Possuidor de má-fé.........................................................................................
2.7. Perda da posse......................................................................................................
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3. Direitos reais...........................................................................................................
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4. Propriedade.............................................................................................................
4.1. Breve histórico da propriedade............................................................................
4.1.1. Concepção conflituosa......................................................................................
4.1.2. Concepção absolutista.......................................................................................
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4.1.3. Concepção relativista – função social da propriedade.................................................. 16
4.2. Conceito......................................................................................................................... 17
4.3. Propriedade e domínio..................................................................................................... 17
4.4. Elementos....................................................................................................................... 18
4.5. Delimitação do direito de propriedade............................................................................. 18
4.5.1. Direito aos frutos e produtos.................................................................................... 19
4.5.2. Descoberta.................................................................................................................. 19
4.6. Limitações ao direito de propriedade......................................................................... 19
4.6.1. Princípio da função social da propriedade e limitações ao exercício do
direito de propriedade................................................................................................. 19
4.6.2. Elementos da função social da propriedade rural............................................ 19
4.6.3. Elementos da função social da propriedade urbana......................................... 21
4.6.4. Limitações ao exercício do direito de propriedade no Código Civil................
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4.6.4.1. A chamada desapropriação judicial (art. 1.228, §§ 4.º e 5.º)........................
4.6.4.1.1. Natureza jurídica.........................................................................................
4.6.4.1.2. Requisitos....................................................................................................
4.6.4.1.3. Exercício.....................................................................................................
4.6.5. Outras limitações......................................................................................................
4.7. Aquisição da propriedade............................................................................................
4.7.1. Aquisição da propriedade imóvel............................................................................
4.7.1.1. Usucapião................................................................................................................
4.7.1.2. Conceito.........................................................................................................
4.7.1.3. Natureza.........................................................................................................
4.7.1.4. Extensão.........................................................................................................
4.7.1.5. Espécies de usucapião....................................................................................
4.7.1.5.1. Usucapião extraordinária............................................................................
4.7.1.5.2. Usucapião ordinária....................................................................................
4.7.1.5.3. Usucapião especial urbana..........................................................................
4.7.1.5.4. Usucapião especial rural.............................................................................
4.7.1.6. Aplicação de institutos da prescrição extintiva..............................................
4.7.1.7. Aspectos processuais.....................................................................................
4.7.1.7.1. Eficácia da sentença...................................................................................
4.7.1.7.2. Usucapião como defesa...............................................................................
4.7.1.8. Acessio possessionis......................................................................................
4.7.2. Aquisição pelo registro do título.......................................................................
4.7.3. Aquisição por acessão.......................................................................................
4.7.3.1. Conceito.........................................................................................................
4.7.3.2. Da formação de ilha.......................................................................................
4.7.3.3. Aluvião...........................................................................................................
4.7.3.4. Avulsão..........................................................................................................
4.7.3.5. Abandono de álveo
4.7.3.6. Das construções e plantações.........................................................................
4.7.3.6.1. Noções........................................................................................................
4.7.3.6.2. Plantação ou construção em solo próprio com sementes, plantas ou
materiais alheios.........................................................................................................
4.7.3.6.3. Plantação ou construção em terreno alheio.................................................
4.7.3.6.3.1. Direito de retenção...................................................................................
4.7.3.6.3.2. Aquisição da propriedade do solo alheio pelo terceiro plantador ou
construtor.....................................................................................................................
4.8. Aquisição da propriedade móvel..........................................................................
4.8.1. Usucapião..........................................................................................................
4.8.2. Ocupação...........................................................................................................
4.8.3. Achado do tesouro.............................................................................................
4.8.4.1. Constituto possessório....................................................................................
4.8.4.2. Alienação de coisa sob poder de terceiro.......................................................
4.8.4.3. Traditio brevi manu........................................................................................
4.8.5. Especificação.....................................................................................................
4.8.6. Confusão, comistão e adjunção.........................................................................
4.8.6.1. Confusão, comistão ou adjunção de má-fé....................................................
4.8.6.2. Formação de espécie nova.............................................................................
4.9. Perda da propriedade............................................................................................
5. Direitos de vizinhança.............................................................................................
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5.1. Natureza jurídica..................................................................................................
5.2. Uso anormal da propriedade................................................................................
5.2.1. Interferência determinada pelo interesse público..............................................
5.2.2. Ação demolitória e ação de dano infecto..........................................................
5.3. Árvores limítrofes................................................................................................
5.4. Passagem forçada.................................................................................................
5.5. Passagem de cabos e tubulações..........................................................................
5.6. Águas....................................................................................................................
5.6.1. Águas naturais...................................................................................................
5.6.2. Águas artificiais................................................................................................
5.6.3. Águas pluviais e de nascente............................................................................
5.6.4. Poluição de águas..............................................................................................
5.6.5. Barragens, açudes e represamento de água.......................................................
5.6.6. Direito de aqueduto ou servidão legal de aqueduto.........................................
5.6.7. Limites entre prédios e direito de tapagem.......................................................
5.6.8. Direito de construir...........................................................................................
6. Condomínio.............................................................................................................
6.1. Conceito...............................................................................................................
6.2. Dos direitos e deveres dos condôminos...............................................................
6.3. Administração do condomínio.............................................................................
6.4. Condomínio necessário........................................................................................
6.5. Condomínio edilício.............................................................................................
7. Propriedade resolúvel..............................................................................................
7.1. Conceito...............................................................................................................
7.2. Hipóteses..............................................................................................................
7.2.1. Propriedade resolúvel........................................................................................
7.2.2. Propriedade ad tempus......................................................................................
8. Propriedade fiduciária.............................................................................................
8.1. Conceito...............................................................................................................
8.2. Requisitos.............................................................................................................
8.3. Desdobramento da posse......................................................................................
8.4. Vencimento da dívida..........................................................................................
9. Direitos reais sobre coisas alheias...........................................................................
9.1. Forma de constituição..........................................................................................
9.2. Direito de superfície.............................................................................................
9.2.1. Direitos e deveres do superficiário....................................................................
9.2.2. Extinção do direito de superfície.......................................................................
9.2.3. Constituição de direito de superfície por pessoa jurídica de direito público
interno.........................................................................................................................
9.3. Servidões. ............................................................................................................
9.3.1. Conceito. ..........................................................................................................
9.3.2. Características. .................................................................................................
9.3.3. Formas de constituição. ...................................................................................
9.3.4. Classificação. ...................................................................................................
9.3.5. Exercício das servidões. ...................................................................................
9.3.5.1. Direito de conservação. .................................................................................
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9.3.5.2. Livre exercício da servidão. ..........................................................................
9.3.5.3. Remoção da servidão. ...................................................................................
9.3.5.4. Restrição ao exercício da servidão.................................................................
9.3.6. Extinção das servidões......................................................................................
9.3.6.1. Regra geral.....................................................................................................
9.3.6.2. Cancelamento judicial....................................................................................
9.3.6.3. Extinção pelo não-uso, confusão ou contrato................................................
9.4. Usufruto...............................................................................................................
9.4.1. Conceito............................................................................................................
9.4.1.1. Distinção com outros institutos......................................................................
9.4.2. Direitos do usufrutuário....................................................................................
9.4.2.1. Regra geral.....................................................................................................
9.4.2.2. Direito aos frutos............................................................................................
9.4.2.3. Direito de arrendar/Proibição de modificação da destinação econômica......
9.4.2.4. Direito de acrescer.........................................................................................
9.4.3. Deveres do usufrutuário....................................................................................
9.4.3.1. Dever de conservação....................................................................................
9.4.3.2. Reparações extraordinárias............................................................................
9.4.3.3. Usufruto de patrimônio..................................................................................
9.4.3.4. Dever de ciência quanto às lesões..................................................................
9.4.3.5. Pagamento do seguro.....................................................................................
9.4.3.6. Destruição de edifício sujeito a seguro..........................................................
9.4.3.7. Desapropriação do prédio sujeito a usufruto..................................................
9.4.4. Espécies de usufruto..........................................................................................
9.4.5. Extinção do usufruto.........................................................................................
9.5. Uso.......................................................................................................................
9.5.1. Conceito............................................................................................................
9.5.2. Regras................................................................................................................
9.6. Habitação..............................................................................................................
9.6.1. Conceito............................................................................................................
9.7. Direito real de aquisição – direito do promitente comprador..............................
9.7.1. Conceito............................................................................................................
9.7.2. Regras................................................................................................................
9.8. Direitos reais de garantia......................................................................................
9.8.1. Conceito............................................................................................................
9.8.2. Princípios...........................................................................................................
9.8.2.1. Vinculação do bem dado em garantia............................................................
9.8.2.2. Capacidade do sujeito e idoneidade do objeto...............................................
9.8.2.3. Acessoriedade................................................................................................
9.8.2.4. Direito de preferência ou prioridade..............................................................
9.8.2.5. Direito de seqüela...........................................................................................
9.8.2.6. Indivisibilidade da garantia............................................................................
9.8.2.7. Vencimento antecipado da dívida garantida..................................................
9.8.2.8. Transitoriedade...............................................................................................
9.8.3. Disposições gerais.............................................................................................
9.8.3.1. Prazo máximo do direito de retenção do credor anticrédito..........................
9.8.3.2. Requisitos de eficácia do contrato constitutivo da garantia...........................
9.8.3.3. Garantia prestada por terceiro........................................................................
9.8.3.4. Proibição do pacto comissório.......................................................................
9.8.3.5. Caráter quirografário do saldo remanescente................................................
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9.8.4. Penhor...............................................................................................................
9.8.4.1. Penhor em geral..............................................................................................
9.8.4.1.1. Conceito......................................................................................................
9.8.4.1.2. Pluralidade de penhores e subpenhor..........................................................
9.8.4.1.3. Espécies de penhor......................................................................................
9.8.4.1.4. Direitos do credor pignoratício...................................................................
9.8.4.1.5. Deveres do credor pignoratício...................................................................
9.8.4.1.6. Extinção do penhor.....................................................................................
9.8.4.2. Penhores especiais..........................................................................................
9.8.4.2.1. Penhor rural.................................................................................................
9.8.4.2.2. Penhor industrial e mercantil......................................................................
9.8.4.2.3. Penhor de direitos e títulos de crédito.........................................................
9.8.4.2.3.1. Penhor de direitos.....................................................................................
9.8.4.2.3.2. Penhor de títulos de crédito......................................................................
9.8.4.2.4. Penhor de veículos......................................................................................
9.8.4.3. Penhor legal...................................................................................................
9.8.5. Hipoteca............................................................................................................
9.8.5.1. Conceito.........................................................................................................
9.8.5.2. Classificação da hipoteca...............................................................................
9.8.5.3. Princípios........................................................................................................
9.8.5.4. Regras.............................................................................................................
9.8.5.4.1. Aquisição do imóvel hipotecado.................................................................
9.8.5.4.1.1. Remição....................................................................................................
9.8.5.4.2. Prazo da hipoteca........................................................................................
9.8.5.4.3. Hipoteca para garantia de dívida futura......................................................
9.8.5.4.4. Loteamento do imóvel hipotecado..............................................................
9.8.5.5. Hipoteca legal.................................................................................................
9.8.5.6. Registro da hipoteca.......................................................................................
9.8.5.7. Extinção da hipoteca......................................................................................
9.8.5.8. Hipoteca de vias férreas.................................................................................
9.8.6. Anticrese...........................................................................................................
9.8.6.1. Conceito.........................................................................................................
9.8.6.2. Direitos do credor anticrético.........................................................................
9.8.6.3. Deveres do credor anticrético.........................................................................
9.8.6.4. Aquisição de imóvel objeto de anticrese........................................................
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................
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EXERCÍCIOS.............................................................................................................
Gabarito....................................................................................................................... 85
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DIREITO DAS COISAS
1. Conceito
Muita discussão existe a respeito da denominação correta desta parte do Direito
Civil, porquanto se entende que o designativo correto seria direitos reais e não direito
das coisas, uma vez que, em expressão de origem irônica, as coisas não têm direitos.
Entretanto, a discussão não se resume a isso, porquanto a denominação que se
deve dar a um ramo do direito deve ser aquela que melhor signifique a abrangência de
seu objeto.
Com efeito, sob a rubrica direito das coisas, o código disciplina não só os
direitos reais, que são aqueles taxativamente previstos no art. 1.225, mas, também, a
posse e outros direitos derivados diretamente da propriedade, como, por exemplo, os
direitos de vizinhança.
Destarte, a denominação direitos reais não abrangeria todo o objeto da
disciplina, de forma que o legislador deve ter por preocupação o conteúdo material das
questões tratadas. No caso específico, a relação do sujeito de direitos com as coisas é, de
fato, o critério que fornece maior amplitude para emprestar à disciplina um nome.
1.2. Distinções entre os direitos reais e os direitos pessoais
Existem várias concepções acerca da diferenciação entre direitos pessoais e
reais. Existem a teoria realista e a teoria personalista. Assim, a) pela teoria realista, o
direito real encerra uma relação entre a pessoa e a coisa; b) pela teoria personalista, o
direito real, assim como o direito pessoal, também encerra relação entre pessoas,
entretanto, o sujeito passivo não é certo e determinado, mas, sim, um sujeito passivo
universal.
De qualquer sorte, o direito real se diferencia, principalmente, do direito pessoal,
por não necessitar de intermediário (outra pessoa) para ser exercido, mas, apenas, da
própria coisa e, em regra, opõe-se erga omnes (contra todos).
Pode-se traçar o seguinte traço entre as principais diferenças entre direitos reais
e pessoais:
a) Direitos pessoais: a1) são exercidos contra outra pessoa; a2) é oponível
somente contra o devedor ou quem por ele se obrigar, por lei ou por contrato;
a3) os direitos pessoais são transitórios, ou seja, extinguem-se com o
cumprimento da obrigação; a4) podem ser violados por fato positivo (obrigações
de não fazer) ou negativo (inadimplemento); a5) não se adquire direito pessoal
por usucapião; a6) podem ser criadas novas formas de direito pessoal,
livremente, pela vontade das partes.
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b) Direitos reais: b1) são exercidos sobre a coisa; b2) são oponíveis erga omnes,
ou seja, podem ser exercidos contra todos; b3) são perpétuos, porquanto não
dependem do cumprimento de uma prestação, por outrem, para serem satisfeitos;
b4) somente podem ser violados por fato positivo; b5) podem ser adquiridos por
usucapião; b6) Tipicidade: não podem ser criados, livremente pelas partes,
novos modos de direitos reais, uma vez que o rol de direitos reais constante da
lei é taxativo (numerus clausus) e não pode ser ampliado por convenção
particular, mas somente pela própria lei (independentemente de ser o próprio
código civil); b7) Seqüela: atributo específico dos direitos reais, a seqüela é a
prerrogativa que faz com que referido direito tenha o efeito de seguir a coisa
sobre a qual incide onde quer que esteja1.
2. Posse
2.1. Teorias sobre a posse
São duas as teorias mais discutidas a respeito da natureza jurídica da posse,
quais sejam, a teoria subjetiva de Savigny e a teoria objetiva de Ihering.
2.1.1. Teoria subjetiva
Para Savigny, a posse é um estado de fato sobre a coisa, segundo o qual o
possuidor, além de deter a coisa em seu poder (corpus), tem o ânimo de detê-la como
dono (animus domini). Em razão disso, sua teoria é conhecida como subjetiva, pois
depende da análise subjetiva da vontade do detentor de possuir a coisa como dono.
As conseqüências da teoria subjetiva importam em classificar a posse como
atributo exclusivo do proprietário, qualificando, pois, como simples detenção, situações
como a do locatário, do credor pignoratício, do arrendatário, etc.
2.1.2. Teoria objetiva
A teoria de Ihering explica melhor a diferença entre posse e detenção e
possibilita enxergar o fenômeno da divisão da posse em direta e indireta.
Para Ihering, a posse existe quando exercida de forma a aparentar o domínio
sobre a coisa, ou seja, para o referido doutrinador, a posse é a exteriorização do
domínio. Para que haja posse, não é necessário que o possuidor tenha ânimo de dono
sobre a coisa, mas apenas que detenha a coisa (corpus) de forma a exercer poderes
próprios de proprietário.
Assim, sua teoria é objetiva, pois não exige a pesquisa do ânimo do possuidor de
ter a coisa como dono, mas apenas os caracteres de sua detenção sobre a coisa.
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Assim, no direito pessoal resultante de um contrato de compra e venda, por exemplo, o credor tem
apenas uma expectativa de direito real sobre a coisa, que somente se concretiza com a tradição. Se o
alienante transfere a coisa a terceiro, o direito pessoal dá ao credor apenas a prerrogativa de exigir o seu
cumprimento, com a conversão em perdas e danos em caso de impossibilidade. Já com o direito real
(compromisso de compra e venda registrado, por exemplo – art. 1.417), o comprador tem, nesse direito, a
prerrogativa de fazê-lo seguir a coisa onde quer que esteja, podendo opô-lo a terceiro adquirente, ainda
que de boa-fé.
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Destarte, aquele que possui a coisa, exercendo poderes típicos de proprietário,
será considerado possuidor, independentemente de ter o domínio sobre a coisa ou o
ânimo de adquiri-lo. Assim, contempla-se a situação do locatário, por exemplo, que
exerce poderes típicos de proprietário como usar a coisa ou dispor deste uso
(sublocação).
Para a teoria objetiva, portanto, a posse se difere da detenção, não porque na
posse haja o animus domini, mas porque, se na mera detenção o detentor age sob o
mando ou instruções de outrem, não tem essa detenção nenhuma das características da
propriedade.
Além disso, situações como a do locatário, credor pignoratício, arrendatário, etc
explicam a divisão da classificação da posse em direta (exercida por quem está na
detenção da coisa, com caracteres específicos de dono) e indireta (exercida pelo
proprietário que cede a outrem a posse direta).
O Código Civil de 1916 já adotava esta teoria, quando rezava, em seu art. 485,
que “considera-se possuidor toda aquele que tem de fato o exercício, pleno, ou não, de
algum dos poderes inerentes ao domínio ou propriedade”.
O Código Civil de 2002 também acata a teoria objetiva, ao dispor, no art. 1.196:
“Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de
algum dos poderes inerentes à propriedade”.
2.1.3. Teoria social
O francês Raymond Saleilles formulou uma teoria própria, partindo, no entanto,
dos princípios da teoria objetiva de Ihering.
Para Saleilles, tal como para Ihering, a caracterização da posse prescinde do
elemento subjetivo (animus domini), bastando seus elementos externos, ou seja, a
aparência de domínio na conduta do possuidor.
No entanto, Saleilles defende que a posse só pode merecer proteção jurídica
quando o estado de fato sobre a coisa estiver acompanhado da realização de algum
objetivo sócio-econômico. Desta forma, evita-se que o ordenamento jurídico ampare
situações em que se exerce posse sem nenhum objetivo social ou econômico, mas por
mera especulação.
Em seu projeto de modificação do Código Civil (Projeto 6.960/02), o deputado
Ricardo Fiúza propõe a seguinte redação para o art. 1.196 do Código Civil:
Considera-se possuidor todo aquele que tem poder fático de ingerência
sócio-econômica, absoluto ou relativo, direto ou indireto, sobre
determinado bem da vida, que se manifesta através do exercício ou
possibilidade de exercício inerente a propriedade ou outro direito real
suscetível de posse.
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Como se vê, o projeto de autoria do deputado Ricardo Fiúza adota, claramente, a
teoria da função social da posse, de Saleilles, porque exige, para configuração da posse,
o exercício de poder fático de ingerência sócio-econômica sobre a coisa. Não basta,
para tanto, deter a coisa com aparência de dono, mas exercer sobre ela alguma atividade
relevante do ponto de vista sócio-econômico.
2.2. Localização tópica da posse
Independentemente da teoria que se adote (objetiva ou subjetiva), a posse é um
estado de fato sobre a coisa e não propriamente um direito que se exerce sobre ela. Por
isso, o Código Civil não admite a posse como direito real, deixando de arrolá-la como
tal no art. 1.225.
Assim, temos no código civil, no livro a respeito do direito das coisas, o título I
a respeito da posse e, posteriormente, o título II a respeito dos direitos reais.
2.3. Classificações da posse
Conforme certas características da posse, ela pode ser classificada, conforme
veremos adiante:
a) Posse direta e indireta: é a divisão da posse conforme o proprietário ou outro
detentor de direito real sobre a coisa transfere a outrem a posse direta sobre a
coisa. Reza o art. 1.197 do Código Civil que “a posse direta, de pessoa que
tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal,
ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o
possuidor direto defender a sua posse contra o indireto”;
b) Posse e detenção: A posse, como vimos, é o estado de fato de uma pessoa
sobre a coisa que faz exteriorizar alguns dos caracteres da propriedade;
assim, o possuidor possui em nome próprio, tendo ou não a propriedade. A
detenção, por sua vez, caracteriza-se pelo apoderamento da coisa em nome
de outra pessoa ou em cumprimento de ordens ou instruções desta outra
pessoa (ex.: a detenção do caseiro sobre a terra rural que lhe é confiada).
Assim, disciplina o art. 1.198: “Considera-se detentor aquele que, achandose em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome
deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas. Parágrafo único.
Aquele que começou a comportar-se do modo como prescreve este artigo,
em relação ao bem e à outra pessoa, presume-se detentor, até que prove o
contrário”. Também se têm entendido como mera detenção as situações dos
arts. 1.208 e 1.224 do Código Civil: “Art. 1.208. Não induzem posse os atos
de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição
os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a
clandestinidade”; “Art. 1.224. Só se considera perdida a posse para quem
não presenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar
a coisa, ou, tentando recuperá-la, é violentamente repelido”. A esta última
hipótese PONTES DE MIRANDA dá o nome de tença. Na consideração da
detenção relevam três conclusões distintas: 1 – a mera detenção não é capaz
de gerar posse ad usucapionem, a não ser que se convole em posse (art.
1.224); 2 – a detenção não pode se convolar em posse por ato unilateral do
11
detentor, mas sempre com a participação do possuidor, ainda que por inércia,
como no caso do art. 1.224; 3 – a ocupação ou apropriação de bens públicos
não gera posse, mas sempre detenção, por se tornar impossível a aparência
de dono exigida pela teoria objetiva2;
c) Composse: É o fenômeno pelo qual duas ou mais pessoas possuem, em
comum, uma coisa indivisa, hipótese na qual “poderá cada uma exercer
sobre ela atos possessórios, contanto que não excluam os dos outros
compossuidores” (art. 1.199);
d) Posse justa e injusta: posse justa é aquela exercida a justo título. Classifica-se
a posse como justa por exclusão, ou seja, será justa quando não for adquirida
de forma violenta, clandestina ou precária (nec vim, nec clam, nec precario),
hipóteses em que se qualifica como injusta. Assim, temos: d1) posse
violenta: aquela adquirida pela força contra o justo possuidor. A violência
pode ocorrer tanto no momento da aquisição da posse como em momento
posterior. Assim, há posse violenta quando a violência é dirigida à retirada
da posse do justo possuidor; da mesma forma, é violenta a posse quando o
justo possuidor, não tendo presenciado o esbulho, é repelido posteriormente.
Enfim, entende-se por violência somente aquela praticada contra a pessoa do
possuidor e não contra a coisa, de forma que o rompimento de obstáculo, por
exemplo, para apossamento de coisa abandonada, não caracteriza a violência
prevista no disposito; d2) posse clandestina: aquela que se adquire às
escondidas, em detrimento do justo possuidor; d3) posse precária: aquela que
se adquire com abuso de confiança, resultando, geralmente, da retenção
indevida da coisa que se deve restituir ao justo possuidor;
e) Posse de boa-fé e de má-fé: A posse será de boa ou de má-fé conforme o
possuidor conheça ou não eventual obstáculo que lhe impede de adquirir a
coisa. Ignorando o obstáculo, o possuidor está de boa-fé; conhecendo-o,
considera-se de má-fé. Daí resulta concluir que, para estar de boa-fé, o
2
USUCAPIÃO NA FORMA EXTRAORDINÁRIA - POSSE PRECÁRIA INVASÃO DE TERRAS AUSÊNCIA DE "ANIMUS DOMINI" PRESCRIÇÃO AQUISITIVA NÃO CONSUMADA. 1- A posse
decorrente de invasão de lote de terreno urbano é clandestina e precária, não ensejando a prescrição
aquisitiva. 2- A usucapião na forma extraordinária somente se consuma com a posse mansa e pacifica,
com "animus domini", exercida durante vinte anos. Apelação desprovida. (Apelação Cível nº
0075543100, Ac.: 3928, 8ª Câmara Cível do TAPR, Andira, Rel. Juiz Conv. R. Cristo Pereira. j.
12.06.1995, Publ. 04.08.1995).
TJSC. Posse. O fâmulo ou detentor não pode alterar unilateralmente a sua situação e tornar-se possuidor.
Inteligência do art. 1.198 do CC/2002. Quanto a esse aspecto, diz Sílvio de Salvo Venosa(in Código Civil
Comentado: direito das coisas, posse, direitos reais, propriedade. Vol.XII. coord. Álvaro Villaça
Azevedo. São Paulo : Atlas. 2003, p. 41): A idéia básica é de que quem inicia a detenção como mero
fâmulo ou detentor não pode alterar por vontade própria essa situação e tornar-se possuidor. Para que o
detentor seja considerado possuidor, há necessidade de um ato ou negócio jurídico que altere a situação
de fato. Isso porque o fato da detenção da coisa é diverso do fato da posse. Por essa razão, como
sufragado de há muito pela doutrina, mas por vezes obscuro em decisões judiciais, presume-se que o
fâmulo se tenha mantido como tal até que ele prove o contrário. Essa modificação de animus, como
apontamos, não depende unicamente da vontade unilateral do detentor. (Decisão Monocrática: Agravo de
Instrumento nº 2007.026671-9/0000-00, da comarca da Capital. Relator: Des. Jaime Luiz Vicari. Data da
decisão: 23.07.2007. Publicação: DJSC Eletrônico n. 255, edição de 26.07.2007, p. 129)
MANUTENÇÃO DE POSSE. OCUPAÇÃO DE ÁREA PÚBLICA, ADMINISTRADA PELA
―TERRACAP – COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA‖. INADMISSIBILIDADE DA
PROTEÇÃO POSSESSÓRIA. – A ocupação de bem público não passa de simples detenção, caso em que
se afigura inadmissível o pleito de proteção possessória contra o órgão público. – Não induzem posse os
atos de mera tolerância (art. 497 do Código Civil/1916). Precedentes do STJ. Recurso especial conhecido
e provido. (REsp 489.732/DF, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em
05.05.2005, DJ 13.06.2005 p. 310)
12
possuidor deve acreditar que sua posse não prejudica a ninguém, hipótese
que se chama de posse de boa-fé real. Além disso, se o possuidor tiver justo
título sobre a coisa, presume-se a sua boa-fé, salvo prova em contrário, caso
em que se tem posse de boa-fé presumida (esta presunção é juris tantum).
Além disso, “a posse de boa-fé só perde este caráter no caso e desde o
momento em que as circunstâncias façam presumir que o possuidor não
ignora que possui indevidamente” (art. 1.202).
2.4. Manutenção dos caracteres da posse
Nos termos do art. 1.203, salvo prova em contrário, entende-se manter a posse o
mesmo caráter com que foi adquirida.
Tal dispositivo importa em afirmar, por exemplo, que se a posse é adquirida por
direito pessoal (locação, comodato, etc.), conservará, sempre, esta característica, de
forma que a sua não-devolução ao final do contrato transformá-la-á em posse precária.
Além disso, ainda que a posse comodatária ou locatícia perdure por longo período de
tempo, ela não perderá essa característica, de forma que não autoriza ao possuidor direto
a aquisição do domínio pela usucapião.
2.5. Aquisição da posse
O novo código (art. 1.204) estatui que se adquire a posse desde o momento em
que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à
propriedade. Tal dispositivo atende à teoria objetiva, já que considera a caracterização
da posse por elementos objetivos, quais sejam, os poderes próprios de proprietário
exercidos pelo possuidor.
Ao disciplinar como a posse pode ser adquirida, o art. 1.205 permite a aquisição
da posse, diretamente, pela pessoa que a pretende, ou por representante; mas permite,
também, que a posse seja adquirida por terceiro sem mandato, dependendo de
ratificação.
O novo código não previu a aquisição da posse pelo chamado constituto
possessório (cláusula constituti). Para entendermos o que seja o constituto possessório,
devemos recorrer a duas situações: a) a primeira é a da pessoa que possui a coisa alheia
por algum fator (locação, comodato, arrendamento, depósito, etc.), mas adquire, depois,
sua propriedade. Neste caso, diz-se que o possuidor tinha animus nomine alieno (ânimo
de possuir coisa alheia) e passou a ter animus domini (ânimo de dono), ao adquirir a
propriedade. Em verdade, ao adquirir a propriedade, esse possuidor já tinha a posse
direta, razão por que não necessita de uma tradição real sobre a coisa, mas apenas da
chamada traditio brevi manu; b) a segunda hipótese é o inverso, ou seja, a pessoa possui
a coisa em virtude do direito de propriedade que exerce sobre ela, entretanto, aliena essa
propriedade a outrem, mas continua a exercer a posse sobre ela (também, por locação,
comodato, arrendamento, depósito, etc.). Neste caso, não houve tradição real da coisa
para o adquirente, pois o alienante continua na posse. Neste caso, podem as partes
celebrar a chamada cláusula constituti, a qual faz com que o vendedor continue na posse
direta da coisa e permite que o comprador adquira a posse, de forma simbólica.
13
Este, então (hipótese da letra b), é o constituto possessório. Muito embora o art.
1.205 não o tenha previsto como forma de aquisição da posse, tem entendido a doutrina
que, por não ter sido proibido pela lei, pode continuar a ser celebrado por vontade das
partes, tal como se observa na conclusão da Jornada I STJ, n.º 77: “A posse das coisas
móveis e imóveis pode ser transmitida pelo constituto possessório”.
2.5.1. Quanto à origem
a) Aquisição originária: o adquirente fica isento dos vícios que a posse anterior
pudesse ter porque não há qualquer relação entre o possuidor atual e o anterior,
como nos casos de apreensão, acessão, ocupação ou usucapião;
b) Aquisição derivada: sendo derivada a aquisição, porque fundada numa relação
entre a posse atual e a anterior, a nova conservará os vícios e defeitos dela. Este
modo de aquisição é o que decorre de negócio jurídico.
2.5.2. Transmissão da posse
A posse pode ser adquirida, também, pela abertura da sucessão. Esta ocorre no
momento do falecimento do autor da herança. Importante ressaltar, entretanto, que “a
posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com os mesmos
caracteres” (art. 1.206), ou seja, se o autor da herança tinha posse decorrente de
contrato com o proprietário, a esse título se dará a sua aquisição pelos herdeiros; se for
violenta, clandestina ou precária, igualmente;
Assim, se for justa a posse do autor da herança, inclusive tendente a legitimar a
usucapião, os herdeiros continuam nesta posse com o mesmo título, tal como prevê o
art. 1.207, primeira parte, que prevê que o sucessor universal continua de direito a
posse do seu antecessor.
2.5.3. Acessio possessionis
A aquisição por acessão da posse pode ocorrer de forma universal, como se
observa na primeira parte do art. 1.207 (item 2.5.1 supra), chamada de sucessão, ou de
forma singular, conforme prevê o art. 1.207, segunda parte, que prevê, in verbis: “ao
sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais”.
Como se observa, no caso de sucessão, a continuação da posse é automática e
imperativa de acordo com a lei. No caso da sucessão singular, ou união, ao sucessor
singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais, o que ocorre,
geralmente, para o efeito de se adquirir a coisa por usucapião.
Para haver acessio possessionis, por sucessão singular, é necessário que a
aquisição da posse, pelo sucessor, seja contínua e pacífica, não podendo o novo
possuidor unir sua nova posse à do possuidor anterior se a adquiriu contra este de forma
injusta (violenta, clandestina ou precária).
2.5.4. Atos de mera tolerância e presunção de posse das coisas móveis
14
Nos termos do art. 1.208, não induzem posse os atos de mera permissão ou
tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou
clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade.
Assim, a posse precária nunca irá se convalidar, porquanto se arrima em mera
permissão ou tolerância do proprietário, que pode derivar, inclusive, de negócio jurídico
no qual se transfere a posse direta (locação, comodato, depósito, etc.). Quanto à posse
clandestina ou violenta, somente pode se convalidar após cessar a violência ou
clandestinidade, ou seja, após a ciência do antigo possuidor que, ciente, não pratica atos
de recuperação da posse.
E, consoante o art. 1.209, a posse do imóvel faz presumir, até prova contrária, a
das coisas móveis que nele estiverem.
2.6. Efeitos da posse
2.6.1. Direito aos interditos possessórios
Um dos principais efeitos da posse é conferir ao possuidor a proteção jurídica ao
exercício do poder de fato que lhe é conferido de forma justa. Assim, nos termos do
caput do art. 1.210, o possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de
turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo
receio de ser molestado.
Subdivide-se, portanto, a proteção possessória, em três hipóteses diferentes:
a) esbulho: ocorre esbulho quando o possuidor da coisa se vê completamente
impedido de exercer a posse sobre a totalidade ou parte dela, por ato de
terceiro que sobre ela passa a exercer posse injusta (clandestina, violenta ou
precária). Dá origem à ação de reintegração de posse;
b) turbação: ocorre a turbação quando o possuidor sofre embaraço no exercício
de sua posse, deixando de conseguir exercer alguns de seus atributos. Não
pode ser confundido com o esbulho parcial sobre a coisa, pois neste existe
impedimento para o exercício de todos os atributos da posse, pelo possuidor,
mas apenas sobre parte da coisa; na turbação, o possuidor se vê apenas
impedido de exercer alguns dos atributos de sua posse, sem, entretanto,
deixar de exercê-la sobre a totalidade do objeto. (ex.: assim, é esbulho
parcial a invasão de dez hectares de uma gleba de cem hectares; é turbação a
atitude do confinante de guardar máquinas, na terra do vizinho, sem seu
consentimento, atrapalhando-o a exercer atributos da posse sobre o local). A
turbação legitima a ação de manutenção de posse;
c) violência iminente: a violência iminente caracteriza-se por atos de terceiro
que caracterizem ameaça de esbulho ou de turbação da posse, dando ao
possuidor o direito ao interdito proibitório.
Essas são as hipóteses que legitimam o possuidor a requerer a proteção judicial
da posse. Autoriza-se, entretanto, que o possuidor se mantenha ou se restitua na posse
por força própria, contanto que o faça logo e que os atos de defesa da posse não
ultrapassem os limites do indispensável à manutenção ou restituição. A isso se dá o
nome de desforço imediato ou desforço incontinenti, previsto no art. 1.210, § 1.º:
15
O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por
sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de
desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou
restituição da posse.
Por fim, deve-se mencionar, também, a proteção possessória conferida pelos
embargos de terceiro senhor e possuidor ou apenas possuidor. Com efeito, ao permitir
a norma processual (CPC, art. 1.046, § 1.º) a defesa da posse contra atos judiciais de
constrição, confere-se previsão clara de proteção possessória ao possuidor da coisa.
2.6.1.1. Alegação de domínio na pendência do processo possessório
A exemplo da normatização anterior, continua vedada a alegação (ou exceção)
de domínio sobre a coisa na pendência do processo possessório. É que, sendo a ação de
caráter possessório, destina-se ela à proteção da justa posse do possuidor, a qual se pode
dar, inclusive, contra o proprietário. Por isso, não se admite, na ação puramente
possessória, a alegação de domínio.
A respeito, disciplina o art. 1.210, § 2.º do Código Civil: “não obsta à
manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro direito
sobre a coisa”.
No mesmo sentido, a norma do art. 923 do Código de Processo Civil, que reza
que “na pendência do processo possessório, é defesa, assim ao autor como ao réu,
intentar a ação de reconhecimento do domínio”.
A Súmula 487 do Supremo Tribunal Federal, no entanto, esclarece que “será
deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio; se com base neste for ela
disputada”, ou seja, somente se defere a posse com base no domínio se a ação for
intentada, pelo autor, com fundamento na propriedade. Neste caso, a ação possessória se
aproxima da petitória (ação na qual se pretende o reconhecimento da propriedade),
embora não perca o caráter possessório.
Em verdade, admite-se a decisão em favor de quem seja o proprietário não só
quando a posse é disputada com base no domínio, mas, também, quando houver, nos
autos, sobre quem detenha a posse justa sobre a coisa.
2.6.2. Direito aos frutos
a) possuidor de boa-fé: o possuidor de boa-fé que perder a posse e, por isso, for
obrigado a restituir a coisa ao legítimo dono, tem direito sobre os frutos
percebidos e colhidos no devido tempo em que conservava a boa-fé (art. 1214).
Os frutos pendentes ao tempo que cessar a boa-fé, assim como os colhidos por
antecipação, devem ser restituídos. Para efeito de restituição, reputam-se
colhidos ou percebidos os frutos naturais ou industriais logo que são separados,
enquanto os frutos civis se reputam dia a dia (art. 1215);
b) possuidor de má-fé: de má-fé o possuidor, além de não ter direito a nenhum
fruto, deverá restituir ou indenizar pelos frutos colhidos e percebidos, bem como
pelos percepiendos ou pendentes que não houver colhido por sua culpa, desde o
16
momento em que se constituiu a má-fé. Todavia, tem direito de ser indenizado
das despesas de produção e custeio (art. 1216).
2.6.3. Perda ou deterioração da coisa
A perda representa a completa inutilização da coisa, por incêndio, terremoto,
perda em sentido próprio, ou outra causa; a deterioração, decorre da diminuição da
utilidade para o fim a que se destina.
a) possuidor de boa-fé: o possuidor de boa-fé não responde pela perda, nem pela
deterioração da coisa, salvo se a culpa for sua;
b) possuidor de má-fé: o possuidor de má-fé responderá pela perda ou a
deterioração ainda que o seja acidental, salvo se provar que uma ou outra
ocorreria mesmo que a coisa estivesse em mãos do legítimo possuidor (art.
1218).
2.6.4. Direito às benfeitorias
2.6.4.1. Noções
O direito às benfeitorias varia conforme a sua natureza e conforme a qualidade
do possuidor. As benfeitorias podem ser necessárias, úteis ou voluptuárias, conforme
tenham por fim conservar a coisa ou evitar que se deteriore, aumentar ou facilitar o seu
uso ou sirvam para simples deleite ou recreio, sem aumentar o uso habitual, embora a
torne mais agradável ou seu valor seja elevado (art. 96).
Conforme seja de boa-fé ou de má-fé o possuidor e conforme a natureza da
benfeitoria, varia a solução do problema em caso de restituição da coisa.
2.6.4.2. Possuidor de boa-fé
Ao possuidor de boa-fé que tiver de restituir a coisa em que houver introduzido
benfeitoria, é assegurado o direito de ser indenizado pelo valor delas, podendo inclusive
exercer o direito de retenção da coisa em seu todo até que o seja pelo valor das
benfeitorias úteis ou necessárias. Quando voluptuária a benfeitoria, ao invés de direito
de retenção, tem direito de retirá-la do local, se o puder sem danificar a coisa.
Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das
benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não
lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e
poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias
necessárias e úteis.
2.6.4.3. Possuidor de má-fé
Se de má-fé o possuidor, outros serão os desfechos: direito de ser indenizado
somente pelas benfeitorias necessárias, mas sem direito de retenção, e perda
incontinenti das benfeitorias voluptuárias sem qualquer indenização.
17
Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as
benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela
importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.
É omisso o Código quanto às benfeitorias úteis. A doutrina tem opinião de que o
possuidor de má-fé perde tanto as benfeitorias úteis como as voluptuárias.
2.7. Perda da posse
A posse se perde, em se adotando a teoria objetiva de Ihering, assim que o
possuidor deixa de exercer sobre as coisas os poderes próprios do domínio, tal como
reza o art. 1.223: “perde-se a posse quando cessa, embora contra a vontade do
possuidor, o poder sobre o bem , ao qual se refere o art. 1.196”.
Por outro lado, dispõe o art. 1.224 que só se considera perdida a posse para
quem não presenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar a
coisa, ou, tentando recuperá-la, é violentamente repelido. Tal não significa que, sendo
violentamente repelido o justo possuidor, a posse do agressor ou clandestino passe a ser
justa. O dispositivo tem o condão apenas de fixar o exato momento da perda da posse.
Tanto é que, para se adquirir a propriedade por usucapião ordinário, exige-se justo
título e boa-fé, circunstâncias que são excluídas em caso de posse injusta.
Tal dispositivo quer dizer que a posse violenta ou clandestina somente se
convalida, pelo decurso de prazo, se obtida na presença do antigo possuidor e sem
nenhuma reação posterior deste.
Se o possuidor não presenciou o esbulho nem teve notícia posterior dele, não se
convalida a posse injusta, não gerando, pois, nenhum efeito a apreensão violenta ou
clandestina. Da mesma forma, só se considera perdida a posse para o que tenta
recuperá-la após ser repelido violentamente. Enquanto perdurarem os atos de tentativa
de recuperação da posse, não se considera esta perdida.
3. Direitos reais
No título específico sobre os direitos reais, o Código Civil dispõe, no art. 1.225,
o rol dos direitos reais, dele constando: I - a propriedade; II - a superfície; III - as
servidões; IV - o usufruto; V - o uso; VI - a habitação; VII - o direito do promitente
comprador do imóvel; VIII - o penhor; IX - a hipoteca; X - a anticrese.
Com relação ao antigo código, o legislador excluiu a enfiteuse3 e incluiu o
direito de superfície.
Além disso, o código estabelece que a propriedade ou qualquer outro direito
3
No art. 2.038, o Código proíbe a constituição de novas enfiteuses, mas excepciona as já existentes, que
continuarão regidas pelo CC-1916 e aquelas constituídas sobre terrenos de marinha verbis: Art. 2.038.
Fica proibida a constituição de enfiteuses e subenfiteuses, subordinando-se as existentes, até sua extinção,
às disposições do Código Civil anterior, Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916, e leis posteriores. § 1º Nos
aforamentos a que se refere este artigo é defeso: I - cobrar laudêmio ou prestação análoga nas
transmissões de bem aforado, sobre o valor das construções ou plantações; II - constituir subenfiteuse. §
2º A enfiteuse dos terrenos de marinha e acrescidos regula-se por lei especial.
18
real, de fato, não se transmite, no regime jurídico pátrio, pelo mero concurso da vontade
das partes, mas apenas com a tradição, em se tratando de bens móveis (art. 1.226) ou
pelo registro em cartório, em caso de bens imóveis (art. 1.227).
4. Propriedade
4.1. Breve histórico da propriedade:
4.1.1. Concepção conflituosa: Richard Pipes4 conta que, na Antigüidade Clássica,
sobretudo na chamada Idade do Ouro (período que o autor chama de passado místico)
preponderou a ausência de propriedade privada, existindo, somente, a chamada
propriedade comunal, época na qual, portanto, são desconhecidas as palavras meu e seu.
Conta-nos, ainda, sobre as filosofias divergentes de Platão e Aristóteles. O
primeiro defendia a comunidade ideal, a exemplo da sociedade do pretérito, porquanto a
propriedade era a motivação da luta de classes. Sem ela, portanto, não mais haveria
motivo para “a violência, as disputas ou a adulação”.5 Já Aristóteles, embora
compartilhasse com seu mestre a concepção de que desigualdades extremas levassem à
luta de classes, via na propriedade um atributo da família, e não da comunidade ou do
Estado. Aristóteles baseou sua filosofia em argumentos utilitaristas e não idealistas.
Para ele, a propriedade comunal era impraticável, porque ninguém cuida bem de objetos
que não sejam seus e, ainda mais, pessoas que possuem coisas em comum tendem a
brigar mais do que aquelas que as possuem individualmente.6 Sendo a causa da
discórdia, portanto, o desejo, e não a propriedade em si, era mais viável conseguir-se a
paz social com o esclarecimento do que pela abolição da propriedade privada.
Entretanto, Aristóteles tinha como ideal a propriedade que não causasse
diferenças extremas, tendo, como sociedade perfeita, aquela que fosse baseada na classe
média.
4.1.2. Concepção absolutista: Paulo Torminn Borges7 traça um histórico de evolução do
direito de propriedade no mundo, dizendo-a absoluta entre os romanos. Isto quer dizer
que o direito do proprietário, de usar, gozar e dispor da coisa, não poderia ser
restringido de forma alguma, nem sob qualquer pretexto.
- Propriedade feudal: exercida por uma pequena casta, sob a legitimação do
poder clerical, possibilitando aos ocupantes da terra apenas a posse, com pagamento de
tributos aos senhores feudais. Sobrevive, de certa forma, no instituto da enfiteuse.
- Revolução francesa: Para o ideário liberal, o que não se concebia era a
desigualdade de oportunidades entre os homens para aquisição da propriedade,
contrapondo-se, portanto, às teorias cristãs (que legitimavam a propriedade apenas nas
mãos dos escolhidos de Deus), fundamento básico da manutenção da propriedade feudal
na Idade Média. Segundo Paulo Torminn8, o ideário liberal da revolução francesa só fez
4
PIPES, Richard. Propriedade e Liberdade. Rio de Janeiro : Recordd, 2001, ps 24-33.
PIPES, Richard. Ob. citada, p. 27.
6
PIPES, Richard. Ob. citada, p. 28.
7
BORGES, Paulo Torminn. Institutos Básicos do Direito Agrário. 3.ª ed., São Paulo : Pró-Livro, 1978,
ps. 21/29
8
Idem.
5
19
solidificar a idéia absolutista de propriedade, quando, em seu art. 544, o Código de
Napoleão reza que a propriedade é o direito de gozar e dispor das coisas da maneira
mais absoluta. Entretanto, observa-se, no mesmo dispositivo, que referido uso não
poderia violar as leis e regulamentos.
- O Código Civil de 1916 adotava essa vertente, em seu art. 524, quando
dispunha apenas os poderes de uso, gozo, disposição e seqüela do proprietário, sem
adotar nenhuma limitação ditada pelo interesse social, mas apenas as limitações
decorrentes do direito de vizinhança, que, em outras palavras, eram ditadas pela
propriedade de outrem.
4.1.3. Concepção relativista – função social da propriedade: do conceito individualista
visto acima, a propriedade evoluiu para o conceito de função social.
Paulo Torminn9 traça esta evolução desde Santo Tomás de Aquino.
Para Tomás de Aquino, a propriedade é legitimada por ser um direito natural,
existindo três planos distintos, na ordem de valores:
- direito natural de apossamento: como animal racional, é natural ao homem
apossar-se de bens materiais para satisfazer-se, economicamente, deles;
- direito de apropriação: decorrente do direito de apossamento, o direito de
apropriação consiste em que o homem, apossando-se dos bens materiais, tem,
por sua natureza de auto-preservação e preocupação com as gerações futuras, o
direito de reservar, para si (para seu próprio futuro e para os sucessores),
reservas econômicas que lhe garantam o sustento;
- possibilidade de condicionamento da propriedade ao momento histórico do
povo, desde que não se chegue ao extremo de negá-lo;
Já as encíclicas papais, com especial enfoque nas encíclicas rerum novarum
(Leão XIII), Quadragésimo anno (Pio XII) e Mater et Magistra, reconhecem na
propriedade um direito natural do homem, mas enfatizam a necessidade da realização
do bem comum.
Por fim, o Estatuto da Terra, em 1964, em seu art. 2.º, § 1.º, traz os requisitos
para que a propriedade cumpra sua função social.
Atualmente, a função social ampara-se também no art. 5.º, XXIII da
Constituição Federal e no novo Código Civil, cujo art. 1.228, §§ 1.º a 5.º dispõe sobre a
necessidade de a propriedade cumprir suas finalidades econômicas e sociais, devendo
ser exercida de modo que sejam preservados a flora, a fauna, as belezas naturais, o
equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição
do ar e das águas, podendo o proprietário ser privado da coisa em caso de utilidade
pública, interesse social, ou de posse coletiva da terra extensa, ocupada por mais de
cinco anos.
4.2. Conceito
9
Ibidem.
20
Propriedade é direito de usar, gozar e dispor de uma coisa, bem como de reavêla de quem quer que injustamente a possua ou detenha, consoante definição legal do art.
1.228, caput do Código Civil.
Assim, a propriedade envolve o elemento interno, relativo ao proprietário, de
poder usar e gozar da coisa, conforme suas necessidades, bem como de dispor desse
poder, caso queira, seja alienando a propriedade em si ou transferindo a outrem alguns
de seus atributos, como a posse direta e a dação em garantia pelo pagamento de dívidas,
por exemplo.
Envolve, também, o elemento externo, que é o de se poder reaver a coisa de quem quer
que injustamente a possua.
4.3. Propriedade e domínio
Tem-se entendido, na lei, que propriedade e domínio são sinônimos. Entretanto, a
doutrina difere os dois conceitos, da seguinte forma:
a) Propriedade: direito que dá ao proprietário a faculdade de usar e gozar de coisa
incorporada ao seu patrimônio, como queira, podendo ser exercido, portanto, sobre
coisas corpóreas e incorpóreas;
b) Domínio: direito que dá ao dominus faculdade de dominação total da coisa,
incluindo não só a noção de jus utendi et fruendi, mas também a de jus abutendi, ou
seja, faculdade de dispor da coisa como bem entender, até mesmo com sua
destruição. Em função dessas características, entende-se que o domínio se exerce,
exclusivamente, sobre coisas corpóreas.
4.4. Elementos
Disciplina o art. 1.228 que ―o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e
dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua
ou detenha‖
Assim, podemos atribuir, como elementos da propriedade:
a) jus utendi: é o direito de usar a coisa, auferindo a sua utilidade;
b) jus fruendi: é o chamado direito de gozo, que envolve a percepção dos
frutos e produtos e demais vantagens provenientes da coisa;
c) jus abutendi: é o direito de dispor da coisa, o que envolve alienar,
gravar de ônus, destruir, consumir ou transformar a coisa;
Além desses elementos clássicos, vê-se que o dispositivo do art. 1.228 dá ao
proprietário, também, o direito de seqüela, ao lhe permitir o direito de reaver a coisa de quem
quer que injustamente a possua ou detenha.
4.5. Delimitação do direito de propriedade
A propriedade se presume plena e exclusiva, até prova em contrário, consoante dicção
do art. 1.231 do Código Civil. Entretanto, pode o proprietário mesmo limitar o alcance de seu
direito, ao gravar a coisa com ônus reais (hipoteca, penhor, anticrese, etc.) ou conferir a outrem
alguns de seus atributos, como nos direitos reais de uso, usufruto, habitação. Algumas dessas
limitações pode decorrer também da lei e não somente da vontade do proprietário, como ocorre
no caso de usufruto legal dos bens dos filhos pelos pais (art. 1.689, I), o direito de habitação do
21
cônjuge sobrevivente (art. 1.831), etc.
Além das limitações ao conteúdo do direito de propriedade, a lei estabelece, com
relação aos imóveis, o âmbito espacial de seu alcance, ao dispor, no art. 1.229:
1.229. A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo
correspondentes, em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não podendo
o proprietário opor se a atividades que sejam realizadas, por terceiros, a uma
altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em impedi-las.
Referido dispositivo estabelece a parêmia de que o direito de propriedade do
solo não tem alcance ad sidera et ad ínferos, porque somente pode servir até onde
importar a utilidade de interesse do proprietário.
Além disso, em função do interesse público, bem como de expressa
determinação constitucional presente nos arts. 176 e 177 da Constituição Federal,
disciplina o art. 1.230:
Art. 1.230. A propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais
recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os monumentos
arqueológicos e outros bens referidos por leis especiais. Parágrafo único. O
proprietário do solo tem o direito de explorar os recursos minerais de emprego
imediato na construção civil, desde que não submetidos a transformação
industrial, obedecido o disposto em lei especial.
4.5.1. Direito aos frutos e produtos
Ademais, ―os frutos e mais produtos da coisa pertencem, ainda quando
separados, ao seu proprietário, salvo se, por preceito jurídico especial, couberem a
outrem (art. 1.232).
4.5.2. Descoberta
A descoberta (denominada de invenção no sistema anterior) está prevista no art.
1.233:
Art. 1.233. Quem quer que ache coisa alheia perdida há de restituí-la ao dono
ou legítimo possuidor. Parágrafo único. Não o conhecendo, o descobridor fará
por encontrá-lo, e, se não o encontrar, entregará a coisa achada à autoridade
competente.
Assiste ao inventor, nos termos do art. 1.234, direito de recompensa não inferior
a 5% do valor da coisa, além de indenização pelas despesas que houver feito com a
conservação e transporte da coisa. Se o dono preferir abandoná-la, o inventor adquire a
propriedade.
Se o inventor não encontrar o proprietário, deverá levar a coisa à autoridade, que
dará conhecimento da descoberta através da imprensa (art. 1.235). Não encontrado o
dono, a propriedade se transfere ao Município onde se encontrou a coisa, deduzidas as
despesas e a recompensa do inventor (art. 1.237).
Sendo de diminuto valor, poderá o Município abandonar a coisa em favor de
22
quem a achou (art. 1.237, parágrafo único)
4.6. Limitações ao direito de propriedade
4.6.1. Princípio da função social da propriedade e limitações ao exercício do direito de
propriedade
A função social da propriedade não significa que este direito não seja mais
garantido, até porque a localização tópica do princípio da função social (CF, art. 5.º,
XXIII) vem logo após o da própria garantia do direito de propriedade (CF, art. 5.º,
XXII).
Entende-se, por função social, portanto, a exigência legal de que a propriedade,
rural ou urbana, atenda a requisitos mínimos, estabelecidos em lei, de atendimento ao
interesse da sociedade. Assim, temos:
4.6.2. Elementos da função social da propriedade rural
a) Na Constituição Federal de 1988 (art. 186)10:
I - aproveitamento racional e adequado;
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio
ambiente;
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
b) Na Lei 8.629/93 (art. 9.º)
I – aproveitamento racional e adequado (art. 9.º, § 1.º): Considera-se racional e
adequado o aproveitamento que atinja os graus de utilização da terra e de
eficiência na exploração especificados nos §§ 1º a 7º do art. 6º desta Lei.
Art. 6º Considera-se propriedade produtiva aquela que, explorada econômica e
racionalmente, atinge, simultaneamente, graus de utilização da terra e de eficiência na
exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente.
§ 1º O grau de utilização da terra, para efeito do caput deste artigo, deverá ser igual ou
superior a 80% (oitenta por cento), calculado pela relação percentual entre a área
efetivamente utilizada e a área aproveitável total do imóvel.
§ 2º O grau de eficiência na exploração da terra deverá ser igual ou superior a 100%
(cem por cento), e será obtido de acordo com a seguinte sistemática: I - para os
produtos vegetais, divide-se a quantidade colhida de cada produto pelos respectivos
índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para
cada Microrregião Homogênea; II - para a exploração pecuária, divide-se o número
total de Unidades Animais (UA) do rebanho, pelo índice de lotação estabelecido pelo
órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea; III - a
soma dos resultados obtidos na forma dos incisos I e II deste artigo, dividida pela área
10
O Estatuto da Terra, editado em 30/11/1964, já traçava, parcialmente esses requisitos, em seu art. 2.º, §
1.º, in verbis: A propriedade da terra desempenha integralmente a sua função social quando,
simultâneamente: a) favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim
como de suas famílias; b) mantém níveis satisfatórios de produtividade; c) assegura a conservação dos
recursos naturais; d) observa as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os
que a possuem e a cultivem.
23
efetivamente utilizada e multiplicada por 100 (cem), determina o grau de eficiência na
exploração.
§ 3º Consideram-se efetivamente utilizadas: I - as áreas plantadas com produtos
vegetais; II - as áreas de pastagens nativas e plantadas, observado o índice de lotação
por zona de pecuária, fixado pelo Poder Executivo; III - as áreas de exploração
extrativa vegetal ou florestal, observados os índices de rendimento estabelecidos pelo
órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea, e a
legislação ambiental; IV - as áreas de exploração de florestas nativas, de acordo com
plano de exploração e nas condições estabelecidas pelo órgão federal competente; V as áreas sob processos técnicos de formação ou recuperação de pastagens ou de
culturas permanentes.
§ 4º No caso de consórcio ou intercalação de culturas, considera-se efetivamente
utilizada a área total do consórcio ou intercalação.
§ 5º No caso de mais de um cultivo no ano, com um ou mais produtos, no mesmo
espaço, considera-se efetivamente utilizada a maior área usada no ano considerado.
§ 6º Para os produtos que não tenham índices de rendimentos fixados, adotar-se-á a
área utilizada com esses produtos, com resultado do cálculo previsto no inciso I do § 2º
deste artigo.
§ 7º Não perderá a qualificação de propriedade produtiva o imóvel que, por razões de
força maior, caso fortuito ou de renovação de pastagens tecnicamente conduzida,
devidamente comprovados pelo órgão competente, deixar de apresentar, no ano
respectivo, os graus de eficiência na exploração, exigidos para a espécie.
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio
ambiente;
II.a) utilização adequada dos recursos naturais (art. 9.º, § 2.º): Considerase adequada a utilização dos recursos naturais disponíveis quando a
exploração se faz respeitando a vocação natural da terra, de modo a
manter o potencial produtivo da propriedade.
II.b) preservação do meio ambiente (art. 9.º, § 3.º): Considera-se
preservação do meio ambiente a manutenção das características
próprias do meio natural e da qualidade dos recursos ambientais, na
medida adequada à manutenção do equilíbrio ecológico da propriedade
e da saúde e qualidade de vida das comunidades vizinhas.
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho (art. 9.º, §
4.º): A observância das disposições que regulam as relações de trabalho implica
tanto o respeito às leis trabalhistas e aos contratos coletivos de trabalho, como
às disposições que disciplinam os contratos de arrendamento e parceria rurais;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores
(art. 9.º, § 5.º): A exploração que favorece o bem-estar dos proprietários e
trabalhadores rurais é a que objetiva o atendimento das necessidades básicas
dos que trabalham a terra, observa as normas de segurança do trabalho e não
provoca conflitos e tensões sociais no imóvel.
4.6.3. Elementos da função social da propriedade urbana
O imóvel urbano atende a função social quando cumpre as exigências
estabelecidas pelo Plano Diretor do Município, que é constitucionalmente obrigatório
apenas para as cidades com mais de vinte mil habitantes (art. 182, § 3º, CF), sem
prejuízo de outras cidades, cuja exigência decorre do art. 41 do Estatuto da Cidade, o
qual também dispõe acerca da função social da propriedade urbana:
24
Art. 39. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências
fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o
atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e
ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no
art. 2º desta Lei.
4.6.4. Limitações ao exercício do direito de propriedade no Código Civil
A necessidade, portanto, de se respeitar a função social da propriedade,
determina que esse direito sofra limitações que não só aquelas que provinham dos
chamados direitos de vizinhança. Por tais razões, o art. 1.228 do novo código, embora
reconheça o direito de usar, gozar e dispor da coisa, determina algumas limitações ao
direito de propriedade, como se pode ver, in verbis:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da
coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a
possua ou detenha.
§ 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as
suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam
preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a
flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio
histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.
§ 2º São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer
comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar
outrem.
§ 3º O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de
desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse
social, bem como no de requisição, em caso de perigo público
iminente.
Outras limitações existem em dispositivos esparsos, como a do art. 1.278 do
Código Civil, que prevê que o interesse público pode determinar a interferência no
exercício do direito de propriedade. Veja-se:
Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de
fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à
saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade
vizinha.
Parágrafo único. Proíbem-se as interferências considerando-se a
natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que
distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância
dos moradores da vizinhança.
Art. 1.278. O direito a que se refere o artigo antecedente não
prevalece quando as interferências forem justificadas por interesse
público, caso em que o proprietário ou o possuidor, causador delas,
pagará ao vizinho indenização cabal.
4.6.4.1. A chamada desapropriação judicial (art. 1.228, §§ 4.º e 5.º)
O art. 1.228, §§ 4.º e 5.º prevê:
§ 4º O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel
reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boafé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas
nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e
serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico
relevante.
25
§ 5º No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização
devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para
o registro do imóvel em nome dos possuidores.
Trata-se de claro exemplo de limitação ao direito de propriedade, pois o
proprietário será privado da coisa, se presentes os requisitos acima previstos.
4.6.4.1.1. Natureza jurídica
A natureza jurídica é de desapropriação, e não de usucapião, embora esteja
condicionada ao decurso de prazo, pois, na usucapião, não existe indenização ao
proprietário. É judicial, pois depende de iniciativa dos interessados e de sentença
judicial constitutiva. Na desapropriação pública, existe ato administrativo declaratório
da desapropriação, o que não ocorre no caso em estudo.
4.6.4.1.2. Requisitos
Segundo NERY Jr e ANDRADE NERY11, os elementos da desapropriação
judicial são referentes à posse exercida e ao imóvel objeto da medida.
a) com relação ao imóvel:
a1) exercício de posse sobre imóvel de outrem
a2) imóvel com área extensa
b) com relação à posse:
b1) boa-fé12;
b2) ininterrupta por cinco anos;
b3) exercício conjunto por número considerável de pessoas;
b4) realização, no imóvel, em conjunto ou separadamente, de obras e
serviços consideráveis de interesse social e econômico relevante. Tem-se
chamado esta característica da posse de posse-trabalho.
4.6.4.1.3. Exercício
Exerce-se esse direito não só através da defesa na ação reivindicatória, mas,
também, através de ação autônoma. A transcrição no Registro de Imóveis, entretanto,
nos termos do art. 1.228, § 5.º, fica condicionada ao pagamento do preço estabelecido
para a indenização.13
11
NERY Jr, Nélson e NERY, Rosa Maria Andrade. Código Civil Comentado e Legislação Extravagante.
3.ª ed. São Paulo : Revista dos Tribunais. 2005, p. 635.
12
A lei exige a boa-fé, mas não o justo título.
13
Jornada STJ, Enunciado 241: “O registro da sentença em ação reivindicatória, que opera
transferência da propriedade para o nome dos possuidores, com fundamento no interesse social (art.
1.228, § 5.º), é condicionada ao pagamento da respectiva indenização, cujo prazo será fixado pelo juiz”.
26
4.6.5. Outras limitações
Como já se frisou, existem limitações ao direito de propriedade impostas pelo
próprio proprietário, como a faculdade de gravar a coisa de ônus reais e de instituir
sobre ela direito real em favor de terceiro, como servidão, usufruto, uso e habitação.
Outras limitações, embora civis, podem não decorrer da vontade do proprietário,
como a penhora, as chamadas servidões legais (direito de passagem, aqueduto, etc.) e as
limitações impostas pelo Poder Público, de cunho militar (CF, art. 5.º, XXV),
administrativo (desapropriações, servidões administrativas, como postes de rede
elétrica, etc). ou eleitoral (requisição de locais de votação, de veículos, etc.)
27
4.7. Aquisição da propriedade
a) Formas de aquisição da propriedade:
a1) Derivada: adquire-se a propriedade de forma derivada quando a
aquisição decorre de relação negocial entre alienante e adquirente (ato
inter vivos) ou decorra de relação sucessória (causa mortis).
a2) Originária: diz-se originária a aquisição da propriedade quando o
adquirente a obtém sem o intermédio de relação negocial com algum
proprietário antigo, como se dá na ocupação, na acessão e, para a
maioria da doutrina, na usucapião14. A principal característica que difere
a aquisição originária da derivada é o fato de que, na aquisição originária,
a propriedade se transfere ao adquirente sem os vícios e ônus que
incidiam, anteriormente, sobre a mesma coisa.
b) Sistemas de aquisição da propriedade:
b1) Aquisição pelo contrato: no ordenamento jurídico francês, o negócio
jurídico válido é suficiente para transmitir a propriedade;
b2) Aquisição pela tradição ou transcrição: no direito brasileiro,
inspirado no sistema alemão, a propriedade não se transmite
simplesmente pelo contrato, mas somente após a tradição (no caso de
móveis) ou transcrição (no caso de imóveis) Dispõe o art. 1.267 do
Código Civil que “a propriedade das coisas não se transfere pelos
negócios jurídicos antes da tradição”. Por sua vez, o art. 1.245 prevê:
“Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título
translativo no Registro de Imóveis. § 1º Enquanto não se registrar o
título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do
imóvel”. Na prática, enquanto não operada a tradição ou transcrição, a
ação do adquirente, contra o alienante será pessoal, para cumprimento da
obrigação de fazer consistente na transmissão da propriedade.
4.7.1. Aquisição da propriedade imóvel
4.7.1.1. Usucapião
4.7.1.2. Conceito
Usucapião é forma originária de aquisição da propriedade, na qual o possuidor
de coisa alheia exerce a posse, de forma contínua e pacífica (sem oposição) por período
de tempo suficiente, segundo a lei, para adquirir a propriedade.
Costuma-se denominar a usucapião, também, de prescrição aquisitiva.
Prescrição porque implica na perda de um direito (propriedade) pelo não exercício, pelo
decurso do tempo; aquisitiva porque leva à aquisição da propriedade pelo possuidor, em
oposição à prescrição extintiva, que importa apenas na perda do direito.
14
Caio Mário da Silva Pereira, por exemplo, entende que a usucapião é forma derivada de aquisição da
propriedade.
28
Importante notar que a posse apta a gerar usucapião é somente aquela exercida
com animus domini, ou seja, se o possuidor tem poder sobre a coisa em virtude de
relação jurídica com o dono (nos casos de locação, comodato e depósito, por exemplo),
ou em hipótese de mera detenção (ou fâmulo da posse) a posse nunca poderá ser capaz
de gerar usucapião, porque não é vestida do ânimo de ser dono.
Assim, a lei utiliza-se, constantemente, da expressão possuir como seu/sua nos
dispositivos referentes à usucapião (arts. 1.238/1.242).
4.7.1.3. Natureza
Enquadra-se a usucapião entre os modos de aquisição originária da propriedade,
porque entre o usucapiente e o proprietário não existe vínculo. Como conseqüência, a
propriedade adquirida pela usucapião se incorpora sem os ônus e vícios porventura
existentes sobre o direito do anterior proprietário.
4.7.1.4. Extensão
A usucapião é modo de aquisição não só do direito de propriedade, como
também da servidão (art. 1.379).
Além disso, somente bens particulares podem ser objeto de usucapião, já que os
arts. 183, § 3.º e 191, parágrafo único da Constituição Federal dispõem, expressamente,
que os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.
Não obstante, o Estatuto da Cidade (lei nº 10.257/01) instituiu a concessão de
uso para fins de moradia em imóveis públicos, prevista em seus arts. 15 e ss, entretanto,
tal disposição foi vetada pelo presidente da república.
4.7.1.5. Espécies de usucapião
4.7.1.5.1. Usucapião extraordinária
A usucapião extraordinária está prevista no art. 1.238 do Código Civil. Reza o
dispositivo:
Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição,
possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de
título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a
qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Diante do dispositivo, percebe-se que os requisitos da usucapião extraordinária
são:
a) posse, com animus domini, com os seguintes caracteres:
a1) ininterrupção: não pode haver interrupção no exercício da
posse ad usucapionem. Assim, a perda da posse, ou mesmo a
simples oposição, pelo proprietário, desse poder de fato sobre a
coisa, inviabiliza a aquisição da propriedade;
a2) pacificidade: a posse do usucapiente deve ocorrer sem
29
oposição do proprietário. A oposição se caracteriza por atos que
caracterizem a intenção de retomar a coisa, como o desforço
imediato, a notificação extrajudicial, o ajuizamento de ação
reivindicatória, etc;
a3) prazo de quinze anos: o prazo de posse mansa e ininterrupta,
para a usucapião extraordinária, é de quinze anos. Esse prazo
“reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no
imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou
serviços de caráter produtivo”. (art. 1.238, parágrafo único);
a4) independência de justo título e boa-fé: no caso da usucapião
extraordinária, o legislador privilegia o grande lapso de tempo em
que a coisa já se encontra em poder do possuidor, razão por que
não se lhe exige a prova de justo título ou boa-fé para o exercício
da posse. Na prática, conclui-se que, ainda que o possuidor tenha
obtido a posse de forma injusta, nas modalidades violenta ou
clandestina, caracteriza-se a posse ud usucapionem, para efeito de
usucapião extraordinária, a partir do momento em que o
proprietário se desinteressa de reaver a coisa, pois, nos termos do
art. 1.224, “só se considera perdida a posse para quem não
presenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de
retornar a coisa, ou, tentando recuperá-la, é violentamente
repelido”.
4.7.1.5.2. Usucapião ordinária
A usucapião ordinária encontra-se disciplinada no art. 1.242, in verbis:
Art. 1.242. Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e
incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.
São requisitos da usucapião ordinária, portanto:
a) posse, com animus domini, com os seguintes caracteres:
a1) continuidade: aqui, da mesma forma, não pode haver
interrupção (solução de continuidade) no exercício da posse ad
usucapionem. Assim, a perda da posse, ou mesmo a simples
oposição, pelo proprietário, desse poder de fato sobre a coisa,
inviabiliza a aquisição da propriedade;
a2) incontestabilidade: de igual modo, a posse do usucapiente,
para a modalidade ordinária, também deve ser pacífica, ou seja,
sem oposição do proprietário. A oposição se caracteriza por atos
que caracterizem a intenção de retomar a coisa, como o desforço
imediato, a notificação extrajudicial, o ajuizamento de ação
reivindicatória, etc.;
a3) prazo de dez anos: o prazo de posse mansa e ininterrupta, para
a usucapião ordinária, é de dez anos. “Será de cinco anos o prazo
previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido,
onerosamente, com base no registro constante do respectivo
cartório, cancelada posteriormente, desde que os possuidores
nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado
investimentos de interesse social e econômico”. (art. 1.242,
30
parágrafo único);
a4) Justo título e boa-fé: quando se trata de usucapião ordinário, é
imprescindível que o possuidor demonstre que adquiriu a posse de
boa-fé, o que significa o desconhecimento de circunstâncias que
tornem a posse injusta; além disso, exige-se o justo título. Por
justo título, tem-se, em doutrina, o título que, em tese, seria apto
para transferir a propriedade. Diz-se em tese porque se, na prática,
ele for apto, a usucapião é desnecessária. Assim, segundo Orlando
Gomes, o justo título é o título de aquisição ineficaz. O mesmo
autor dispõe sobre três casos nos quais se impede a eficácia do
título: a4.1) aquisição a non domino, ou seja aquisição da coisa,
pelo possuidor, de quem não seja dono; a4.2) aquisição a domino
nula, seja por incapacidade do dominus ou por alguma outra
nulidade de pleno direito; a4.3) erro no modo de aquisição, como
no caso da aquisição, por instrumento particular, de bem para cuja
aquisição a lei exigia escritura pública.15
4.7.1.5.3. Usucapião especial urbana
A usucapião especial urbana, agora expressamente disciplina no Código Civil, já
era prevista pelos arts. 183 da Constituição Federal e 9.º do Estatuto da Cidade. Prevê o
art. 1.240 do Código Civil:
Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e
cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição,
utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio,
desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. § 1º O título
de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a
ambos, independentemente do estado civil. § 2º O direito previsto no parágrafo
antecedente não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.
Seus requisitos são aqueles estabelecidos para a usucapião extraordinária, em
resumo: posse ininterrupta, pacífica e independente de justo título e boa-fé. Além
destes, exige-se, também:
a) utilização da área para moradia do usucapiente ou de sua família;
b) área máxima de 250 m2;
c) inexistência de outros imóveis (urbanos ou rurais) em nome do
possuidor;
d) limitação à aquisição da propriedade, por esta modalidade, somente
uma vez.
O Estatuto da Cidade previu, em seu art. 10, o chamado usucapião coletivo:
Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados,
ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos,
ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos
ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas
coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro
imóvel urbano ou rural.
15
GOMES, Orlando. Direitos Reais. 7.ª ed. Rio : Forense. 1980, ps. 164-165.
31
 Usucapião familiar:
o Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e
cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem
oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á
o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou
rural. § 1o O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao
homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.
4.7.1.5.4. Usucapião especial rural
A usucapião especial rural, agora também expressamente disciplina no Código
Civil, já era prevista pelos arts. 191 da Constituição Federal e 1.º da Lei 6.969/81. Diz o
art. 1.239 do Código Civil:
Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano,
possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em
zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu
trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a
propriedade.
Seus requisitos são aqueles estabelecidos para a usucapião extraordinária, em
resumo: posse ininterrupta, pacífica e independente de justo título e boa-fé. Além
destes, exige-se, também:
a) utilização da área para moradia do usucapiente ou de sua família;
b) área máxima de 50 hectares
b) inexistência de outros imóveis (urbanos ou rurais) em nome do
possuidor;
4.7.1.6. Aplicação de institutos da prescrição extintiva
Aplicam-se ao usucapião as disposições gerais acerca da prescrição extintiva,
por força do art. 1.244:
Art. 1.244. Estende-se ao possuidor o disposto quanto ao devedor acerca das
causas que obstam, suspendem ou interrompem a prescrição, as quais também
se aplicam à usucapião.
Institutos como a citação em ação reivindicatória, por exemplo, então,
interrompem a prescrição aquisitiva em favor do possuidor.
Assim, excluem-se da aplicação da prescrição aquisitiva os proprietários
absolutamente incapazes, porque contra esses não corre a prescrição (art. 198, I).
4.7.1.7. Aspectos processuais.
Para as ações de usucapião ordinária e extraordinária, o Código de Processo
Civil prevê rito especial.
Já as usucapiões especiais devem ser processadas sob o rito sumário, consoante
determinação da Lei 6.969/81, art. 5.º e 14 do Estatuto da Cidade.
32
4.7.1.7.1. Eficácia da sentença
A sentença proferida na ação de usucapião é meramente declaratória. Já houve
quem defendesse a natureza constitutiva da sentença, entretanto, o texto do art. 1.241 do
Código Civil (que já encontrava similar no art. 550 do revogado código) é claro ao
estatuir:
Art. 1.241. Poderá o possuidor requerer ao juiz seja declarada adquirida,
mediante usucapião, a propriedade imóvel. Parágrafo único. A declaração
obtida na forma deste artigo constituirá título hábil para o registro no Cartório
de Registro de Imóveis.
Na prática, tal disposição equivale a dizer que o possuidor, após o decurso do
prazo necessário, já é proprietário da área usucapida, sendo a sentença meramente
declaratória dessa propriedade, com eficácia para transcrição no registro de imóveis.
4.7.1.7.2. Usucapião como defesa
A alegação de usucapião como matéria de defesa, em ação dominial, dá ao
possuidor, em regra, apenas a prerrogativa de permanecer no imóvel, tendo em vista o
reconhecimento da propriedade na fundamentação da sentença.
Assim, a regra é a de que, na ação reivindicatória, por exemplo, a alegação de
usucapião, pelo réu, não terá o efeito de servir como título para transcrição no Registro
de Imóveis.
Esse tratamento decorre de dois motivos básicos: o primeiro é o de que a
alegação de usucapião, em defesa, não tem o condão de modificar o procedimento
ordinário adotado para a reivindicação, por isso, não sendo citados os confinantes, nem
as fazendas públicas, como exige o rito especial da usucapião, não pode a sentença
servir como título para registro; o segundo é o de que a alegação de usucapião como
defesa configura questão prejudicial ao exame do mérito da reivindicatória. Sendo
assim, segue-se o regramento geral do art. 469, I do Código de Processo Civil, que
prevê que não fazem coisa julgada: (...) III – a apreciação da questão prejudicial,
decidida incidentemente no processo.
Há aqueles, entretanto, que defendem a possibilidade de alegação de usucapião
através de ação declaratória incidental (CPC, arts. 5.º, 325 e 470), hipótese em que seu
reconhecimento faria coisa julgada e deveria servir de título para transcrição. Pensamos
que, para que se faça coisa julgada, a usucapião deve ser alegada sempre como
prejudicial externa, ou seja, em outro processo, tendo em vista a incompatibilidade de
seu procedimento com o ordinário estabelecido para a reivindicatória.
Essa regra, entretanto, aplica-se somente às usucapiões ordinária e
extraordinária, pois, nas usucapiões especiais (rural e urbana), existe regramento
expresso na legislação especial. A respeito, o art. 7.º da Lei 6.969/81:
Art. 7.º A usucapião especial poderá ser invocada como matéria de defesa,
valendo a sentença que a reconhecer como título para transcrição no Registro
de Imóveis.
33
De igual teor o art. 13 do Estatuto da Cidade:
Art, 13. A usucapião especial de imóvel urbano poderá ser invocada como
matéria de defesa, valendo a sentença que a reconhecer como título para
registro no cartório de registro de Imóveis.
4.7.1.8. Acessio possessionis
Já vimos que a acessio possessionis (item 2.5.3) é a união da posse do possuidor
sucessor com a do possuidor antecessor, para as finalidades legais.
Essa prerrogativa pode ser utilizada pelo usucapiente, a fim de demonstrar o
prolongamento da posse ininterrupta e pacífica pelo prazo exigido em lei. Para a
usucapião ordinária, entretanto, a posse do antecessor deve conter os requisitos do justo
título e boa-fé, sob pena de inviabilidade da aquisição.
No sistema anterior do Código Civil de 2002, entendia-se que a acessio
possessionis se destinava exclusivamente às usucapiões ordinária e extraordinária, por
ausência de expressa previsão na legislação referente às usucapiões especiais (A Lei
6.969/81, por exemplo, não a previa).
A partir do Estatuto da Cidade, entretanto, passou a ser admitida a acessão de
posse para a usucapião especial urbana, por força dos arts. 9.º, § 3.º e 10, º 1.º.
O novo Código Civil resolveu, definitivamente, a dúvida, ao disciplinar, no art.
1.243:
Art. 1.243. O possuidor pode, para o fim de contar o tempo exigido pelos
artigos antecedentes, acrescentar à sua posse a dos seus antecessores (art.
1.207), contanto que todas sejam contínuas, pacíficas e, nos casos do art. 1.242,
com justo título e de boa-fé.
Repare que os artigos antecedentes ao art. 1.243, no novo código, tratam das
quatro hipóteses de usucapião (extraordinária, especial rural, especial urbana e
ordinária, respectivamente), razão por que se aplica a acessio possessionis a todas elas.
4.7.2. Aquisição pelo registro do título
A forma mais corrente de aquisição da propriedade imóvel, em nosso sistema
jurídica, é o do registro do título. Por registro do título, portanto, tenha-se a transcrição,
no Registro Imobiliário, de algum título hábil para a aquisição da propriedade
imobiliária, como: a escritura pública de compra e venda ou outro negócio jurídico que
vise transmitir a propriedade, como a doação ou a permuta, por exemplo (para imóveis
com valor superior a trinta salários mínimos); a escritura particular, quando o valor do
imóvel não superar os trinta salários mínimos; o formal de partilha, etc.
Já vimos que, em nosso ordenamento, a propriedade não se transmite antes da
tradição ou transcrição (item 4.7, letra b), seguindo a tradição dos sistemas romano e
germânico. Por isso, disciplina o art. 1.245:
34
Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título
translativo no Registro de Imóveis. § 1º Enquanto não se registrar o título
translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel. § 2º
Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de
invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser
havido como dono do imóvel.
Assim, antes do registro, pelo adquirente, o alienante continua a ser havido como
dono do imóvel; de igual forma, uma vez registrada a propriedade em nome do
adquirente, passa ele a ser o dono e assim continua a ser havido até que se promova, por
ação própria, a ação de decretação da invalidade do registro.
A ação para retificação ou anulação do registro se encontra prevista no art.
1.247. A conseqüência do reconhecimento judicial de invalidade do registro é o retorno
da propriedade ao proprietário anterior que conste no cartório de registro de imóveis.
Por isso, o parágrafo único do dispositivo citado prevê que “Cancelado o registro,
poderá o proprietário reivindicar o imóvel, independentemente da boa-fé ou do título
do terceiro adquirente”.
Essa desconsideração da boa-fé do terceiro adquirente se dá porque, caso não
fosse assim, a causa de nulidade ou anulabilidade do título não produziria o efeito
previsto pelo art. 182 do Código Civil, que estatui que “anulado o negócio jurídico,
restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível
restituí-las, serão indenizadas com o equivalente”.
A eficácia do registro se dá a partir do momento em que se apresenta o título ao
oficial, com a prenotação no protocolo (art. 1.246).
4.7.3. Aquisição por acessão
4.7.3.1. Conceito
Acessão significa acréscimo, aumento. Assim, pode o proprietário de um bem
imóvel adquirir propriedade pelo acréscimo, ao bem que já lhe pertencia, de nova
propriedade.
A acessão, portanto, pode ser natural ou por construções e plantações. Aqui
devemos diferenciar o que seja imóvel por natureza (como o solo, a vegetação natural,
os minerais, rios, etc.) dos bens imóveis por acessão natural.
Acessão natural é aquela que ocorre por acontecimento da natureza, sem a
intervenção humana, como na formação de ilhas, na aluvião, na avulsão e no abandono
de álveo.
Nas construções e plantações, diversamente, o acréscimo se dá pelo concurso da
ação humana.
4.7.3.2. Da formação de ilha
O conteúdo do art. 1.249, que disciplina a acessão pela formação de ilhas,
conduz à conclusão de que, ao se formar uma ilha em uma corrente de águas, sua
35
propriedade é automaticamente acrescida à propriedade daquele que for dono de um
imóvel que seja fronteiro à referida ilha.
A aquisição da propriedade, entretanto, ocorre na proporção da proximidade do
imóvel com a ilha.
Assim, as ilhas que se formarem no meio do rio consideram-se acréscimos
sobrevindos aos terrenos ribeirinhos fronteiros de ambas as margens, na proporção da
testada de cada imóvel. Tenha-se, por testada, a extensão da margem do imóvel à frente
da ilha. Além disso, o acréscimo de cada imóvel vai somente até a linha que divide o
álveo (leito do rio) em duas partes iguais.
Destarte, se a ilha se situa entre uma margem e a linha divisória (situada na
metade do leito), pertencerá somente aos proprietários dos imóveis que se situam do
lado onde ela se formar.
Se a ilha se formar pela formação de um novo braço do rio, ela pertencerá ao
proprietário da área invadida pela água.
4.7.3.3. Aluvião
Aluvião é o acréscimo, sucessivo e imperceptível, de depósitos e aterros naturais
pelas correntes nos terrenos marginais. Segundo conceituação de Coelho da Rocha (in
Nery Jr. e Nery, ob. Citada, p. 654), “é o aumento que as correntes dos rios e ribeiras
depositam pouco a pouco nas terras das margens”.
O acréscimo formado pela aluvião pertence ao proprietário do prédio ao qual
adere, sem direito à indenização ao proprietário que teve seu imóvel diminuído.
4.7.3.4. Avulsão
A avulsão, diferentemente da aluvião, ocorre de forma abrupta, quando, por
força natural violenta, uma porção de terra se destacar de um prédio e se juntar a outro.
Nesse caso, o dono do prédio acrescido adquire a propriedade se indenizar o
dono do prédio diminuído. Esse direito de indenização, no entanto, sofre decadência se,
no prazo de 01 (um) ano, não houver reclamação (art. 1.251, caput, parte final).
Se, dentro do prazo, o proprietário prejudicado reclamar e o proprietário
acrescido se negar a indenizar, terá o primeiro o direito à remoção da parte acrescida
(art. 1.251, parágrafo único).
4.7.3.5. Abandono de álveo
Álveo é o leito do rio, por onde passam suas águas. Pode ocorrer de a água
abandonar o álveo, formando porção de terra. Essa terra pertencerá aos proprietários
ribeirinhos de ambas as margens. A propriedade de cada prédio é estendida, portanto,
até o meio do álveo, sem direito de indenização aos donos dos terrenos por onde as
águas abrirem novo curso.
36
Só se caracteriza o álveo abandonado se o abandono for total e permanente. Se
ocorre abandono parcial, por desvio ou retração de águas, ocorre o que se chama de
aluvião imprópria, dando ao proprietário ribeirinho o domínio da porção de terras
acrescida.
4.7.3.6. Das construções e plantações
4.7.3.6.1. Noções
Adquire-se a propriedade imóvel, também, quando se planta ou constrói. O art.
1.253 prevê a regra geral para as construções e plantações, ao dispor que “toda
construção ou plantação existente em um terreno presume-se feita pelo proprietário e à
sua custa, até que se prove o contrário”.
Assim, o proprietário que constrói ou planta em solo próprio adquire, de plano, a
propriedade da construção e plantação que se incorpora ao chão.
Diversas circunstâncias, entretanto, podem indicar a necessidade de tratamento
especial pela lei, dada a possibilidade de realização de construção ou plantação por
terceiros possuidores, de boa ou má-fé. Vejamos:
4.7.3.6.2. Plantação ou construção em solo próprio com sementes, plantas ou materiais
alheios
O proprietário do terreno que planta ou edifica em solo próprio, utilizando-se de
sementes, plantas ou materiais de outrem, adquire a propriedade da plantação ou
construção, entretanto, deve pagar o valor da matéria-prima ao proprietário dela. Se
estiver de má-fé, responde ainda por perdas e danos.
4.7.3.6.3. Plantação ou construção em terreno alheio
Quem realizar plantação ou construção em solo alheio, de qualquer forma perde,
em proveito do proprietário do solo, as sementes, plantas ou construções. A lei lhe dá
diferente tratamento em caso de boa ou má-fé:
a) se age de boa-fé: tem direito à indenização pelo valor da construção ou
plantação;
b) se age de má-fé: não tem direito à indenização;
c) se de ambas as partes houve má-fé: adquirirá o proprietário as sementes,
plantas e construções, devendo ressarcir o valor das acessões. Presume-se má-fé
no proprietário, quando o trabalho de construção, ou lavoura, se fez em sua
presença e sem impugnação sua (art. 1.256, parágrafo único)
d) Construção ou plantação em terreno alheio com sementes plantas ou materiais
alheios: nesse caso, aplica-se o art. 1.256, devendo o proprietário do solo, que
adquire a propriedade da acessão ressarcir o seu valor. O proprietário das
sementes, plantas ou materiais poderá cobrar do proprietário do solo a
indenização devida, quando não puder havê-la do plantador ou construtor (art.
1.257, parágrafo único)
37
4.7.3.6.3.1. Direito de retenção
Muito se tem discutido acerca do direito de retenção do plantador ou construtor
que planta ou semeia de boa-fé em solo alheio. O ordenamento positivo não o prevê, ao
contrário do que faz, expressamente, para as benfeitorias (art. 1.219).
Lembre que construção e plantação são modalidades de acessão, ou seja, modo
de aquisição da propriedade, significando acréscimo original ao solo nu. Já a benfeitoria
caracteriza-se como melhoramento a uma construção já existente, não se podendo
confundir, portanto, os dois conceitos.
A jurisprudência tem se inclinado no sentido da impossibilidade do exercício do
direito de retenção pela construção ou plantação, a exemplo do seguinte julgado:
Acessão. Direito de retenção. Impossibilidade. Cuidando-se de acessão, não
há possibilidade de exercício do direito de retenção (RT 616/144)16
VENOSA, por exemplo, opina no sentido da existência de direito de retenção ao
possuidor que constrói ou planta em solo alheio de boa-fé:
No entanto, seja o conceito de benfeitora, seja de acessão voluntária, o que a lei
busca é evitar o injusto enriquecimento. O regime da construção e da
semeadura em terreno alheio pode ensejar o direito de retenção ao possuidor de
boa-fé, da mesma forma que as benfeitorias, pois a índole é a mesma 17
Na Jornada I do STJ, concluiu-se, no enunciado 81: “o direito de retenção
previsto no CC 1.219, decorrente da realização de benfeitorias necessárias e úteis,
também se aplica às acessões (construções e plantações) nas mesmas circunstâncias.
4.7.3.6.3.2. Aquisição da propriedade do solo alheio pelo terceiro plantador ou
construtor
O novo código contempla hipóteses de aquisição da propriedade do solo por
aquele que planta ou constrói em terreno alheio. Podemos dividir as inovações em três
hipóteses:
A – Aquisição total da propriedade do solo alheio, por construção ou plantação
O parágrafo único do art. 1.255 do Código Civil prevê que “se a construção ou
a plantação exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé,
plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante pagamento da
indenização fixada judicialmente, se não houver acordo”.
Havendo boa-fé, portanto, de quem plantou ou edificou, este adquire a
propriedade do solo de terceiro, desde que o valor da plantação ou construção exceda
consideravelmente o valor do terreno e o edificante ou plantador pague indenização
fixada judicialmente, se não houver acordo.
16
17
Apud NERY JR e NERY, ob. Citada, p. 655.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Direitos Reais. 6.º ed. São Paulo : Atlas. 2006, ps. 187-188.
38
A discussão jurídica em torno do assunto é mais tenaz a respeito do significado
da expressão “exceda consideravelmente o valor do terreno”. Com efeito, trata-se de
conceito legal indeterminado cuja aplicação caberá à interpretação do juiz no caso
concreto.
Aqui, portanto, diferentemente das hipóteses a seguir, existe ocupação total do
solo alheio, com a conseqüente aquisição total dessa propriedade.
B – Aquisição parcial da propriedade do solo alheio, por construção, em porção não
excedente à vigésima parte do terreno invadido
Os arts. 1.258 e 1.259 trazem dispositivos sem precedentes no código antigo,
que se aplicam, entretanto, apenas às construções e não às plantações.
De acordo com o art. 1.258, aquele que constrói, parcialmente, em solo próprio e
invade, em parte, solo alheio, de boa-fé, tem direito à aquisição do solo invadido, desde
que a construção não exceda a vigésima parte do terreno total invadido e se o valor da
construção exceder o dessa parte, mediante pagamento de indenização correspondente
ao valor da área perdida e à desvalorização da área remanescente.
Se o construtor estiver de má-fé, deverá pagar em décuplo o valor da
indenização prevista no caput do art. 1.258 e só terá direito à aquisição do solo se o
valor da construção exceder consideravelmente o da parte invadida, que não pode ser
superior à vigésima parte do terreno total invadido. Além disso, o direito de aquisição
está condicionado, também, à circunstância de não se poder demolir a porção invasora
sem grave prejuízo para a construção.
C – Aquisição parcial da propriedade do solo alheio, por construção, em porção
excedente à vigésima parte do terreno invadido
Finalmente, o art. 1.259 prevê o direito de adquirir a propriedade do solo alheio,
em caso de invasão parcial, se a invasão exceder a vigésima parte do terreno de terceiro.
Entretanto, para este caso, embora a lei não exija que o valor da construção exceda
consideravelmente o da área invadida, a indenização se fixa pelo valor da área invadida,
acrescida da desvalorização da área remanescente e, enfim, do valor que a invasão
acrescer à construção.
Se o construtor estiver de má-fé, neste caso, não há direito à aquisição da parte
invadida, devendo ser demolida a construção e condenado o edificante de má-fé ao
pagamento de perdas e danos em dobro. Em resumo, a aquisição pelo construtor de máfé só se dá na hipótese do art. 1.258, parágrafo único, ou seja, se a invasão não exceder
a vigésima parte do terreno invadido.
4.8. Aquisição da propriedade móvel
4.8.1. Usucapião
A usucapião também é forma de aquisição da propriedade móvel. Aqui, também,
subdivide-se em ordinário e extraordinário.
39
Na ordinária, exige-se justo título e boa-fé a par da posse contínua e incontestada
da coisa por três anos.
Na extraordinária, não se exige justo título e boa-fé, mas apenas a posse contínua
e incontestada da coisa por cinco anos.
4.8.2. Ocupação
Ocorre a ocupação quando alguém se assenhoreia de coisa sem dono, desde que
a ocupação não seja defesa por lei.
A caracterização da coisa sem dono pode se dar por se tratar de bem que nunca
teve proprietário (res nullius) ou de coisa abandonada pelo dono (res derelictae), desde
que se demonstre a vontade expressa do dominus de abandonar a propriedade da coisa.
Por ocupação defesa em lei podemos ter a apropriação de animais vedada pela
legislação ambiental ou de bens cuja exploração resulta de monopólio da União, como
jazidas, minas e demais recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os
monumentos arqueológicos e outros bens referidos por leis especiais.
4.8.3. Achado do tesouro
O tesouro pode ser encontrado de forma casual ou premeditada.
Sendo casual o encontro, tem o descobridor o direito à metade do tesouro,
dividindo-o com proprietário do prédio.
Sendo premeditado o encontro do tesouro, aplica-se o art. 1.265, parte final, que
dispõe que pertence por inteiro ao proprietário do prédio o tesouro achado por ele, em
pesquisa por ele ordenada, ou por terceiro não autorizado.
4.8.4. Tradição
A tradição é o negócio jurídico translativo da propriedade móvel no direito
brasileiro. Com efeito, segundo o art. 1.267, “a propriedade das coisas não se transfere
pelos negócios jurídicos antes da tradição”.
4.8.4.1. Constituto possessório
Subentende-se a tradição quando o transmitente continua a possuir a coisa pelo
constituto possessório. Nesse caso, tem-se hipótese em que o alienante da coisa
continua a possuí-la, agora sob outro título (locatário, depositário, etc.) Assim, a lei dá
ao fenômeno o nome de constituto possessório, possibilitando ao adquirente a aquisição
da propriedade através da tradição simbólica da coisa.
4.8.4.2. Alienação de coisa sob poder de terceiro
Subentende-se também a tradição, de forma simbólica, quando o transmitente
aliena ao adquirente coisa que se encontra em poder de terceiro, constando no título
negocial o direito à restituição. Assim, tem o adquirente o direito de exigir do terceiro a
entrega real da coisa, uma vez que já adquiriu sua propriedade pela tradição simbólica.
40
Essas disposições, entretanto, não podem violar direito do possuidor que decorra
de negócio jurídico com o alienante, como o contrato de locação por tempo determinado
que ainda não tenha chegado ao seu termo final na época da alienação.
4.8.4.3. Traditio brevi manu
Ocorre a tradição brevi manu quando o adquirente já está na posse da coisa, por
ocasião do negócio jurídico, ou seja, tradição real não há, pois o adquirente já se
encontra com a coisa quando a adquire.
4.8.5. Especificação
Especificação é a aquisição da propriedade de coisa que se obtém com a
transformação de matéria-prima, não sendo possível restituir tal matéria à forma
anterior.
Se o especificador é o proprietário da matéria-prima, não há dificuldade no
fenômeno.
Se o especificador, no entanto, não é proprietário da matéria-prima, a lei dá as
seguintes soluções:
a) Matéria-prima em parte alheia: se o especificador obtém a espécie
nova com matéria-prima somente em parte alheia, adquire ele a
propriedade dessa nova espécie, desde que não seja possível restituir-se à
forma anterior;
b) Matéria-prima integralmente alheia: se a matéria-prima for
integralmente alheia, e impossível a redução à forma precedente, o
especificador somente adquire a propriedade se tiver agido de boa-fé;
b1) Especificador de má-fé: estando o especificador de má-fé, a
espécie nova será do dono da matéria-prima, ainda que se possa
reduzi-la à forma anterior;
b2) Espécie nova de valor consideravelmente superior ao da
matéria-prima: Em qualquer caso, inclusive o da pintura em
relação à tela, da escultura, escritura e outro qualquer trabalho
gráfico em relação à matéria-prima, a espécie nova será do
especificador, se o seu valor exceder consideravelmente o da
matéria-prima (art. 1.270, § 2.º).
O art. 1.271 estabelece ao dono da matéria-prima, em qualquer caso (utilização
parcial ou total), o direito ao ressarcimento do dono que sofrer, a não ser no caso do
especificador de má-fé, porque, nesse caso, adquire ele a propriedade da espécie nova.
4.8.6. Confusão, comistão18 e adjunção
a) Confusão: mistura de líquidos;
b) Comistão: junção de coisas sólidas ou secas, formando uma só coisa (Ex.:
18
A Lei (CC, Livro III, Título III, Cap. III, Seção VI), utiliza-se equivocadamente da palavra comissão,
quando o correto é comistão.
41
mistura de duas espécies de café). Neste caso, não há formação de espécie
nova, pois, em sendo assim, ocorre especificação;
c) Adjunção: justaposição de uma coisa sobre outra. Difere-se da comistão no
sentido de que, na adjunção, não há mistura das coisas justapostas, mas a
junção de duas coisas que continuam distintas, mas impossíveis de serem
separadas (Ex: soldagem de uma peça a um motor).
A regra ditada pela lei para o caso é o condomínio (art. 1.272, § 2.º), cabendo a
cada um dos donos quinhão proporcional ao valor da coisa com que entrou para a
mistura ou agregado.
Sendo uma das coisas, no entanto, considerada principal, e a outra, acessória, o
dono da principal adquirirá o todo, indenizando os demais (ex.: incrustação de uma
pedra preciosa a um anel de metal de valor bastante inferior).
4.8.6.1. Confusão, comistão ou adjunção de má-fé
Se a confusão, comissão ou adjunção se operou de má-fé, à outra parte caberá
escolher entre adquirir a propriedade do todo, pagando o que não for seu, abatida a
indenização que lhe for devida, ou renunciar ao que lhe pertencer, caso em que será
indenizado.
4.8.6.2. Formação de espécie nova
Se da confusão, comistão ou adjunção se obtém espécie nova, temos
especificação. Entretanto, ao contrário do que dizia o código de 1916, que determinava
que se aplicassem as regras da especificação, o novo código manda aplicar regras dos
arts. 1.272 e 1.273, razão por que, em sendo assim, não se dá mais ao especificador,
nesses casos, a propriedade automática da coisa, mas sim o condomínio estabelecido
pelo art. 1.272.
4.9. Perda da propriedade
O Código Civil de 2002 previu, no art. 1.275, os modos de perda da propriedade
(móvel ou imóvel).
Temos, portanto, segundo a dicção legal, os seguintes modos de perda da
propriedade:
a) Alienação: embora a lei diga que se perde a propriedade pela
alienação, o negócio jurídico, por si só, como vimos, não gera esse efeito,
pois o adquirente não obtém a propriedade senão após a tradição ou
transcrição. Depende, portanto, de registro do título no Registro de
Imóveis, em caso de bem imóvel;
b) Renúncia: a renúncia é modo especial de abandonar a propriedade,
como no caso de renúncia à herança, por exemplo. Com a morte do autor
da herança, transmite-se imediatamente a propriedade dos bens aos
herdeiros (princípio da saisine). A renúncia, portanto, importa em perda
dessa propriedade. Por expressa determinação legal (art. 1.275, parágrafo
único), depende, também, de registro do título no Registro de Imóveis,
42
em caso de bem imóvel;
c) Abandono: o abandono, ou derrelição, é ato de vontade do
proprietário, o qual deixa de exercer os direitos à propriedade (usar,
gozar) com vontade expressa de dispor dela. Não pode ser presumido,
como no caso da simples ausência de exercício, sem vontade de
abandonar. Também não se caracteriza o abandono no caso de perda ou
sumiço da coisa, pois, nos termos do art. 1.233, “quem quer que ache
coisa alheia perdida há de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor”;
d) Perecimento da coisa: é a destruição da coisa, que não se confunde
com sua perda. É hipótese na qual o objeto do direito deixa de existir;
e) Desapropriação: é forma de perda da propriedade para o poder
público, por interesse social ou utilidade pública. A desapropriação pode
ser: e1) direta: quando decorrer, previamente, de decreto de
desapropriação, podendo ser amigável ou judicial. No respectivo
processo, não cabe ao proprietário discutir a justiça ou injustiça da
desapropriação, mas apenas o valor da indenização ou possível
extrapolação da área desapropriada; e2) indireta: quando o poder público
se utiliza da área particular, nele constituindo um bem público de uso
comum do povo ou especial (como abertura de ruas, estradas ou
construção de prédios públicos), sem o prévio decreto desapropriatório,
de forma que ocorre uma afetação implícita da coisa. Nesse caso, assiste
ao proprietário o direito de indenização, através de ação contra o poder
público.
Além dos casos estabelecidos no art. 1.275, podemos citar a desapropriação
judicial prevista pelo art. 1.228, §§ 4.º e 5.º) e pelo abandono de coisa imóvel,
disciplinado pelo art. 1.276, passando o bem para o domínio do Poder Público.
5. Direitos de vizinhança
5.1. Natureza jurídica
A primeira discussão que se estabelece a respeito dos direitos de vizinhança diz
respeito à sua natureza jurídica.
Sua ausência no rol dos direitos reais do art. 1.225 pode induzir à conclusão de
que se tratam de direitos pessoais, no entanto, é de se observar, de plano, que não se
caracterizam os direitos de vizinhança como direitos pessoais, uma vez que não têm
eles um sujeito passivo fixo e determinado; pelo contrário, exercem-se em favor de um
imóvel e em desfavor de outros, quaisquer que sejam seus proprietários.
Alguns enxergam nos direitos de vizinhança obrigações propter rem, no que não
se contém equívoco, já que se estabelecem, em desfavor do proprietário, obrigações
(negativas e positivas) decorrentes da coisa.
De logo, entretanto, nota-se que os direitos de vizinhança não se impõem
somente a imóveis contíguos, mas a quaisquer imóveis que possam interferir no
exercício dos atributos da propriedade pelo dono.
43
Os direitos da vizinhança, portanto, são, antes de obrigações propter rem,
atributos da propriedade imóvel, os quais, entretanto, favorecem não só o proprietário
como, também, o possuidor, já que estabelece limite à propriedade imóvel vizinha.
Orlando Gomes19 destaca que são dois os sistemas que visam classificar os
direitos de vizinhança: a) sistema das servidões legais: nesse sistema, os direitos de
vizinhança se impõem como ônus imposto a um prédio serviente; b) sistema das
limitações legais da propriedade: por este, conceituam-se os direitos de vizinhança
como obrigações negativas impostas ao proprietário, consistentes na proibição de
perturbar a propriedade vizinha.
É certo que o ordenamento jurídico não adotou a posição das servidões legais,
pois os direitos de vizinhança se encontram disciplinados em capítulo diverso daquele
dispensado às servidões. No entanto, percebe-se, em alguns casos, nítida situação de
servidão, como no de passagem forçada (art. 1.285) e no direito de aqueduto (art.
1.293). Nos demais, trata-se de limitação ao direito de propriedade, como na proibição
do uso anormal da propriedade, árvores limítrofes, passagem de cabos e tubulações,
águas, limites entre prédios, direito de tapagem e direito de construir.
5.2. Uso anormal da propriedade
Disciplina o art. 1.277 que “o proprietário ou o possuidor de um prédio tem o
direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde
dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha”.
Esta norma dá ao proprietário ou possuidor o alcance geral do sentido de
limitação do direito de propriedade do vizinho. Pelo dispositivo, portanto, dá-se ao
proprietário ou possuidor o direito à ação de nunciação de obra nova, desde que esta
possa ser prejudicial à segurança, ao sossego e à saúde dos que habitam o imóvel
prejudicado.
O parágrafo único define: “proíbem-se as interferências considerando-se a
natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as
edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância dos moradores da
vizinhança”. Assim, por exemplo, pode-se proibir a interferência resultante de
estabelecimento comercial, em imóvel vizinho, quando for erguido em zona
exclusivamente residencial, consoante a respectiva lei municipal de zoneamento urbano.
5.2.1. Interferência determinada pelo interesse público
Em claro atendimento às normas de direito administrativo, que dá ao Poder
Público a prerrogativa de se utilizar da propriedade vizinha para finalidades públicas (as
chamadas servidões administrativas, como no caso da passagem de linhas elétricas, por
exemplo), o art. 1.278 prevê que “o direito a que se refere o artigo antecedente não
prevalece quando as interferências forem justificadas por interesse público, caso em
que o proprietário ou o possuidor, causador delas, pagará ao vizinho indenização
cabal”.
19
Ob. Citada, p. 183.
44
No entanto, “ainda que por decisão judicial devam ser toleradas as
interferências, poderá o vizinho exigir a sua redução, ou eliminação, quando estas se
tornarem possíveis” (art. 1.279).
5.2.2. Ação demolitória e ação de dano infecto
O 1.280 prevê que “o proprietário ou o possuidor tem direito a exigir do dono
do prédio vizinho a demolição, ou a reparação deste, quando ameace ruína, bem como
que lhe preste caução pelo dano iminente”.
Quando a única solução para que a ruína do imóvel vizinho não se transforme
em prejuízo para o proprietário ou possuidor for a destruição da obra, assiste-lhe o
direito à ação demolitória.
Quando a ruína do prédio vizinho decorrer de obra já existente, pode o
proprietário ou possuidor exigir caução pelo dano iminente, ao que se denomina de
ação de dano infecto e é prevista como procedimento cautelar no art. 830 do Código de
Processo Civil.
Se se tratar de obra nova que possa prejudicar a propriedade vizinha, a solução é
a ação de nunciação de obra nova (CPC, art. 934, I).
Pode ocorrer que a obra pretensamente nociva tenha de ser realizada dentro do
imóvel do proprietário pretensamente prejudicado. Assim, prevê o art. 1.281 que “o
proprietário ou o possuidor de um prédio, em que alguém tenha direito de fazer obras,
pode, no caso de dano iminente, exigir do autor delas as necessárias garantias contra o
prejuízo eventual”.
5.3. Árvores limítrofes.
Se o tronco da árvore se situar na linha divisória entre dois prédios, presume-se
pertencer em comum aos donos dos dois prédios confinantes (art. 1.282).
Além disso, assiste ao proprietário de um prédio o direito de cortar as raízes e
ramos de árvore situada no prédio vizinho que, porventura, ultrapassarem a estrema do
prédio, mas só até o plano vertical divisório (art. 1.283).
Por fim, assiste também ao proprietário do prédio o direito aos frutos caídos de
árvore do terreno vizinho, desde que caiam em propriedade particular (art. 1.284).
5.4. Passagem forçada
O direito de passagem decorre do encravamento do prédio, ou seja, para que haja
direito à passagem forçada, é indispensável que o prédio não tenha acesso à via
pública, nascente ou porto (art. 1.285).
Obviamente, a existência de acesso à via pública para o prédio não impede o
estabelecimento de servidões de trânsito entre prédios vizinhos, entretanto, a servidão
depende do consenso entre proprietários. No encravamento, a passagem é forçada.
45
Divide-se em direito de passagem para: a) acesso à via pública; b) acesso à
nascente de águas, para delas se aproveitar; c) acesso porto, para nele atracar ou
desatracar.
Tem-se admitido que, se o imóvel detiver acesso, mas este for extremamente
penoso ou inseguro, caracteriza-se o direito à passagem forçada20.
Por fim, o exercício desse direito depende de pagamento de indenização ao
vizinho pelos prejuízos que a utilização possa causar ao seu imóvel.
5.5. Passagem de cabos e tubulações
Em atendimento ao interesse público, disciplina o art. 1.286 que “mediante
recebimento de indenização que atenda, também, à desvalorização da área
remanescente, o proprietário é obrigado a tolerar a passagem, através de seu imóvel,
de cabos, tubulações e outros condutos subterrâneos de serviços de utilidade pública,
em proveito de proprietários vizinhos, quando de outro modo for impossível ou
excessivamente onerosa”.
É o que ocorre com a passagem de tubulações de água e esgoto, ou de fiações
subterrâneas de rede elétrica ou telefônica.
Assiste ao proprietário prejudicado o direito de “exigir que a instalação seja
feita de modo menos gravoso ao prédio onerado, bem como, depois, seja removida, à
sua custa, para outro local do imóvel” (art. 1.286, parágrafo único), bem como de
exigir a realização de obras de segurança “se as instalações oferecerem grave risco”
(art. 1.287).
5.6. Águas
5.6.1. Águas naturais
O dono ou o possuidor do prédio inferior é obrigado a receber as águas que
correm naturalmente do superior, não podendo realizar obras que embaracem o seu
fluxo; porém a condição natural e anterior do prédio inferior não pode ser agravada por
obras feitas pelo dono ou possuidor do prédio superior (art. 1.288).
5.6.2. Águas artificiais
Quanto às águas artificiais, no entanto, disciplina o art. 1.289: ―Quando as águas,
artificialmente levadas ao prédio superior, ou aí colhidas, correrem dele para o inferior,
poderá o dono deste reclamar que se desviem, ou se lhe indenize o prejuízo que sofrer.
Parágrafo único. Da indenização será deduzido o valor do benefício obtido‖.
5.6.3. Águas pluviais e de nascente
20
Cf. VENOSA, ob. Citada, ps. 286-287
46
Segundo o art. 1.290, “o proprietário de nascente, ou do solo onde caem águas
pluviais, satisfeitas as necessidades de seu consumo, não pode impedir, ou desviar o
curso natural das águas remanescentes pelos prédios inferiores”.
5.6.4. Poluição de águas
Disciplina o art. 1.291 que “o possuidor do imóvel superior não poderá poluir
as águas indispensáveis às primeiras necessidades da vida dos possuidores dos imóveis
inferiores; as demais, que poluir, deverá recuperar, ressarcindo os danos que estes
sofrerem, se não for possível a recuperação ou o desvio do curso artificial das águas”.
A poluição de águas configura dano ambiental. Ainda que as águas se situem em
imóvel particular, em se tratando de dano ambiental, a lei não deixa ilesa nem a autolesão, até porque, como se vê, a poluição de águas prejudica terceiros e, como um todo,
a sociedade. Assim, não se exige culpa na conduta do proprietário que polui águas, pois,
de qualquer forma, deverá ele recuperá-las.
5.6.5. Barragens, açudes e represamento de água
De acordo com o art. 1.292, “o proprietário tem direito de construir barragens,
açudes, ou outras obras para represamento de água em seu prédio; se as águas
represadas invadirem prédio alheio, será o seu proprietário indenizado pelo dano
sofrido, deduzido o valor do benefício obtido”.
5.6.6. Direito de aqueduto ou servidão legal de aqueduto
A servidão legal de aqueduto é prevista, também, no Código de Águas (Decreto
24.643/34).
O art. 1.293, caput reza que “é permitido a quem quer que seja, mediante prévia
indenização aos proprietários prejudicados, construir canais, através de prédios
alheios, para receber as águas a que tenha direito, indispensáveis às primeiras
necessidades da vida, e, desde que não cause prejuízo considerável à agricultura e à
indústria, bem como para o escoamento de águas supérfluas ou acumuladas, ou a
drenagem de terrenos”.
Trata-se, também, de servidão forçada. Ao proprietário do prédio serviente
assiste o direito ao “ressarcimento pelos danos que de futuro lhe advenham da
infiltração ou irrupção das águas, bem como da deterioração das obras destinadas a
canalizá-las”, bem como o de “exigir que seja subterrânea a canalização que
atravessa áreas edificadas, pátios, hortas, jardins ou quintais”.
Por fim, prevê o parágrafo terceiro do art. 1.293 que ―o aqueduto será construído
de maneira que cause o menor prejuízo aos proprietários dos imóveis vizinhos, e a
expensas do seu dono, a quem incumbem também as despesas de conservação‖.
A expressão “águas a que tenha direito” exposta no caput do dispositivo
encontra complemento no art. 1.290, acima referido. Quer dizer, o proprietário do
prédio favorecido tem o direito a buscar as águas remanescentes de correntes pluviais
ou de nascentes nos imóveis vizinhos.
47
5.6.7. Limites entre prédios e direito de tapagem
O art. 1.297 traduz ao proprietário o direito de cercar, murar, valar ou tapar de
qualquer modo o seu prédio, urbano ou rural. Para tanto, assiste a ele o direito de
constranger o confinante a proceder, em conjunto, à demarcação, bem como a aviventar
rumos apagados e a renovar marcos destruídos ou arruinados (direito à ação
demarcatória).
5.6.8. Direito de construir
O direito de construir, nos termos do art. 1299, é limitado pelo direitos dos
vizinhos e pelos regulamentos administrativos.
Assim, o Código Civil estabelece, por exemplo, regras como: vedação a
construir obras que despeje águas sobre o prédio vizinho (art. 1.300); vedação à abertura
de janelas, terraço ou varanda a menos de metro e meio do prédio vizinho; direito à
utilização de parede-meia (art. 1.305); vedação de construções capazes de poluir, ou
inutilizar, água de poço ou nascente alheias; direito de entrada em prédio vizinho para
dele temporariamente usar, quando indispensável ou à reparação, construção,
reconstrução ou limpeza de casa ou muro divisório ou para apoderar-se de coisas suas,
inclusive animais.
De qualquer sorte, as disposições do Código Civil estabelecem os conteúdos
mínimos dos regulamentos de vizinhança. Podem as legislações de posturas e
regulamentos administrativos de construção (estabelecidos em leis municipais),
disciplinar, de forma mais rigorosa, esses limites, podendo, por exemplo, estabelecer
distância maior do muro divisório para a construção de janelas ou varandas.
6. Condomínio
6.1. Conceito
O condomínio é o direito real de propriedade exercido comumente por mais de
uma pessoa.
Pode se estabelecer de forma absoluta, ou seja, de fato e de direito, de forma que
todos os condôminos são proprietários do todo (condomínio pro indiviso), ou relativa,
dividindo-se em frações ideais (condomínio pro diviso), quando, então, o condomínio é
apenas de direito, mas não de fato, porque cada condômino ocupa parte certa e
determinada da coisa.
Divide-se, também, o condomínio em voluntário e necessário. Caracteriza-se,
como se vê, pela incidência ou não da vontade dos condôminos para sua constituição. O
condomínio necessário ou legal, no entanto, pode decorrer: a) do estado natural de
indivisão da coisa, como nas paredes, cercas, muros, valas, pastagens, formação de
ilhas, comistão, confusão, adjunção e tesouro; b) de direito hereditário, ocasião em que
os herdeiros são condôminos, independentemente de sua vontade, até a partilha final.
48
Nesse caso, sendo a coisa, também indivisível, o condomínio perdurará até que seja
adotada a solução prevista pelo art. 1.32221.
6.2. Dos direitos e deveres dos condôminos
O Código Civil prevê os direitos e deveres dos condôminos, dentre os quais,
podemos destacar:
a) Direito de uso: Cada condômino pode usar da coisa conforme sua destinação,
sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de
terceiro, defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal, ou gravá-la
(art.1.314). O direito de uso compreende, portanto, os atributos normais da
propriedade, com exceção do jus abutendi (disposição), que somente
compreende a parte ideal. Quanto à destinação, ―nenhum dos condôminos pode
alterar a destinação da coisa comum, nem dar posse, uso ou gozo dela a
estranhos, sem o consenso dos outros‖ (art. 1.314, parágrafo único);
b) Dever de conservação: Disciplina o art. 1.315 que “o condômino é obrigado,
na proporção de sua parte, a concorrer para as despesas de conservação ou
divisão da coisa, e a suportar os ônus a que estiver sujeita”. Para tanto, o
parágrafo único reza que se presumem iguais as partes ideais dos condôminos;
c) Direito de renúncia: mediante renúncia à parte ideal, pode o condômino
eximir-se da obrigação de pagar as despesas e dívidas para conservação e
divisão da coisa (art. 1.316);
d) Direito de regresso nas obrigações contraídas em proveito da comunhão: Reza
o art. 1.318: “As dívidas contraídas por um dos condôminos em proveito da
comunhão, e durante ela, obrigam o contratante; mas terá este ação regressiva
contra os demais”;
e) Responsabilidade pelos frutos e danos: “Cada condômino responde aos
outros pelos frutos que percebeu da coisa e pelo dano que lhe causou”. (art.
1319);
f) Direito à divisão da coisa comum: A todo tempo será lícito ao condômino
exigir a divisão da coisa comum, respondendo o quinhão de cada um pela sua
parte nas despesas da divisão (art. 1.320, caput). Podem, entretanto os
condôminos acordar que fique indivisa a coisa comum por prazo não maior de
cinco anos, suscetível de prorrogação ulterior (§ 1.º). Em caso de doação ou
testamento, não poderá exceder de cinco anos a indivisão estabelecida pelo
doador ou pelo testador (§ 2.º). Por fim, disciplina o § 3.º que “a requerimento
de qualquer interessado e se graves razões o aconselharem, pode o juiz
determinar a divisão da coisa comum antes do prazo”.
21
Art. 1.322. Quando a coisa for indivisível, e os consortes não quiserem adjudicá-la a um só,
indenizando os outros, será vendida e repartido o apurado, preferindo-se, na venda, em condições iguais
de oferta, o condômino ao estranho, e entre os condôminos aquele que tiver na coisa benfeitorias mais
valiosas, e, não as havendo, o de quinhão maior. Parágrafo único. Se nenhum dos condôminos tem
benfeitorias na coisa comum e participam todos do condomínio em partes iguais, realizar-se-á licitação
entre estranhos e, antes de adjudicada a coisa àquele que ofereceu maior lanço, proceder-se-á à licitação
entre os condôminos, a fim de que a coisa seja adjudicada a quem afinal oferecer melhor lanço,
preferindo, em condições iguais, o condômino ao estranho
49
6.3. Administração do condomínio
A administração será atribuída a quem for escolhido pela maioria, que poderá ser
estranho (art. 1.323). O mesmo dispositivo prevê que, em caso de aluguel da coisa, o
condômino terá preferência, em condições iguais, ao estranho.
Em não havendo decisão de escolha do representante, aquele que administrar
sem oposição dos outros presume-se representante comum (art. 1.324).
A maioria calcula-se pelo valor dos quinhões, bem como o direito aos frutos. As
deliberações são tomadas por maioria absoluta, e, não sendo possível alcançá-la, será a
deliberação tomada pelo juiz (arts. 1.325 e 1.326).
6.4. Condomínio necessário
O condomínio por meação de paredes, cercas, muros e valas regula-se pelas
normas estabelecidas, especificamente, pelos direitos de vizinhança.
Segundo o art. 1.328, “o proprietário que tiver direito a estremar um imóvel
com paredes, cercas, muros, valas ou valados, tê-lo-á igualmente a adquirir meação na
parede, muro, valado ou cerca do vizinho, embolsando-lhe metade do que atualmente
valer a obra e o terreno por ela ocupado” Não convindo os dois no preço da obra, será
este arbitrado por peritos, a expensas de ambos os confinantes (art. 1.329).
Qualquer que seja o valor da meação, enquanto aquele que pretender a divisão
não o pagar ou depositar, nenhum uso poderá fazer na parede, muro, vala, cerca ou
qualquer outra obra divisória (art. 1.330).
6.5. Condomínio edilício
Chama-se condomínio edilício aquele instituído em edificações, como prédios
residenciais, comerciais, condomínios horizontais, etc.
Pode ser instituído por ato entre vivos ou testamento (art. 1.332), mas deve ser
registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar do ato de instituição,
além do que exigir a lei especial: I - a discriminação e individualização das unidades de
propriedade exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns; II - a
determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes
comuns; III - o fim a que as unidades se destinam.
O condomínio edilício tem regras próprias definidas em convenção subscrita
pelos titulares de, pelo menos 2/3 (dois terços) das frações ideais. Para ser oponível
contra terceiros, a convenção do condomínio deverá ser registrada no Cartório de
Registro de Imóveis.
O Código Civil disciplina as cláusulas mínimas da convenção do condomínio
(arts. 1.332 e 1.334); os direitos e deveres do condômino (arts. 1.335 e 1.336); aplicação
de multa a condômino que descumpre reiteradamente seus deveres (art. 1.337); direito
de preferência na locação de área de garagem (art. 1.338); direitos referentes às áreas
50
comuns (arts. 1.339 e 1.340); quorum mínimo para deliberação pela construção de obras
(arts. 1.341 a 1.343); despesas de conservação do terraço (art. 1.344); obrigação propter
rem para o adquirente, em decorrência de débitos do alienante para com o condomínio
(art. 1.345); seguro obrigatório (art. 1.346); administração (arts. 1.347 a 1.355) e
extinção do condomínio (arts. 1.357 e 1.358), em caso de destruição, ruína ou
desapropriação.
7. Propriedade resolúvel
7.1. Conceito
A propriedade é, em regra, um direito perene do proprietário. Somente por
exceção se pode admitir que a propriedade seja um direito temporário ou sujeito a
extinção pré-determinada.
Os arts. 1.359 e 1.360 tratam de duas hipóteses distintas de propriedade sujeita à
extinção pré-determinada, mas com denominação indistinta: propriedade resolúvel.
Em verdade, propriedade resolúvel é aquela sujeita a termo final ou condição
resolutiva, por determinação da própria vontade das partes em seu título constitutivo, o
que o ocorre no caso do art. 1.359. No caso do art. 1.360, a propriedade se resolve por
fato superveniente não sujeito ao arbítrio das partes no momento de consorciar sua
vontade com a da outra.
7.2. Hipóteses
7.2.1. Propriedade resolúvel
A hipótese do art. 1.359 é de propriedade resolúvel propriamente dita:
Art. 1.359. Resolvida a propriedade pelo implemento da condição ou pelo
advento do termo, entendem-se também resolvidos os direitos reais concedidos
na sua pendência, e o proprietário, em cujo favor se opera a resolução, pode
reivindicar a coisa do poder de quem a possua ou detenha.
Neste caso, a imposição de uma condição resolutiva da propriedade ou de um
termo final a ela surge da própria vontade das partes. Já se sabe, desde o nascedouro,
que a propriedade é resolúvel. Assim, aquele em favor de quem se resolve a propriedade
(proprietário diferido) tem o direito a receber a coisa sem possíveis direitos reais
constituídos durante o domínio do proprietário atual, como o penhor, a hipoteca, o
usufruto, etc.
Além disso, resolvida a propriedade, tem o proprietário diferido o direito de
reivindicar a coisa do poder de quem a possua ou detenha.
Com tudo isso, quer-se dizer que, nesse caso, a resolução da propriedade tem
efeito ex tunc, dando-se ao proprietário diferido o direito de receber a coisa no estado
em que se encontrava quando o proprietário atual adquiriu a coisa.
Orlando Gomes cita alguns exemplos de propriedade resolúvel, como os de
51
fideicomisso22, retrovenda, venda a contento, doação com cláusula de reversão e na
alienação fiduciária.23
7.2.2. Propriedade ad tempus
A denominação propriedade ad tempus é dada por Orlando Gomes. Referido
autor considera que, nesse caso, a propriedade é apenas potencialmente temporária.
Reza o art. 1.360:
Art. 1.360. Se a propriedade se resolver por outra causa superveniente, o
possuidor, que a tiver adquirido por título anterior à sua resolução, será
considerado proprietário perfeito, restando à pessoa, em cujo benefício houve a
resolução, ação contra aquele cuja propriedade se resolveu para haver a própria
coisa ou o seu valor.
Aqui, como se vê, a propriedade se resolve por causa superveniente não oriunda
da vontade das partes, como ocorre, por exemplo, na revogação da doação por
ingratidão do donatário. Outro exemplo que se pode imaginar é o da resolução do
contrato de compra e venda por aplicação da cláusula resolutiva expressa em caso de
inadimplência (no CC – 1916: pacto comissório)
Os efeitos são diversos, pois, nesse caso, aquele em benefício de quem houve a
resolução recebe a coisa no estado em que se encontra, pois os efeitos, aqui, são ex
nunc. Por isso, se alguém tiver adquirido a coisa por título anterior à resolução, o
proprietário diferido terá ação apenas contra aquele cuja propriedade se resolveu para
haver a própria coisa ou o seu valor.
Atente-se para o fato de que este dispositivo é aplicável às causas de resolução
da propriedade, e não para as de nulidade ou anulabilidade do título aquisitivo, pois,
nesses casos, ocorre rescisão do negócio jurídico. A solução, para casos de invalidade
do negócio jurídico translativo da propriedade, dependerá da aferição da boa-fé do
terceiro adquirente.
8. Propriedade fiduciária
22
Art. 1.951. Pode o testador instituir herdeiros ou legatários, estabelecendo que, por ocasião de sua
morte, a herança ou o legado se transmita ao fiduciário, resolvendo-se o direito deste, por sua morte, a
certo tempo ou sob certa condição, em favor de outrem, que se qualifica de fideicomissário.
23
GOMES, Orlando. Ob. Citada, p. 236.
52
8.1. Conceito
O próprio Código Civil conceitua a propriedade fiduciária quando reza, no art.
1.361: “Considera-se fiduciária a propriedade resolúvel de coisa móvel infungível que
o devedor, com escopo de garantia, transfere ao credor.”
Ocorre propriedade fiduciária, portanto, quando o devedor de certa quantia dá ao
credor a propriedade resolúvel de uma coisa sua, com a finalidade de garantir a dívida.
Não pode ser considerada como direito real de garantia sobre coisa alheia, pois,
na propriedade fiduciária, o credor adquire, de fato, a propriedade, passando a ser dono
da coisa, embora de forma resolúvel e sem a posse direta.
8.2. Requisitos
Depende a propriedade fiduciária de registro do contrato no Registro de Títulos
e Documentos ou na repartição competente para licenciamento, em se tratando de
veículos (art. 1.361, § 1.º).
Reza o art. 1.362 que o contrato, que serve de título à propriedade fiduciária,
conterá: I - o total da dívida, ou sua estimativa; II - o prazo, ou a época do pagamento;
III - a taxa de juros, se houver.
8.3. Desdobramento da posse
Reza o art. 1.361, § 2.º que ―Com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se
o desdobramento da posse, tornando-se o devedor possuidor direto da coisa‖. Por isso,
―antes de vencida a dívida, o devedor, a suas expensas e risco, pode usar a coisa
segundo sua destinação, sendo obrigado, como depositário: I - a empregar na guarda da
coisa a diligência exigida por sua natureza; II - a entregá-la ao credor, se a dívida não
for paga no vencimento‖ (art. 1.363).
Veja-se que o direito de uso da coisa, pelo devedor, extingue-se com o
vencimento da dívida, sendo essa a condição de resolução da propriedade
expressamente ditada pela vontade das partes.
Reza o art. 1.361, § 3.º que “a propriedade superveniente, adquirida pelo
devedor, torna eficaz, desde o arquivamento, a transferência da propriedade
fiduciária”.
8.4. Vencimento da dívida
Vencida a dívida, e não paga, fica o credor obrigado a vender, judicial ou
extrajudicialmente, a coisa a terceiros, a aplicar o preço no pagamento de seu crédito e
das despesas de cobrança, e a entregar o saldo, se houver, ao devedor (art. 1.364), mas
“é nula a cláusula que autoriza o proprietário fiduciário a ficar com a coisa alienada
em garantia, se a dívida não for paga no vencimento”. (art. 1.365, caput). Não obstante,
“o devedor pode, com a anuência do credor, dar seu direito eventual à coisa em
53
pagamento da dívida, após o vencimento desta” (parágrafo único). Trata-se, portanto,
de dação em pagamento, pelo devedor, de seu direito eventual à coisa para quitar a
dívida havida com o credor por ocasião da constituição da propriedade fiduciária.
Reza o art. 1.366 que “quando, vendida a coisa, o produto não bastar para o
pagamento da dívida e das despesas de cobrança, continuará o devedor obrigado pelo
restante”. Aqui, já se extinguiu a propriedade fiduciária em favor do credor, bem como
o direito eventual do devedor de recuperar o domínio da coisa. Os efeitos posteriores aí
previstos são meramente pessoais.
O art. 1.367 manda aplicar, no que for cabível, disposições acerca dos direitos
reais de garantia e, em especial, do penhor.
Enfim, disciplina o art. 1.368 que “o terceiro, interessado ou não, que pagar a
dívida, se sub-rogará de pleno direito no crédito e na propriedade fiduciária”. Além
disso, as espécies de propriedade fiduciária disciplinadas de forma especial (alienação
fiduciária de veículos, por exemplo) são disciplinadas pelas respectivas leis especiais
(como o Decreto-lei 911/69), aplicando-se o Código Civil apenas de maneira supletiva.
9. Direitos reais sobre coisas alheias
O Código Civil traça o rol de direitos reais em seu art. 1.225, dispondo, ao lado
da propriedade, a superfície, as servidões, o usufruto, o uso, a habitação, o direito do
promitente comprador do imóvel, o penhor, a hipoteca e a anticrese.
Pode-se afirmar que a propriedade, embora sofra limitações legais e, às vezes,
convencionais, é o direito real ilimitado por excelência, pois envolve as prerrogativas
de usar, gozar e dispor da coisa. Todos os demais direitos reais expostos no art. 1.225
são limitados, porque não se exercem sobre coisa própria (jus in re própria), mas, sim,
sobre coisa alheia (jus in re aliena), ou seja, sobre coisa de que o titular do direito real
não é proprietário.
Subdividem-se os direitos reais limitados ou sobre coisas alheias em:
a) Direitos reais de gozo ou fruição: a superfície, as servidões, o usufruto, o uso
e a habitação;
b) Direitos reais de garantia: o penhor, a hipoteca e a anticrese;
c) Direitos reais de aquisição: o direito do promitente comprador do imóvel.
9.1. Forma de constituição
De acordo com o art. 1.226, “os direitos reais sobre coisas móveis, quando
constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com a tradição”. A
formalidade crucial, portanto, para a formação do direito real sobre coisa alheia móvel,
é a tradição, sem o que ele não se constitui.
54
Esta regra sofre exceção no art. 1.431, parágrafo único, que dispõe: ―no penhor
rural, industrial, mercantil e de veículos, as coisas empenhadas continuam em poder do
devedor, que as deve guardar e conservar‖.
Da mesma forma, para os bens imóveis, a constituição do direito real sobre coisa
alheia exige, na forma do art. 1.227, o registro no Cartório de Registro de Imóveis. Essa
disposição, entretanto, aplica-se para os casos de constituição por ato inter vivos, já que,
causa mortis, os bens herdáveis se transmitem automaticamente com a extinção do
autor da herança.
Além disso, o próprio art. 1.227 ressalva outros casos expressos no código,
como no direito real de habitação do cônjuge sobrevivente (art. 1.831) e no usufruto
decorrente do poder familiar (art. 1.689, I), pois, nesses casos, independe de transcrição
no Registro de Imóveis a aquisição do direito real.
9.2. Direito de superfície
Pode o proprietário do terreno convencionar com terceiro o direito de construir
ou plantar em sua área, durante determinado tempo a ser convencionado em escritura
pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis.
A natureza jurídica do direito de superfície, portanto, é a de ―direito real
imobiliário, autônomo e limitado, sendo resolúvel a propriedade superficiária‖. A
escritura pública é da substância do ato, porque expressamente exigida pelo art. 1.369,
de forma que, consoante os arts. 104, III e 108, não se constitui esse direito real sem a
escritura. Institui-se, portanto, o direito de superfície, por negócio jurídico entre o
concedente (proprietário – detentor da propriedade plena) e o superficiário (detentor da
propriedade superficiária).
De regra, o direito de superfície deve ser instituído, sempre, por tempo
determinado e não autoriza obra do subsolo, a não ser que esta seja inerente ao objeto da
concessão (art. 1.369, parágrafo único). A exceção a esta regra é a instituição do direito
de superfície urbana, prevista pelo Estatuto da Cidade (Lei 10.257/01), que prevê a
possibilidade de sua instituição por tempo indeterminado e com abrangência do subsolo
e do espaço aéreo.
9.2.1. Direitos e deveres do superficiário
Prevê o art. 1.370 que ―a concessão da superfície será gratuita ou onerosa; se
onerosa, estipularão as partes se o pagamento será feito de uma só vez, ou
parceladamente‖.
Além disso, nos termos do art. 1.371, ―o superficiário responderá pelos encargos
e tributos que incidirem sobre o imóvel‖. Essa regra incide, entretanto, no silêncio das
partes quando da instituição do direito de superfície, porquanto, conforme conclusão da
Jornada I STJ, Enunciado 94, ―as partes têm plena liberdade para deliberar, no contrato
respectivo, sobre o rateio dos encargos e tributos que incidirão sobre a área objeto da
concessão do direito de superfície‖. Podem as partes, portanto, estipular previsão
diversa.
55
Em se tratando de direito real, ainda que resolúvel, assiste ao superficiário o
direito de transferi-lo a terceiros, conforme permissão do art. 1.372. O mesmo
dispositivo prevê, também, a transmissão do direito aos herdeiros do superficiário e
veda ao proprietário (concedente) a estipulação de qualquer pagamento pela
transferência.
Assiste ao superficiário, por fim, o direito de preferência em caso de alienação
do imóvel sobre o qual incide o direito de superfície, segundo inferência do art. 1.373.
Por outro lado, o mesmo dispositivo prevê que, se o superficiário exercer o direito que
lhe resulta do art. 1.372, caput, ou seja, se for transferir o direito de superfície a terceiro,
tem o proprietário o direito de preferência para adquiri-lo. Sujeita-se o exercício do
direito de preferência, entretanto, à igualdade de condições.
9.2.2. Extinção do direito de superfície
Extinguir-se-á o direito de superfície, em regra, no termo final estipulado pelo
concedente e o superficiário. Entretanto, segundo diz o art. 1.374, se o superficiário der
ao terreno destinação diversa daquela para que foi concedida, resolver-se-á a concessão.
Com a extinção do direito de superfície, passa o proprietário a ter a propriedade
plena sobre o terreno, incluindo as construções ou plantações acrescidas pelo
superficiário, independentemente de indenização (art. 1.375). O mesmo artigo
possibilita, entretanto, que as partes estipulem o contrário, ou seja, o direito de
indenização do superficiário ao final da concessão.
O art. 1.376 fixa critério de proporcionalidade quando o direito de superfície for
extinto em conseqüência de desapropriação, ou seja, ―a indenização cabe ao proprietário
e ao superficiário, no valor correspondente ao direito real de cada um‖. Esta
proporcionalidade não quer dizer que o proprietário terá direito ao valor do terreno, sem
as construções ou plantações e que o superficiário terá direito ao valor das construções
ou plantações. Cada um terá direito à indenização pelo valor do direito real que possuir.
Isto quer dizer que o proprietário terá direito ao valor do imóvel levando em
consideração o preço que ele receberia em caso de venda a terceiro que,
conscientemente, suportaria o ônus do direito de superfície exercido pelo superficiário.
Por outro lado, o superficiário teria direito ao valor pelo qual ele poderia transferir o
direito de superfície do qual é detentor a terceiro.
9.2.3. Constituição de direito de superfície por pessoa jurídica de direito público interno
Diz o art. 1.377 que ―o direito de superfície, constituído por pessoa jurídica de
direito público interno, rege-se por este Código, no que não for diversamente
disciplinado em lei especial‖. Isto quer dizer que, quanto à instituição do direito de
superfície em área rural, por pessoa jurídica de direito público, aplica-se o Código Civil;
quanto à sua instituição em área urbana, aplica-se o Estatuto da Cidade.
O direito de superfície pode ser instituído pela pessoa jurídica de direito público
interno tanto na qualidade de concedente como na de superficiário. O direito de
superfície constituído pelo Poder Público, na qualidade de concedente, não se confunde
com a concessão de direito real de uso, pois esta se limita aos caracteres do uso,
56
disciplinado pelos arts. 1.412 e 1.413, o qual é caracterizado pela intransmissibilidade
(art. 1.393, c/c art. 1.413).
9.3. Servidões
9.3.1. Conceito
A servidão é direito real caracterizado pela imposição de um encargo sobre um
prédio denominado serviente, em benefício de outro prédio, denominado dominante,
conferindo ao titular deste o uso e gozo da utilidade proporcionada pelo serviente.
É direito real porque, embora constituído entre duas pessoas (titulares dos
prédios dominante e serviente), é oponível contra terceiros (inclusive futuros donos do
prédio serviente), que não podem embaraçar o exercício da servidão pelo titular do
prédio dominante.
Não se confunde com os direitos de vizinhança, porque estes, quando impõem
limitação à propriedade para servir a prédio alheio, o fazem por determinação legal,
enquanto as servidões se constituem por declaração de vontade ou por usucapião.
Também não se confunde com o usufruto, uso e habitação, porque, nestes, existe
transmissão da posse da coisa para o titular do direito real sobre coisa alheia, o que não
se dá na servidão.
No Direito Romano, dividiam-se as servidões em prediais e pessoais. Prediais
eram as servidões decorrentes da limitação de um prédio em favor de outro. Pessoais
eram o uso, o usufruto, a habitação e a escravidão.
O Código Civil de 1916 tratava apenas das servidões prediais. O atual diploma
também trata, como servidões, apenas as prediais, embora não tenha adotado
expressamente esse título.
9.3.2. Características
A servidão se caracteriza por: a) necessidade de pertencerem os prédios
(dominante e serviente) a proprietários diversos, pois, pertencendo os dois prédios ao
mesmo proprietário, não há que se falar em servidão; b) prazo indeterminado: alguns
dizem que a servidão é perpétua, entretanto, melhor é dizer que se constitui sempre por
prazo indeterminado, pois a própria lei prevê casos legais de extinção (arts.
1.387/1.389); c) indivisibilidade: subsiste a servidão ainda que o imóvel serviente seja
dividido por ato entre vivos ou em partilha decorrente de inventário (art. 1.386); d) é
exclusiva para bens imóveis, não havendo que se falar em servidão de bens móveis.
9.3.3. Formas de constituição
As servidões se constituem, voluntariamente por atos entre vivos ou causa
mortis. Involuntariamente, constituem-se por usucapião, desde que aparentes. Por isso,
podem ser constituídas: a) por contrato, oneroso ou gratuito, demandando, portanto,
declaração expressa dos proprietários; b) por testamento; c) por usucapião. Admite-se,
ainda, a constituição da servidão por: d) sentença em ação divisória (porque se dividem
57
dois prédios, podendo um deles ficar encravado ou com outra necessidade); e)
destinação do proprietário: o que ocorre quando uma mesma pessoa, proprietário de
dois imóveis, constitui servidão entre eles e depois aliena um dos dois.
De qualquer forma, a servidão somente se constitui por declaração expressa dos
proprietários, quer dizer, não pode o possuidor instituir servidão, embora possa,
eventualmente, dela usufruir, desde que tenha sido instituída em favor do prédio sobre o
qual exerce a posse.
Além disso, o ato constitutivo deve ser levado a registro no Cartório de Registro
de Imóveis, sob pena de a servidão não atingir o efeito erga omnes. Este princípio
comporta exceções quanto às servidões aparentes, como veremos no tópico pertinente.
Disciplinam os arts. 1.378 e 1.379:
Art. 1.378. A servidão proporciona utilidade para o prédio dominante, e grava
o prédio serviente, que pertence a diverso dono, e constitui-se mediante
declaração expressa dos proprietários, ou por testamento, e subseqüente
registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Art. 1.379. O exercício incontestado e contínuo de uma servidão aparente, por
dez anos, nos termos do art. 1.242, autoriza o interessado a registrá-la em seu
nome no Registro de Imóveis, valendo-lhe como título a sentença que julgar
consumado a usucapião. Parágrafo único. Se o possuidor não tiver título, o
prazo da usucapião será de vinte anos.
9.3.4. Classificação
a) Quanto à situação do prédio: no que pertine à situação do prédio, a servidão
pode ser: a1) urbana, se a utilidade incide sobre um prédio edificado, “e não
porque localizadas na zona urbana. O critério da distinção coloca-se na
natureza da servidão”24; a2) rústica, se a utilidade é proporcionada ao solo
do imóvel.
b) Quanto à exteriorização: b1) Aparente: é aparente a servidão conforme ela se
caracterize por alguma obra ou circunstância que faça ver a sua existência.
Assim, podemos exemplificar com a passagem de água por aqueduto. Já a
servidão de trânsito pode ser aparente ou não aparente, conforme exista ou
não alguma obra que confira visibilidade à passagem; b2) Não aparente: é
aquela que não se caracteriza por elemento de visibilidade. A lei confere
proteção possessória somente à servidão aparente, como podemos inferir dos
arts. 1.213 e 1.379. Nestes dispositivos, observa-se que a usucapião, pelo
exercício da posse contínua e incontestada da servidão, pelo prazo, somente
incide sobre as servidões aparentes. Além disso, reza o art. 1.213 que “o
disposto nos artigos antecedentes não se aplica às servidões não aparentes,
salvo quando os respectivos títulos provierem do possuidor do prédio
serviente, ou daqueles de quem este o houve”. Observa-se, portanto, que a
servidão não aparente somente confere proteção possessória ao titular do
prédio dominante se provier de título conferido pelo possuidor do prédio
serviente ou daqueles de quem este o houve. O Código Civil de 1916 era
mais claro sobre o tema, quando previa, no art. 697: “as servidões não
aparentes só podem ser estabelecidas por meio de transcrição no Registro
24
VENOSA, ob. Citada, p. 436.
58
de Imóveis”. O conteúdo do atual art. 1.379 pode levar à mesma conclusão,
pois somente se admite a usucapião sobre as servidões aparentes. A Súmula
415 do Supremo Tribunal Federal é um bom indicativo de como a
jurisprudência tem conferido proteção possessória às servidões aparentes,
independentemente de título registrado: ―Servidão de trânsito não titulada,
mas tornada permanente, sobretudo pela natureza das obras realizadas,
considera-se aparente, conferindo direito à proteção possessória‖;
c) Quanto ao modo de exercício: c1) Contínua: é a servidão que não depende de
ação humana para se caracterizar, mas apenas de elementos que a
caracterizem continuamente, como na passagem de águas; c2) Descontínua:
depende de ação humana para seu exercício, como na servidão de passagem;
d) Quanto ao encargo: d1) Positiva ou afirmativa: quando impõe ao titular do
prédio serviente a tolerância a alguma prática pelo titular do prédio
dominante, como a passagem, por exemplo; d2) Negativa: quando se impõe
ao titular do prédio serviente a obrigação de não fazer algo, como na
servidão de edificar a certa altura, por exemplo.
9.3.5. Exercício das servidões
9.3.5.1. Direito de conservação
Reza o art. 1.380 que o dono de uma servidão pode fazer todas as obras
necessárias à sua conservação e uso, e, se a servidão pertencer a mais de um prédio,
serão as despesas rateadas entre os respectivos donos. As obras, portanto, devem ser
feitas pelo dono do prédio dominante, a não ser que o contrário resulte do título
constitutivo (art. 1.381).
Neste último caso, quando a obrigação incumbir ao dono do prédio serviente,
este poderá exonerar-se, abandonando, total ou parcialmente, a propriedade ao dono do
dominante (art. 1.382, caput). Reza o parágrafo único que “se o proprietário do prédio
dominante se recusar a receber a propriedade do serviente, ou parte dela, caber-lhe-á
custear as obras”.
9.3.5.2. Livre exercício da servidão
A lei impede o dono do prédio serviente de embaraçar, de qualquer modo, o
exercício legítimo da servidão pelo titular do prédio dominante (art. 1.383).
9.3.5.3. Remoção da servidão
A lei dá ao dono do prédio serviente a prerrogativa de remover a servidão, de um
local para outro, desde que em nada diminua as vantagens do prédio dominante (art.
1.384, primeira parte).
Da mesma forma, confere-se ao dono do prédio dominante o mesmo direito,
qual seja de remover a servidão de um local para outro, e à sua custa, desde que haja
considerável incremento da utilidade e não prejudique o prédio serviente.
9.3.5.4. Restrição ao exercício da servidão
59
O exercício da servidão deve se restringir às necessidades do prédio dominante.
Assim, busca-se evitar, quanto possível, o agravamento do encargo do prédio serviente
(art. 1.385, caput).
Por isso, reza o parágrafo primeiro do referido dispositivo que “constituída para
certo fim, a servidão não se pode ampliar a outro”, a não ser, é lógico, que a ampliação
resulte de declaração expressa dos proprietários, na forma do 1.378.
Também por isso, disciplina o parágrafo segundo que “nas servidões de trânsito,
a de maior inclui a de menor ônus, e a menor exclui a mais onerosa”. Isto quer dizer
que, na servidão de trânsito, se há previsão de um encargo de gravame maior (passagem
de veículos, p. ex.), isto implica em se admitir também o menor (passagem a pé, p. ex.);
a contrario sensu, se o título indica apenas o encargo menos gravoso (passagem a pé),
não se pode exigir do dono do prédio serviente o mais gravoso (passagem de veículo).
Exceção à regra é a contida no parágrafo terceiro, que disciplina que “se as
necessidades da cultura, ou da indústria, do prédio dominante impuserem à servidão
maior largueza, o dono do serviente é obrigado a sofrê-la”. Entretanto, reza a parte
final do dispositivo: “mas tem (o proprietário do prédio serviente) direito a ser
indenizado pelo excesso”.
9.3.6. Extinção das servidões
9.3.6.1. Regra geral
A regra geral para extinção da servidão, uma vez registrada, é o cancelamento
(art. 1.387), para o qual, entretanto, deve haver consentimento do titular do prédio
dominante, inclusive do credor hipotecário (art. 1.387, parágrafo único).
9.3.6.2. Cancelamento judicial
Reza o art. 1.388 que “o dono do prédio serviente tem direito, pelos meios
judiciais, ao cancelamento do registro, embora o dono do prédio dominante lho
impugne:
I - quando o titular houver renunciado a sua servidão;
II - quando tiver cessado, para o prédio dominante, a utilidade ou a
comodidade, que determinou a constituição da servidão: isso pode
ocorrer no caso de abertura de nova estrada, por exemplo, para o caso de
servidão de trânsito
III - quando o dono do prédio serviente resgatar a servidão: o que se dá
pelo pagamento da vantagem ao dono do prédio dominante.
9.3.6.3. Extinção pelo não-uso, confusão ou contrato
Segundo o art. 1.389. Também se extingue a servidão, ficando ao dono do prédio
serviente a faculdade de fazê-la cancelar, mediante a prova da extinção:
60
I - pela reunião dos dois prédios no domínio da mesma pessoa
(confusão);
II - pela supressão das respectivas obras por efeito de contrato, ou de
outro título expresso (contrato);
III - pelo não uso, durante dez anos contínuos (não uso).
9.4. Usufruto
9.4.1. Conceito
O art. 713 do Código Civil de 1916, sem dispositivo correspondente no novo
código, conceituava o usufruto: “Constitui usufruto o direito real de fruir as utilidades
e frutos de uma coisa enquanto temporariamente destacado da propriedade”.
Caracteriza-se, portanto, pela transferência, a pessoa que não seja o proprietário,
do direito de usar e fruir da coisa, seja por ato negocial (inter vivos ou causa mortis –
contrato de doação, testamento, etc.), ou por imposição legal25.
De acordo com o art. 1.390, “o usufruto pode recair em um ou mais bens,
móveis ou imóveis, em um patrimônio inteiro, ou parte deste, abrangendo-lhe, no todo
ou em parte, os frutos e utilidades”. Pode recair, portanto, sobre bens móveis ou
imóveis. Como se trata de direito real, ―o usufruto de imóveis, quando não resulte de
usucapião, constituir-se-á mediante registro no Cartório de Registro de Imóveis‖ (art.
1.391).
O usufruto tem o condão de transferir ao usufrutuário a posse direta da coisa e o
direito de usá-la e fruir todas as suas utilidades, por isso, salvo disposição em contrário,
estende-se aos acessórios da coisa e seus acrescidos (art. 1.392, caput). Ao proprietário
resta a nua-propriedade, mas tem ele o direito à restituição dos acessórios e acrescidos
consumíveis que ainda existirem ao tempo da extinção do usufruto, bem como o
equivalente ou o valor daqueles já consumidos (art. 1.392, § 2.º) 26.
Embora o usufruto torne nua a propriedade do dono da coisa, este pode alienar o
seu domínio a terceiro. Este, porém, deve respeitar o direito do usufrutuário de usar e
fruir a coisa.
Por outro lado, a lei veda ao usufrutuário o direito a alienar a titularidade do
direito ao usufruto (art. 1.393). Entretanto, o mesmo dispositivo lhe resguarda a cessão,
25
Art. 1.652. O cônjuge, que estiver na posse dos bens particulares do outro, será para com este e seus
herdeiros responsável: I - como usufrutuário, se o rendimento for comum; (...) Art. 1.689. O pai e a mãe,
enquanto no exercício do poder familiar: I - são usufrutuários dos bens dos filhos; II - têm a
administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade. (...) Art. 1.952. A substituição
fideicomissária somente se permite em favor dos não concebidos ao tempo da morte do testador.
Parágrafo único. Se, ao tempo da morte do testador, já houver nascido o fideicomissário, adquirirá este a
propriedade dos bens fideicometidos, convertendo-se em usufruto o direito do fiduciário.
26
§ 2º Se há no prédio em que recai o usufruto florestas ou os recursos minerais a que se refere o art.
1.230, devem o dono e o usufrutuário prefixar-lhe a extensão do gozo e a maneira de exploração. § 3º Se
o usufruto recai sobre universalidade ou quota-parte de bens, o usufrutuário tem direito à parte do tesouro
achado por outrem, e ao preço pago pelo vizinho do prédio usufruído, para obter meação em parede,
cerca, muro, vala ou valado.
61
a título gratuito ou oneroso, do exercício do direito resultante do usufruto. Isto quer
dizer que o cessionário do usufruto responde perante o usufrutuário, sendo este, sempre,
o titular dos direitos e deveres inerentes ao usufruto, perante o proprietário, previstos no
Código Civil (arts. 1.394/1.409).
9.4.1.1. Distinção com outros institutos.
O usufruto não se confunde com a enfiteuse. Esta, abolida pelo atual Código
(excepcionadas apenas as já existentes e aquelas incidentes sobre terrenos de marinha,
reguladas por lei especial – art. 2.038), era perpétua e transmissível, enquanto o usufruto
extingue-se com a morte do usufrutuário (art. 1.410, I) e não se transmite ou aliena, a
não ser com relação ao exercício do direito.
Também não se confunde com a locação, o arrendamento e o comodato. Tais
contratos geram apenas direitos pessoais e a transferência da posse direta da coisa para
o locatário, arrendatário ou comodatário. No usufruto, cria-se direito real em favor do
usufrutuário, com todas as características desta espécie de direitos e sua respectiva
natureza jurídica.
Por fim, não há que se misturar o usufruto com o fideicomisso. Neste, o testador
institui uma pessoa, chamada de fiduciário, ao qual se transmitirá a propriedade
resolúvel de um dos bens da herança, com o encargo de transmitir a coisa a outra,
chamada de fideicomissário, por ocasião da morte do fiduciário, a certo tempo ou sob
certa condição. Portanto, vê-se que, no fideicomisso, o fiduciário adquire a propriedade
da coisa, podendo, inclusive, aliená-la. No usufruto, o usufrutuário adquire apenas a
posse direta e direito de uso e gozo, sem direito de alienar a coisa nem o próprio
usufruto.
9.4.2. Direitos do usufrutuário
9.4.2.1. Regra geral
A regra geral instituída pelo art. 1.394 do Código Civil reza que “o usufrutuário
tem direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos”. É a consagração do
conceito supra desenvolvido, pois, nesse dispositivo, percebe-se que o legislador dá ao
usufrutuário a posse e os direitos de uso da coisa, administração e fruição, ou seja,
percepção dos frutos advindos dela.
Quanto à posse direta e o direito de uso e administração da coisa, as
denominações já se explicam.
9.4.2.2. Direito aos frutos.
Quanto ao direito aos frutos, aí reside a principal razão de permanência do
instituto, visando proteger o usufrutuário e dar-lhe, na maioria das situações, condições
de subsistência. Disciplina o art. 1.396 que, salvo direito adquirido por outrem (o que se
62
pode dar no caso de anticrese, por exemplo), o usufrutuário faz seus os frutos naturais,
pendentes ao começar o usufruto, sem encargo de pagar as despesas de produção.
Neste regramento, importa aplicar as regras referentes à classificação dos frutos
em pendentes e separados, pois o parágrafo único do art. 1.396 prevê que ―os frutos
naturais, pendentes ao tempo em que cessa o usufruto, pertencem ao dono, também sem
compensação das despesas.‖. Entretanto, prevê o art. 95 que “apesar de ainda não
separados do bem principal, os frutos e produtos podem ser objeto de negócio
jurídico”. Por isso, antes da constituição do usufruto, pode o proprietário ter constituído
negócio jurídico sobre os frutos pendentes, o qual deve ser respeitado pelo usufrutuário,
consoante se observa, inclusive, do caput do art. 1.396. Após a constituição do usufruto,
no entanto, não pode mais o proprietário transigir sobre os frutos naturais, porque
passam a pertencer ao usufrutuário.
Recaindo o usufruto sobre animais, as crias pertencem ao usufrutuário,
deduzidas quantas bastem para inteirar as cabeças de gado existentes ao começar o
usufruto (art.1.397).
No tocante aos frutos civis (rendimentos), pertencem ao proprietário aqueles já
vencidos quando da data inicial do usufruto. Aqueles que se vencerem na constância do
usufruto pertencerão ao usufrutuário (salvo a hipótese do art. 95, já referida acima). Por
fim, pertencem também ao usufrutuário, também, aqueles já vencidos ao tempo em que
cessar o usufruto, ainda que não tenham sido adimplidos na data do vencimento.
9.4.2.3. Direito de arrendar/Proibição de modificação da destinação econômica
O art. 1.399 dá ao usufrutuário o direito de usufruir da coisa em pessoa, ou
mediante arrendamento. Entretanto, não pode ele modificar a destinação econômica da
coisa sem expressa autorização do proprietário. Exemplo de modificação da destinação
econômica seria a transformação de prédio residencial, dado em usufruto, em
estabelecimento comercial.
9.4.2.4. Direito de acrescer
O direito de acrescer está previsto, genericamente, pelo art. 1.411 do Código
Civil: “Constituído o usufruto em favor de duas ou mais pessoas, extinguir-se-á a parte
em relação a cada uma das que falecerem, salvo se, por estipulação expressa, o
quinhão desses couber ao sobrevivente”.
Assim, se o usufruto for constituído em favor de duas ou mais pessoas, a morte
de uma delas somente gera ao(s) demais o direito de acrescer o objeto do usufruto se
houver estipulação expressa. Se não, a morte de um deles é causa de extinção do
usufruto quanto à parte da pessoa que falecer.
9.4.3. Deveres do usufrutuário
9.4.3.1. Dever de conservação
O usufrutuário tem o dever de conservar a coisa que lhe é dada em usufruto,
tanto é que lhe incumbem: I - as despesas ordinárias de conservação dos bens no estado
63
em que os recebeu; II - as prestações e os tributos devidos pela posse ou rendimento da
coisa usufruída. (art. 1.403).
Para tanto, deve, antes de assumir o usufruto, inventariar, à sua custa, os bens
que receber, determinando o estado em que se acham.
Pode o proprietário exigir do usufrutuário a prestação de caução, fidejussória ou
real, para garantia da conservação dos bens dados usufruídos e de sua entrega ao final
do usufruto. Reza o art. 1.401 que “o usufrutuário que não quiser ou não puder dar
caução suficiente perderá o direito de administrar o usufruto; e, neste caso, os bens
serão administrados pelo proprietário, que ficará obrigado, mediante caução, a
entregar ao usufrutuário o rendimento deles, deduzidas as despesas de administração,
entre as quais se incluirá a quantia fixada pelo juiz como remuneração do
administrador”.
Pode o usufruto, no entanto, e aliás, com freqüência, decorrer de doação,
reservando-se o doador no direito de usufruto vitalício da coisa. Neste caso, por
imposição lógica, o legislador prevê, no art. 1.400, parágrafo único, que “não é
obrigado à caução o doador que se reservar o usufruto da coisa doada”.
De qualquer sorte, o usufrutuário não é obrigado a pagar as deteriorações
resultantes do exercício regular do usufruto (art. 1.402). Assim, se o usufruto é de um
veículo, não pode o usufrutuário ser responsabilizado pela conservação de seu valor de
mercado, pois a desvalorização resulta do exercício regular do usufruto.
9.4.3.2. Reparações extraordinárias
Incumbem ao dono as reparações extraordinárias (imprevistas) e as que não
forem de custo módico; mas o usufrutuário lhe pagará os juros do capital despendido
com as que forem necessárias à conservação, ou aumentarem o rendimento da coisa
usufruída (art. 1.404, caput). Se o dono não fizer as reparações a que está obrigado, e
sendo elas indispensáveis à conservação da coisa, pode o usufrutuário realizá-las e
cobrar do proprietário a importância despendida. Para esses efeitos, não se consideram
módicas as despesas superiores a 2/3 (dois terços) do líquido rendimento de um ano
9.4.3.3. Usufruto de patrimônio
Reza o art. 1.405 que “se o usufruto recair num patrimônio, ou parte deste, será
o usufrutuário obrigado aos juros da dívida que onerar o patrimônio ou a parte dele”.
9.4.3.4. Dever de ciência quanto às lesões
O usufrutuário é obrigado a dar ciência ao dono de qualquer lesão produzida
contra a posse da coisa, ou os direitos deste (art. 1.406).
9.4.3.5. Pagamento do seguro
Se a coisa estiver segurada, a obrigação de pagar o prêmio do seguro é do
usufrutuário, mas é do proprietário o direito de cobrar a indenização contra o segurador,
ainda que o seguro tenha sido feito pelo usufrutuário (art. 1.407). O parágrafo segundo
64
do referido dispositivo reza, porém, que, “em qualquer hipótese, o direito do
usufrutuário fica sub-rogado no valor da indenização do seguro”. Tal quer dizer que o
usufrutuário tem direito a ser ressarcido, pelo valor do direito real que perdeu, a ser
deduzido da indenização a ser paga ao proprietário.
9.4.3.6. Destruição de edifício sujeito a seguro
Reza o art. 1.408 que “se um edifício sujeito a usufruto for destruído sem culpa
do proprietário, não será este obrigado a reconstruí-lo, nem o usufruto se
restabelecerá, se o proprietário reconstruir à sua custa o prédio; mas se a indenização
do seguro for aplicada à reconstrução do prédio, restabelecer-se-á o usufruto”.
9.4.3.7. Desapropriação do prédio sujeito a usufruto
Em caso de desapropriação, extingue-se o usufruto, mas, sendo o proprietário
indenizado, aplica-se regra semelhante à do art. 1.407, parágrafo segundo, ou seja, subroga-se no ônus do usufruto a indenização paga (art. 1.409), devendo deduzir-se do
valor dado ao proprietário a quantia referente ao direito real perdido pelo usufrutuário.
9.4.4. Espécies de usufruto
a) quanto aos bens: pode ser geral, parcial ou particular; geral quando
recai sobre todo um patrimônio (universalidade de bens); parcial quando
recai sobre parte de um patrimônio; particular quando recai sobre bens
determinados;
b) quanto à constituição: o usufruto pode ser legal, quando decorre da lei
(vide nota 23) ou convencional, quando decorre de ato inter vivos ou
mortis causa;
c) quanto à duração: pode ser temporário, se estabelecido com termo
final, ou por algum motivo do qual se origina, cessando este; ou vitalício,
quando estabelecido para vigorar até a morte do usufrutuário. Com
relação às pessoas jurídicas, pode o usufruto ser constituído com o prazo
máximo de 30 (trinta) anos (art. 1.410);
d) quanto à extensão: usufruto pleno, aquele que abrange os acessórios da
coisa e seus acrescidos (art. 1392); usufruto, o que se limita a certas
utilidades da coisa;
e) Usufruto próprio: estabelecido sobre coisas infungíveis; usufruto
impróprio ou quase-usufruto: é aquele que se estabelece sobre coisas
fungíveis ou consumíveis. Chama-se de impróprio ou quase-usufruto
porque se, ao final, o usufrutuário deverá devolver ao proprietário coisa
equivalente ou o seu valor, não devolverá a própria coisa, tendo
ocorrido, portanto, em seu favor, a propriedade. Era disciplinado pelo
art. 726 do Código Civil (Art. 726. As coisas que se consomem pelo uso caem para
logo no domínio do usufrutuário, ficando, porém, este obrigado a restituir, findo o
usufruto, o equivalente em gênero, qualidade e quantidade, ou, não sendo possível, o
seu valor, pelo preço corrente ao tempo da restituição)‖ . Não é previsto no Novo
Código e pode ser substituído, livremente, pelo arrendamento ou pelo
mútuo. Admite-se que o caso do art. 1.395 é de usufruto impróprio: “Art.
1.395. Quando o usufruto recai em títulos de crédito, o usufrutuário tem
direito a perceber os frutos e a cobrar as respectivas dívidas. Parágrafo
único. Cobradas as dívidas, o usufrutuário aplicará, de imediato, a
65
importância em títulos da mesma natureza, ou em títulos da dívida
pública federal, com cláusula de atualização monetária segundo índices
oficiais regularmente estabelecidos”.
9.4.5. Extinção do usufruto
O usufruto se extingue pelas causas previstas pelo art. 1.410 (I - pela renúncia ou
morte do usufrutuário; II - pelo termo de sua duração; III - pela extinção da pessoa
jurídica, em favor de quem o usufruto foi constituído, ou, se ela perdurar, pelo decurso
de trinta anos da data em que se começou a exercer; IV - pela cessação do motivo de
que se origina; V - pela destruição da coisa, guardadas as disposições dos arts. 1.407,
1.408, 2ª parte, e 1.409; VI - pela consolidação; VII - por culpa do usufrutuário, quando
aliena, deteriora, ou deixa arruinar os bens, não lhes acudindo com os reparos de
conservação, ou quando, no usufruto de títulos de crédito, não dá às importâncias
recebidas a aplicação prevista no parágrafo único do art. 1.395; VIII - Pelo não uso, ou
não fruição, da coisa em que o usufruto recai (arts. 1.390 e 1.399), ressalvado o direito
de acrescer (cf item 10.4.2.4).
9.5. Uso
9.5.1. Conceito
Segundo a definição de NERY JR e NERY:
Uso é direito real sobre bem móvel ou imóvel de propriedade de terceiro,
instituído exclusivamente ex voluntate, pelo qual o usuário tem o direito de
gozar da coisa e perceber os seus frutos (naturais ou civis), mas limitadamente
(modica perceptio) ao necessário à sua vida e de sua família (tantum necessitati
servit).27
Caracteriza-se o uso, portanto, e diferencia-o do usufruto as seguintes
circunstâncias: a) somente se constitui por ato voluntário, não existindo uso decorrente
da lei; b) como no usufruto, o usuário tem o direito a usar da coisa e perceber os frutos,
mas esta percepção se limita às necessidades dele e de sua família; c) o uso é
personalíssimo ou incessível, ou seja, não admite, como no usufruto, a cessão de seu
exercício a outrem; d) o uso é, por fim, indivisível, pois não admite a sua constituição
pro parte.
9.5.2. Regras
Na conceituação de necessidades pessoais do usuário, o art. 1.412, § 1.º defineas conforme a sua condição social e o lugar onde viver. Já com relação às necessidades
da família do usuário, o parágrafo segundo do mesmo dispositivo informa que elas
compreendem as de seu cônjuge, dos filhos solteiros e das pessoas de seu serviço
doméstico.
Por fim, o art. 1.413 dispõe que “são aplicáveis ao uso, no que não for contrário
à sua natureza, as disposições relativas ao usufruto”. Contrário à natureza do uso é, por
exemplo, o disposto no art. 1.393, parte final, que dá ao usufrutuário o direito de ceder,
por título gratuito ou oneroso, o exercício do direito dele decorrente.
27
NERY JR, Nélson e NERY, Rosa Maria Andrade. Ob. Citada, p. 712.
66
9.6. Habitação
9.6.1. Conceito
Dispõe o art. 1.414 do Código Civil que “quando o uso consistir no direito de
habitar gratuitamente casa alheia, o titular deste direito não a pode alugar, nem
emprestar, mas simplesmente ocupá-la com sua família”.
Observa-se, portanto, que a habitação é uma espécie de uso que incide,
entretanto, sobre imóvel residencial, dando ao usuário o direito real de habitar
gratuitamente casa alheia (se houver pagamento, torna-se locação), não podendo ele
alugar nem emprestar a coisa, mas simplesmente ocupá-la com sua família. O conceito
de família, para esse efeito, deve ser o do art. 1.412, § 2.º, embora, segundo Orlando
Gomes, ele não esteja impedido “contudo, de ter entre os moradores da casa pessoas
que não sejam de sua família, desde, porém, que não paguem hospedagem”.
À semelhança do uso, do qual a habitação, como se vê, é modalidade, esta
também é personalíssima e para ela também se aplicam as disposições relativas ao
usufruto, no que não for incompatível (art. 1.416), entretanto, enquanto o uso recai
sobre coisas móveis ou imóveis, a habitação tem por objeto somente ocupação de
imóvel residencial (urbano ou rural); além disso, na habitação se admite a constituição
do direito real em favor de mais de uma pessoa (art. 1.415), hipótese em que qualquer
delas que sozinha habite a casa não terá de pagar aluguel à outra ou às outras, mas
não as pode inibir de exercerem, querendo, o direito, que também lhes compete, de
habitá-la.
Por fim, o direito real de habitação, diferentemente do uso, pode decorrer de lei,
como no caso do art. 1.831:
Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será
assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito
real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família,
desde que seja o único daquela natureza a inventariar 28.
9.7. Direito real de aquisição – direito do promitente comprador
9.7.1. Conceito
O direito do promitente comprador, como se vê na epígrafe, é direito real de
aquisição da coisa. Para se compreender a necessidade do legislador de disciplinar a
matéria nesses termos, é necessário que se faça digressão sobre a eficácia do negócio
jurídico de compra e venda no ordenamento jurídico brasileiro.
É que, como vimos, no sistema brasileiro, inspirado no romano-germânico, a
simples contratação não tem o condão de transmitir a propriedade, o que só ocorre, em
28
Existe discussão doutrinária a respeito da permanência em vigor do art. 7.º, parágrafo único da Lei
9.278/96, que dava ao companheiro (União Estável) direito real de habitação sobre o imóvel utilizado
como moradia pelos companheiros, em razão de sua não previsão expressa no novo Código Civil (cf.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 15.ª ed. Rio : Forense. 2004. Vol. VI, p.
162).
67
se tratando de imóvel, com a transcrição do título no Registro de Imóveis (art. 1.245), o
que já era regra no Código Civil de 1916 (arts. 530, 531, caput, 533 e 860, parágrafo
único).
Ocorre que nem sempre as partes que celebravam negócios jurídicos de compra
e venda de imóveis tinham condições imediatas de transferir a propriedade junto ao
Cartório de Registro de Imóveis, seja por não poderem custear as despesas da
transferência ou por algum impedimento legal momentâneo. Celebravam, portanto, um
compromisso de compra e venda.
Esse compromisso de compra e venda, em regra, era irretratável. No entanto, o
promitente comprador, em várias oportunidades, era constrangido por atos do vendedor,
que continuava proprietário da coisa. Isso significava que a coisa vendida em
compromisso de compra e venda, continuando no patrimônio do vendedor, estava
sujeito à penhora, hipoteca, e até mesmo venda a terceiros.
Para proteger a situação do promitente comprador, portanto, o legislador previu,
no Decreto-Lei 58, de 10 de dezembro de 1937, o direito real de aquisição àquele que
adquirisse imóvel loteado, desde que averbasse o título. Veja-se o texto dos s. 4.º e 5.º:
Art. 4.º. Nos cartórios do registro imobiliário haverá um livro auxiliar na forma
da lei respectiva e de acordo com o modelo anexo. Nele se registrarão,
resumidamente: a) por inscrição, o memorial de propriedade loteada; b) por
averbação, os contratos de compromisso de venda e de financiamento, suas
transferências e rescisões. Parágrafo único. No livro de transcrição e à marge
do registro da propriedade loteada, averbar-se-á a inscrição assim que efetuada.
Art. 5.º. A averbação atribui ao compromissário direito real oponível a terceiro,
quanto à alienação ou oneração posterior, e far-se-á à vista do instrumento de
compromisso de venda, em que o oficial lançará a nota indicativa do livro,
página e data do assentamento.
O mesmo diploma legal conferiu o mesmo direito aos promitentes compradores
de imóveis não loteados, em seu art. 22:
Os contratos, sem cláusula de arrependimento, de compromisso de compra e
venda e cessão de direitos de imóveis não loteados, cujo preço tenha sido pago
no ato de sua constituição ou deva sê-lo em uma ou mais prestações, desde que
inscritos a qualquer tempo, atribuem aos compromissários direito real oponível
a terceiros, e lhes conferem o direito de adjudicação compulsória nos termos
dos arts. 16 desta Lei, 640 e 641 do Código de Processo Civil.
A Lei 6.766/79, que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano, também previu
o compromisso de compra e venda em seu art. 25.
Passou-se a se considerar esse direito, portanto, como direito real, porque, uma
vez registrado, era oponível a terceiros. Implementando a necessidade de registro para
oponibilidade erga omnes, o STF editara a Súmula 621, que previa que “não enseja
embargos de terceiro à penhora a promessa de compra e venda não inscrita no registro
de Imóveis”.
A Súmula 621, no entanto, era equivocada, pois o art. 1.046 do Código de
Processo Civil protege, por embargos de terceiro, não só o senhor (proprietário), como o
possuidor. Por isso, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 84, na qual se prevê
68
que “é admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse
advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido de
registro”.
É o direito do promitente comprador, portanto, direito real de aquisição
decorrente de promessa de compra e venda, dando ao promitente comprador o direito a
exigir a escrituração do imóvel, uma vez cumprida sua prestação, bem como o de opor
esse direito a terceiros, uma vez registrado no Registro de Imóveis.
9.7.2. Regras
Dispõe o art. 1.417 do Código Civil:
Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou
arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada
no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito
real à aquisição do imóvel.
O texto fornece a interpretação de que a formação do direito real de aquisição
depende do registro no Cartório de Registro de Imóveis, o que é verdade, pois, nos
termos do art. 1.227, “Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por
atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos
referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código”.
Para a configuração do direito real de aquisição, portanto, é necessário o registro
do título no Registro de Imóveis, máxime para o efeito da oponibilidade erga omnes
desse direito.
Coisa diversa, entretanto, é o direito pessoal do promitente comprador à
adjudicação compulsória do imóvel adquirido. Vejamos o texto do art. 1.418:
Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do
promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a
outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no
instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do
imóvel.
Assim, quando o direito à escrituração definitiva da compra e venda é exercido
diretamente contra o promitente vendedor, não se lhe condiciona ao registro, consoante
conclusão do Enunciado 95 da Jornada I do STJ: “o direito à adjudicação compulsória,
(CC, 1.418), quando exercido em face do promitente vendedor, não se condiciona ao
registro da promessa de compra e venda no cartório de registro imobiliário (Súmula
239 do STJ)”.
E o texto da Súmula 239: “O direito à adjudicação compulsória não se
condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis”.
Lembre-se, entretanto, que, em se tratando de cumprimento de obrigação, cabe
ao devedor a exceção de contrato não cumprido, prevista no art. 476, in verbis: “Nos
contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação,
pode exigir o implemento da do outro” e no art. 640 do Código de Processo Civil:
69
“Tratando-se de contrato, que tenha por objeto a transferência da propriedade de coisa
determinada, ou de outro direito, a ação não será acolhida se a parte, que a intentou,
não cumprir a sua prestação, nem a oferecer, nos casos e formas legais, salvo se ainda
não exigível”.
9.8. Direitos reais de garantia
9.8.1. Conceito
Direito real de garantia é o que dá ao credor de algum crédito a prerrogativa de
fazer valer seu direito pessoal sobre um específico do patrimônio do devedor.
A garantia nem sempre recaiu, exclusivamente, sobre o patrimônio do devedor.
Em período anterior à chamada Lex Poetelia Papiria (326 a.C.), o devedor garantia o
pagamento da dívida com a disponibilidade física de seu corpo, podendo ser
escravizado em caso de inadimplemento.
O sistema de execução de dívidas, no direito atual, é patrimonial, com as
raríssimas exceções do inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação
alimentícia e a do depositário infiel (CF, art. 5.º, LXVII), nos quais se autoriza a prisão
civil do devedor.
Destarte, ainda que subsistam garantias pessoais ou fidejussórias (fiança e aval,
por exemplo), estas, por sua vez, recairão sobre o patrimônio do fiador, e não sobre sua
pessoa.
O fim, portanto, do patrimônio do devedor, é a constrição judicial (penhora) em
eventual ação de execução proposta pelo credor, para futura venda em juízo e satisfação
do crédito.
Como, em muitas vezes, torna-se trabalhoso ao credor descobrir algum bem no
patrimônio do devedor, após o inadimplemento, podem as partes de uma relação
jurídica obrigacional estabelecer, já no contrato, ou em momento posterior, a vinculação
de uma coisa pertencente ao patrimônio do devedor para garantir o pagamento do
débito.
9.8.2. Princípios
A garantia, como se vê, gera para o credor um direito sobre a coisa alheia, mas
destacado da propriedade. É, pois, direito real sobre coisa alheia, porque confere a
terceiro um poder sobre a coisa dada em garantia.
Diferencia-se das preferências e dos privilégios creditórios (arts. 964 e 965), pois
estes estabelecem, em favor de determinados credores, a preferência para receber
primeiro, entretanto, sem vinculação a um bem determinado. A preferência, portanto
(ex.: crédito privilegiado da Fazenda Pública e dos empregados em falência), é direito
pessoal e recai, genericamente, sobre todo o patrimônio do devedor.
Tem o direito real de garantia certas características, algumas dos direitos reais
em geral e outras próprias da garantia.Vejamos:
70
9.8.2.1. Vinculação do bem dado em garantia
A garantia tem o efeito de vincular o bem gravado ao cumprimento da obrigação
(art. 1.419). Em caso de descumprimento, tem o credor o direito de fazer valer o crédito
sobre o bem especificamente dado em garantia. Isto revela, também, o caráter de
especialidade ou especialização da garantia, pois, com ela, não só se dá ao credor o
direito de excutir, especificamente, o bem gravado, como ao devedor a prerrogativa de
liberar o restante de seu patrimônio.
9.8.2.2. Capacidade do sujeito e idoneidade do objeto
Tema de bastante relevância nos direitos reais de garantia é a necessidade de que
o sujeito que empenha, hipoteca ou dá em anticrese tenha capacidade para alienar.
Trata-se, portanto, da capacidade e legitimidade do sujeito. Assim, por exemplo, os bens
de menores somente podem ser alienados e, portanto, hipotecados ou empenhados pelos
pais com autorização judicial. Em alguns casos, como o da tutela e curatela, não se
admite a gravação do bem com ônus real. Por fim, o cônjuge, qualquer que seja o
regime de bens, não pode dá-los em garantia real sem a outorga do outro.
Veja-se, aliás, a opinião de PEREIRA:
Nesta ordem de idéias, salienta-se que os bens do menor sob pátrio poder
exigem prévia autorização judicial para serem dados em garantia real; que os
imóveis pertencentes a menor sob tutela jamais poderão ser hipotecados, pois é
conditio legis de sua alienação a hasta pública e esta é incompatível com a
hipoteca (CLÓVIS BEVILACQUA); que os bens pertencentes a curatelados
não podem ser hipotecados (salvo o caso dos pródigos, art. 459 do Cód. Civil).
Não obstante opiniões em contrário, a jurisprudência assentou-se no sentido da
opinião aqui esposada, que se ampara aliás em boas autoridades.
Qualquer que seja o regime de bens, a outorga do outro cônjuge é
indispensável à constituição de qualquer ônus real sobre imóvel, e, pois, à
instituição das garantias de hipoteca e anticrese.29
Como se vê, trata-se não só da capacidade do sujeito, devendo ser ele maior,
como, também, da sua legitimidade, ou seja, deve o agente ser titular do direito sobre a
coisa (proprietário) e não possuir nenhum impedimento legal para alienar (ausência de
outorga do cônjuge, cláusula de inalienabilidade, etc.).
O art. 1.420 dispõe:
Art. 1.420. Só aquele que pode alienar poderá empenhar, hipotecar ou dar em
anticrese; só os bens que se podem alienar poderão ser dados em penhor,
anticrese ou hipoteca. § 1º A propriedade superveniente torna eficaz, desde o
registro, as garantias reais estabelecidas por quem não era dono. § 2º A coisa
comum a dois ou mais proprietários não pode ser dada em garantia real, na sua
totalidade, sem o consentimento de todos; mas cada um pode individualmente
dar em garantia real a parte que tiver.
Observa-se que o texto legal impõe não só a capacidade do sujeito, mas,
também, a sua titularidade sobre a coisa, excetuando, entretanto, o caso em que o
29
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 4.ª ed. Rio : Forense. 1981. Vol. IV, p.
252
71
sujeito, ainda não sendo proprietário, dá a coisa em garantia, valendo esta em caso de
aquisição superveniente da propriedade (§ 1.º). Em caso de condomínio, a coisa não
pode ser dada, na totalidade, em garantia, sem o consentimento de todos, entretanto,
cada condômino pode dar em garantia sua parte ideal na coisa.
Por fim, entende-se, também, que, por aplicação do art. 496 (É anulável a venda de
ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente
houverem consentido), não pode o ascendente oferecer garantia em favor de descendente,
pois não pode alienar a ele seus bens sem o consentimento dos demais. Não é a opinião
que prevalece, entretanto, na jurisprudência30
Além da capacidade e legitimidade do agente, o dispositivo supra transcrito
exige, também, a idoneidade do objeto, pois “só os bens que se podem alienar poderão
ser dados em penhor, anticrese ou hipoteca” (art. 1.420, caput, parte final). Assim, os
bens fora do comércio (bens públicos, por exemplo) não são idôneos para a garantia.
Também não o são os bens gravados com cláusula de inalienabilidade, em caso de
doação ou testamento, por exemplo (art. 1.911).
A idoneidade do objeto significa também, por fim, que o objeto da garantia deve
ser próprio e adequado para a espécie convencionada. Assim, objeto idôneo do penhor
são os bens móveis; da hipoteca, os bens imóveis, os navios e as aeronaves; da
anticrese, somente os imóveis.
9.8.2.3. Acessoriedade
A garantia é um direito acessório de um direito principal, qual seja, o direito de
crédito. Assim, em respeito à regra geral acessorium sequitur principale, uma vez
reconhecida a invalidade da obrigação principal, invalida-se, também, a garantia, em
aplicação ao art. 184:
Art. 184. Respeitada a intenção das partes, a invalidade parcial de um negócio
jurídico não o prejudicará na parte válida, se esta for separável; a invalidade
da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a destas
não induz a da obrigação principal.
9.8.2.4. Direito de preferência ou prioridade
O direito de preferência significa conferir ao credor hipotecário ou pignoratício o
direito de excutir, em primeiro lugar, o bem dado em garantia, ou seja, terá ele
preferência específica, sobre qualquer outro crédito, para a constrição judicial do bem
empenhado ou hipotecado.
O 1.422 prevê: “O credor hipotecário e o pignoratício têm o direito de excutir a
coisa hipotecada ou empenhada, e preferir, no pagamento, a outros credores,
observada, quanto à hipoteca, a prioridade no registro”. Além da preferência sobre
outros créditos, portanto, dá-se, na hipoteca, a preferência do credor de primeiro grau
sobre os de grau de menor, o que se verifica pelo registro.
30
―Hipoteca entre ascendentes e descendentes. A hipoteca não é venda, e, sendo legal, não há como
presumi-la simulada, ou fraudulenta, donde não se poder, sob qualquer aspecto, equipará-la à venda
prevista no citado inciso legal (RT 182/340)‖ (NERY JR, Nélson e NERY, Rosa Maria Andrade. Ob.
Citada, p. 413).
72
Esse direito, entretanto, não prevalece quando a lei estabelece, em favor de
algum crédito, preferência sobre quaisquer outros, como no caso do art. 965 e dos
créditos com privilégio geral na falência. Dispõe o parágrafo único do art. 1.422:
“Excetuam-se da regra estabelecida neste artigo as dívidas que, em virtude de outras
leis, devam ser pagas precipuamente a quaisquer outros créditos”.
9.8.2.5. Direito de seqüela
O direito de seqüela, inerente aos direitos reais, dá ao credor a prerrogativa de
fazer com que a garantia possa seguir a coisa onde quer que esteja. Assim, ainda que o
proprietário da coisa hipotecada ou empenhada a aliene a terceiro, o adquirente suporta
os ônus da garantia em favor do credor.
9.8.2.6. Indivisibilidade da garantia
A indivisibilidade significa que, em regra, a coisa dada em garantia responde
pela integralidade do débito, até que ele seja totalmente quitado. Isso importa em que o
pagamento parcial do débito, ou de parcelas ajustadas, não implica em liberação parcial
da garantia, a não ser que haja expressa previsão contratual. Veja-se, a respeito, o art.
1.421: “O pagamento de uma ou mais prestações da dívida não importa exoneração
correspondente da garantia, ainda que esta compreenda vários bens, salvo disposição
expressa no título ou na quitação”.
Corolário desse princípio é a letra do art. 1.429, in verbis:
Art. 1.429. Os sucessores do devedor não podem remir parcialmente o penhor
ou a hipoteca na proporção dos seus quinhões; qualquer deles, porém, pode
fazê-lo no todo. Parágrafo único. O herdeiro ou sucessor que fizer a remição
fica sub-rogado nos direitos do credor pelas quotas que houver satisfeito.
9.8.2.7. Vencimento antecipado da dívida garantida
Por fim, as dívidas garantidas por ônus real geram, em certos casos, o efeito de
antecipar o vencimento do débito, tal como se observa pelo texto do art. 1.425:
Art. 1.425. A dívida considera-se vencida: I - se, deteriorando-se, ou
depreciando-se o bem dado em segurança, desfalcar a garantia, e o devedor,
intimado, não a reforçar ou substituir; II - se o devedor cair em insolvência ou
falir; III - se as prestações não forem pontualmente pagas, toda vez que deste
modo se achar estipulado o pagamento. Neste caso, o recebimento posterior da
prestação atrasada importa renúncia do credor ao seu direito de execução
imediata; IV - se perecer o bem dado em garantia, e não for substituído; V - se
se desapropriar o bem dado em garantia, hipótese na qual se depositará a parte
do preço que for necessária para o pagamento integral do credor.
Importante ressaltar que esse princípio, resultante da lei, aplica-se somente às
dívidas garantidas com ônus real. Nos créditos quirografários, o vencimento antecipado,
em qualquer caso, inclusive quando não se pagar alguma prestação, deve decorrer do
contrato ou de lei especial, como no caso da alienação fiduciária, por exemplo (DL
911/69).
73
Mas, nos termos do art. 1.426, “nas hipóteses do artigo anterior, de vencimento
antecipado da dívida, não se compreendem os juros correspondentes ao tempo ainda
não decorrido”.
9.8.2.8. Transitoriedade
Os direitos reais de garantia, ao contrário dos direitos reais, em geral, que são
perpétuos, são transitórios, porque somente duram até a extinção da obrigação à qual se
vinculam.
9.8.3. Disposições gerais
O legislador dispôs, como regras gerais sobre os direitos reais de garantia,
algumas determinações legais, como:
9.8.3.1. Prazo máximo do direito de retenção do credor anticrédito.
O credor anticrético tem, pela natureza da anticrese, direito de retenção da coisa
até o pagamento da dívida. Dispõe o art. 1.423, no entanto: “O credor anticrético tem
direito a reter em seu poder o bem, enquanto a dívida não for paga; extingue-se esse
direito decorridos quinze anos da data de sua constituição”.
9.8.3.2. Requisitos de eficácia do contrato constitutivo da garantia
A lei estabelece requisitos para eficácia do contrato constitutivo do direito real
de garantia. De acordo com o art. 1.424 são eles: I - o valor do crédito, sua estimação,
ou valor máximo; II - o prazo fixado para pagamento; III - a taxa dos juros, se houver.
IV - o bem dado em garantia com as suas especificações (princípio da especialidade ou
da especialização). Acrescente-se a esses requisitos o registro: em caso de penhor
comum e sobre títulos de crédito, no cartório de títulos e documentos; no penhor rural,
industrial e mercantil e na hipoteca, no cartório de registro de imóveis.
O caput do art. 1.424 fala, expressamente, em eficácia, localizando tais
requisitos, portanto, no plano da eficácia do negócio jurídico constitutivo da garantia.
Assim, há de se concluir que a falta dos requisitos acima faz com que o negócio
jurídico não tenha a eficácia de criar direito real em favor do credor. A conseqüência
disto é a de que o negócio vale entre as partes, sujeitando o bem específico à quitação
do débito, entretanto, não possui a oponibilidade erga omnes própria dos direitos reais,
máxime em caso de ausência de registro. Não pode a garantia carente dos requisitos
legais, portanto, ser oposta a terceiros.
9.8.3.3. Garantia prestada por terceiro
A garantia pode ser prestada por terceiro que não seja o devedor. Essa hipótese
consagra caso legal de responsabilidade sem obrigação, já que os bens do terceiro
respondem sem que ele tenha contraído obrigação com o credor. Por isso, salvo
cláusula expressa, o terceiro que presta garantia real por dívida alheia não fica
obrigado a substituí-la, ou reforçá-la, quando, sem culpa sua, se perca, deteriore, ou
desvalorize (art. 1.427).
74
9.8.3.4. Proibição do pacto comissório
O pacto comissório que, em direito contratual, significa cláusula resolutória
expressa em contrato de compra e venda para o caso de inadimplemento, tem, na
garantia real, o efeito de outorgar ao credor a propriedade da coisa dada em garantia,
também em caso de não pagamento da dívida no vencimento.
O art. 1.428 veda, expressamente, essa prática, ao estatuir que “é nula a cláusula
que autoriza o credor pignoratício, anticrético ou hipotecário a ficar com o objeto da
garantia, se a dívida não for paga no vencimento”.
Entretanto, “após o vencimento, poderá o devedor dar a coisa em pagamento da
dívida” (parágrafo único). Destarte, somente por vontade livre e consciente do devedor,
e não por imposição contratual, poderá haver a dação em pagamento da coisa dada em
garantia para extinguir o débito.
9.8.3.5. Caráter quirografário do saldo remanescente
Prevê o art. 1.430 que “quando, excutido o penhor, ou executada a hipoteca, o
produto não bastar para pagamento da dívida e despesas judiciais, continuará o
devedor obrigado pessoalmente pelo restante”.
Assim, se, depois da venda das coisas dadas em garantia, ainda subsistir débito
(saldo remanescente) em favor do credor, assume este saldo o caráter quirografário, ou
seja, de dívida sem garantia real.
9.8.4. Penhor
9.8.4.1. Penhor em geral
9.8.4.1.1. Conceito
O penhor, em geral, é a garantia real incidente sobre coisa móvel. Entretanto, as
fontes romanas contam que, pelo pignus, em geral, se gravavam tanto bens móveis
como imóveis. O que caracterizava o instituto, na Antigüidade, era a transferência da
posse da coisa para o credor, a fim de garantir o adimplemento da prestação do devedor.
Com o tempo, o penhor passou a se destinar, exclusivamente, aos bens móveis,
guardando, ainda, a característica de se instituir com a transferência da posse coisa para
o credor.
Reza o art. 1.431, caput:
Art. 1.431. Constitui-se o penhor pela transferência efetiva da posse que, em
garantia do débito ao credor ou a quem o represente, faz o devedor, ou alguém
por ele, de uma coisa móvel, suscetível de alienação.
Observa-se, portanto, dos termos legais, que a regra para constituição do
penhora é a transferência efetiva da posse de coisa móvel, suscetível de alienação, para
o credor, para garantia do débito.
75
Há exceções, no entanto, à regra da transferência da posse ao credor, previstas
pelo parágrafo único do art. 1.431, que reza que “no penhor rural, industrial, mercantil
e de veículos, as coisas empenhadas continuam em poder do devedor, que as deve
guardar e conservar”.
Afora essas exceções, portanto, o contrato de penhor (acessório de um contrato
de mútuo, por exemplo), pelo qual se cria a garantia, é considerado contrato real, e não
meramente consensual, porque depende da entrega da coisa ao credor para se constituir.
Por fim, reza o art. 1.432 que “o instrumento do penhor deverá ser levado a
registro, por qualquer dos contratantes; o do penhor comum será registrado no
Cartório de Títulos e Documentos”.
9.8.4.1.2. Pluralidade de penhores e subpenhor
É princípio básico do penhor a impossibilidade de constituição de mais de um
penhor sobre a coisa, já que, em regra, o devedor transfere ao credor a posse. Entretanto,
nos casos em que essa transferência não se sucede (no penhor rural, industrial,
mercantil e de veículos), nada impede que isso ocorra. Veja-se, aliás, a opinião de
VENOSA:
O penhor típico, em face da necessidade de transmissão da posse, não admite,
em princípio, um segundo penhor sobre a coisa. Contudo, quando a posse
permanece com o devedor, não há obstáculo para que isso suceda. A Lei n.º
492/37, regulador do penhor rural, autoriza que o devedor institua novo penhor
sobre os bens ou animais já empenhados, sem consentimento do credor,
ressalvada a prioridade (art. 4.º, § 1.º). Com o presente Código, como não
houve revogação específica da legislação civil especial, haverá questões a
serem levantadas como, por exemplo, a manutenção das leis especiais de
penhor perante o atual diploma. Também ocorrerá o fenômeno do segundo
penhor nas hipóteses de penhor legal, quando a coisa já estava empenhada
convencionalmente. Também sobre o mesmo crédito pode ocorrer segundo
penhor.31
Já o subpenhor é a instituição de penhor pelo credor pignoratício que tem a
posse da coisa empenhada, ou seja, o credor dá em penhor coisa sob sua posse, mas de
propriedade do devedor pignoratício. Venosa admite sua constituição32, desde que o
contrato não o proíba. Entretanto, o art. 1.431 exige, para o penhor, que a coisa seja
suscetível de alienação. Ora, embora o credor receba a posse da coisa empenhada, não
tem ele o direito de aliená-la, portanto, não poderá ele dá-la em garantia, a não ser que
se trate de penhor legal ou que o credor adquira, supervenientemente, a propriedade da
coisa (art. 1.420, § 1.º).
9.8.4.1.3. Espécies de penhor
O penhor pode ser classificado conforme a fonte ou o objeto. Assim, podemos
estabelecer a seguinte classificação
a) Quanto à fonte:
31
32
VENOSA, ob. Citada, p. 531.
Idem.
76
a1) Penhor convencional: é aquele cuja fonte é a vontade das
partes, sendo estatuído em contrato;
a2) Penhor legal: origina-se da lei, independentemente do
concurso da vontade de ambas as partes.
b) Quanto ao objeto:
b1) Penhor comum: é aquele que incide sobre qualquer objeto,
desde que não seja destinado, pela lei, aos penhores especiais;
b2) Penhor especial: é aquele estabelecido sobre objeto específico
e com regras próprias, como o rural (agrícola e pecuário),
industrial e mercantil, de direitos e títulos de crédito e de veículos.
9.8.4.1.4. Direitos do credor pignoratício
Segundo o art. 1.433 são direitos do credor pignoratício:
a) posse: tem o credor pignoratício, em regra, a posse da coisa
empenhda;
b) direito de retenção: o credor pignoratício tem direito de retenção
sobre a coisa, até que o indenizem das despesas devidamente
justificadas, que tiver feito, não sendo ocasionadas por culpa sua. De
acordo com o art. 1.434, “O credor não pode ser constrangido a
devolver a coisa empenhada, ou uma parte dela, antes de ser
integralmente pago, podendo o juiz, a requerimento do proprietário,
determinar que seja vendida apenas uma das coisas, ou parte da
coisa empenhada, suficiente para o pagamento do credor”;
c) Ressarcimento por vício da coisa: tem o credor, também, o direito por
ressarcimento do prejuízo que houver sofrido por vício da coisa
empenhada;
d) Excussão da coisa: tem o credor o direito de executar judicialmente o
devedor, recaindo a execução sobre o bem empenhado.
Eventualmente, desde que o contrato autorize expressamente, ou o
devedor dê procuração, o credor pode vender amigavelmente o bem.
Relembre-se, entretanto, o texto do art. 1.428, que faz nula a cláusula
que autoriza o credor pignoratício, anticrético ou hipotecário a ficar
com o objeto da garantia, se a dívida não for paga no vencimento;
e) Percepção dos frutos: Diz o art. 1.433, V que o credor tem direito “a
apropriar-se dos frutos da coisa empenhada que se encontra em seu
poder. Aqui, no entanto, aplicam-se as regras gerais quanto à
percepção de frutos pelo possuidor de boa-fé, pois é obrigação do
credor a restituição da coisa com os respectivos frutos e acessões,
uma vez paga a dívida. Além disso, uma vez apropriando-se dos
frutos, tem ele o dever de imputar o valor deles nas despesas de
guarda e conservação, nos juros e no capital da obrigação
garantida, sucessivamente (art. 1.435, III e IV);
f) Venda antecipada: Além disso, compete ao credor “promover a
venda antecipada, mediante prévia autorização judicial, sempre que
haja receio fundado de que a coisa empenhada se perca ou deteriore,
devendo o preço ser depositado. O dono da coisa empenhada pode
impedir a venda antecipada, substituindo-a, ou oferecendo outra
garantia real idônea” (art. 1.433, VI);
77
9.8.4.1.5. Deveres do credor pignoratício
O art. 1.435 estabelece os deveres do credor pignoratício. São eles:
a) Depósito: Reza o art. 1.435, I que o credor é obrigado “à custódia da
coisa, como depositário, e a ressarcir ao dono a perda ou
deterioração de que for culpado, podendo ser compensada na dívida,
até a concorrente quantia, a importância da responsabilidade”. O
credor pignoratício, portanto, passa a ser depositário da coisa
empenhada, desde que lhe transferida a posse, com todas os deveres
inerentes ao contrato de depósito;
b) Defesa da posse: Como o penhor é direito real, cria-se, em favor do
credor que tem a posse, o direito de seqüela, podendo seguir a coisa
onde quer que se encontre. Entretanto, o credor não só tem esse
direito, mas também o dever de partir em “defesa da posse da coisa
empenhada e a dar ciência, ao dono dela, das circunstâncias que
tornarem necessário o exercício de ação possessória”;
c) Frutos: Tendo o credor o direito aos frutos, como já vimos, terá, por
corolário, a obrigação de “imputar o valor dos frutos, de que se
apropriar (art. 1.433, inciso V) nas despesas de guarda e
conservação, nos juros e no capital da obrigação garantida,
sucessivamente” bem como de “restituí-la (a coisa empenhada), com
os respectivos frutos e acessões, uma vez paga a dívida”;
d) Saldo remanescente: Uma vez vendida a coisa (judicial ou
amigavelmente), tem o credor a obrigação de “entregar o que sobeje
do preço, quando a dívida for paga”.
9.8.4.1.6. Extinção do penhor
Como o penhor é pacto acessório a uma dívida, para garanti-la, sua extinção
depende, em primeiro plano, da extinção da própria obrigação, eis que a ela vinculado.
Assim, pode ocorrer com o pagamento, a prescrição, a remissão, a confusão, a
compensação, etc. e com a venda amigável ou judicial da coisa.
Entretanto, pode derivar da vontade do próprio credor, que renuncia à garantia
ou ocorrer pelo perecimento da coisa. Nesses casos, porém, extingue-se a garantia, e
não a dívida.
Assim, cinco são os casos de extinção do penhor previstos no art. 1.436 do
Código Civil:
a) extinguindo-se a obrigação;
b) perecendo a coisa;
c) renunciando o credor. A renúncia, entretanto, se presume quando: c1) o
credor consentir na venda particular do penhor sem reserva de preço, c2)
quando restituir a posse da coisa ao devedor c3) ou quando anuir à sua
substituição por outra garantia;
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d) confundindo-se na mesma pessoa as qualidades de credor e de dono da coisa.
Entretanto, operando-se a confusão tão-somente quanto a parte da dívida
pignoratícia, subsistirá inteiro o penhor quanto ao resto.;
e) dando-se a adjudicação judicial, a remissão ou a venda da coisa empenhada,
feita pelo credor ou por ele autorizada
A extinção do penhor, entretanto, somente produz efeitos depois de averbado o
cancelamento do registro, à vista da respectiva prova.
9.8.4.2. Penhores especiais
9.8.4.2.1. Penhor rural
O penhor rural se caracteriza por incidir, especificamente, sobre os objetos
descritos nos arts. 1.442 (penhor agrícola) e 1.444 (penhor pecuário).
Além disso, é regra especial do penhor rural a não transferência da posse da
coisa para o credor, razão por que se constitui mediante instrumento público ou
particular, registrado no Cartório de Registro de Imóveis da circunscrição em que
estiverem situadas as coisas empenhadas (art. 1.438).
Pode o penhor rural dar origem à cédula rural pignoratícia, regida pela
legislação especial.
Por fim, o penhor rural tem prazos máximos previstos em lei (art. 1.439), sendo
de três anos para o agrícola e de quatro anos para o pecuário, prorrogáveis, uma só vez,
pelo mesmo tempo, devendo a prorrogação ser averbada à margem do registro
respectivo, mediante requerimento do credor e do devedor.
Disciplina o parágrafo primeiro do art. 1.439 que “embora vencidos os prazos,
permanece a garantia, enquanto subsistirem os bens que a constituem”.
Podem ser objeto de penhor agrícola:
I - máquinas e instrumentos de agricultura;
II - colheitas pendentes, ou em via de formação;
III - frutos acondicionados ou armazenados;
IV - lenha cortada e carvão vegetal;
V - animais do serviço ordinário de estabelecimento agrícola.
São objeto de penhor pecuário: os animais que integram a atividade pastoril,
agrícola ou de lacticínios.
9.8.4.2.2. Penhor industrial e mercantil
O penhor industrial e mercantil também se caracteriza por não conferir ao credor
a posse da coisa empenhada.
São objetos de penhor industrial ou mercantil:
79
a) máquinas, aparelhos, materiais, instrumentos, instalados e em
funcionamento, com os acessórios ou sem eles;
b) animais, utilizados na indústria;
c) sal e bens destinados à exploração das salinas;
d) produtos de suinocultura, animais destinados à industrialização de carnes e
derivados;
e) matérias-primas e produtos industrializados.
Constitui-se mediante instrumento público ou particular, registrado no Cartório
de Registro de Imóveis da circunscrição onde estiverem situadas as coisas empenhadas
e pode dar origem à cédula de crédito industrial ou mercantil, conforme o caso, regida
por lei especial.
9.8.4.2.3. Penhor de direitos e títulos de crédito
9.8.4.2.3.1. Penhor de direitos
O penhor de direitos constitui-se sobre direitos sobre coisas móveis, desde que
suscetíveis de cessão.
Para constituir-se, deve ser registrado no Registro de Títulos e Documentos e o
devedor (titular do direito empenhado) deverá entregar ao credor pignoratício os
documentos comprobatórios desse direito, salvo se tiver interesse legítimo em conserválos.
Não tem eficácia senão quando notificado ao devedor, mas por notificado se tem
o devedor que, em instrumento público ou particular, declarar-se ciente da existência do
penhor.
Se o mesmo crédito for objeto de vários penhores, só ao credor pignoratício,
cujo direito prefira aos demais, o devedor deve pagar; responde por perdas e danos aos
demais credores o credor preferente que, notificado por qualquer um deles, não
promover oportunamente a cobrança (art. 1.456).
9.8.4.2.3.2. Penhor de títulos de crédito
Já o penhor, que recai sobre título de crédito, constitui-se mediante instrumento
público ou particular ou endosso pignoratício, com a tradição do título ao credor.
Aqui tem-se hipótese, entretanto, em que o devedor, em verdade, possui um
crédito contra terceiro representado por um título, podendo dá-lo em penhor a um credor
seu.
Rege-se pelas disposição gerais do penhor e, em especial, pelas seguintes regras:
a) Direitos do credor pignoratício de título de crédito: a1) conservar a posse do
título e recuperá-la de quem quer que o detenha; a2) usar dos meios judiciais
convenientes para assegurar os seus direitos, e os do credor do título empenhado;
a3) fazer intimar ao devedor do título que não pague ao seu credor, enquanto
durar o penhor; a4) receber a importância consubstanciada no título e os
80
respectivos juros, se exigíveis, restituindo o título ao devedor, quando este solver
a obrigação.
b) Efeitos do penhor em relação ao devedor do título de crédito: b1) O devedor
do título empenhado que receber a intimação prevista no inciso III do artigo
1.459, ou se der por ciente do penhor, não poderá pagar ao seu credor. Se o fizer,
responderá solidariamente por este, por perdas e danos, perante o credor
pignoratício; b2) Se o credor der quitação ao devedor do título empenhado,
deverá saldar imediatamente a dívida, em cuja garantia se constituiu o penhor.
9.8.4.2.4. Penhor de veículos
O penhor pode recair sobre veículos e, nesse caso, não depende da transferência
da posse ao credor pignoratício. Tem prazo máximo de dois anos, prorrogável uma vez
por igual prazo (art. 1.466) e se constitui mediante instrumento público ou particular,
registrado no Cartório de Títulos e Documentos do domicílio do devedor, e anotado no
certificado de propriedade. Pode dar origem, também, à respectiva cédula de crédito.
Não se fará o penhor de veículos sem que estejam previamente segurados contra
furto, avaria, perecimento e danos causados a terceiros (art. 1.464).
Por fim, consoante o art. 1.465. “a alienação, ou a mudança, do veículo
empenhado sem prévia comunicação ao credor importa no vencimento antecipado do
crédito pignoratício”.
9.8.4.3. Penhor legal
Como vimos, o penhor pode ter como fonte, também, a lei, constituindo-se,
nesse caso, em penhor legal. Para o penhor legal, a lei não exige o registro em cartório,
já que decorre da lei, independentemente de convenção, mas, de acordo com o art.
1.471, depende de homologação judicial (CPC, arts. 874 a 876).
É previsto em lei para garantir a determinados credores o pagamento da dívida,
tendo em vista a natureza da própria obrigação, que pode ser de difícil execução em
razão da evasão do devedor do local da origem do débito, como no caso de débitos
originados por hospedagem em hotéis ou pela locação de prédios urbanos ou rústicos.
Assim, prevê o art. 1.467:
Art. 1.467. São credores pignoratícios, independentemente de convenção:
I - os hospedeiros, ou fornecedores de pousada ou alimento, sobre as bagagens,
móveis, jóias ou dinheiro que os seus consumidores ou fregueses tiverem
consigo nas respectivas casas ou estabelecimentos, pelas despesas ou consumo
que aí tiverem feito;
II - o dono do prédio rústico ou urbano, sobre os bens móveis que o rendeiro ou
inquilino tiver guarnecendo o mesmo prédio, pelos aluguéis ou rendas.
Podemos citar, ainda, o caso do art. 31 da lei nº 6.533/78, que estabelece penhor
legal em favor dos artistas e técnicos de diversão, sobre todo o equipamento e material
de propriedade do empregador, utilizado na realização de programa, espetáculo ou
produção, pelo valor das obrigações não cumpridas.
81
Pode o locatário impedir a constituição do penhor mediante caução idônea (art.
1.472).
9.8.5. Hipoteca
9.8.5.1. Conceito
A hipoteca, assim como o penhor, constitui-se por contrato acessório a uma
obrigação, para garantir seu pagamento. É, pois, direito real de garantia, conferindo ao
credor hipotecário os direitos naturalmente inerentes aos direitos reais, como a seqüela e
a oponibilidade erga omnes. Para tanto, depende de registro (art. 1.492).
Diferencia-se do penhor tanto pelo fato de incidir, em regra, sobre imóveis,
como também por não exigir a transferência da posse para o credor.
Além disso, a hipoteca admite, em regra, a pluralidade, podendo ser conferidas
hipotecas de vários graus a credores, tendo prioridade aqueles que as registrarem
primeiro33. A respeito, dispõem os arts. 1.476 a 1.478:
Art. 1.476. O dono do imóvel hipotecado pode constituir outra hipoteca sobre
ele, mediante novo título, em favor do mesmo ou de outro credor.
Art. 1.477. Salvo o caso de insolvência do devedor, o credor da segunda
hipoteca, embora vencida, não poderá executar o imóvel antes de vencida a
primeira. Parágrafo único. Não se considera insolvente o devedor por faltar ao
pagamento das obrigações garantidas por hipotecas posteriores à primeira.
Art. 1.478. Se o devedor da obrigação garantida pela primeira hipoteca não se
oferecer, no vencimento, para pagá-la, o credor da segunda pode promover-lhe
a extinção, consignando a importância e citando o primeiro credor para recebêla e o devedor para pagá-la; se este não pagar, o segundo credor, efetuando o
pagamento, se sub-rogará nos direitos da hipoteca anterior, sem prejuízo dos
que lhe competirem contra o devedor comum. Parágrafo único. Se o primeiro
credor estiver promovendo a execução da hipoteca, o credor da segunda
depositará a importância do débito e as despesas judiciais.
9.8.5.2. Classificação da hipoteca
A hipoteca classifica-se, também, pela fonte ou pelo objeto.
Pela fonte pode ser convencional ou legal.
Pelo objeto pode ser comum ou especial, conforme incida sobre imóveis em
geral ou sobre bens especialmente designados pela lei.
Assim, podem ser objeto de hipoteca:
I - os imóveis e os acessórios dos imóveis conjuntamente com
eles. Envolve, portanto, os bens acessórios ao imóvel, como as
construções, plantações, etc.;
33
Art. 1.493. Os registros e averbações seguirão a ordem em que forem requeridas, verificando-se ela
pela da sua numeração sucessiva no protocolo. Parágrafo único. O número de ordem determina a
prioridade, e esta a preferência entre as hipotecas.
82
II - o domínio direto;
III - o domínio útil. Domínio útil é o que resulta da enfiteuse, em
que o proprietário transfere ao enfiteuta o domínio útil sobre a
coisa;
IV - as estradas de ferro;
V - os recursos naturais a que se refere o art. 1.230,
independentemente do solo onde se acham. Reza o art. 1.230: “A
propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais
recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os
monumentos arqueológicos e outros bens referidos por leis
especiais. Parágrafo único. O proprietário do solo tem o direito
de explorar os recursos minerais de emprego imediato na
construção civil, desde que não submetidos a transformação
industrial, obedecido o disposto em lei especial”;
VI - os navios;
VII - as aeronaves.
A hipoteca abrange todas as acessões, melhoramentos ou construções do imóvel.
Subsistem os ônus reais constituídos e registrados, anteriormente à hipoteca, sobre o
mesmo imóvel (art. 1.474).
Por outro lado, é nula a cláusula que proíbe ao proprietário alienar imóvel
hipotecado (art. 1.475), mas se pode convencionar que vencerá o crédito hipotecário, se
o imóvel for alienado
9.8.5.3. Princípios
A hipoteca, como os direitos reais de garantia em geral, demanda a confluência
de dois princípios: o da publicidade e o da especialização.
A publicidade é essencial para a oposição do direito do credor hipotecário a
terceiros, realizando-se com a inscrição no Registro de Imóveis.
A especialização é a necessidade de indicação precisa do bem que serve de
objeto da garantia.
Destarte, assim como já informado no item 9.8.3.2, há de se concluir que a falta
dos requisitos acima faz com que o negócio jurídico não tenha a eficácia de criar
direito real em favor do credor. A conseqüência disto é a de que o negócio vale entre as
partes, sujeitando o bem específico à quitação do débito, entretanto, não possui a
oponibilidade erga omnes própria dos direitos reais, máxime em caso de ausência de
registro. Não pode a garantia carente dos requisitos legais, portanto, ser oposta a
terceiros.
9.8.5.4. Regras
9.8.5.4.1. Aquisição do imóvel hipotecado
Sendo nula a cláusula que proíbe ao proprietário alienar imóvel hipotecado, a
coisa dada em hipoteca pode, livremente, ser adquirida por terceiro. Este porém, sujeita-
83
se ao ônus real dela decorrente. Embora não fique obrigado ao pagamento da dívida,
pode ter a coisa adquirida tomada em função da excussão judicial. Assim, o art. 1.479
lhe dá solução para não se exonerar da hipoteca:
Art. 1.479. O adquirente do imóvel hipotecado, desde que não se tenha
obrigado pessoalmente a pagar as dívidas aos credores hipotecários, poderá
exonerar-se da hipoteca, abandonando-lhes o imóvel.
Para tanto, “o adquirente notificará o vendedor e os credores hipotecários,
deferindo-lhes, conjuntamente, a posse do imóvel, ou o depositará em juízo” (art.
1.480). Assim, diz o parágrafo único que “poderá o adquirente exercer a faculdade de
abandonar o imóvel hipotecado, até as vinte e quatro horas subseqüentes à citação,
com que se inicia o procedimento executivo”.
9.8.5.4.1.1. Remição
Dá o art. 1.481 do Código Civil ao adquirente do imóvel hipotecado o direito de
remi-lo. Veja-se:
Art. 1.481. Dentro em trinta dias, contados do registro do título aquisitivo, tem
o adquirente do imóvel hipotecado o direito de remi-lo, citando os credores
hipotecários e propondo importância não inferior ao preço por que o adquiriu.
§ 1º Se o credor impugnar o preço da aquisição ou a importância oferecida,
realizar-se-á licitação, efetuando-se a venda judicial a quem oferecer maior
preço, assegurada preferência ao adquirente do imóvel.§ 2º Não impugnado
pelo credor, o preço da aquisição ou o preço proposto pelo adquirente, haverse-á por definitivamente fixado para a remissão do imóvel, que ficará livre de
hipoteca, uma vez pago ou depositado o preço. § 3º Se o adquirente deixar de
remir o imóvel, sujeitando-o a execução, ficará obrigado a ressarcir os credores
hipotecários da desvalorização que, por sua culpa, o mesmo vier a sofrer, além
das despesas judiciais da execução. § 4º Disporá de ação regressiva contra o
vendedor o adquirente que ficar privado do imóvel em conseqüência de
licitação ou penhora, o que pagar a hipoteca, o que, por causa de adjudicação
ou licitação, desembolsar com o pagamento da hipoteca importância excedente
à da compra e o que suportar custas e despesas judiciais.
9.8.5.4.2. Prazo da hipoteca
Conforme o art. 1.485, “mediante simples averbação, requerida por ambas as
partes, poderá prorrogar-se a hipoteca, até perfazer vinte anos, da data do contrato.
Desde que perfaça esse prazo, só poderá subsistir o contrato de hipoteca,
reconstituindo-se por novo título e novo registro; e, nesse caso, lhe será mantida a
precedência, que então lhe competir”.
9.8.5.4.3. Hipoteca para garantia de dívida futura
Segundo o art. 1.487, ―a hipoteca pode ser constituída para garantia de dívida
futura ou condicionada, desde que determinado o valor máximo do crédito a ser
garantido. § 1º Nos casos deste artigo, a execução da hipoteca dependerá de prévia e
expressa concordância do devedor quanto à verificação da condição, ou ao montante da
dívida; § 2º Havendo divergência entre o credor e o devedor, caberá àquele fazer prova
de seu crédito. Reconhecido este, o devedor responderá, inclusive, por perdas e danos,
em razão da superveniente desvalorização do imóvel‖.
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9.8.5.4.4. Loteamento do imóvel hipotecado
Nos termos do art. 1.488:
Art. 1.488. Se o imóvel, dado em garantia hipotecária, vier a ser loteado, ou se
nele se constituir condomínio edilício, poderá o ônus ser dividido, gravando
cada lote ou unidade autônoma, se o requererem ao juiz o credor, o devedor ou
os donos, obedecida a proporção entre o valor de cada um deles e o crédito.
§ 1º O credor só poderá se opor ao pedido de desmembramento do ônus,
provando que o mesmo importa em diminuição de sua garantia.
§ 2º Salvo convenção em contrário, todas as despesas judiciais ou
extrajudiciais necessárias ao desmembramento do ônus correm por conta de
quem o requerer.
§ 3º O desmembramento do ônus não exonera o devedor originário da
responsabilidade a que se refere o art. 1.430, salvo anuência do credor.
9.8.5.5. Hipoteca legal
Independentemente de convenção, haverá hipoteca para os seguintes casos:
I - às pessoas de direito público interno sobre os imóveis pertencentes aos
encarregados da cobrança, guarda ou administração dos respectivos
fundos e rendas;
II - aos filhos, sobre os imóveis do pai ou da mãe que passar a outras
núpcias, antes de fazer o inventário do casal anterior;
III - ao ofendido, ou aos seus herdeiros, sobre os imóveis do delinqüente,
para satisfação do dano causado pelo delito e pagamento das despesas
judiciais;
IV - ao co-herdeiro, para garantia do seu quinhão ou torna da partilha,
sobre o imóvel adjudicado ao herdeiro reponente;
V - ao credor sobre o imóvel arrematado, para garantia do pagamento do
restante do preço da arrematação.
Diferentemente do penhor legal, a hipoteca legal deve ser registrada e, além
disso, especializada. Veja-se, aliás, o conteúdo do art. 1.497:
Art. 1.497. As hipotecas legais, de qualquer natureza, deverão ser registradas e
especializadas. § 1º O registro e a especialização das hipotecas legais
incumbem a quem está obrigado a prestar a garantia, mas os interessados
podem promover a inscrição delas, ou solicitar ao Ministério Público que o
faça. § 2º As pessoas, às quais incumbir o registro e a especialização das
hipotecas legais, estão sujeitas a perdas e danos pela omissão.
9.8.5.6. Registro da hipoteca
O art. 1.492 estabelece a necessidade de registro da hipoteca, determinando que
ele seja feito no lugar do imóvel e à vista do título, por qualquer interessado.
85
Faz-se o registro de acordo com a ordem em que são requeridas as hipotecas,
determinando-se a prioridade pelo número de ordem.
De acordo com o art. 1.494, “não se registrarão no mesmo dia duas hipotecas,
ou uma hipoteca e outro direito real, sobre o mesmo imóvel, em favor de pessoas
diversas, salvo se as escrituras, do mesmo dia, indicarem a hora em que foram
lavradas”.
9.8.5.7. Extinção da hipoteca
A hipoteca também se extingue, de regra, pela extinção da obrigação, mas pode
terminar, também, por outras circunstâncias, como pelo perecimento da coisa ou pela
resolução da propriedade do devedor.
Vejamos o rol de causas extintivas do art. 1.499:
Art. 1.499. A hipoteca extingue-se:
I - pela extinção da obrigação principal;
II - pelo perecimento da coisa;
III - pela resolução da propriedade;
IV - pela renúncia do credor;
V - pela remição;
VI - pela arrematação ou adjudicação.
A extinção da obrigação principal pode se dar pelas várias causas do código em
geral, seja por pagamento, prescrição, novação, ou pelas espécies previstas no próprio
dispositivo, como na remição e na arrematação e adjudicação.
Por outro lado, perecendo a coisa dada em hipoteca, extingue-se, também, a
garantia real. Quanto à resolução da propriedade, é de se observar que o art. 1.359
prevê: “Resolvida a propriedade pelo implemento da condição ou pelo advento do
termo, entendem-se também resolvidos os direitos reais concedidos na sua pendência, e
o proprietário, em cujo favor se opera a resolução, pode reivindicar a coisa do poder
de quem a possua ou detenha”.
A par desses modos de extinção, pode o credor renunciar à hipoteca, caso em
que esta, obviamente, se extingue.
Além disso, o cancelamento do registro da hipoteca no respectivo cartório
também tem o condão de extingui-la (art. 1.500).
Por fim, o art. 1.501 estabelece norma de ordem processual, ao estatuir que “não
extinguirá a hipoteca, devidamente registrada, a arrematação ou adjudicação, sem que
tenham sido notificados judicialmente os respectivos credores hipotecários, que não
forem de qualquer modo partes na execução”.
9.8.5.8. Hipoteca de vias férreas
A hipoteca pode recair sobre estrada de ferro, caso em que será registrada no
Município da estação inicial da respectiva linha (art. 1.502).
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Os credores hipotecários não podem embaraçar a exploração da linha, nem
contrariar as modificações, que a administração deliberar, no leito da estrada, em suas
dependências, ou no seu material (art. 1.503).
Essa hipoteca será circunscrita à linha ou às linhas especificadas na escritura e
ao respectivo material de exploração, no estado em que ao tempo da execução
estiverem; mas os credores hipotecários poderão opor-se à venda da estrada, à de suas
linhas, de seus ramais ou de parte considerável do material de exploração; bem como à
fusão com outra empresa, sempre que com isso a garantia do débito enfraquecer (art.
1.504).
Enfim, na execução das hipotecas sobre vias férreas, será intimado o
representante da União ou do Estado, para, dentro em quinze dias, remir a estrada de
ferro hipotecada, pagando o preço da arrematação ou da adjudicação (art. 1.505).
9.8.6. Anticrese
9.8.6.1. Conceito
A anticrese é o direito real pelo qual o devedor transfere ao credor a posse de
coisa imóvel, para que este compense a dívida com os frutos e rendimentos decorrentes
do imóvel.
É exclusivo, portanto, de bens imóveis e depende da entrega do imóvel ao
credor (art. 1.506).
9.8.6.2. Direitos do credor anticrético
São direitos do credor anticrético:
a) administrar os bens dados em anticrese e fruir seus frutos e utilidades (art.
1.507), com direito de retenção até a compensação total da dívida;
b) arrendar, salvo pacto em sentido contrário, os bens dados em anticrese a
terceiro, mantendo, até ser pago, direito de retenção do imóvel, embora o aluguel
desse arrendamento não seja vinculativo para o devedor (art. 1.507, § 2.º);
c) vindicar os seus direitos contra o adquirente dos bens, os credores
quirografários e os hipotecários posteriores ao registro da anticrese (art. 1.509).
9.8.6.3. Deveres do credor anticrético
a) apresentar anualmente balanço, exato e fiel, de sua administração (art. 1.507).
Se o devedor anticrético não concordar com o que se contém no balanço, por ser
inexato, ou ruinosa a administração, poderá impugná-lo, e, se o quiser, requerer
a transformação em arrendamento, fixando o juiz o valor mensal do aluguel, o
qual poderá ser corrigido anualmente (art. 1.507, § 1.º);
b) responder pelas deteriorações que, por culpa sua, o imóvel vier a sofrer, e
pelos frutos e rendimentos que, por sua negligência, deixar de perceber;
9.8.6.4. Aquisição de imóvel objeto de anticrese
87
Conforme o art. 1.510, “o adquirente dos bens dados em anticrese poderá remilos, antes do vencimento da dívida, pagando a sua totalidade à data do pedido de
remição e imitir-se-á, se for o caso, na sua posse”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BORGES, Paulo Torminn. Institutos Básicos do Direito Agrário. 3.ª ed., São Paulo :
Pró-Livro, 1978.
GOMES, Orlando. Direitos Reais. 7.ª ed. Rio : Forense, 1980.
NERY Jr, Nélson e NERY, Rosa Maria Andrade. Código Civil Comentado e Legislação
Extravagante. 3.ª ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2005.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 4.ª ed. Rio : Forense.
1981. Vol. IV.
___________________. Instituições de Direito Civil. 15.ª ed. Rio : Forense. 2004. Vol.
VI.
PIPES, Richard. Propriedade e Liberdade. Rio de Janeiro : Recordd, 2001.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Direitos Reais. 6.º ed. São Paulo : Atlas,
2006.
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EXERCÍCIOS
1) – MAGISTRATURA-SP-168 Sobre o conceito de posse as duas principais teorias
são:
a) Teoria objetiva de Planiol e Teoria subjetiva de Ripert.
b) Teoria subjetiva de Savigny e Teoria objetiva de Ihering.
c) Teoria subjetiva de Ihering e Teoria objetiva de Savigny.
d) Teoria objetiva de Keisen e Teoria subjetiva de Ennecerus.
2) – MAGISTRATURA-SP-168 São atinentes ao registro da propriedade imóvel os
seguintes princípios:
a) da continuidade, da equivalência e da simetria.
b) da continuidade, da especialidade e da presunção legal.
c) da continuidade, da concentração e da verdade transcendental.
d) da continuidade, da eventualidade e da presunção de hominis.
3) – MAGISTRATURA-SP-170 Diz o art. 485, do Código Civil, que "considera-se
possuidor todo aquele que tem de fato o exercício pleno ou não de algum dos poderes
inerentes ao domínio ou propriedade". O Código Civil adotou teoria de quem? Como se
define?
(A) De Ihering, com sua teoria objetiva. A posse é conduta de dono. É, então, a
exteriorização da propriedade, a visibilidade do domínio, o uso econômico da coisa.
(B) De Ihering, com sua teoria subjetiva. A posse caracteriza-se pela conjugação de dois
elementos: o corpus e o animus.
(C) De Savigny, com sua teoria objetiva. A posse consiste na detenção física da coisa.
(D) De Savigny, com sua teoria subjetiva. A posse consiste na intenção de exercer sobre
a coisa um poder no interesse próprio.
04) – MAGISTRATURA-SP-171 O contrato de compromisso de compra e venda de
bem imóvel não loteado, para assegurar à parte direito real deverá conter, além das
assinaturas do vendedor e do comprador,
(A) ausência de cláusula de arrependimento e registro no Cartório do Registro de
Imóveis.
(B) cláusula de arrependimento e registro no Cartório Imobiliário.
(C) celebração por escritura pública, mesmo com pagamento em prestações.
(D) celebração por compromisso particular, porém com pagamento à vista.
5) – MAGISTRATURA-SP-171 Usucapião.
(A) O processo de arrecadação de herança jacente, a respeito do mesmo imóvel, impede
o reconhecimento do usucapião.
(B) Área incluída em reserva florestal não podeser objeto de usucapião.
(C) Nas ações de usucapião, de interesse de particular que apenas objetiva uma sentença
favorável para regularização do domínio, a intervenção do Ministério Público não é
necessária.
(D) O usucapião é forma originária de aquisição da propriedade e não apenas exercício
de posse por um lapso de tempo estipulado em lei.
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6) – MD-DF-24 Julgue os itens subseqüentes.
I Podem ser objeto de usucapião tanto os bens móveis quanto os imóveis; em relação
aos imóveis, a Constituição de 1988 apresentou inovação — o usucapião especial
urbano —, ao prever a possibilidade de aquisição do imóvel por aquele que possuir,
como sua, área urbana de, no máximo, 250 m2, por cinco anos, initerruptamente e sem
oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, desde que não seja
proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
II A introdução de criança ou adolescente em família substituta estrangeira é feita,
observadas as devidas cautelas, por meio de adoção, tutela ou guarda.
III O Ministério Público não tem legitimidade para requerer a perda ou suspensão do
pátrio poder quando a criança ou o adolescente possuírem avós paternos ou maternos.
IV O mútuo feneratício é caracterizado pela cobrança capitalizada de juros.
A quantidade de itens certos é igual a
A) 1.
B) 2.
C) 3.
D) 4.
7) – MD-DF-25 Assinale a opção incorreta.
A De acordo com o novo Código Civil, a coação, para viciar a declaração de vontade,
há de ser tal que incuta ao paciente fundado termo de dano iminente e considerável à
sua pessoa, à sua família ou aos seus bens e, em circunstâncias específicas, a pessoa
não-pertencente à família do paciente.
B De acordo com o novo Código Civil, o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e
dispor da coisa; são defesos, todavia, os atos que não tragam ao proprietário qualquer
comodidade ou utilidade e sejam animados pela intenção de prejudicar terceiros.
C Tanto o Código Civil em vigor como o novo Código Civil explicitam que os bens
públicos não estão sujeitos ao usucapião.
D O novo Código Civil estabelece que os direitos reais sobre coisas móveis, quando
constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com a tradição.
8) – OAB-GO-18.08.02 Assinale a alternativa correta:
a) – posse justa é aquela obtida por meios não precários, clandestinos mas não
violentos;
b) – o constituto possessório se caracteriza pelo ato em que aquele que possuía em seu
nome passa a possuir em nome de outrem;
c) – a manutenção de posse, reintegração de posse, interdito proibitório, imissão de
posse, nunciação de obra nova, reivindicatória são as ações admitidas no direito
brasileiro para defesa da posse;
d) – penhor é o contrato formal, acessório, pelo qual o devedor dá, geralmente, em
garantia, um bem imóvel ao credor.
9) Magistratura-BA-2004 (modificada) Julgue os itens seguintes, referentes a posse e
propriedade.
81. A aquisição da posse só ocorre com o exercício do poder de ingerência sobre o bem.
82. Os julgamentos dos interditos possessórios pautam-se apenas nas questões
pertencentes ao mundo dos
fatos; a eventual alegação de direito real sobre o bem litigioso servirá apenas como mais
um elemento de prova.
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83. Apenas o possuidor de posse velha, no caso de turbação ou esbulho, pode manter-se
ou restituir-se na posse por sua própria força.
84. O possuidor de má-fé tem direito de ser ressarcido apenas pelas benfeitorias
necessárias, assistindo-lhe direito de retenção pela importância a elas referente.
85. A adjudicação compulsória de bem imóvel é devida ao promitente comprador titular
de direito real.
Estão certos:
a) Os itens 82 e 85
b) Os itens 81, 83 e 84
c) Todos os itens
d) Nenhum item
10) MAGISTRATURA-SC-Abr/2003 Consideradas as disposições do Código Civil em
vigor, assinale, dentre as alternativas abaixo, a correta:
a. Além da propriedade, a enfiteuse também esta inscrita como direito real.
b. A anticrese não se constitui em direito real de garantia.
c. O direito do promitente comprador do imóvel constitui-se em direito real.
d. A habitação e o uso não são previstos como direitos reais.
e. As rendas expressamente constituídas sobre imóveis caracterizam-se como direitos
reais.
11) MAGISTRATURA-SC-Nov/2003 Assinale a alternativa correta:
Há propriedade resolúvel:
a) Na superfície e na anticrese.
b) Na retrovenda e na alienação fiduciária em garantia.
c) Na venda a contento sob condição suspensiva e no fideicomisso.
d) Na venda a contento sob condição resolutiva e no usufruto.
e) Nenhuma das alternativas é correta.
12) MAGISTRATURA-SC-Nov/2003 Assinale a alternativa correta:
É possível o convalecimento de posse precária?
a) Sim, desde que date de mais de ano e dia.
b) Sim, desde que antes de um ano seja ajuizada ação possessória.
c) Sim, desde que antes de dois anos seja ajuizada ação possessória.
d) Sim, desde que também não seja clandestina.
e) Não, porque a precariedade não cessa.
13) MAGISTRATURA-MG-2003/2004 Sobre a disciplina dos Direitos Reais de Garantia
no Novo Código Civil é CORRETO afirmar
que:
(A) qualquer que seja a espécie de penhor, sua constituição sempre pressupõe a
transferência efetiva da posse pelo devedor ao credor de coisa móvel, suscetível de
alienação.
(B) são direitos do credor pignoratício reconhecidos no novo Código Civil, entre outros: o
de apropriar-se dos frutos da coisa empenhada que se encontra em seu poder; o de promover
a venda antecipada, independentemente de prévia autorização judicial, sempre que haja
receio fundado de que a coisa empenhada se perca ou deteriore.
(C) na excussão judicial da garantia hipotecária, realizada a praça, o executado poderá, até a
assinatura do auto de arrematação ou até que seja publicada a sentença de adjudicação,
remir o imóvel hipotecado, oferecendo preço igual ao da avaliação. Igual direito caberá ao
cônjuge, aos descendentes ou ascendentes do executado.
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(D) o penhor de veículos só se pode convencionar pelo prazo máximo de 1 (um) ano,
prorrogável até o limite de igual tempo.
(E) a hipoteca não pode jamais ser constituída para garantia de dívida futura ou
condicionada, ainda que determinado o valor máximo do crédito a ser garantido.
14) MAGISTRATURA-MG-2003/2004 Pedro edificou, de boa-fé, casa em terreno que
acreditava lhe pertencer na totalidade. Constatou, porém, após o término da construção, que
por um erro da descrição das linhas limítrofes de seu registro, parte da edificação invadiu
metade do terreno de seu vizinho. Assim, parte da casa encontra-se em terreno próprio e
parte ocupa metade do terreno alheio. Marque, a seguir, a alternativa CORRETA.
(A) Pedro adquirirá a propriedade da área invadida, devendo pagar o décuplo do valor do
terreno perdido e o da desvalorização da área remanescente.
(B) Pedro, embora esteja de boa-fé, terá que demolir a parte da construção que invadiu o
terreno alheio, ainda que com grave prejuízo para a edificação.
(C) Pedro, independentemente de sua boa ou má-fé, adquire a propriedade da parte do solo
invadido, mediante o pagamento de indenização correspondente ao valor do terreno objeto
da invasão.
(D) Pedro adquirirá a propriedade da parte do solo invadido apenas se o valor da construção
exceder o valor do terreno.
(E) Estando Pedro de boa-fé, adquire a propriedade da parte do solo invadido, e responde
por perdas e danos que abranjam o valor que a invasão acrescer à construção, mais o da área
perdida e o da desvalorização da área remanescente.
15) MAGISTRATURA-SP-174 Na defesa da posse, o desforço imediato
(A) cabe ao possuidor apenas nos casos de turbação de posse.
(B) cabe apenas a quem seja, ao mesmo tempo, possuidor direto e indireto.
(C) cabe apenas nos casos de esbulho ou de turbação de posse.
(D) cabe nos casos de esbulho, de turbação de posse e ante justo receio de moléstia à
posse.
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Gabarito:
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
B
B
C
A
D
A
C
B
A
C
B
E
C
E
C
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