documento associado - Ordem dos Farmacêuticos

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Boletim
do
CIM
c e n t r o d e
i n f o r m a ç ã o
d o m e d i c a m e n t o
Utilização de medicamentos no idoso
dicamentos (RAM) ou uma interacção; não está a tomar correctamente
o medicamento.4
o subgrupo com mais de 85 anos tem aumentado rapidamente.1,2 Em
Os problemas relacionados com medicamentos podem aumentar
Portugal, a população com mais de 65 anos representa 16,5% da popu-
consideravelmente o risco de morbilidade e mortalidade.11 Podem causar
lação total.3
quedas, dificuldades cognitivas, desidratação, incontinência, depressão,
hospitalização, colocação em instituições ou diminuição da qualidade
de vida. Também pode existir subutilização de terapêuticas benéficas
no tratamento de problemas crónicos. Por exemplo, a osteoporose sem
Alterações na resposta farmacológica
associadas ao envelhecimento
tratamento pode ocasionar graves fracturas.4
As alterações fisiológicas associadas ao envelhecimento modificam
a farmacocinética e a farmacodinamia, podendo afectar a resposta farmacológica.4 No entanto, os idosos são um grupo heterogéneo, em que a
idade cronológica nem sempre reflecte a “idade funcional”.2
As diminuições na produção de ácido gástrico, na taxa de esvaziamento gástrico e na motilidade gastrointestinal podem modificar a absorção.5
No entanto, geralmente, é pouco alterada no idoso.4
A distribuição é afectada pelo aumento da proporção de gordura, diminuição da massa muscular, da água corporal e da concentração plasmática de albumina.5 Com uma maior proporção de fármaco livre, em alguns
idosos pode aumentar a difusão a vários órgãos de fármacos com elevada união a proteínas. Em contraste, a distribuição pode estar diminuída,
como resultado de um menor rendimento cardíaco e fluxo sanguíneo.4
Podem aumentar os níveis plasmáticos dos medicamentos hidrossolúveis
e diminuir os dos lipossolúveis.
A redução da massa e do fluxo sanguíneo hepáticos e da sua capacidade metabólica afecta o metabolismo dos fármacos. Os compostos
5
que experimentam metabolismo de fase I (oxidação, redução, hidroxilação) têm uma depuração diminuída ou inalterada, enquanto os metabolizados por processos de fase II, como a conjugação ou a acetilação,
não são alterados.2
A função renal diminui, afectando a eliminação de muitos fármacos.
4,5
As alterações na farmacodinamia devidas à idade são frequentemente
imprevisíveis. Diversas modificações biológicas podem alterar a resposta
aos medicamentos. Por exemplo: diminuição da capacidade de homeostase; diminuição da sensibilidade do centro da sede com tendência a
desidratar (precaução com os diuréticos); atenuação da resposta imune;
redução da eficiência respiratória (precaução com os depressores do sistema nervoso central – SNC).5
Tem sido identificada uma alta incidência de acontecimentos adversos
relacionados com medicamentos em idosos em ambulatório.12
O uso de medicamentos potencialmente inadequados represen-
JULHO/AGOSTO 2009
O envelhecimento progressivo da população constitui uma nova problemática, já que os idosos têm necessidades especiais.1 Em particular,
ta um risco importante e prevenível associado com RAM, hospitalização
e mortalidade.13
A prescrição inadequada é elevada nos idosos, especialmente nos
residentes em lares.4,14,15 Há alguns fármacos que em geral devem ser
evitados nos idosos por ineficácia ou alto risco desnecessário; nem sempre a sua prescrição é inadequada, mas há evidência de sobreutilização.9
Exemplos:
Analgésicos: anti-inflamatórios não esteróides (AINE) (naproxeno, piroxicam, indometacina), opióides como dextropropoxifeno.4,9,11
Psicofármacos: benzodiazepinas como diazepam, clorodiazepóxido
ou flurazepam),4,9,11 antipsicóticos de primeira geração (tioridazina)4,9
ou atípicos (olanzapina, risperidona).4
Fármacos com efeitos anticolinérgicos: relaxantes musculares, anti-histamínicos, 4,9,11 ou antidepressores tricíclicos (AT) (amitriptilina e
doxepina).9,11
Antidiabéticos de longa duração de acção como cloropropamida ou
glibenclamida.
10,9
Anti-hipertensores como a metildopa
3,9,11
ou prazosina.9
Antes de serem atribuídos a uma nova doença ou à idade, os sintomas
no idoso devem ser considerados no contexto dos efeitos da medicação.4
Muitas vezes é prescrito um medicamento para tratar um sintoma que
não é reconhecido como sendo uma RAM provocada por outro fármaco;1,10
o doente é colocado em risco de desenvolver efeitos adversos adicionais
por um tratamento potencialmente desnecesssário.1
São comuns as falhas no ajuste posológico, sendo muitas vezes
prescritas doses elevadas,4,9 por exemplo, nos insuficientes renais.9
Problemas relacionados com o uso
de medicamentos no idoso
As potenciais interacções aumentam em função do número de medicamentos1,5 e representam um importante problema, geralmente prevení-
Os idosos têm necessidades especiais devido ao elevado consumo
de medicamentos
4,6-8
e às alterações fisiológicas referidas.
4,7
A utilização
vel.1 A prescrição de um medicamento para o qual existe uma interacção
bem estabelecida e clinicamente importante com outro fármaco é um
de múltiplos fármacos, que pode ser inevitável, torna-os mais suscep-
erro frequente.12 Os idosos podem receber prescrições de vários médicos
como
e os medicamentos serem dispensados em várias farmácias; muitos são
tíveis a erros e problemas relacionados com os medicamentos,
8,9
interacções e reacções adversas.1,5,7,10 Contribuem para esta problemáti-
tomados sem conhecimento do médico.1
ca: a prescrição realizada por diversos especialistas, os problemas cog-
A terapêutica pode ser complexa. Os idosos com múltiplas prescri-
nitivos, a incapacidade física2,5 e a difícil situação social, sendo muitos
ções frequentemente devem tomar os medicamentos a diferentes horas
os que moram sozinhos. 5 Alguns idosos podem não manter um estado
do dia; alguns com alimentos, outros após as refeições; às vezes, têm
nutricional adequado.1
de partir comprimidos; usam diversas formas farmacêuticas e múltiplas
Podem surgir problemas quando o doente: deve receber um fár-
vias de administração.9
maco novo ou adicional para uma doença mas não o faz; recebe um
A monitorização não adequada da terapêutica é frequente.9 A falta
fármaco não necessário; recebe o fármaco errado para a sua situação;
de adesão à terapêutica é particularmente problemática no idoso.4 Há
recebe uma dose incorrecta; experimenta uma reacção adversa a me-
factores que favorecem a falta de adesão intencional (RAM, não percep-
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1
BOLETIM DO CIM
ção da necessidade da terapêutica, ineficácia da medicação, custos), e
Deve existir uma indicação clara para a prescrição de cada medi-
outros a não intencional (esquecimento, complexidade dos tratamentos,
camento.4,10 Considerar as RAM como uma possível causa de novos
desconhecimento do objectivo da medicação, características da embala-
problemas9 e ensinar os doentes a vigiá-las.
gem do medicamento).
Têm sido referidos problemas no domicílio como armazenagem
deficiente (na cozinha ou casa de banho), reembalagem inadequada,
O prescritor deve conhecer informação relevante, como alergias ou
dificuldades com a administração de determinadas formas farmacêuticas, como inaladores ou colírios.
acumulação de medicamentos ou o compartilhar medicamentos com
Não devem ser prescritos medicamentos inadequados se existir alter-
outras pessoas. As deficiências físicas podem dificultar o manuseamento
nativa mais segura; precaução com os fármacos de longa semivida
da medicação.
ou que se acumulam no organismo.10
Podem existir resultados adversos associados com os medicamentos. O número de fármacos, a prescrição inadequada ou as
doses desajustadas constituem factores de risco de RAM e hospitali-
A comunicação e colaboração entre os profissionais de saúde são
zações.9 Em idosos na comunidade têm sido referidos valores de RAM
cruciais para o uso com qualidade dos medicamentos no idoso.1,4,9 A far-
de até 35%.2
macoterapia neste grupo proporciona uma excelente oportunidade de
Também são importantes as interacções “medicamento-doen-
intervenção farmacêutica.6 Nos doentes tratados por vários médicos é
ça”, definidas como a exacerbação de uma doença preexistente por um
importante a utilização de uma única farmácia.10 A dificuldade na utiliza-
fármaco: hipertrofia benigna da próstata e anticolinérgicos; diabetes e
ção de medicamentos e a grande quantidade de problemas associados
corticosteróides; hipotensão postural, hipertrofia da próstata ou demência
faz do farmacêutico um colaborador necessário no cuidado do idoso5
e AT,16,17 bloqueadores beta e doença pulmonar obstrutiva crónica, AINE
através da identificação, avaliação e prevenção dos potenciais proble-
e insuficiência cardíaca,14 AINE ou corticosteróides em úlcera péptica,14,17
mas com a medicação.4,7
anticolinérgicos, opióides ou AT e obstipação, entre outros.17
Aurora Simón
Como melhorar o uso de medicamentos
no idoso
Há diversos instrumentos, cada um com vantagens e inconvenientes, para melhorar a qualidade da medicação.7 Para identificar doentes
em risco de problemas relacionados com a medicação, pode rever-se a
medicação usando critérios explícitos, como a identificação de medicamentos inadequados.11 Existem listagens de medicamentos potencialmente inadequados neste grupo de doentes; uma das mais conhecidas é
a baseada nos critérios de Beers, criada por consenso inicialmente para
doentes internados em lares, com adaptação posterior para incluir a população idosa em geral. 10 Alguns estudos têm estabelecido listagens de
práticas de prescrição problemática ou inadequada, mas uma objecção
ao seu uso é a falta de consideração das circunstâncias clínicas de um
doente individual. Outra abordagem para a prevenção de problemas é
identificar a priori doentes de alto risco (medicação ou características
dos doentes). 11
Algumas recomendações para um melhor uso de medicamentos em
idosos:
Revisão cuidadosa da medicação em relação à segurança e eficácia
terapêutica, descontinuando e/ou adicionando medicação se necessário.2,10 Pode-se pedir ao doente para trazer todos os medicamentos
para revisão, visitar o domicílio, questionar sobre o uso de medicamentos não sujeitos a receita médica e de suplementos.9,10 A revisão
da medicação permite detectar possíveis RAM e interacções. Quando
há consultas com vários especialistas, a revisão do “saco dos medicamentos” pode revelar problemas de adesão à terapêutica e levar
à suspensão da medicação que já não é necessária. A revisão da medicação no domicílio permite identificar medicações múltiplas, locais
de armazenamento não adequados ou medicação fora do prazo de
validade.10
Individualizar a posologia: reduzir as doses se necessário; iniciar alguns tratamentos com doses baixas, que, caso necessário, são aumentadas; evitar também a infradosagem.9 Avaliar a função renal,
adaptando a posologia.10
Simplificar o regime terapêutico;7,9 minimizar o número de doses
e tomas por dia, de formas farmacêuticas diferentes ou de procedimentos como partir comprimidos. Utilizar formas farmacêuticas
adequadas.
Implicar os doentes na terapêutica, aumentar a sua autonomia e
adesão, considerando as suas capacidades.9
O doente ou o cuidador devem ser informados dos objectivos da
medicação, como tomar, quais as RAM esperadas e quais as consequências da não adesão.4,10
Realizar uma adequada monitorização da terapêutica quando são
prescritos determinados fármacos, com determinação de: INR nos
anticoagulantes, 4,9,10,14 electrólitos nos diuréticos,4,9,10 creatinina sérica na digoxina, função hepática nas estatinas16 ou função tiroideia
na levotiroxina.14
2
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