No mundo da Esquizofrenia Apesar de ser uma doença mental conhecida há milênios, estudos na área psiquiátrica ainda não foram capazes de decifrar as causas da doença que atinge 1% da população mundial. Por Flávia Cristina Gomes A etimologia do termo “esquizofrenia” é grega, composta de dois termos: skhizein que significa fender, rasgar, dividir, separar e phrên, phrênios que é pensamento. Até então, sabe-se que a esquizofrenia é uma doença mental caracterizada por uma desorganização ampla dos processos mentais. Uma das teorias explica que há uma alteração na produção ou expressão irregular de um hormônio chamado Dopamina ou ainda que número de seus receptores, em determinadas partes do cérebro, fica desregulado. Isso significa que o indivíduo tem uma quantidade certa de dopamina, mas a expressão dela é diferenciada porque o número de receptores não equivale à quantidade desse hormônio no indivíduo. “Apesar das falhas da dopamina serem genéticas, não é certo que essa doença mental seja somente hereditária”, revela o médico psiquiatra Murillo M. Nascente. Os estudos permitem dizer que a presença de pai ou mãe esquizofrênico aumenta em 5% a probabilidade de filhos doentes. Caso ambos sejam esquizofrênicos, sobe para 10% as chances, e em gêmeos monozigóticos(idênticos) o grau de concordância é de 25%, diz o médico. Fatores sociais e comportamentais também podem contribuir para a doença. Teorias genéticas, dopaminérgicas, apenas norteiam a psiquiatria no tratamento dessa doença cheia de misticismo, preconceito e medo na população em geral. Segundo Dr. Murillo Nascente, a experiência médica permite prever em determinados pacientes traços que são mais propícios ao desenvolvimento da esquizofrenia, apesar de não haver nada objetivo, apenas empírico. As manifestações O sintoma mais característico da esquizofrenia é a perda da capacidade de prever, julgar a realidade. Coisas simples a qualquer pessoa passam a ter significados mágicos no paciente com essa doença mental. Eles passam a ter a impressão que seus pensamentos estão sendo lidos por alguém ou que eles mesmos passam a ter a capacidade para tal. A simples queda de uma folha pode significar como traição ou sua própria morte. Existem basicamente quatro tipos de esquizofrenia: a Paranóide - o paciente passa a surtos de perseguição. Qualquer olhar ele sente que estão querendo persegui-lo para prejudica-lo; o tipo Simples é aquele que a capacidade de julgar a realidade se agrava e o paciente fala coisas repetitivamente. Há também o tipo Residual estágio crônico da doença com muita deterioração e pouca sintomatologia produtiva – os sintomas não se alteram; e ainda a Catatônica, o esquizofrênico tem seu sistema motor alterado. Ele é capaz de ficar na mesma posição por dias, como uma estátua. É importante observar que ao contrário de outras doenças mentais, nesse tipo o indivíduo tem um desenvolvimento normal até por volta dos 15 anos em homens e 25 anos em mulheres. A média de faixa etária para o primeiro surto psicótico é de 25-35anos no sexo feminino, e 15-25 no sexo masculino. Apesar de a doença se manifestar em homens mais cedo, os surtos são geralmente mais graves. Os estudos, até então realizados, pressupõem que os hormônios sexuais femininos, principalmente os estrógenos, possuem na sua célula nervosa um efeito semelhante aos dos medicamentos antipsicóticos. É como se a mulher possuísse uma defesa no organismo protegendo-a das manifestações da doença. O apoio Familiar A família é uma das grandes aliadas para controlar a doença. Infelizmente, na maioria das vezes, possui pouco ou quase nenhum conhecimento sobre a doença do paciente. Ela não percebe a gravidade do problema, e com isso não dá o devido acompanhamento para evitar transtornos ainda maiores. Há dificuldades que são grandes barreiras para o médico cujos pacientes não possuem ajuda familiar. Uma delas é convencer, tanto família como paciente, que o problema enfrentado necessita de um acompanhamento rigoroso. Para Dr. Murillo Nascente, o grande desafio é mostrar aos pacientes a necessidade de tomar medicamentos que eles acreditam veemente não precisar. Além de efeitos colaterais fortes, o alto custo das drogas atípicas – aquelas com menos efeitos colaterais – dificulta o correto tratamento. A. Borges descobriu que tinha esquizofrenia há 16 anos, após uma crise de estafa em seu antigo trabalho. Ele revela que os parentes se assustaram e mantiveram certa distância, com isso sofreu muito com o preconceito além da medicação. ”Os efeitos colaterais são muito desagradáveis, tenho muitos tremores”, confessa Borges. Na procura de um diagnóstico, alguns médicos chegaram a desconfiar de Transtorno Bipolar, e ainda hoje há dúvidas do seu problema. O acompanhamento médico, juntamente com psicólogos é também de fundamental importância, revela Marilena Teixeira, psicoterapeuta há mais de 25 anos. O Transtorno Bipolar uma psicose que muitas vezes é confundida com esquizofrenia. Ambas possuem sintomas muito parecidos. Nessa o indivíduo não perde a capacidade de julgar a realidade, não ouve vozes inexistentes ou tem delírios de perseguição; sintomas esses que caracterizam a esquizofrenia. O paciente delira, geralmente com noção de grandeza: “sou amigo do Lula”, “sou dono do Banco X” etc. Na esquizofrenia seus sintomas mais comuns são delírio de perseguição, alucinação auditiva, alteração do pensamento e do conteúdo. Dr. Murillo Nascente observou em seus casos clínicos que a esquizofrenia é mais presente nas classes mais baixas, variando de acordo com educação escolaridade e estruturação familiar.Isso reforça a idéia que fatores ambientais também podem contribuir para a manifestação da doença. Esquizofrenia na tela Atualmente a esquizofrenia está em pauta em roda de amigos e nos veículos de comunicação. Uma das causas disso é a oportunidade que a autora da novela “Caminho das Índias”, Glória Perez, dá ao público de conhecer e desmistificar a doença. No horário nobre, a psicose é interpretada por dois jovens de classes sociais diferentes. Bruno Gagliasso vive Tarso, e Sidney Santiago interpreta o divertido Ademir. Ambos possuem famílias que pouco sabem ou contribuem para a melhoria de seus transtornos, revelando a realidade familiar da maioria dos esquizofrênicos independente de classe social. Nas telonas, o assunto entrou em cartaz em 2001, com o filme “Uma mente Brilhante”, interpretado por Russell Crowe, retratando a genialidade e a luta contra a esquizofrenia de Nash. O filme é uma adaptação da biografia do matemático John Forbes Nash. Logo no início de carreira, Nash fez uma fantástica descoberta, sendo aclamado internacionalmente. Ameaçado pela esquizofrenia, teve que enfrentar inúmeros obstáculos, até ser finalmente consagrado em 1994 com o Premio Nobel de Economia. Visão espírita Além dos inúmeros debates científicos para as diversas possíveis causas de esquizofrenia, o espiritismo também possui suas explicações. Lênia Soares,19 anos, diz que para a doutrina espírita a esquizofrenia vai além do desequilíbrio do pensamento: “a alma, espírito da pessoa pode estar sofrendo interferências sobrenaturais de pessoas já falecidas”, ocorrendo uma relação conjunta entre seres espirituais e corpos mediúnicos que não sabem controlar por falta de conhecimento a sua mediunidade, trazendo desequilíbrios hormonais, e diversas outras alterações ao corpo físico. ”Para o espiritismo, todos nós somos médiuns em potencial, mas algumas pessoas estão mais preparadas espiritualmente do que outras”, revela Lênia. Apesar de ser uma visão totalmente diferente da medicina, a doutrina espírita não prega o abandono do tratamento médico, pois os medicamentos ajudarão a controlar o corpo físico para que o indivíduo saiba lidar com suas fragilidades espirituais. O vice-presidente da Associação Médico-Espírita do Brasil, AME-BRASIL, Dr. Roberto Lúcio Vieira de Souza, revela que a esquizofrenia é uma doença de vários fatores associados a vidas passadas que envolvem abuso da inteligência, poder além de homicídios e suicídios. Nessa visão, as marcas genéticas seriam expressões das marcas espirituais, oriundas desse passado de dificuldades. A criatura escolhe ou é levada a escolher pais que tragam essa carga genética, predispondo-se à doença. Na nova oportunidade de reencarnação, as situações familiares e sociais podem agravar a condição daquele que já traz a predisposição. A permanência numa postura de pouca mudança, moral e espiritual desencadeará o quadro. Para o médico espírita o tratamento espiritual é complementar, mas a evangelhoterapia é recurso de mudança de profundidade que fornecerá renovação perispiritual (corpo espiritual), diminuindo a gravidade do quadro nesta vida, e possibilitando que em nova encarnação o paciente possa ser curado. Depoimento Juciely Malta, casada há mais de dois anos com Israel Rodrigues, revela que o marido descobriu que tinha esquizofrenia por volta dos 14 anos. Israel declarava ter conversas com Deus, e “visões” do pulgatório, com várias pessoas pedindo perdão. ”Nos momentos de surtos, suas conversas com Deus eram tão intensas que chegamos a pensar na sua capacidade mediúnica”, comenta Juciely. Ele também acreditava que era capaz de atravessar paredes. De acordo com ela, Israel nunca teve reações agressivas, pelo contrário, ele parecia se tornar exageradamente educado. No início do relacionamento, ela conta que não sabia dos transtornos. “Ele sempre contava aos poucos sobre o seu problema”, comenta. A família não negou o tratamento, pois a mãe de Israel, também esquizofrênica, já tinha certo conhecimento da doença. Hoje, o marido tem acompanhamento médico freqüente a cada dois meses, e já controla a maioria das crises. Sabe quando iniciará novos delírios e alucinações, e pede para ser internado.