Pós-Graduação Lato Sensu FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS ESUDA ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO DAS EMERGÊNCIAS E DESASTRES ANDRÉ DE CASTRO SILVA PATOLOGIAS EM EDIFICAÇÕES DE ALVENARIA RESISTENTE EM JABOATÃO DOS GUARARAPES - PE RECIFE AGOSTO 2013 Pós-Graduação Lato Sensu FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS ESUDA ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO DAS EMERGÊNCIAS E DESASTRES ANDRÉ DE CASTRO SILVA PATOLOGIAS EM EDIFICAÇÕES DE ALVENARIA RESISTENTE EM JABOATÃO DOS GUARARAPES - PE Monografia desenvolvida pelo aluno ANDRÉ DE CASTRO SILVA, orientada pelo Prof. Esp. LUIZ GONZAGA DA SILVA DUTRA, e apresentado ao Curso de Especialização em Gestão das Emergências e Desastres da Faculdade de Ciências Humanas ESUDA como requisito final para obtenção do grau de Especialista. RECIFE AGOSTO 2013 Pós-Graduação Lato Sensu FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS ESUDA ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO DAS EMERGÊNCIAS E DESASTRES PATOLOGIAS EM EDIFICAÇÕES DE ALVENARIA RESISTENTE EM JABOATÃO DOS GUARARAPES - PE ANDRÉ DE CASTRO SILVA Monografia submetida ao Corpo Docente do Curso de Especialização em Gestão das Emergências e Desastres da Faculdade de Ciências Humanas ESUDA e ___________________ com _______ (_____________________) em ____ de ___________________ de 2013. Banca Examinadora: ___________________________________________________________________________ Orientador: Luiz Gonzaga da Silva Dutra, Engenheiro, Especialista e Professor da Faculdade de Ciências Humanas ESUDA. ___________________________________________________________________________ Examinador: Jarbas Esteves de Assis Filho - Especialista - UNICAP. AGRADECIMENTOS A Deus, que está presente em todos os momentos da minha vida, ajudando-me a superar grandes adversidades e desafios. Aos meus pais, Olívio e Asmir José de Castro, pelo amor e zelo com que conduziram a minha educação e formação moral, para que eu pudesse chegar até esta etapa de minha vida e assim conduzi-la com dignidade. Como também a minha irmã Patrícia de Castro e ao meu cunhado José Nelson Laureano pelo exemplo inspirador de esforço, dedicação e vontade de vencer. A minha avó Maria José que nas horas difíceis mostrou o caminho a ser seguido. As minhas tias Edeilda de Castro e Eunice de Castro por sempre me apoiarem e sempre terem mostrado interesse e preocupação com meus estudos. Aos meus primos Maurício de Castro e Marcone de Castro que em muitas ocasiões deixaram seus afazeres, trabalho e lazer, para contribuir com meus estudos. Ao meu primo in memoriam Marcos de Castro pela dedicação e competência na profissão de Engenheiro. A minha amada esposa Zélia Cristina Coimbra por estar ao meu lado sempre me incentivando, principalmente, nas horas mais difíceis, e aos meus queridos filhos André Petrônio e Renato Henrique por serem meu estímulo a sempre seguir em frente vencendo os obstáculos que a vida oferece. . Ao meu orientador Cel. Bombeiro Luiz Gonzaga da Silva Dutra pelo incentivo e a confiança depositada para realização desse estudo. Aos professores do Curso de Pós-Graduação em Gestão das Emergências e Desastres da Faculdade ESUDA que ao longo de todo período acadêmico foram incansáveis na transmissão de seus conhecimentos. Aos abnegados companheiros da Defesa Civil do Município de Jaboatão dos Guararapes – PE que com dedicação, profissionalismo e acima de tudo amor ao próximo, que superam os obstáculos que a profissão impõe e fazem a diferença nesta profissão. A Albertina Farias pela inestimável colaboração para a realização deste trabalho. A todos vocês, meu muito Obrigado! Que Deus ilumine e abençoe a todos. RESUMO Este estudo buscou evidenciar as causas de insegurança estrutural nas edificações de alvenaria resistente que têm levado aos múltiplos desabamentos dos prédios tipo caixão, particularmente no Município de Jaboatão dos Guararapes, na Região Metropolitana do Recife, Estado de Pernambuco, com o agravante de perdas de vidas humanas nos sinistros. Como todo processo construtivo, existem erros na fase de projetos e execução que podem acarretar a problemas futuros, entre esses, as chamadas patologias. O objetivo principal deste estudo visou identificar e distinguir as patologias inerentes ao comportamento estrutural (aspectos relacionados com concepção e construção) e patologias inerentes ao comportamento da alvenaria como material. A metodologia de pesquisa teve caráter exploratório com análise quali-quantitativa utilizando-se de diversos artigos publicados sobre as ocorrências de ruína dessas edificações, com análises através de registros fotográficos das unidades habitacionais. Como resultado considerou-se que a origem está na elaboração do projeto estrutural que não prevê proteções aos sistemas estruturais e o processo construtivo que privilegia questões econômicas em lugar da segurança da habitação. Dentre as patologias encontradas as fissuras e infiltrações foram as mais detectadas decorrentes das condições de agressividade do solo, ar e água, aliado a sobrecargas, deformações geradas por estruturas de concreto, recalques de fundação. A solução apresentada é de reformulação dos projetos estruturais com base nas normas específicas para projetos habitacionais de moradias populares seguindo todas as recomendações e cuidados necessários descritos nas determinações no intuito de evitar o aparecimento de anomalias, como forma de assegurar a saúde e segurança dos residentes, eliminando os riscos de colapsos que já ceifaram tantas vidas. Palavras-chave: Alvenaria Resistente. Patologias. Prédios-Caixão. ABSTRACT This study searched for highlight the structural causes of insecurity in resistant masonry buildings that have led to multiple collapses of buildings coffin-like, particularly in the city of Jaboatão Guararapes in the Metropolitan Region of Recife, State of Pernambuco, with the further loss of life human in claims. Like any construction process, there are errors in the design phase and execution that can lead to future problems, among these, the so-called pathologies. The main objective of this study aimed to identify and distinguish the pathologies inherent structural behavior (aspects of design and construction) and pathologies inherent in the behavior of masonry as a material. The research methodology was exploratory in nature with qualitative and quantitative analysis using several articles published on the occurrences of ruin of these buildings, with analysis by photographic records of the housing units. As a result it was considered that the origin is in the preparation of structural design which does not provide protections for structural systems and construction process that favors economic issues instead of housing security. Among the pathologies found cracks and leaks were detected under the most aggressive conditions of soil, air and water, combined with overload, deformations generated by concrete structures, foundation settlements. The solution presented is to reformulate the structural designs based on specific standards for housing projects housing following all the recommendations and precautions described in the determinations required in order to avoid the appearance of anomalies, in order to ensure the health and safety of residents, eliminating the risks of failures that have already claimed many lives Key-words: Resistant Masonry. Pathologies. Buildings Coffin-like. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1.1 - Parede de Alvenaria Resistente de Tijolos e Argamassa .......................... 18 Figura 1.2 - Construção com Método Empírico ........................................................... 19 Figura 1.3 - Construção em Alvenaria Resistente (Portugal) ....................................... 21 Figura 2.1 - Prédio em Colapso (Maceió-AL) ………………………………………. Figura 2.2 - Desabamento de Paredes (Maceió-AL) .................................................... 28 Figura 3.1 - Blocos Interditados no Conjunto Muribeca …………………………….. 37 Figura 3.2 - Recalque Edf. Ijuí …………………………………………………….... 39 Figura 3.3 - Ruínas ………………………………………………………………...... 39 Figura 3.4 - Edificio Areia Branca …………………………………………………... 40 Figura 3.5 - Escombros ……………………………………………………………… 41 Figura 3.6 - Regaste das Vítimas ……………………………………………………. 41 Figura 3.7 - Equipe de Resgate no Areia Branca ……………………………………. 42 Figura 3.8 - Bloco B do Edf. Sevilha ………………………………………………... 43 Figura 3.9 - Reformas Interna e Externa …………………………………………….. 46 Figura 3.10 - Muro na Área Externa ………………………………………………….. 46 Figura 3.11 - Danos à Estrutura ………………………………………………………. 47 Figura 3.12 - Fissuras …………………………………………………………………. 47 Figura 3.13 - Puxadinhas ……………………………………………………………… 48 Figura 3.14 - Infiltração ………………………………………………………………. 48 Figura 3.15 - Puxadinha para Comércio ……………………………………………… 49 Figura 3.16 - Fissura e Infiltração ……………………………………………………. 49 Figura 3.17 - Excesso de Carga ………………………………………………………. 50 Figura 3.18 - Ausência de Manutenção ………………………………………………. 51 Figura 3.19 - Pavimentos e Reservatório Superior …………………………………… 54 Figura 3.20 - Vão de Escada abaixo do Reservatório Superior ….…………………… 54 27 Figura 3.21 - Vão de Escadas com Danos …………………………………………….. 55 Figura 3.22 - Fissura Diagonal ……………………………………………………....... 55 Figura 3.23 - Argamassa de Assentamento …………………………………………… 57 Figura 3.24 - Infiltração ………………………………………………………………. 57 Figura 3.25 - Fachada com Infiltração ………………………………………………... 58 Figura 3.26 - Derrubada de Parede …………………………………………………… 58 Figura 3.27 - Reforma completa do Banheiro ………………………………………… 59 Figura 3.28 - Reforma da Sala ………………………………………………………... 60 Tabela 2.1 - Número e tipos de laudos de “Prédios de Tipo Caixão” de cinco municípios da Região Metropolitana do Recife. ...................................... 30 Tabela 2.2 - Resumo Parcial de Edifícios em Grau de Risco na RMR, em 2010 ................. 32 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABECE Associação Brasileira de Engenharia e Consultoria Estrutural ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas AE Alvenaria Estrutural AR Alvenaria Resistente ASTM Standard Test Methods for Flexural Bond Strength of Masonry BNH Banco Nacional da Habitação CONDECIPE Coordenação de Defesa Civil de Pernambuco CREA Conselho Regional de Engenharia. Arquitetura e Agronomia EPU Expansão por Umidade IBAPE Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia do estado de São Paulo IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ITEP Instituto de Tecnologia de Pernambuco NBR Norma Brasileira PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios RMR Região Metropolitana do Recife SEDEC Secretaria Executiva de Defesa Civil SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 11 CAPÍTULO 1 – EDIFICAÇÕES EM ALVENARIA ................................................. 16 1.1 Origem Histórica do Uso de Alvenaria em Edificações ............................................. 17 1.2 Construção em Alvenaria Resistente no Brasil e em Outros Países ........................... 18 1.3 Comportamento Estrutural das Edificações em Alvenaria Resistente ....................... 22 1.4 Colapsos da Alvenaria Resistente .............................................................................. 24 CAPÍTULO 2 – RUÍNAS DE PRÉDIOS EM ALVENARIA RESISTENTE ........ 27 2.1 Desabamento de Prédios-Caixão ................................................................................ 27 2.2 Tipos de Laudo Pericial .............................................................................................. 29 2.3 Acidentes por Falhas Estruturais em Prédios na Região Metropolitana do Recife .... 32 CAPÍTULO 3 – ACIDENTES EM PRÉDIOS-CAIXÃO EM JABOATÃO DOS 36 GUARARAPES ............................................................................................................... 3.1 Edifício Aquarela ........................................................................................................ 38 3.2 Edifício Ijuí ................................................................................................................. 39 3.3 Edifício Areia Branca ................................................................................................. 40 3.4 Edifício Sevilha .......................................................................................................... 42 3.5 Conjunto Residencial Muribeca ................................................................................. 43 3.5.1 Bloco 155 do Conjunto Muribeca ............................................................................ 44 3.5.2 Bloco 190 do Conjunto Muribeca ............................................................................ 49 CAPÍTULO 4 – PATOLOGIAS IDENTIFICADAS NAS EDIFICAÇÕES “TIPO 52 CAIXÃO” EM JABOATÃO DOS GUARARAPES .................................................... 4.1 Escadas e Caixa D’Água ............................................................................................. 53 4.2 Patologias das Fissuras ............................................................................................... 55 4.3 Modificações na Estrutura do Imóvel ......................................................................... 58 4.4 Causas para Interdição da Edificação ......................................................................... 60 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 63 REFERÊNCIAS .............................................................................................................. 65 ANEXO A – MODELO DO RELATÓRIO DE VISTORIA TÉCNICA .................. 69 ANEXO B – GLOSSÁRIO ............................................................................................ 70 11 INTRODUÇÃO O bem social “moradia” é considerada um dos eixos, além da Educação e Saúde, de constante preocupação dos órgãos governamentais a fim de satisfazer os anseios da sociedade. O Brasil tem sistematicamente elaborado programas habitacionais objetivando solucionar o déficit “moradia”, principalmente, para a classe econômica menos favorecida. No entanto, os resultados ainda não são positivos, uma vez que a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD de 2007 apontou déficit de 6,273 milhões de domicílios (IPEA, 2008). Recentemente o Ministro Moreira Franco, da Secretaria de Assuntos Estratégicos do Governo Federal, declarou que o déficit atual é de oito milhões de unidades habitacionais (MOREIRA FRANCO, 2012). Vale relembrar que na década de 70 houve uma explosão imobiliária para a construção de edifícios populares de até quatro pavimentos, constituídos de apartamentos com 100 m² de área construída, grande número deles sobre pilotis, onde a partir de uma grelha em concreto armado erguia-se a estrutura em alvenaria resistente. No entanto, crises financeiras no setor de construção civil levaram a remodelagem desse padrão. Assim, a partir da década de 80 os apartamentos passaram a ocupar todo pavimento térreo, e a diminuição da área construída que passou a ser inferior a 50 m². De acordo com Mota e Oliveira (2007) desse modo duplicou-se a oferta de moradia mantendo-se a mesma área de terreno de antes, e ainda, esses autores pontuam que tenham sido construídas seis mil unidades para 250.000 pessoas, na Região Metropolitana do Recife RMR, ou seja, uma média de 40 pessoas por unidade construída. A Região Metropolitana do Recife é composta por quatorze municípios e os mais populosos e carentes por unidades habitacionais com preços acessíveis (para população de baixa renda) são: Jaboatão dos Guararapes, Olinda, Paulista, Moreno e Camaragibe, por esta razão, cerca de 10% dessa população moram em edifícios em alvenaria resistente de até quatro pavimentos. Esses prédios denominados regionalmente "edifícios tipo caixão" são estruturados em elementos de alvenaria, utilizando blocos de vedação (tijolos furados) com a função estrutural. Essas edificações, entretanto, têm apresentado falhas estruturais que geraram nas últimas décadas o registro de acidentes com desabamento, provocando óbitos e feridos. Além da questão crítica e irreparável pela perda de vidas humanas e lesões corporais, a frequência desses sinistros e a natureza brusca da ruptura, com colapso progressivo, têm gerado 12 inquietação à comunidade técnica e, principalmente, aos moradores dessas edificações, que vivem em sobressalto pela incerteza das condições de segurança de suas residências e de suas vidas (PIRES SOBRINHO, 2012). Esta afirmativa tem respaldo nos estudos de Araújo et al. (2006) que declararam que a Região Metropolitana do Recife apresenta um quadro alarmante que compromete a imagem da construção civil brasileira. A dura afirmativa desses autores é decorrente da estatística que aponta que de 1977 até 2004, 12 edifícios desabaram, deixando mais de 30 vitimas fatais e dezenas de feridos, considerando que apenas no sinistro do Edifício Giselle, localizado em Jaboatão dos Guararapes-PE, em 1º de junho de 1977 morreram 22 pessoas, é importante destacar que nesse Município foram identificadas 6 edificações em risco (Quadro 1). Quadro 1 – Unidades habitacionais da RMR em risco, no período de 1992-2009. Ano Edifício Município Observações 1992 Baronatti Olinda Ruína na construção 1994 Bosque das Madeiras Recife Ruína na construção 1997 Aquarela Jaboatão Ruína 1999 Érika Olinda Ruína com 5 mortes 1999 Enseada do Serrambí Olinda Ruína com 7 mortes 2000 N. Sra da Conceição Jaboatão Interditado e desocupado 2001 Ijui Jaboatão Ruína 2004 Bloco 190 - Muribeca Jaboatão 2007 Sevilha Jaboatão 2009 Bloco 155 - Muribeca Jaboatão Recalque da estrutura Interditado e desocupado Ruína de um bloco Os demais blocos foram interditados e desocupados Interditado e desocupado Fonte: Pires Sobrinho, 2012. E importante referir que, segundo Melo (2007), o Edifício Giselle além de desabar levando a óbito 22 pessoas causou lesões em mais de 20 pessoas. O prédio que estava em fase de acabamento, tinha 7 andares e 28 apartamentos, mas no pavimento térreo já funcionava uma agência bancária, na época do desabamento o edifício passava pelo serviço de reforço de uma das colunas. 13 A informação citada acima leva a considerar a precariedade da construção, pois, como afirma Danielle Cavalcanti: Dizer que um edifício foi construído em alvenaria estrutural significa que a sua base de sustentação é feita pelas paredes e não por pilares de concreto. Não há nada na engenharia civil que questione a aplicação desta técnica, muito empregada por construtoras focadas em produtos para a classe C por permitir que a obra seja executada em menos tempo, diminuindo custos. O resultado é um preço mais competitivo no mercado (CAVALCANTI, 2012, p. 1). Sendo assim, considera-se relevante realizar um estudo exploratório em razão de seus agravos e riscos para a população que habita os prédios “tipo caixão”. Neste sentido este estudo justifica-se pelo argumento de que é fundamental identificar as patologias recorrentes a fim de contribuir para a solução dos problemas encontrados nas edificações de alvenaria resistente, em especial as construídas no Município de Jaboatão dos Guararapes-PE, como ainda analisar as possíveis causas para os colapsos, estabelecendo parâmetros comuns entre as edificações e as problemáticas que atingem este tipo de construção, propondo-se deste modo servir de suporte aos meios acadêmicos e técnicos, embasando trabalhos futuros, face os riscos iminentes de desastres. Neste trabalho foi adotada pesquisa exploratória de caráter quali-quantitativo com o propósito de contextualizar a situação dos referidos imóveis, através da sistematização dos dados coletados na pesquisa de campo, incluindo registros fotográficos a fim de respaldar os resultados e o objetivo proposto. A opção por este tipo de pesquisa teve por base o fato de não requerer o uso de técnicas e métodos estatísticos, mas sim, o ambiente como fonte direta dos dados e o pesquisador como instrumento chave, como também envolver dados descritivos sobre os processos construtivos pelo contato direto do investigador com a situação estudada, desta forma o processo é o foco principal da abordagem, tendo como objetivo maior a interpretação de fenômenos e a atribuição de resultados (MINAYO, 2003). A coleta de dados foi realizada a partir de observações diretas do pesquisador com registros fotográficos no período de 2010 a 2012, com base no Modelo de Vistoria (Anexo A). Os resultados obtidos foram analisados e comparados com a literatura de forma a identificar as patologias existentes. Vale destacar que o objetivo foi analisado sob a ótica de pesquisa descritiva e pesquisa exploratória, pois de acordo com o entendimento de Gil (2008) a investigação exploratória é 14 usada quando a investigação descritiva “visa proporcionar uma visão geral de um determinado fato, do tipo aproximativo” (ibidem p. 43) e a exploratória quando “envolver levantamento bibliográfico, experiências práticas com o problema pesquisado e análise de exemplos que estimulem a compreensão.” (ibidem, p. 46). Seguindo as orientações de Lakatos e Marconi (2003), o delineamento deste estudo foi realizado com o emprego de técnicas metodológicas através de um levantamento bibliográfico, documental e pesquisa de campo. Neste sentido, o principal objetivo foi o de analisar os processos que contribuem para as causas das patologias nas edificações de alvenaria resistente, localizadas no município de Jaboatão dos Guararapes, referido pela literatura como uma área crítica e que reúne o maior número de sinistros, a fim de buscar soluções para essa problemática. Para tanto, faz-se mister conhecer as patologias recorrentes nas edificações “tipocaixão”, relacionando os efeitos dos vícios construtivos que são predominantes nessas edificações e que redundam em colapso estrutural, conjugados a influência que as modificações estruturais realizadas pelos usuários facilitam a ocorrências de riscos à segurança e saúde dos moradores. Em relação ao processo construtivo, vale considerar os estudos de Gil (2008) quando afirma que a ciência pode ser caracterizada como uma forma de conhecimento verificável porque sempre possibilita demonstrar a veracidade das informações, como também é falível, porque reconhece sua própria capacidade de errar. Pode-se acrescentar que a extensão do erro é o limite de novo acerto em ciência, porquanto o conhecimento não é um fato estanque, é evolutivo. Para um melhor entendimento a estrutura deste trabalho foi dividida em quatro capítulos, além da Introdução e das Considerações Finais. Na Introdução relatou-se sobre a delimitação do tema e sua importância para este estudo, além da justificativa que pontuou a necessidade de uma pesquisa de campo, e ainda, os objetivos propostos que nortearam o desenvolvimento deste trabalho, conduzindo ao resultado final. No capítulo Edificações em Alvenaria iniciou-se com uma breve apresentação da origem deste tipo de construção, em seguida abordou-se como esse processo construtivo é usado no Brasil e em outros países, continuando, refere-se sobre o comportamento da estrutura dessas edificações para compreender as causas para os colapsos da alvenaria resistente. 15 Ruínas de Prédios em Alvenaria Resistente é o título do próximo capítulo, no qual focalizou-se as formas de desabamento, a conduta pericial, e apresentação de formulários utilizados para emissão de laudo da perícia, destacou-se ainda os sinistros ocorridos em edificações no município em foco. No capítulo seguinte, Acidentes em Prédios-Caixão em Jaboatão dos Guararapes, tratou do campo de pesquisa, assim, analisou-se algumas edificações por suas características de colapso, foram escolhidos os prédios: Aquarela, Areia Branca, Sevilha, Ijuí, e os blocos 155 e 190 do Conjunto Muribeca, considerou-se ainda, pertinente inserir algumas fotos a fim de colaborar com as análises. Complementando o estudo, no capítulo Patologias Identificadas nas Edificações “Tipo Caixão” em Jaboatão dos Guararapes discorreu-se sobre aqueles elementos estruturais que são mais frequentes e suas patologias, com o auxílio das afirmações expressas pela literatura científica consultada e os resultados obtidos com a observação de campo permitiram uma análise que identificou, entre outros determinantes, o agravo da falta de controle de qualidade dos componentes e dos procedimentos construtivos, aliado a ausência do conhecimento dos mutuários sobre os riscos de intervenção em seus imóveis, por fim, foram abordadas as causas que levam a interdição de um prédio como forma de assegurar a segurança e saúde dos residentes. Com esses requisitos reunidos foi possível tecer as Considerações Finais correlacionando-as com o objetivo proposto para este estudo, para assim apresentar orientações destinadas a minimização do risco de desabamento em prédios “tipo caixão”, e como consequência a não ocorrência de desabrigados, feridos e graves fatalidades (óbitos) de seus moradores. 16 CAPÍTULO 1 - EDIFICAÇÕES EM ALVENARIA Uma construção que utiliza alvenaria é aquela em que há um conjunto de tijolos, blocos, pedras etc. (e ligantes, como argamassa) que resistem a esforços de compressão, possuindo propriedades intrínsecas que possam compor elementos estruturais. Há ainda, apesar de menos usadas, as alvenarias de pedras naturais ou artificiais e alvenarias adensadas, maciços de argila ou concreto, moldadas em formas especiais. De acordo com o seu uso e da forma como é feita, a alvenaria pode ter as seguintes formas: Alvenaria Armada: a alvenaria armada é reforçada devido a exigências estruturais. São utilizadas armaduras passivas de fios, barras e telas de aço. Alvenaria não Armada: nesse tipo de alvenaria, os reforços de aço (barras, fios e telas) ocorrem apenas por necessidades construtivas. Alvenaria Protendida: alvenaria reforçada por uma armadura ativa (pré-tensionada) que submete a alvenaria a esforços de compressão. Alvenaria Resistente: são as alvenarias construídas para resistirem a cargas outras além do próprio peso. Alvenaria Estrutural: no sistema convencional de construção, as paredes apenas fecham os vãos entre pilares e vigas, encarregados de receber o peso da obra. Mas existe outro método, o de alvenaria estrutural que diferencia-se da alvenaria resistente por ser dimensionada empiricamente. Neste caso pilares e vigas são desnecessários, pois as paredes (chamadas portantes) distribuem a carga uniformemente ao longo dos alicerces (FRANCO, 2008, p. 4). Nas alvenarias antigas, essas unidades eram compostas apenas de pedra ou o tijolo cerâmico, eventualmente, reforçadas com estrutura interna de madeira. Desde a mais remota antiguidade que o homem utiliza a alvenaria como método construtivo, inicialmente através do empilhamento de pedras e em seguida através da descoberta de técnicas que foram evoluindo ao longo dos séculos. Para Valle (2008) a alvenaria estrutural resultou, em decorrência de processos empíricos de aprendizagem, ou seja, por tentativa de acerto e erro, numa conjugação de elementos resistentes nos quais a transferência das cargas se faz por percursos de tensões de compressão. Apesar da aparente falta de ligação entre os elementos o fato é que, muitas destas estruturas, deram provas da sua eficácia e mantiveram a sua forma durante séculos. 17 1.1 Origem Histórica do Uso de Alvenaria em Edificações Na Antiguidade, os povos etruscos, egípcios e romanos, já construíam pontes em arcos, monumentos e outras edificações e que permanecem até a atualidade como testemunhas da importância da utilização da alvenaria como material de construção ao longo da história da humanidade. Ao longo do tempo essas estruturas sofreram diversas alterações, transformando-se das formas iniciais, pesadas e espessas, para formas mais delgadas e leves, se tornando nos dias atuais um dos componentes, mais frequentemente, usado em quase todos os tipos de edificações (VITÓRIO, 2003). Alguns exemplos de edificações históricas, que atravessaram séculos, são destacadas nos estudos de José Marlos Lunardi: A história relata que as pirâmides do Egito, que datam de 2600 a.C., a de Quéops, possuía 147m de altura e 2,3 milhões de blocos, com peso médio de 2500 kg. O Farol de Alexandria, do ano 280 a.C., era de mármore branco com 134m de altura, porém, foi destruído por um terremoto no século XIV, e sabe-se que dessa forma também foi construído o Coliseu romano, do ano 70 d.C., que tem 50m de altura e 500m de diâmetro (LUNARDI, 2010, p. 18). De acordo com o site Comunidade da Construção (2012, p. 6) 1 “o sistema construtivo em alvenaria é utilizado no Brasil desde que os portugueses aqui desembarcaram no início do século XV”. Contudo, na literatura não há referência de edificações daquela época, com esse tipo de processo. No entanto, os estudos de Ramalho e Corrêa (2003) apontam que a alvenaria estrutural foi introduzida em 1966, quando foram construídos edifícios com apenas quatro pavimentos. Em 1968, com o avanço das teorias de cálculo e projeto surgiu a primeira fábrica de blocos de concreto no Brasil. Vale considerar que, em 1972, foi construído o Condomínio Central Parque Lapa formado de quatro blocos de doze pavimentos, nesse sentido, segundo Lunardi (2010, p. 18), “até meados da década de 70, mais de dois milhões de unidades habitacionais já haviam sido construídas no país através desse sistema de construção”. Já nos anos 80 são iniciadas construções de conjuntos habitacionais, de baixo custo, para famílias de baixa renda, e concomitante, “o aparecimento de muitas patologias durante e após a execução” (CORRÊA, 2010, p. 17). 1 Disponível em: <www.comunidadedaconstrucao.com.br/upload/ativos/.../07marcioc.p... > Acesso em: 18 dez 2012. 18 1.2 Construção em Alvenaria Resistente no Brasil e em Outros Países Alvenaria resistente é uma técnica construtiva que se caracteriza pela utilização de unidades de vedação (cerâmicas, concreto, sílico-calcáreo) com finalidade estrutural, ou seja, com o objetivo de suportar cargas além do seu próprio peso. No processo de construção as peças são industrializadas com dimensões e peso que as tornam manuseáveis, ligadas por argamassa, tornando o conjunto monolítico (Figura 1.1). Figura 1.1 - Parede de Alvenaria Resistente de Tijolos e Argamassa Fonte: Maciel e Lourenço, 2007. O comportamento estrutural dos prédios de alvenaria resistente é muito discutido por diversos autores. Entre eles, destacam-se Gusmão et al. (2009) que referem um aspecto primordial a ser inicialmente salientado, praticamente não se têm estudos que permitam o conhecimento das formas pelas quais as paredes de alvenaria construídas com blocos destinados a vedação, usadas com função estrutural, resistam aos esforços a que são submetidas. Sabendo-se que há uma forte razão para isto, e que reside na contradição intrínseca em se usar o componente de forma inadequada. A análise desse panorama é feita por Pires Sobrinho et al. (2008) de que essas edificações foram construídas sem embasamento técnico-normativo, onde as paredes, construídas com blocos de pequena espessura, funcionam como elementos estruturais recebendo as cargas das lajes e transmitindo-as aos elementos de fundação, sem necessariamente existir outros elementos distribuidores das tensões. E ainda, Gouveia et al. (2009) referem que a alvenaria é um material compósito (constituído pela mistura e aglutinação de duas ou mais substâncias) que consiste em blocos e 19 juntas. Uma representação detalhada da alvenaria terá de incluir a modelação dos blocos, argamassa e interfaces bloco/argamassa. Esta modelação é demasiado exigente para aplicações correntes, quer em termos de necessidades de memória quer de tempo de execução. Para esses autores uma abordagem mais simplificada em que a junta (de pequena espessura) é substituída por um elemento de junta com espessura zero resulta mais vantajosa. Este gênero de análise é apropriado para elementos estruturais constituídos por um número não muito elevado de blocos e juntas, sujeitos a distribuições de tensões e extensões muito heterogêneas, como observado na Figura 1.2. Figura 1.2 - Construção com Método Empírico Fonte: Maciel e Lourenço, 2007. O comportamento da alvenaria é influenciado por inúmeros fatores, tais como: as propriedades dos blocos e juntas que constituem a parede de alvenaria, a disposição das juntas verticais e horizontais, as dimensões dos blocos de alvenaria, a qualidade da mão-de-obra, o grau de cura, a idade e fatores atmosféricos. Devido a esta variabilidade, só recentemente a comunidade científica internacional começou a concentrar esforços nas estruturas de alvenaria. A importância reduzida que tem sido atribuída aos aspectos numéricos e comprovada pela ausência de leis constitutivas bem estabelecidas. Por outro lado, as dificuldades em adotar os modelos de outros campos científicos mais avançados, tais como a mecânica das rochas, dos solos, são evidentes, dadas as características particulares da alvenaria (MACIEL; LOURENÇO, 2007). Acrescente-se a isso, de acordo com Vitório (2003, p. 5), “a agressividade ambiental, a má utilização e a falta de conservação para que comecem a se manifestar os fenômenos patológicos que tendem a comprometer a funcionalidade e a segurança do imóvel”. 20 É válido ainda referir os estudos de Melo (2007) quando afirma ser comum o aparecimento de trincas em prédios caixão devido às movimentações térmicas, já que a diferença de temperatura entre o ambiente interno e externo gera um gradiente que pode causar tensões, como também provocar rupturas, ocorrendo principalmente nos contornos das lajes de cobertas com as paredes do último pavimento. Essa patologia é agravada pela ausência das cintas de amarração, que teria ainda a função de distribuir as cargas da laje e dar mais rigidez a estrutura. As patologias citadas levam a compreender os sinistros ocorridos nos prédios tipo caixão, sendo assim, vale considerar os estudos de Parsekian et al. (2005) sobre as características da edificação e dos critérios de projeto analisados, e que estão referidos abaixo, podendo-se destacar: presença ou não de cintas intermediárias e grautes verticais em paredes de alvenaria estrutural; escolha da família de blocos utilizada e as soluções adotadas na modulação; utilização ou não de armadura negativa em lajes. Esses autores alertam sobre a questão do orçamento versus a segurança estrutural, ao afirmarem que na mesma empresa de projeto, percebe-se diferença na adoção de um critério por influência da empresa construtora, que muitas vezes está visando à redução de consumo de material. Ainda que muitas vezes a escolha de determinado critério não acarrete em diminuição da segurança estrutural, essa postura às vezes aumenta o potencial de surgimento de manifestações patológicas (PARKESIAN et al., 2005). Para melhor entender o alerta desses autores vale referir que seus estudos quantificaram e analisaram indicadores de projetos realizados em uma única empresa de projeto, localizado na cidade de São Carlos-SP. Todas as edificações eram em alvenaria estrutural não armada com fundação em estacas e vigas-baldrame. Sendo edifícios residenciais de 4 e 5 pavimentos com as seguintes características: Conjunto Residencial Palmares - composto por 10 edifícios de 5 pavimentos (térreo mais 4 pavimentos-tipo). Grauteamento vertical nos encontros das alvenarias e nas laterais de aberturas. Conjunto Habitacional Francisco Morato - composto por 7 edifícios de 4 pavimentos (térreo mais 3 pavimentos-tipo). Grauteamento vertical nos encontros das paredes. Conjunto habitacional Felix Sahão - composto por 10 edifícios com 4 pavimentos (térreo mais 3 pavimentos-tipo). Grauteamento vertical nos encontros das paredes (PARSEKIAN et al., 2005). 21 Na análise de Gouveia et al. (2009) uma construção pensada, planificada e economicamente avaliada permite reduzir tempos de execução na fase de construção, aplicar novos materiais de funções mais apropriadas e aproveitar de forma mais eficaz os diversos elementos de construção para o desempenho estrutural. Para edifícios de pequeno porte, existem estudos que referem que a construção em alvenaria estrutural é competitiva face à solução tradicional em estrutura reticulada de betão (concreto) armado, sendo referidas reduções de custos entre 10% a 25% por alguns estudos. Por outro lado é igualmente possível reduzir a percentagem de problemas associados ao comportamento das paredes de alvenaria que atualmente se verifica. E ainda, em vários países a utilização de paredes resistentes em alvenaria tem um peso considerável, com o surgimento da regulamentação europeia, aliada a incorporação de novas disciplinas nos planos de estudo das escolas de Engenharia e com a divulgação de metodologias adequadas, é certo dizer que é possível implementar processos de construção de edifícios em alvenaria estrutural, como exemplo, em Portugal (Figura 1.3), e fomentar a ligação saber–fazer, ou seja a ligação ensino–indústria, de forma mais eficaz na obtenção dos resultados pretendidos (GOUVEIA et al., 2009). Figura 1.3 - Construção em Alvenaria Resistente (Portugal). Fonte: Gouveia et al., 2009. A literatura salienta que em vários países a utilização de paredes resistentes em alvenaria tem um peso considerável, como, por exemplo, na Alemanha onde 45% das construções de edifícios são em alvenaria estrutural, quando trata-se de aplicações a dois ou três pisos, o que denota um maior equilíbrio entre diferentes soluções (GOUVEIA et al., 2009). 22 Entretanto, de acordo com Maciel e Lourenço (2007, p. 1), “nesta situação correspondem regulamentos europeus pouco adequados, quando comparados com os seus congêneres para estruturas metálicas ou estruturas de betão”. A estrutura de betão (concreto) ao receber uma armadura metálica resiste aos esforços de tração, enquanto o concreto em si resiste a compressão. As razões para o questionamento dos regulamentos europeus são encontradas na afirmativa de Hendry (2002) quando refere que, muito embora entre os séculos 19 e 20 tivessem sido realizados testes de resistência dos elementos da alvenaria estrutural em vários países, mesmo assim se elaborava o projeto de alvenaria estrutural de acordo com métodos empíricos de cálculo, o que representou grandes limitações. Neste contexto, considera-se que o desenvolvimento de alvenaria estrutural representou um avanço tecnológico significativo para a indústria de construção e consequentemente resultados econômicos que vão ao encontro das necessidades de cada País. Ademais, pode-se dizer que a alvenaria resistente está sujeita às patologias que usualmente acometem a alvenaria estrutural, pelo fato de estar submetida não apenas a condições de carregamento como também a ações do meio ambiente. 1.3 Comportamento Estrutural das Edificações em Alvenaria Resistente Vale referir a análise de Cavalheiro (2003) distinguindo a tipificação de Alvenaria Estrutural e Alvenaria Resistente. De acordo com esse autor este tipo de construção, com uma ou outra característica peculiar da região e maior ou menor arrojo, é encontrado de norte a sul do Brasil. Não se trata na realidade de Alvenaria Estrutural (AE), mas de Alvenaria Resistente (AR), para estabelecer, conceitualmente, uma primeira diferença entre os sistemas construtivos. AE é um sistema racionalizado, que utiliza blocos modulares, com vazados verticais (por onde passam as tubulações, em geral), de resistência à compressão variando de 4,5 a cerca de 30 MPa, na área bruta. Todo um conjunto de procedimentos é utilizado na AE, respeitando-se normas brasileiras de cálculo, execução e controle de qualidade. Já a Alvenaria Resistente (AR) é feita, na maioria das vezes, de forma empírica, como o seu cálculo, empregando blocos de pouca precisão dimensional e baixa resistência, caracterizados pela existência de furos horizontais (blocos de vedação). Ensaios mostram que a resistência destes blocos oscila entre 0,5 a 2 ou 3 MPa, em quase todos os casos. De acordo com os estudos de Pires Sobrinho et al. (2010, p. 3) as edificações com essa tipologia não apresentam características construtivas em um padrão definido, “variam muito 23 desde os materiais, as técnicas construtivas e modelo estrutural”. As fundações, geralmente, são construídas em alvenaria simples ou dobrada em continuidades às paredes da edificação que podem estar assentadas sobre vigas “TÊ” invertido de concreto, sobre componentes de fundação em pré-moldadas ou simplesmente sobre camada de concreto magro. A alvenaria moderna de blocos industrializados, portanto, é definida por construções formadas por blocos industrializados de diversos materiais, suscetíveis de serem projetadas para resistirem a esforços de compressão única, ou ainda, a uma combinação de esforços ligados entre si pela interposição de argamassa e podem ainda conter armadura envolta em concreto ou argamassa no plano horizontal e/ou vertical (FRANCO, 2008). Vale, no entanto, considerar que o interior das fundações pode estar preenchido e o piso assentado diretamente sobre o solo ou seu interior pode não estar preenchido, utilizando laje pré-moldada como piso, sendo esta caracterizada como caixão vazio ou perdido. Neste tipo de edificação é possível não existir cintas-radier (Anexo B) na interface, fundação-parede de elevação ou mesmo nas interfaces parede-laje em cada pavimento, bem como ausência de vergas e contravergas nos vãos de janelas (PIRES SOBRINHO et al., 2008). Para Camacho (2006) a experiência tem demonstrado que o conveniente emprego da alvenaria estrutural pode trazer as seguintes vantagens técnicas e econômicas: Redução de custos: a redução de custos que se obtém está intimamente relacionada à adequada aplicação das técnicas de projeto e execução, podendo chegar, segundo a literatura, até a 30%, sendo proveniente basicamente da simplificação das técnicas de execução; e da economia de formas e escoramentos. Menor diversidade de materiais empregados: reduz o número de subempreiteiras na obra, a complexidade da etapa executiva e o risco de atraso no cronograma de execução em função de eventuais faltas de materiais, equipamentos ou mão-de-obra. Redução da diversidade de mão-de-obra especializada: necessita-se de mão-de-obra especializada somente para a execução da alvenaria, diferentemente do que ocorre nas estruturas de concreto armado e aço. Maior rapidez de execução: essa vantagem é notória nesse tipo de construção, decorrente principalmente da simplificação das técnicas construtivas, que permite maior rapidez no retorno do capital empregado. 24 Robustez estrutural: decorrente da própria característica estrutural, resultando em maior resistência à danos patológicos decorrentes de movimentações, além de apresentar maior reserva de segurança frente a ruínas parciais (CAMACHO, 2006). Pode-se considerar então que a alvenaria resistente é uma técnica construtiva que busca pela minimização dos custos, o que resulta na deficiência do controle de qualidade dos componentes e dos procedimentos construtivos, o que conduziu a uma série de patologias e acidentes (PIRES SOBRINHO et al, 2010). 1.4 Colapsos da Alvenaria Resistente Com base no que asseguram Mota e Oliveira (2007, p. 1) “o cálculo da resistência à compressão das paredes dos edifícios construídos com este tipo de alvenaria, são insuficientes para resistir aos esforços a que se destinam, particularmente nos pavimentos inferiores”, podese considerar o risco que essas edificações apresentam para os seus moradores, e ainda, a necessidade de uma revisão técnica que formule uma prática de engenharia segura. Neste sentido, segundo Melo (2007) a gravidade da patologia é variável, porém pode levar a edificação à inviabilidade de uso ou até ao colapso. Entre os sintomas o mais comum é o aparecimento de fissuras ou trincas, que originam-se devido a insuficiência nas propriedades e características que os materiais possuem para resistirem às tensões a que estão expostos. No caminho da investigação Mota e Oliveira (2007) realizaram pesquisas através de ensaios experimentais para identificar formas de ruptura em prismas de alvenaria de blocos cerâmicos destinados a vedação, empregados com função estrutural e assentados com furos na horizontal. Deste modo foram identificados resultados dos ensaios em prismas nas seguintes condições: Não revestidos, apenas chapiscados: as amostras dos prismas nus e apenas chapiscados apresentaram rupturas bruscas em todos os casos. Foi observado que o ponto crucial do processo de ruptura ocorre no instante em que se rompe o septo ligado à argamassa de assentamento. Resultados: nos prismas não revestidos e nos prismas apenas chapiscados ocorreram rupturas bruscas; nos prismas de mesma espessura, não foi verificada diferença na forma de ruptura quando se variou o traço da argamassa de revestimento; foi registrado em todos os ensaios dos prismas com revestimento, que inicialmente houve falência do bloco cerâmico, continuando as capas de revestimento resistindo como chapas. 25 Nas duas faces e revestidos nas duas faces, com espessuras de 2 cm: os prismas ensaiados apresentaram rupturas, na grande maioria dos casos, por tração dos septos horizontais dos blocos cerâmicos. Os septos ligados à argamassa de assentamento rompem-se por último completando o processo de colapso. Nesse caso, a argamassa de assentamento deixou de estar triaxialmente comprimida passando a se deformar substancialmente nas direções horizontais, gerando deslocamentos laterais provocando a ruptura da camada da argamassa de revestimento nesta região e com consequente colapso. Nos demais casos, verificaram-se rupturas generalizadas, geralmente bruscas; Resultados: nos prismas revestidos com 2,0 cm de espessura foi observado inicialmente as rupturas por tração dos septos horizontais, constatando-se que os septos ligados à argamassa de assentamento romperam-se por último, com posterior colapso da capa de revestimento. Com espessuras de 3 cm: na maioria dos prismas ensaiados com revestimento de 3,0 cm de espessura, observou-se que após a ruptura dos septos horizontais dos blocos cerâmicos por tração, ocorreu o rompimento por cisalhamento da capa de revestimento. A maior rigidez da capa de revestimento com 3 cm de espessura, na maioria dos casos, inibiu a deformação lateral excessiva após o desequilíbrio do estado triaxial de confinamento da argamassa de assentamento com os blocos cerâmicos; com dois tipos de traço em cada caso; Resultados: nos prismas com revestimento de 3,0 de espessura, foram observados que, após a ruptura dos septos horizontais dos blocos por tração, o rompimento por cisalhamento da capa de revestimento. Esses autores destacam como última observação, a ocorrência de vários estalos durante o carregamento dos prismas, devidos aos rompimentos progressivos dos septos. Sons semelhantes foram testemunhados por moradores de edifícios que colapsaram (MOTA; OLIVEIRA, 2007). Gusmão et al. (2009) também apresentam resultados semelhantes aos achados pelos autores acima, seguindo a metodologia utilizada no estudo de alvenaria estrutural e de vedação foram realizados ensaios de blocos, prismas e paredinhas em diversas composições de argamassas de assentamento e de revestimento, objetivando a determinação de suas propriedades e comportamentos estruturais. Os resultados desses estudos permitiram determinar as razões pelas quais, apesar dos cálculos indicarem que as paredes dos edifícios do tipo caixão sejam instáveis, milhares delas encontram-se em “aparente” estabilidade. Alguns resultados obtidos são a seguir sumarizados: 26 Os blocos cerâmicos e de concreto pesquisados apresentaram importante variabilidade dimensional denunciando um precário controle de qualidade no seu processo de fabricação; A resistência à compressão dos blocos ensaiados se mostrou excessivamente baixas – da ordem de 2 MPa – aspecto que os caracteriza como blocos que deveriam ter utilização restrita como elementos de vedação. Nenhum dos blocos ensaiados apresentou resistência compatível para suportar cargas além do próprio peso da parede; Os ensaios de compressão realizados em componentes, prismas e paredinhas de blocos cerâmicos mostraram ruptura brusca; Os ensaios realizados em prismas e paredinhas indicaram que o chapisco e o revestimento contribuem para o aumento da capacidade de carga destes elementos e a sua existência pode ser um dos responsáveis pela “estabilidade” aparente de grande parte das edificações em alvenaria resistente no Estado; Apesar de ter sido constatada melhoria na capacidade de carga gerada pelos revestimentos, a natureza brusca da ruptura dos elementos ensaiados ainda se constitui em um problema a ser superado; Os ensaios realizados em prismas e paredinhas indicaram, ainda, que a colocação de armaduras no interior da camada de revestimento, desde que adotados critérios adequados de disposição e fixação, pode contribuir para o incremento da capacidade de carga dos elementos ensaiados, bem como promover ductilidade. Uma das propostas para reforçar as edificações em alvenaria resistente é abordada por Pires Sobrinho et al. (2010) que consiste em incorporar cantoneiras de aço intertravadas com parafusos nos cantos e encontros de paredes. Para o reforço destas edificações, um princípio que norteia o projeto é de fornecer ductilidade ao sistema, além de eliminar o colapso progressivo, pois permite a transferência das cargas para a estrutura metálica definida pelas cantoneiras. Esses autores declararam que foram estudadas duas formas de reforço: utilizando capas de argamassa armada intertravadas, com o uso de conectores de aço sobre o revestimento existente; e com uso de cantoneiras intertravadas com conectores de aço no encontro entre paredes e nas ligações das paredes com as lajes. Porém as cantoneiras utilizadas nos encontros de paredes não se mostraram eficientes no incremento da capacidade de carga destes encontros (PIRES SOBRINHO et al., 2010). 27 CAPÍTULO 2 - RUÍNAS DE PRÉDIOS EM ALVENARIA RESISTENTE 2.1 Desabamento de Prédios-Caixão Neste tipo de edificação, de acordo com Gusmão et al. (2009), é frequente não se disporem cintas de concreto armado na interface fundação-parede de elevação ou mesmo nas interfaces parede-laje em cada pavimento. É comum também a ausência de vergas e contravergas nos vãos de aberturas de portas e janelas. As paredes de elevação são construídas em alvenaria singela de blocos cerâmicos ou de concreto, com espessura média de 9 cm, com juntas verticais descontínuas, assentadas com argamassa mista de cimento, cal e areia, de cimento saibro e areia ou simplesmente cimento e areia. Um exemplo disto é apresentado pelas Figuras a seguir: Figura 2.1 – Prédio em Colapso (Maceió-AL). Fonte: www.alvenaria.net/maceio.html Cavalheiro (2003) ao analisar a Figura 2.1 destaca que é perceptível a utilização de, pelo menos dois tipos de blocos: 6 furos redondos e 6 furos quadrados (este, a princípio, de maior resistência); as juntas horizontais de argamassa, parecem muito espessas (talvez chegando a 20 mm). Ensaios mostram que a resistência da alvenaria à compressão cai cerca de 15% a cada milímetro acima da espessura ideal de 10 mm; a figura não evidenciou a existência de cintas de amarração no respaldo das paredes, pelo menos com rigidez suficiente, indispensáveis para uma melhor distribuição de tensões na alvenaria e solidarizarão global das paredes. 28 Esse autor comenta ainda que a Figura 2.2 revela a questão sobre a resistência da parede (fpa), que muitas vezes é confundida com a resistência do bloco (fb). A relação fpa/fb (denominada Fator de Eficiência) é da ordem de 0,50 para blocos (de vedação) tipo 6 furos horizontais. Considerando um carregamento de 15 kN/m/andar para este tipo de prédio, e bloco de 9cm de largura, a tensão de serviço no térreo será: (15.000 N x 4 andares)/(90 mm x 1000 mm) = 0,67 MPa. Admitindo fpa/fb = 0,50, a resistência mínima que o bloco deverá ter à compressão, no térreo, será de 1,34 MPa, isto sem considerar nenhum efeito adicional devido a excentricidade de carga, esbeltez da parede, características da argamassa e outros. Então, com as hipóteses feitas, blocos de resistência inferior a 1,34 MPa, podem levar a parede ao colapso (CAVALHEIRO, 2003). Figura 2.2 – Desabamento de Paredes (Maceió-AL). Fonte: www.alvenaria.net/maceio.html O laudo expedido pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado de Alagoas (CREA-AL) citado por Cavalheiro (2003) refere que “a edificação caiu por não apresentar um mínimo de estabilidade e por utilizar indevidamente tijolos sem qualidade para paredes estruturais”, complementa esse autor que um coeficiente de segurança razoável a ser aplicado neste caso é 5, o que levaria a necessidade de blocos de resistência média fb = 1,34 x 5 = 6,7 MPa. E aponta a solução definitiva para a não ocorrência desses eventos, que seria a mudança de uma cultura construtiva para outra, ou seja, para a alvenaria estrutural. Por esse motivo, durante a construção, recomendam Araújo et al. (2006), deve-se fazer um controle de qualidade dos materiais utilizados para garantir a resistência da edificação. Depois de terminada a obra, é ideal realizar laudos periódicos, atestando se há necessidade de 29 reparos preventivos ou corretivos e, imediatamente, tomar as providências cabíveis. Além disso, o engenheiro deve está sempre atento à responsabilidade civil que lhe cabe e a necessidade de sua constante atualização durante o exercício da sua vida profissional. Os órgãos responsáveis pela fiscalização das obras devem apresentar procedimentos para um controle mais rígido das construções e exigir dos responsáveis, no mínimo, a consciente obediência às normas brasileiras. 2.2 Tipos de Laudo Pericial Molinari (2008) define laudo como um documento que visa fornecer elementos técnicos, objetivos, racionais e lógicos, fundamentados em princípios físicos e matemáticos, e em aplicação em engenharia, como auxílio à apuração da verdade dos fatos.. Entretanto, Melo (2007) aponta a existência de laudos insuficientes que teriam como características não esclarecer tudo o que dele se espera como meio de entendimento sobre uma questão ou várias que tenham sido formuladas. Como por exemplo: Pode ocorrer que um laudo não satisfaça o propósito a que se destina Pode ocorrer que seja questionável e omisso. Pode satisfazer uma parte e não satisfazer a outra. As verificações podem ser incompletas. Os exames podem omitir ou mal interpretar as patologias. Um fato pode passar despercebido. Analisando os desabamentos dos prédios tipo caixão na RMR Melo (2007) afirma que no caso dos edifícios que ruíram, os laudos tiveram como objetivo investigar as causas que deram origem aos sinistros. Esses laudos foram solicitados pelo CREA e pelo Ministério Público Estadual. As interdições, pelas competências das ações, foram determinadas pelos órgãos de Defesa Civil de cada município, originadas de um laudo de vistoria que identificou os problemas de cada edifício, analisou caso a caso, e procedeu a interdição de cada unidade que não tinha condições adequadas de habitalidade, ou problemas estruturais que colocassem em risco a vida de seus ocupantes, como exemplo, o requerimento de interdição impetrado junto ao Ministério Público pela SEDEC, Jaboatão dos Guararapes (Anexo A). É válido referir que existem diversos modelos de laudos, específicos para cada investigação, como mostrado na Tabela 1, a seguir. 30 Tabela 1 - Número e tipos de laudos de “Prédios de Tipo Caixão” de cinco municípios da Região Metropolitana do Recife. Laudos de Laudos de Laudos de Laudos de Pareceres Alvarás de Municípios Prédios Vistorias Vistorias Perícias Técnicos Interdição Desabados Particulares Prefeituras Totais Olinda 02 02 05 15 483 01 511 Jaboatão 02 00 00 03 280 06 291 Paulista 00 00 00 05 07 00 12 Recife 00 01 00 01 00 00 02 Camaragibe 00 00 00 00 00 00 00 Total 04 03 05 24 775 07 813 Fonte: Melo, 2007 (adaptado) De modo a esclarecer as diversas concepções de documentos destacados na Tabela 1, Melo (2007) explica que: - Laudo Técnico Para avaliação das causas dos desabamentos, são os mais completos. - Laudo de Vistoria Para avaliação das condições de estabilidade e habitabilidade das construções. Normalmente tem finalidades específicas, avaliando as condições momentâneas da obra, sem fazer uma investigação mais aprofundada, mesmo tendo em vista evidências de outros problemas (Anexo C). Melo (2007) para ilustrar cita que houve casos em que foram feitas investigações nos embasamentos de alguns edifícios, constatando-se a perda de resistência em alguns trechos, mas não se pesquisou se estava ocorrendo problemas com os blocos ou com as argamassas de assentamento. - Laudo Pericial Relatório técnico solicitado a um Perito, por um Juiz de Direito, que tem a finalidade de elucidar as causas de desabamento ou interdição. Apresenta elementos esclarecedores e conclusões. Desta forma pode ser instruído por ensaios tecnológicos, investigações, plantas, desenhos, fotografia, ou quaisquer outros documentos elucidativos. 31 - Parecer Técnico Opinião, conselho ou esclarecimento técnico emitido por um profissional legalmente habilitado sobre assunto de sua especialidade, solicitado pelo Poder Público e pelas partes interessadas. Outros tipos de laudo existem nas diversas áreas profissionais. Nas considerações que Melo (2007) analisa são explicitadas falhas detectadas nos laudos dos edifícios da RMR. Entre essas, foram apontadas: a falta de padronização entre os laudos técnico e de vistoria; as informações contidas nos laudos de vistoria mostram que mesmo tendo os mesmos objetivos (investigar os riscos), sobre materiais idênticos (os prédios caixão), a simples mudança do agente investigador (Engenheiro responsável) acarreta uma dispersão considerável. Diz ainda esse autor que as diferenças entre os resultados dos laudos devem ser levadas em conta, quando se pensa em padronizar as informações mínimas a serem colocadas nos laudos, em caráter obrigatório. Isso evitaria que esses documentos servissem para distorcer informações sobre determinados fatos, por omissão ou direcionamento. Conclui esse autor que se faz necessário padronizar o laudo, respeitando-se sua função ou natureza (se é vistoria ou técnico, se a estrutura é de concreto ou alvenaria, ou outros), e que seja o mais abrangente possível para cumprir de forma independente o seu papel (MELO, 2007). A literatura também referiu os requisitos para a elaboração de laudos, tais como os relatórios de inspeção necessitam ser conduzido por profissionais devidamente habilitados para realização deste tipo de investigação. São aspectos importantes: detalhar todas as patologias encontradas no trabalho de campo; descrever todos os procedimentos de ensaio empregados no trabalho de inspeção; apresentar o diagnóstico de forma clara e objetiva, com a identificação das causas, origens e mecanismos de ocorrências; apresentar recomendações relativas às intervenções a serem efetuadas; mencionar eventuais obstáculos encontrados que impediram ou dificultaram a investigação, citando as causas e os nomes das pessoas que criaram obstáculos ao trabalho, se for o caso; apresentar o prognóstico da estrutura, indicando o que deve ocorrer no caso de não se realizar as intervenções recomendadas. 32 2.3 Acidentes por Falhas Estruturais em Prédios na Região Metropolitana do Recife Na Região Metropolitana do Recife (RMR), de acordo com o alerta de Silva Filho (2010, p. 7) “o risco de desabamento de um prédio-caixão é 20 vezes maior do que em qualquer outro lugar do mundo”. A relação entre o número de acidentes ocorridos, um total de 12 desabamentos desde 1992, e o número de edificações existentes, cerca de 6 mil unidades na RMR, resulta em uma probabilidade de um desabamento para cada 500 prédios. De acordo com Pires Sobrinho (2012) a aplicação da metodologia aos prédios tipo caixão nos cinco municípios da RMR apresentou os seguintes resultados: Tabela 2 - Resumo Parcial de Edifícios em Grau de Risco na RMR, em 2010. N° DE UNIDADES POR GRAU DE RISCO MUNICÍPIO TOTAL INTERDITADOS BAIXO MÉDIO ALTO MUITO ALTO CAMARAGIBE 0 29 1 0 30 0 JABOATÃO 0 459 523 28 1.010 19 273 91 70 52 486 54 PAULISTA 0 199 396 19 614 19 RECIFE 8 935 1.200 133 2.276 28 281 1.713 2.190 232 4.416 120 OLINDA TOTAL DE UNIDADES Fonte: Pires Sobrinho (2012). Adaptado. A partir da década de 90 os sinistros passaram a ser mais próximos. De acordo com Araújo et al. (2006) em 1994 um desabamento aconteceu com um dos blocos de apartamento do Conjunto Residencial Bosque das Madeiras, localizado no bairro de Engenho do Meio (Recife) que ruiu ainda na fase de construção. Os autores explicitam que a alvenaria da edificação era singela em blocos cerâmicos de oito furos e a fundação em caixão vazio. Não houve vítimas. O laudo de avaliação do acidente foi conduzido pelo Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura de Pernambuco (CREA-PE) e apontou como causa principal do colapso a execução de rasgos horizontais para instalação de eletrodutos ao longo de toda extensão de uma parede divisória central. A ruína foi demolida e reconstruíram o prédio. Para 33 Pires Sobrinho et al. (2008) as intervenções feitas pelos moradores como retirada de paredes ou cortes horizontais extensos nas alvenarias deste tipo de edificação, agrava de sobremaneira as tensões nas partes remanescentes e podem provocar a ruína da edificação. Os estudos de Melo (2007) destacam que: - No município de Olinda existem 511 prédios caixão, e segundo Melo (2007) em 52 deles foram constatados sérios problemas que comprometem a segurança do edifício, e em 2006 existiam 75 edifícios interditados e 21 desinterditados. - Em Jaboatão dos Guararapes tem 972 prédios autoportante, sendo que 10 estão interditados e 02 desinterditados. - Em 2007, no município de Paulista existiam 608 edificações em alvenaria resistente, dos quais 10 estavam interditados e apenas 01 desinterditado. - E em Recife, o número era de 2.242 prédios contabilizados em 2006, não havendo registro de interdição nem desinterdição, porém sabe-se que isto não corresponde a realidade. A mesma situação foi encontrada no município de Camaragibe, que conta com 72 prédios caixão e sem informações sobre interdição. A primeira grande tragédia ocorreu com o Edifício Érika, localizado em Jardim Fragoso, no município de Olinda, Gusmão et al. (2009) referem que a ruína aconteceu em novembro de 1999 causando a morte de 5 pessoas e ferimentos em mais 11 moradores. O edifício tinha 4 andares e 8 apartamentos e era construído em alvenaria singela mista, envolvendo blocos cerâmicos e blocos de vedação em concreto. A fundação desta edificação foi executada em caixão vazio e as paredes em alvenaria singela mista. Foram observados em alguns pontos vazios de até 1,70 m, entre o solo natural e a laje de piso do pavimento térreo. No mês seguinte, dezembro de 1999, colapsou também em Jardim Fragoso, o Bloco B do Conjunto Enseada de Serrambi causando 7 vítimas fatais. O edifício também tinha 4 andares e 8 apartamentos e era construído em alvenaria singela de blocos cerâmicos vazados assentados com furos na horizontal. A fundação deste prédio foi também executada em caixão vazio com paredes em alvenaria singela e a laje de piso do pavimento térreo era do tipo volterrana. Nos dois sinistros o laudo de avaliação foi conduzido pela Coordenação de Defesa Civil de Pernambuco (CODECIPE) e apontou o seguinte: - Edifício Érika: A causa principal da ruína foi a perda de resistência decorrente da degradação produzida pela ação contínua de íons de sulfatos sobre os componentes do cimento. 34 - Bloco B do Conjunto Enseada de Serrambi: Identificada como causa principal da ruína a falha dos blocos de fundação. O colapso da edificação mostrava a fragmentação generalizada da mesma, decorrente da inexistência de cintas de concreto armado nos níveis dos pisos (GUSMÃO et al., 2009). Além do lapso de tempo entre esses eventos (45 dias) e o fato de estarem localizados a cerca de 500 metros de distância entre eles, provocou pânico na população por entender que o problema estava no solo, de acordo com Melo (2007). Neste sentido, Araújo et al. (2006) analisam que no caso dos edifícios Érika e do Bloco B do Serrambi, localizados cerca de mil metros do mar, possivelmente foram negligenciadas precauções em relação à estrutura no que diz respeito às fundações, pois o laudo cita como um fator de influência do desabamento a existência de um lençol freático a cerca de 1,5 metro de profundidade do solo. Em geral, antes da ocorrência de desabamentos observam-se modificações na estrutura (feitas por moradores) e nas fundações do imóvel como trincas e rachaduras (patologias), mas, esses autores ressaltam que nem sempre é possível prever a ocorrência de acidentes. Foi o que ocorreu com o Edifício Érika, que nunca havia apresentado sinais como rachaduras ou outros tipos de falhas na construção quando desabou. Mas, nem por isso deixam de alertar que a maioria dos desabamentos foi provocada por problemas na fundação do prédio e, sobretudo, pela falta de cuidados básicos na construção (ARAÚJO et al., 2006). Outro ponto está presente nos estudos de Mota e Oliveira (2007) e também de Pires Sobrinho et al. (2008) quando observam que nessas edificações, os materiais utilizados, especialmente os blocos cerâmicos, não apresentam requisitos de desempenho necessários para serem considerados estruturais. Esses estudos apontam que em vários desabamentos ocorridos, nos quais foram empregados blocos cerâmicos, houve ruptura brusca nas fundações e colapso progressivo, que se deram a partir das paredes de fundação, situadas entre as sapatas corridas de concreto armado e o nível do pavimento térreo, os denominados embasamentos. Devido as ocorrências de sinistros, e em alguns om óbitos, segundo Pires Sobrinho (2012) coube ao Instituto de Tecnologia de Pernambuco (ITEP), por solicitação do Ministério Publico Estadual e Federal, o desenvolvimento de uma metodologia de investigação e avaliação de segurança estrutural para esses tipos de edificações na RMR. Deste modo, devido ao grande número de edificações existentes, o não conhecimento da quantidade e características dessas edificações em cada município e ao exíguo tempo arguido na ação, a metodologia foi proposta para ser desenvolvida em três etapas. 35 1ª etapa denominada de cadastro e determinação de grau de risco potencial: consiste em caracterizar e georeferenciar todas as edificações de três e quatro pavimentos construídas em alvenaria resistente e determinar seu grau de risco potencial. Este grau de risco é determinado segundo metodologia de investigação e modelo de cálculo apresentados nos dois itens seguintes. 2ª etapa denominada de investigação e avaliação da segurança estrutural das edificações: consiste na elaboração de laudos técnicos que concluam sobre a segurança estrutural das edificações que apresentarem grau de risco elevado (alto e muito alto), determinados na primeira etapa. 3ª e última etapa denominada de recuperação das edificações: consiste no desenvolvimento de projetos e execução de reforços nos elementos das edificações, determinados nos laudos técnicos, que apresentarem não conformidades com os requisitos de segurança estrutural (PIRES SOBRINHO, 2012). As pesquisas sobre os fatores que fragilizam as estruturas de alvenaria resistente devem ter continuidade, porque não há interesse científico em se promover uma investigação desta natureza se não houver uma forte motivação, como os sinistros mostrados até então. No estado de Pernambuco, de acordo com Gusmão et al. (2009), existem razões importantes para o desenvolvimento de pesquisas pelo fato de que existe um significativo passivo de construções executadas dentro deste princípio, com altíssimas faixas de risco, expondo cerca de 60.000 famílias a possibilidades de perdas de vida e/ou do seu patrimônio. Este quadro se constitui num grave problema social a ser equacionado e resolvido, o que justifica amplamente os esforços nesta direção. É válido destacar que a construção de edifícios em alvenaria, vem desde os primórdios coloniais no Brasil devido fundamentalmente, à herança dos portugueses em utilizar essa prática construtiva, bem como à abundância de matéria prima para fabricação de tijolos cerâmicos (MOTA; ROMILDE, 2007). E, mais recentemente, a partir da década de 1980, quando o Governo lançou um plano habitacional para construir 100.000 unidades habitacionais para famílias de baixa renda, através do BNH – Banco Nacional de Habitação, como já referido, as construções de alvenaria resistente em prédios tipo “caixão” foram a tônica do setor de construção civil, em Pernambuco, notadamente nas áreas populosas da Região Metropolitana do Recife, e nesse contexto, o município de Jaboatão dos Guararapes, localidade de grande ocorrência de sinistros. 36 CAPÍTULO 3 - ACIDENTES EM PRÉDIOS-CAIXÃO EM JABOATÃO DOS GUARARAPES A importância de estudar os sinistros no município de Jaboatão dos Guararapes é reflexo dos registros mostrados na Tabela 2, que destaca o grau de risco por unidade como nível médio com 459 unidades; nível alto com 523 unidades e nível muito alto com 28 unidades, totalizando mais de mil unidades que apresentavam riscos de colapsos. É expressivo esses dados, além do que este pesquisador teve a oportunidade de visitar e registrar a situação de alguns desses imóveis. Entretanto, antes de iniciar a análise de algumas das unidades que apresentavam em 2012, escolhidas por mostrarem riscos eminentes de colapsos, é pertinente nesta abertura de capítulo, considerar o que Camacho (2006, p. 16) refere em relação ao uso da argamassa, quando discorre sobre esse elemento ao referir sua importância por ser “o agente ligante que integra a alvenaria, deste modo a argamassa deve ser forte, durável e capaz de garantir a integridade e estanqueidade da mesma, devendo também possuir certas propriedades elásticas, trabalhabilidade e ser econômica”. E ainda, complementando, esse autor que destaca que: A argamassa deve ter capacidade de retenção de água suficiente para que quando em contato com unidades de elevada absorção inicial, não tenha suas funções primárias prejudicadas pela excessiva perda de água para a unidade. É importante também que seja capaz de desenvolver resistência suficiente para absorver os esforços que possam atuar na parede logo após o assentamento (CAMACHO, 2006, p. 16). A ocorrência de diversos acidentes com edifícios construídos em alvenaria resistente, ou os reconhecidos “prédios caixão”, tem chamado a atenção da comunidade técnica local para a necessidade de se estabelecer critérios de investigação, estudo e reabilitação desse tipo de edificação, dentro de níveis de confiabilidade aceitáveis. Diversas manifestações patológicas têm sido observadas nos prédios da Região Metropolitana do Recife (RMR), como já referido neste estudo, em alguns casos, desabamentos com vítimas fatais, deste modo não se trata de um problema somente técnico, mas também social (GUSMÃO et al., 2009). Nessa perspectiva a reportagem veiculado por Luiz Filipe Freire, da Folha de Pernambuco, em 21 de maio de 2013, destaca o mapeamento que realizado pelo Instituto de Tecnologia de Pernambuco (ITEP-PE) identificando que cerca de “cerca de 4,7 mil empreendimentos dessa natureza instalados na Região Metropolitana do Recife apresentam 37 problemas estruturais que os colocam numa situação de risco. Desses, 110 já passaram por interdição.” (FREIRE, 2013, p. 1). No texto o jornalista registrou o receio dos moradores do Conjunto Muribeca em Jaboatão dos Guararapes, nas seguintes falas: É o caso das vizinhas Cristina Viana e Neide Araújo, que moram há 31 anos na quadra 3 do Conjunto Muribeca, em Jaboatão dos Guararapes. Os apartamentos delas ficam num dos 69 edifícios que estão tendo a estrutura avaliada na localidade. Ao redor, o cenário não é animador. “Vários prédios atrás e na frente do nosso já foram desocupados porque os laudos apontaram que eles tinham risco. O nosso é um dos poucos em que o pessoal ainda não teve que sair”, diz Cristina. “No meu apartamento, não tem rachadura. Mas a gente vive constantemente nesse medo: vemos os outros indo embora e ficamos na expectativa sobre o que o laudo do nosso prédio vai dizer”, disse Neide (FREIRE, 2013, p. 1). A reportagem traz ainda uma foto mostrando a área que foi interditada (Figura 3.1) Figura 3.1 – Blocos interditados no Conjunto Muribeca. Fonte: Folha de Pernambuco, 2013. E ainda, a explicação dos especialistas do ITEP-PE é de que erros de cálculo nos projetos de edificação são motivos determinantes para as dificuldades constatadas nesses empreendimentos. “Muitas vezes, esses edifícios foram feitos sobre um sistema nãonormatizado. Reformas indevidas, com a retirada de paredes, também comprometem a estrutura. Mas, enquanto não caírem, há chance de recuperação” (FREIRE, 2013, p. 1) Analisando os casos mais graves observam-se os riscos a que estão submetidos os moradores dos prédios caixão na RMR, principalmente no município do Jaboatão dos Guararapes, objeto desta investigação. 38 O primeiro caso que registrou vítimas e causou repercussão na mídia aconteceu em 1977. Segundo Melo (2010) o Edifício Giselle, localizado no município, desabou matando 22 pessoas e ferindo mais de 20. O prédio tinha 7 andares e 28 apartamentos, estava em fase de acabamento, mas no pavimento térreo já funcionava uma agência bancária, na época do desabamento o prédio passava pelo serviço de reforço de uma das colunas. Para Pires Sobrinho (2008) a retirada de paredes ou cortes horizontais extensos nas alvenarias deste tipo de edificação agrava de sobremaneira as tensões nas partes remanescentes e podem provocar a ruína da edificação. A partir do final da década de 1990, os sinistros com prédios caixão no município de Jaboatão dos Guararapes passaram a ser mais recorrentes, como se observa a seguir. 3.1 Edifício Aquarela De acordo com Zarzar Junior et al. (2010) o Edifício Aquarela entrou em colapso em virtude da ruptura brusca dos embasamentos das fundações. Estes elementos de fundações correspondem às paredes que serviam de fundações para o edifício e que transmitiam as cargas ao solo. O conjunto destas paredes definia muros sobre os quais se apoiavam as lajes de piso, tendo o espaço delimitado pelo solo natural, paredes de fundação e lajes, um porão que é geralmente designado como “caixão perdido”. Discutem ainda Araújo et al. (2006) que a edificação precipitou em 1 metro na época e, posteriormente em 2000, desabou. O colapso ocorreu onze anos após sua construção. A estrutura da edificação era em alvenaria singela de blocos cerâmicos vazados, assentados à galga na superestrutura com os furos na horizontal. As lajes eram pré-moldadas do tipo volterrana apoiadas sobre cintas de concreto armado, corridas ao longo de todas as paredes. A fundação deste edifício, em caixão vazio, foi construída em alvenaria singela de blocos cerâmicos de seis furos (19cm x 11cm x 9cm) assentados ao chato, constituindo uma trama de paredes. Os embasamentos então formados não foram aterrados em seu interior, apresentando em alguns pontos vazios de até 1,40m do solo à laje de piso. Não houve vítimas. O laudo de avaliação foi conduzido, pelo CREA-PE e indicou como causa principal da ruptura a perda de resistência dos blocos de fundação decorrente da expansão por umidade. Também foram observadas na edificação reduções das dimensões das alvenarias de embasamento projetadas. 39 3.2 Edifício Ijuí Em maio de 2001, o Edifício Ijuí, localizado em Candeias, também construído em alvenaria resistente de blocos de concreto e fundação em caixão vazio, ruiu sem deixar vítimas, pois o Corpo de Bombeiros previamente já havia evacuado o prédio em razão da reclamação dos moradores de que no dia anterior haviam escutado vários “estalidos”. Pires Sobrinho et al. (2008) analisa que a construção era em blocos de concreto para vedação, possuindo blocos calha, parcialmente grauteados e armados com ferros finos com diâmetro de 5.0mm, sob as lajes pré-moldadas nervuradas. Entende esse autor que esta suposta cinta possibilitou a edificação aceitar pequeno recalque (Figura 3.2) decorrente da falha da fundação durante cinco horas antes de colapsar bruscamente (Figura 3.3). Figura 3.2 – Recalque Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013 Figura 3.3 – Ruínas Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013 40 A informação de Melo (2007) é que o laudo de avaliação foi conduzido pela SEDEC da Prefeitura Municipal de Jaboatão dos Guararapes contando com a participação do ITEP e CREA-PE, que concluíram que a ruptura se deu a partir dos embasamentos provocados pelo descalçamento das sapatas corridas em decorrência da passagem das águas servidas e pluviais somado com a inclinação do terreno natural e pelo fato da fundação não ser aterrada. 3.3 Edifício Areia Branca Em 14 de outubro de 2004, o Areia Branca, situado em Piedade, edificado em concreto, com 12 andares e 28 apartamentos (Figura 3.4), e com 28 anos de construído, ruiu deixando 4 mortos (Figuras 3.5 e 3.6). Destaca Melo (2010) que a tragédia não foi maior porque como o edifício apresentava problemas na sua estrutura, os moradores já tinham abandonado o prédio poucas horas antes do sinistro. Figura 3.4 – Edifício Areia Branca Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. 41 Figura 3.5 – Escombros. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Figura 3.6 – Resgate das Vítimas. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. 42 Segundo Bernhoeft et al. (2013) o laudo oficial do CREA-PE elaborado por uma equipe multidisciplinar nove meses após a tragédia (Figura 3.7), a causa principal do desabamento seriam falhas executivas na estrutura (com grande destaque para as fundações), e ainda ratifica que a ausência de uma cultura de manutenção preventiva e corretiva torna as edificações vulneráveis. Figura 3.7 – Equipe de Resgate no Areia Branca. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Este desmoronamento gerou algumas iniciativas na área da engenharia estrutural, com grande destaque em 2005 para elaboração do “checklist para vistoria de edificações em concreto armado” iniciativa da Associação Brasileira de Engenharia e Consultoria Estrutural ABECE, como objetivo de minimizar riscos e indicar formas de preservar a integridade dos edifícios em concreto armado (ABECE, 2005). 3.4 Edifício Sevilha Em dezembro de 2007, a parte posterior do Bloco B do Edifício Sevilha, como mostra a Figura 3.8 abaixo, colapsou no nível das paredes que constituíam os embasamentos da edificação. A fundação era também construída em caixão vazio em alvenaria singela formada por blocos vazados de oito furos assentados ao chato (MELO, 2010). Novamente esse autor informa que não foi disponibilizado o laudo técnico pericial. 43 Figura 3.8 – Bloco B do Edf. Sevilha Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Outro ponto está presente nos estudos de Mota e Oliveira (2007) quando observam que nessas edificações, os materiais utilizados, especialmente os blocos cerâmicos, não apresentam requisitos de desempenho necessários para serem considerados estruturais. O cálculo da resistência à compressão das paredes dos edifícios construídos com este tipo de alvenaria, mostra que são insuficientes para resistir aos esforços a que se destinam, particularmente nos pavimentos inferiores. Em vários desabamentos ocorridos, nos quais foram empregados blocos cerâmicos, houve ruptura brusca nas fundações e colapso progressivo, que se deram a partir das paredes de fundação, situadas entre as sapatas corridas de concreto armado e o nível do pavimento térreo, os denominados embasamentos. 3.5 Conjunto Residencial Muribeca O Conjunto Habitacional Muribeca, foi inaugurado em 1982, pela então Companhia de Habitação de Pernambuco (COHAB-PE), na sua inauguração, segundo Silva Filho (2010) o Conjunto era inicialmente composto por 72 blocos. Mas já em 1986, ou seja, quatro anos após a construção do conjunto habitacional, bloco de n° 10 apresentou problemas de ordem estrutural, sendo desocupado e posteriormente e demolido. De acordo com esse autor, outro fenômeno natural foi o crescimento das famílias, o tamanho reduzido dos apartamentos, que não comportavam mais os novos integrantes, desencadeou a necessidade de fazer ocupações em torno do conjunto, pois as pessoas se 44 sentiam ligadas aos familiares e ao lugar (identidade familiar e comunitária). Surgiram assim, novos problemas de urbanização não previstos no planejamento da cidade e consequentemente, o aumento populacional do Conjunto Muribeca (SILVA FILHO, 2010). Como resultado dessa desestruturação ocupacional, em dia 3 de maio de 2009, o Conjunto Residencial Muribeca teve seis prédios interditados por técnicos da Defesa Civil. Um desses prédios sofreu um processo conhecido como recalque. Afundou aproximadamente dez centímetros e pendeu para o lado esquerdo. Na parte de cima do imóvel, as rachaduras chegavam a cinco centímetros de largura (MELO, 2010). Vale destacar a análise de Oliveira (2005), que concorda com os estudos de Bernhoeft et al. (2013) sobre as causas dos desabamentos, quando resume os fatores de riscos de construção: a insuficiente resistência da construção original; a adoção de materiais inadequados; o uso de técnicas de construção incorretas; as alterações das construções; as agressões ao meio ambiente e a falta de manutenção. De acordo com Vitório (2003) a estrutura garante a estabilidade da edificação submetida a cargas cujas diferentes direções e intensidades provocam conflitos que necessitam ser equacionados. O projeto estrutural é o instrumento utilizado para solucionar esses conflitos, fazendo com que as cargas atuantes e as tensões internas sejam mantidas sob controle em sistemas de ação e reação interdependentes, que garantam o equilíbrio tanto de cada componente individual, como da estrutura como um todo. Estudos apontam que o Conjunto Residencial Muribeca, em Jaboatão dos Guararapes, é o que representa o maior grau de risco de colapso na Região Metropolitana do Recife, como destaca uma reportagem publicada no Diário de Pernambuco, em 2009, de que: A proporção ultrapassa o máximo aceitável que é de um desabamento para cada 10 mil construções. E está ainda mais distante do índice desejável de um para cada 100 mil prédios. A constatação faz parte de uma pesquisa desenvolvida por quatro instituições de ensino superior: a Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP), de Pernambuco (UPE), Federal de Pernambuco (UFPE) e a Federal de Santa Catarina (UFSC), além do Instituto de Tecnologia de Pernambuco (ITEP). O tamanho da conta para reverter essa condição está avaliado em R$ 2 bilhões. Os recursos, que não têm ainda fonte definida, seriam para corrigir as falhas construtivas ou de manutenção nessas edificações que respondem pela moradia de 10% da população da RMR ou 250 mil pessoas. Talvez nenhum outro conjunto residencial, na RMR, seja mais emblemático para retratar os riscos estruturais relacionados aos prédios do tipo caixão, do que o conjunto Muribeca, em Jaboatão dos Guararapes. Para os especialistas, a "bombarelógio" em que se transformaram essas construções, que apresentam graus de risco variados, teve início com a criação do Banco Nacional de Habitação (BNH), a partir da década de 1970. A maior parte da construção dos habitacionais de até quatro pavimentos, financiados pelo extinto BNH, 45 segundo o estudo, foi executada de forma empírica, sem atender aos requisitos de normas técnicas. E o pior: com a utilização de material de baixa qualidade para redução dos custos (DIÁRIO DE PERNAMBUCO, 2009). Nesse sentido os pontos mais vulneráveis de cada estrutura devem sempre estar perfeitamente identificados, tanto na fase de projeto quanto na fase de construção, para que seja possível estabelecer, para estes pontos, um programa mais intenso de inspeções e um sistema de manutenção particular. É importante destacar que há mais de dez anos as edificações apresentam problemas de estrutura e dos 71 blocos, 25 já foram desocupados e outros 13 estão sob avaliação. Os números são bastante expressivos e colocam o Conjunto Residencial Muribeca como um campo de estudo propício para o entendimento das falhas de engenharia na construção dessas edificações que propiciam os colapsos nas unidades habitacionais. Especialistas consideram que a ocorrência de tantos problemas no Recife e na RMR se deve a uma parte da edificação chamada de embasamento, ou seja, da fundação do prédio até o piso do térreo, que tem cerca de 70 centímetros de alvenaria e ao analisarem os colapsos detectaram que todos os problemas com prédios-caixão tiveram origem no embasamento. Além dos blocos do Conjunto Residencial Muribeca, referidos acima, a maior gravidade foi encontrada nos Blocos 155 e 190 como mostrados a seguir. 3.3.1 Bloco 155 do Conjunto Muribeca Em 03 de maio 2009, trinta e duas famílias do Bloco 155 da Quadra 02, abandonaram às pressas seus apartamentos, pois perceberam que o prédio estava estalando muito e apresentando várias rachaduras, mais uma vez a Defesa Civil é acionada e recomenda a interdição imediata. Vale referir que esse bloco ruiu ainda em 2009. É importante mostrar que várias interferências na estrutura e no layout do bloco foram realizadas pelos moradores, como apresentam as figuras abaixo. É recorrente a alteração do layout da edificação, entre elas a construção de muros, com a justificativa de proteção ou mesmo definir uma área privada para lazer, hortas ou outros fins. O condomínio do bloco em apreço edificou um muro na parte externa, além de outras intervenções internas em alvenaria mostradas nas Figuras 3.9 e 3.10 abaixo. 46 Figura 3.9 – Reformas Interna e Externa. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Figura 3.10 – Muro na Área Externa Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Em geral essas intervenções são praticadas por leigos ou profissionais de outras áreas que não Engenharia Civil, frequentemente, são pedreiros contratados pelo condomínio para levantar uma parede, e pelo desconhecimento técnico não alcançam o risco que pode causar a estrutura, como observado na Figura 3.11 abaixo. 47 Figura 3.11 – Danos à Estrutura Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. A ocorrência de fissuras é o resultado mais frequente da intervenção da estrutura como mostra a Figura 3.12. Figura 3.12 – Fissuras Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Nesse bloco foi ainda verificado outro agravo à estrutura, mais uma vez, bastante corriqueiro nas unidades habitacionais, que é a construção da “puxadinha”, seja para fazer uma garagem, seja para ampliar sua moradia, seja para comércio, entre outros fins. Como mostra a Figura 3.13 abaixo. 48 Figura 3.13 – Puxadinhas Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Observa-se ainda que a edificação apresentava infiltração como mostra a Figura 3.14 abaixo, neste caso a questão foi de embasamento como já referido neste estudo. Figura 3.14 – Infiltração Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Essas mesmas patologias foram encontradas no Bloco 190 do Conjunto Residencial Muribeca, como analisado a seguir. 49 3.3.2 Bloco 190 do Conjunto Muribeca De acordo com Vitório (2003) pelo fato de empregarem materiais diversos, com parâmetros físicos diferenciados, tornam-se necessários cuidados especiais, especialmente na junção entre paredes e de paredes com a estrutura, de modo a evitar que as diferenças de comportamento provoquem danos à edificação. Analisando o Bloco 190 observa-se a presença de “puxadinha” na Figura 3.15. Figura 3.15 – Puxadinha para Comércio Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Para Vitório (2003, p. 53) “basta observar que as fissuras mais comuns ocorrem justamente na ligação das paredes com lajes, vigas e pilares, junto às aberturas de portas e janelas e na ligação entre paredes”. É exatamente o que mostra a Figura 3.16. Figura 3.16 – Fissura e Infiltração. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. 50 As fissuras ocupam o primeiro lugar na lista dos problemas mais comuns nas alvenarias. Suas causas nem sempre são facilmente identificadas, porém, o conhecimento das mesmas é de fundamental importância para a adoção dos procedimentos adequados de correção. A infiltração de água nas fachadas e cobertas pode ser agravada pela intensidade e direção dos ventos e da chuva (VITÓRIO, 2003). Para esse autor as alvenarias também são muito sensíveis às movimentações estruturais provocadas por recalques diferenciais nas fundações, excesso de sobrecarga nas lajes (Figura 3.17) ou deformabilidade das peças estruturais, aliado a isso, é fundamental destacar que a falta de manutenção acelera o episódio como na Figura 3.18 abaixo (VITÓRIO, 2003). Figura 3.17 – Excesso de Carga Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Todas as anomalias identificadas e mostradas nas figuras poderiam ser controladas ou até mesmo, evitadas se os condomínios realizassem algumas ações simples como manutenção periódica das estruturas conforme a Figura 3.18 abaixo, observação da ocorrência de anormalidade do layout da edificação, conscientização dos moradores para não realizarem alterações estruturais em suas unidades, entre outros cuidados. 51 Figura 3.18 – Ausência de Manutenção. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. A experiência mostra que parte considerável dos eventos que demandam a realização de vistorias e perícias em edificações, decorrem de manifestações patológicas muitas vezes identificadas através da simples observação do quadro de fissuração, o que facilita bastante o diagnóstico dos problemas existentes (VITÓRIO, 2003). Por outro lado, além destas atitudes, sabe-se que outros fatores contribuem para a ocorrência de patologias em unidades habitacionais, tipo caixão, que serão abordadas no próximo capítulo. 52 CAPÍTULO 4 – PATOLOGIAS IDENTIFICADAS NAS EDIFICAÇÕES “TIPO CAIXÃO” EM JABOATÃO DOS GUARARAPES O termo patologia (derivado do grego pathos, sofrimento, doença, e logia, ciência, estudo) é o estudo das doenças em geral sob determinados aspectos e muito utilizado na área médica, no entanto atualmente é empregado, também, na Engenharia Civil, fazendo uma associação com a medicina, como sendo a parte da engenharia que estuda as anomalias (doenças) das edificações (MATTOS, 2005 apud CORRÊA, 2010, p. 19). Nessa perspectiva e com referência a questão da umidade, que pelas figuras estudadas está presente em todas as edificações e que contaminam o embasamento das estruturas habitacionais, vale considerar de início os estudos de Zarzar Junior et al. (2010) quando destacam que apenas 20% da Região Metropolitana do Recife contam com sistema de esgotamento sanitário e que boa parte das águas servidas se infiltra diretamente no subsolo, contribuindo para acelerar os potenciais processos de deterioração das fundações e das partes da estrutura que se encontram continuamente em contato com o solo. A explicação é dada por Campos (2006) de que os elementos cerâmicos tais como blocos para alvenaria, placas de revestimento de pisos e fachadas e louças sanitárias estão suscetíveis ao fenômeno físico-químico da expansão por umidade (EPU). Nesse sentido, cerâmicas porosas aquecidas a temperaturas inferiores a 1000ºC são propensas a expandirem, ocorrendo três tipos de fenômenos: (a) absorção de água nos poros maiores; (b) adsorção nas superfícies internas e externas dos corpos cerâmicos com redução da energia superficial que os torna mais deformáveis, resultando em expansão e perda da resistência mecânica; (c) combinação química irreversível da água em condições ambientais, resultando em expansão e perda das propriedades mecânicas. Estudos sobre acidentes com obras de alvenaria atribuíram como uma das causas a expansão por umidade (ZARZAR JÚNIOR et al., 2010). Neste mesmo entendimento Vitório (2003) refere que a EPU só ganhou destaque no meio técnico a partir de 1997, após a ocorrência de acidentes com edifícios de alvenaria estrutural no Grande Recife. Na ocasião laudos apontaram o fenômeno como fator determinante para a baixa resistência das alvenarias de embasamento que provocaram a falência estrutural dos prédios, deste modo pode-se considerar que a EPU é um fenômeno bastante complexo e implica sempre em consequências danosas e com riscos graves. Outro ponto crítico é destacado por Juliana Valle ao analisar a estrutura que no caso são as paredes, entende-se pois, como patologia não-estrutural aquela que: 53 [...] corresponde a paredes das quais não depende diretamente a estabilidade de outros elementos construtivos. Esta opção resulta menos clara, do ponto de vista da designação, para as situações em que os defeitos das paredes nãoestruturais resultam do deficiente desempenho ou interação dos elementos estruturais confinantes ou de suporte e para as ações mecânicas externas ou internas, a que está sujeita a parede, e que põem em causa a sua própria estabilidade, sem que da sua eventual ruína resultem consequências para outros elementos construtivos (VALLE, 2008, p. 13). Na esteira desse entendimento Vitório (2003) explica que a EPU ocorre em razão de que as cerâmicas porosas absorvem água (hidratação) e com o passar do tempo sofrem um aumento de volume (expansão). Os problemas decorrentes podem variar de fissuras em azulejos, descolamento de revestimentos e pisos cerâmicos até a graves lesões estruturais em paredes de alvenaria de tijolos cerâmicos, podendo comprometer a estabilidade das edificações construídas com alvenaria. É válido destacar outra observação referida por Richter (2007) de que as fissuras horizontais podem ser causadas também pelo fenômeno físico da retração, que ocorre com os materiais de base cimentícia, no qual, o volume inicialmente ocupado pelo material no estado plástico diminui de acordo com as condições de umidade do sistema e a evolução da matriz de cimento. Dentre os equipamentos que requerem atenção por sua falibilidade estrutural pode-se referir pelas observações já consideradas neste estudo, os quais são analisados a seguir. 4.1 Escadas e Reservatório Superior De acordo com Vitório (2003) os seis mil prédios tipo caixão construídos no Recife e Área Metropolitana são compostos, em geral, de um pavimento térreo e três pavimentos superiores, com estrutura de concreto armado apenas no trecho correspondente à escada e reservatório superior conforme Figuras 3.19 e 3.20 abaixo, ficando a maior parte da edificação funcionando de tal modo que todas as cargas são transmitidas diretamente para as paredes que, por sua vez, as transmitem para as fundações, geralmente em sapatas corridas. De acordo com Pires Sobrinho (2008) a caixa de escada, muitas vezes posicionada na parte central do bloco, é geralmente estruturada em pórtico de concreto armado e serve como sustentação da caixa d’água. Como ainda, pode ser encontrado bloco de escada sem pilares, onde os degraus são engastados nas paredes de alvenaria. 54 Figura 3.19 – Pavimentos e Reservatório Superior. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Figura 3.20 – Vão de Escada abaixo do Reservatório Superior. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Outra constatação é que há casos de ser encontrado bloco de escada sem pilares, onde os degraus são fixados apenas nas paredes de alvenaria à mercê de infiltração e consequentes fissuras, como observado na Figura 3.21 abaixo. 55 Figura 3.21 – Vão de Escada com Danos. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. As observações acima permitem entender que os elementos e componentes de uma construção estão sujeitos a variações que repercutem numa variação dimensional dos materiais de construção (dilatação ou contração), os movimentos de dilatação e contração são tensões que poderão provocar o aparecimento de fissuras (VALLE, 2008). 4.2 Patologias das Fissuras Em painéis de alvenaria as fissuras podem se apresentar nas direções horizontal, vertical, diagonal (Figura 3.22), ou uma combinação destas. Segundo Valle (2008) quando verticais ou diagonais, elas podem ser retas, atravessando unidades e juntas, ou podem ter aspecto escalonado, passando apenas pelas juntas. Figura 3.22 – Fissura Diagonal. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. 56 A forma da fissura é influenciada por vários fatores, incluindo a rigidez relativa das juntas com relação às unidades, a presença de aberturas ou outros pontos de fragilidade, as restrições da parede e a causa da fissura. Essas anomalias são as patologias mais recorrentes nas edificações sob risco de colapso, a literatura relaciona diversas causas desde a má fabricação do bloco cerâmico nas olarias, passando pelas péssimas condições de transporte e estocagem, chegando até ao cuidado na hora da execução (CORRÊA, 2010). Observa-se que múltiplos fatores podem interferir na qualidade dos blocos cerâmicos, deste modo, o engenheiro responsável pela obra deve estar atento na utilização desse material durante a construção, promovendo testes de resistência dos mesmos por amostragem. Os estudos de Ederson Corrêa analisam os fatores destacados por ele: A falta de um controle de qualidade mais eficaz por parte dos fornecedores ainda é um grande problema quando se trata de alvenaria estrutural. Geralmente eles são fabricados em olarias artesanais que não apresentam as mínimas condições técnicas de controle e muito menos pessoal especializado para realização deste serviço. As condições de transporte e a estocagem também são fatores que acarretam muitas trincas à alvenaria estrutural. O transporte geralmente é feito em pequenos caminhões com péssimas condições e sem meios seguros de fazer a acomodação dos blocos. Durante o carregamento e o descarregamento e consequentemente a estocagem, também percebe-se a falta de cuidado dos colaboradores que manuseiam os blocos cerâmicos quanto à integridade física dos mesmos, gerando uma imensa quantidade de tijolos fissurados e quebrados (CORRÊA, 2010, p. 234). Outro fator de contribuição para o aparecimento de fissuras é a falta de um controle tecnológico eficaz com relação ao traço da argamassa de assentamento, como afirma Azevedo (2009) de que as argamassas não devem ser altamente resistentes, eles devem ser capazes de absorver pequenas deformações, pois se elas forem muito resistentes, não serão capazes de deformarem junto com os blocos e acabarão trincando os mesmos, como mostra a Figura 3.23 abaixo. E ainda, fissuras na alvenaria e argamassa de assentamento pouco consistente contribuirão, também, para o aparecimento de infiltrações como pode-se observar na Figura 3.24 abaixo, segundo Bauer (2007) a umidade chega à alvenaria de forma líquida através da absorção capilar e fluxo superficial de água, nos demais casos ela é absorvida na forma gasosa. 57 Figura 3.23 – Argamassa de Assentamento. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Figura 3.24 – Infiltração. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. De acordo com Bauer (2007) a sugestão seria que durante a fase de projeto vários aspectos devem ser analisados no sentido de minimizar os problemas com as infiltrações. Dentre esses aspectos esse autor cita a orientação das fachadas em relação aos ventos predominantes, detalhes arquitetônicos e técnicos como rufos, platibandas, beirais, tipo de cobertura, a intensidade e a duração das precipitações na região. É válido referir que a localização do Conjunto Muribeca é próxima a faixa litorânea do Estado e que os níveis de precipitação são altos, basicamente, grande parte do ano. A Figura 3.25 abaixo mostra a agressão sofrida na fachada pelo fenômeno da infiltração. 58 Figura 3.25 – Fachada com Infiltração. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. 4.3 Modificações na Estrutura do Imóvel Os registros apresentados até agora neste estudo mostram que a maioria dos moradores de alguns blocos residenciais realizaram intervenções externas em suas residências, com destaque para as “puxadinhas”. No entanto, este pesquisador teve acesso apenas a um imóvel em reforma completa, que pode ser representativo de outras intervenções. Através do que mostra a Figura 3.26, pode-se avaliar o grau de interferência na estrutura do imóvel, além disto, os trabalhadores não eram qualificados para a execução do serviço de reforma. Figura 3.26 – Derrubada de parede. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. 59 O estudo monográfico de Cláudio Jacques (2008) apresenta o resultado de uma pesquisa em que as reformas realizadas contemplam, também, as instalações hidrossanitárias e suas razões, o que revela que os moradores realizam essas reformas, também por questões estéticas do seu imóvel: Os moradores enfrentaram diversos problemas nas instalações hidrossanitárias, tornando inevitável a intervenção nas instalações, seja para correção, seja para acréscimos vinculados às reformas e aumentos da área construída A manutenção foi necessária em razão de problemas nas instalações, dos quais entupimentos e vazamentos foram os problemas com maior incidência apresentados pelos entrevistados, sendo revelado que o próprio morador tomou a si esta tarefa. Outro fator foi a simplicidade do revestimento destinado aos banheiros – cimento alisado no piso e escaiola nas paredes – ensejou aos moradores a substituição por material mais moderno, uma vez que no período, a indústria da cerâmica aprimorou-se vertiginosamente, dando opções variadas aos usuários, No entanto, outros motivos foram determinantes para tal fato, uma vez que as patologias surgidas nos banheiros, conforme os moradores, oportunizaram a substituição dos revestimentos (JACQUES, 2008, p. 85) Nessa perspectiva pode-se considerar que um dos cômodos em que mais são realizadas reformas é o banheiro e de modo, amplo, como mostra a Figura 3.27. Figura 3.27 – Reforma completa do Banheiro. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. E ainda, para Jacques (2008) a preferência nas alterações internas, amplamente realizadas pelos próprios moradores, recaiu pela manutenção do sistema construtivo em alvenaria, também seguida nos casos de ampliações, como mostra a Figura 3.28 abaixo. 60 Figura 3.28 – Reforma da Sala. Fonte: Acervo do Pesquisador, 2013. Segundo Hendry et al. (2004) o objetivo básico do projeto estrutural é garantir que a estrutura venha cumprir a função a que se destina ao longo de sua vida sem excessiva deformação, fissuras ou colapso. Em sendo assim, necessariamente um dos resultados do laudo, segundo determinação da lei do Estado de Pernambuco nº 13032/2006, são indicações de ações não apenas corretivas, mas também preventivas, visando a segurança, e durabilidade técnica, e funcional da edificação. 4.4 Causas para Interdição da Edificação Diz-se que uma estrutura é segura quando resiste às distintas ações que venham solicitá-la durante a vida útil, preservando suas características originais. Neste contexto quando o arquiteto ou engenheiro projeta uma estrutura, quatro aspectos são levados em consideração: segurança, economia, conforto e durabilidade (BERNHOEFT et al., 2013). É válido destacar que a lei pernambucana (13032/06) é fundamentalmente decisiva para o sucesso da gestão de manutenção das edificações, afinal como afirma Pujadas (2007) a Inspeção Predial deve ser empregada na avaliação da manutenção e conservação das edificações. É através dessas vistorias que um leigo em engenharia, síndico ou administrador, pode tomar decisões importantes e fundamentadas “terceirizando” o que não está a seu alcance que é estabelecer prioridades de manutenção e mais importante, a gestão da manutenção deve ser executada por profissional legalmente habilitado confirmando assim a necessidade das vistorias técnicas. 61 Neste sentido pode-se definir como parâmetros para a interdição de unidades habitacionais os seguintes requisitos que apresentam riscos para a segurança dos moradores, segundo o Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia do estado de São Paulo - IBAPE (2009): - Crítico (impacto irrecuperável): é aquele que provoca danos contra a saúde e segurança das pessoas, e meio ambiente, perda excessiva de desempenho e funcionalidade causando possíveis paralisações, aumento excessivo de custo, comprometimento sensível de vida útil e desvalorização acentuada. - Regular (impacto parcialmente recuperável): é aquele que provoca a perda parcial de desempenho e funcionalidade da edificação sem prejuízo à operação direta de sistemas, deterioração precoce e desvalorização em níveis aceitáveis. - Mínimo (impacto recuperável): é aquele causado por pequenas perdas de desempenho e funcionalidade, principalmente quanto à estética ou atividade programável e planejada, sem incidência ou sem a probabilidade de ocorrência dos riscos relativos aos impactos irrecuperáveis e parcialmente recuperáveis. Diante das orientações acima pode-se considerar a importância de uma avaliação sistemática dos equipamentos que mais requerem atenção como fundações, super estrutura, reservatórios e fachadas, assim, visando a identificação e caracterização do fenômeno patológico essas podem ser conseguidas através de uma inspeção preliminar, que consiste em um exame visual da estrutura, elemento por elemento, com o objetivo de identificar os sintomas e a natureza do dano, e ainda, verificando sua repetição na estrutura. Nesse sentido, Bernhoeft et. al. (2013) referem os resultados de alguns laudos dos sinistros, destacando que o risco nas fundações trata-se de um item importantíssimo para análise, uma vez que o diagnostico de causas de desabamentos na RMR sempre remete a ligação com as fundações. Na super estrutura, o risco está associado a facilitadores como infiltrações na estrutura de concreto armado, gera elevado índice de danos estruturais, quase sempre corrosão de armaduras. Em relação aos reservatórios, possivelmente por se tratar de uma área de difícil e restrito acesso, apesar de sua integridade ser fundamental para a salubridade, economia e segurança dos usuários, as reais condições internas dos reservatórios muitas vezes são negligenciadas, com a penetração de umidade a deterioração do concreto armado é inevitável gerando comprometimento da segurança estrutural. Os estudos de Bernhoeft et. al. (2013) contemplam ainda análise das fachadas, sendo um elevado item de valorização do imóvel observado através da ótica arquitetônica, os revestimentos 62 de fachada tem a função majoritária de proteger a edificação e isso inclui sua estrutura, é necessário destacar que penetração de água/umidade (vapor ou liquido) é a causadora, ou ao menos desencadeadora de grande parte das tradicionais patologias que atingem as edificações. Considera-se ainda, para efeito de laudo conclusivo, que o profissional perito tenha embasamento quando das notificações de deformações, fissurações e outras falhas resultantes das cargas de serviço e as deformações impostas ao edifício habitacional ou sistema a valores que não causem prejuízos ao desempenho de outros elementos e não causem comprometimento da durabilidade da estrutura. A literatura também referiu os requisitos para a elaboração de laudos, tais como os relatórios de inspeção necessitam ser conduzido por profissionais devidamente habilitados para realização deste tipo de investigação. São aspectos importantes: detalhar todas as patologias encontradas no trabalho de campo; descrever todos os procedimentos de ensaio empregados no trabalho de inspeção; apresentar o diagnóstico de forma clara e objetiva, com a identificação das causas, origens e mecanismos de ocorrências; apresentar recomendações relativas às intervenções a serem efetuadas; mencionar eventuais obstáculos encontrados que impediram ou dificultaram a investigação, citando as causas e os nomes das pessoas que criaram obstáculos ao trabalho, se for o caso; apresentar o prognóstico da estrutura, indicando o que deve ocorrer no caso de não se realizar as intervenções recomendadas (Anexo A). 63 CONSIDERAÇÕES FINAIS Na abordagem das causas dos desabamentos dos prédios na RMR a literatura destaca, entre outros, os edifícios Aquarela, Ijuí e Sevilha, em Jaboatão dos Guararapes. Nesses casos, foram identificados pela primeira vez fenômenos de degradação nunca antes discutidos no meio técnico local, muito embora não se constituam em temas inéditos sob o ponto de vista do conhecimento técnico-científico, é o caso da Expansão por Umidade no Edifício Aquarela. Este estudo analisou os processos que contribuíram para as causas das patologias em edificações de alvenaria resistente no referido Município, tendo como meta propor soluções para esta problemática. Em resposta ao objetivo da investigação foram identificadas diversas patologias, que não necessariamente todas se fizeram presentes nos sinistros, no entanto, observou-se que dentre as causas a questão econômica foi comum a todas. O que significa dizer que na tentativa de viabilizar economicamente as unidades, elementos essenciais como cintas, pilaretes, vergas e contravergas, foram suprimidos, em grande número de casos. E ainda na linha da redução de custos, foram adotadas soluções tecnicamente inadequadas, como é o caso do uso do piso não aterrado (caixão vazio). O que resultou em um processo de degradação muito acelerado das obras, um envelhecimento precoce e inúmeras manifestações patológicas, desde as mais simples até as mais complexas com comprometimento da segurança das edificações. Além da falta de controle de qualidade dos componentes e dos procedimentos construtivos. Estudos destacaram que a relação entre o número de acidentes ocorridos e o número de edificações existentes resulta numa probabilidade de falha de 1:500, e este é um valor socialmente inaceitável, uma vez que o correspondente indicador para o caso em que envolve riscos de vidas humanas é de no máximo 1:10.000, sendo 1:100.000 um valor desejável. Em relação a estrutura foi observado que a espessura das paredes é responsável, em grande parte, pela redução da já pequena capacidade de carga destes elementos resistentes devido à sua elevada esbeltez. Para os valores de pé-direito usualmente empregados neste tipo de construção, 2,60 m, tem-se uma esbeltez próxima de 30 que é consideravelmente superior ao valor 20, admitido para construções em alvenaria estrutural. Outro fato constatado refere que a argamassa de revestimento contribui para a resistência de uma parede de alvenaria e a literatura internacional mostra através de 64 estimativas que a vida útil de rebocos é da ordem de vinte anos, razão pela qual não se pode atestar a segurança da edificação que padece de falha congênita, ou seja, ter sido executada com alvenaria de vedação com finalidade estrutural. Em grande número de desabamentos, a ruptura não se deu necessariamente a partir da parede mais carregada, daí, não se pode estabelecer coeficientes de segurança baseados apenas em critérios de resistência mecânica, quando a deterioração dos materiais é que pode ser determinante. Com essa perspectiva pode-se reconhecer que os prédios construídos com alvenaria resistente estão sujeitos a ruptura brusca e colapso progressivo. A solução para essa problemática tem início com os projetos de recuperação que devem ter, para merecer esta designação, necessariamente, capacidade de redistribuição de esforços decorrente de uma possível ruína de um dos elementos estruturais. Em sendo assim, considera-se que este estudo alcançou seu propósito ao sistematizar os dados obtidos na literatura científica acolhidos pelas observações e registros fotográficos realizados no campo da pesquisa, analisando as possíveis causas para os problemas e estabelecendo parâmetros comuns entre as edificações e as problemáticas que atinge este tipo de construção. Por fim, reitera-se que a estrutura resultante não poderá ser suscetível à ruptura brusca, nem ao colapso progressivo, mas para que assim seja o desempenho estrutural de qualquer edificação deve ser verificado pelas normas brasileiras específicas para projeto estrutural e devem prever condições de agressividade do solo, do ar e da água na época do projeto, determinando as proteções aos sistemas estruturais e suas partes, assim como as sobrecargas limitantes ao uso das edificações. É importante, ainda, relembrar a ausência do conhecimento dos mutuários sobre os riscos de intervenção em seus imóveis como forma de assegurar a segurança e saúde dos residentes. Em suma, esta investigação pretendeu ainda servir de suporte aos meios acadêmicos e técnicos, embasando trabalhos futuros, uma vez que este estudo não esgota a temática, e que pela sua relevância são necessárias mais pesquisas em razão de que colapsos continuam ocorrendo neste tipo de edificação, como acontecido com dois blocos do Condomínio Residencial Eldorado, no bairro do Arruda, em Recife, em 24 de maio deste ano, interditados pela Defesa Civil. 65 REFERÊNCIAS ABNT. Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 15575:2 2012. Edifícios habitacionais de até 5 pavimentos – desempenho. Rio de Janeiro, 12 mar 2012. ABECE. ASSOCIAÇÃO BRASILERIA DE CONSULTORIA E ENGENHARIA ESTRUTURAL. Check list para vistorias em edificações em concreto armado, Recife, 2005. ARAÚJO, F. J. C.; SILVA, G. C.; ADISSI, P. J. 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Córdoba, Argentina, 2, 3 Y 4 junio 2010. 69 ANEXO A MODELO DO RELATÓRIO DE VISTORIA TÉCNICA SOLICITANTE: (pessoa responsável pela administração da edificação) LOCAL DA VISTORIA: (endereço do imóvel) MOTIVO DA SOLICITAÇÃO: (vistoria preventiva, corretiva, interdição, liberação, outros) DATA DA VISTORIA: (término da vistoria) AUTOR: (profissional responsável pela vistoria) OBJETIVO: (razões para a vistoria: grau de risco, problemas edificantes, outros) CARACTERIZAÇÃO DA EDIFICAÇÃO: (dados da edificação: tipo de alvenaria, nº de pavimentos, nº de unidades, tempo de construção, tipo de fachada, tipo de calçamento, tipo de coberta, tipo de fornecimento de água e energia, localização da caixa d’água, outros) CARACTERIZAÇÃO DAS PATOLOGIAS: (informações sobre intervenções, danos estruturais, outros) CARACTERIZAÇÃO DO MEIO FÍSICO: (informações sobre localização, serviços públicos, outros) DETERMINAÇÕES: (informações sobre os serviços a serem feitos) CONCLUSÃO: (Análise final da vistoria com informações complementares) ENCAMINHAMENTO: (destinado procedimentos a serem adotados) ao solicitante, com esclarecimento sobre os OBS: (informações sobre as observações visuais, grau de risco detectado, necessidade de desocupação, base legal para impedimento de modificação da estrutura original, outros) Fonte: Secretaria Executiva de Defesa Civil. Prefeitura do Jaboatão dos Guararapes (2010). 70 ANEXO B GLOSSÁRIO Alvenaria estrutural – Tipo de alvenaria que dispensa o uso de elementos estruturais, como vigas e pilares, onde os próprios tijolos suportam a carga da estrutura. Anomalias - O que se desvia da norma. Irregularidade. Deformidade. Bloco estrutural de vedação – É o tijolo propriamente dito Eflorescência – Aparecimento de machas esbranquiçadas na alvenaria decorrente de depósitos salinos de metais alcalinos e alcalinos terrosos na superfície das alvenarias provenientes da migração de sais solúveis dos materiais e dos componentes da alvenaria. Higroscopia - É a propriedade que possuem certos materiais de absorver água. Patologias – É a parte da engenharia que estuda as anomalias das edificações Radier – Tipo de fundação rasa que consiste em uma placa de concreto armado colocado sobre o solo como uma laje de piso. Fonte: Corrêa 2010, p. 42.