UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Lindamara França EDUCAÇÃO SEXUAL UMA ANÁLISE DA CONCEPÇÃO DOS PROFESSORES DE DUAS ESCOLAS ESTADUAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL DE CURITIBA CURITIBA 2008 Lindamara França EDUCAÇÃO SEXUAL UMA ANÁLISE DA CONCEPÇÃO DOS PROFESSORES DE DUAS ESCOLAS ESTADUAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL DE CURITIBA Dissertação apresentada ao curso de Mestrado em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná na linha de Práticas Pedagógicas como requisito à obtenção do título de Mestre. Orientadora: Profª. Drª. Ariclê Vechia CURITIBA 2008 TERMO DE APROVAÇÃO Lindamara França EDUCAÇÃO SEXUAL UMA ANÁLISE DA CONCEPÇÃO DOS PROFESSORES DE DUAS ESCOLAS ESTADUAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL DE CURITIBA Esta dissertação foi julgada e aprovada para obtenção do título de Mestre em Educação no Programa de Pós-Graduação em Educação, Mestrado, Linha de Práticas Pedagógicas: elementos articuladores, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Tuiuti do Paraná. Curitiba, 30 de Abril de 2008. Mestrado em Educação Universidade Tuiuti do Paraná ________________________________ Profª. Drª. Naura Syria Carapeto Ferreira Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação, Mestrado em Educação Universidade Tuiuti do Paraná ________________________________ Profª. Drª. Ariclê Vechia – Orientadora Universidade Tuiuti do Paraná ________________________________ Prof. Dr. Lindomar Wessler Boneti Pontifícia Universidade Católica do Paraná _________________________________ Profª. Drª. Eliane Mimesse Prado Universidade Tuiuti do Paraná Dedico este trabalho especial e carinhosamente à minha filha Briana, que foi gerada e se desenvolveu juntamente com este meu projeto de pesquisa, dividindo o tempo que seria exclusivamente dela. Na sua doçura e inocência, conseguiu compreender a minha ausência em tantos momentos compartilhado juntas. que poderíamos ter AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus por me proporcionar tamanha força, perseverança e dedicação para a conclusão deste trabalho. À minha orientadora, Professora Doutora Ariclê Vechia, detentora de toda a sapiência necessária para a excelente condução e orientação para que eu pudesse seguir pelo melhor caminho e conseguir chegar até aqui. Ao meu marido Nilton, companheiro de todas as horas, que soube respeitar e compreender os momentos em que precisei me ausentar, me apoiando sempre e sendo uma das peçaschave para o meu sucesso. À minha outra peça-chave, minha filha Briana! Agradeço carinhosa e amorosamente a ela pelo simples fato de estar presente em minha vida, tornando-se a luz que me ilumina para que eu possa percorrer caminhos nem sempre tão simples ou agradáveis, mas imprescindíveis para minhas grandes conquistas! À Babá Ana, pela dedicação, fidelidade e amor demonstrado por minha filha Briana nas tantas horas em que estive ausente, me transmitindo tranqüilidade e serenidade para continuar a minha caminhada! Aos meus pais Zuza e Rufina, pelo amor e o apoio incondicional. Aos professores (as) das duas escolas investigadas que participaram desta pesquisa. Ao Prof. Marcos Cordiólli, Prof. Dr. Jomar A. Camarinha Filho, Profª. Draª. Mary Neide Figueiró, Prof. Dr. Mauro Cherobim, Prof. Dr. Sidney Reinaldo da Silva e entre tantos outros que contribuíram com idéias, sugestões e materiais. À Regina, que com sua dedicação e competência, trabalhou na revisão da dissertação. À Antônia Schwinden, pela atenção prestada à conclusão deste trabalho! À Hebert, pela dedicação, disponibilidade, contribuição com digitação, preparação de apresentação no Power Point e correções. E a todos que, de uma forma geral, me auxiliaram na construção e consolidação deste trabalho. MUITO OBRIGADA! RESUMO Este trabalho considera a educação e suas práticas pedagógicas como objeto de reflexão e elege a Educação Sexual na escola como tema de pesquisa. O problema da pesquisa está focado na concepção apresentada pelos professores que atuam em duas escolas do Ensino Fundamental da rede pública de Curitiba. O estudo almejou contextualizar a sexualidade na perspectiva emancipatória, em busca de subsídios para uma educação política e emancipatória que aborda a sexualidade na visão biopsicossocial, dentro de um contexto cultural em que normas de conduta, crenças e valores vão definindo sua vivência, concebendo a sexualidade como fator político relevante na formação da subjetividade do ser humano, com a finalidade centrada no desenvolvimento do indivíduo. A pesquisa de campo foi realizada em duas escolas públicas e os sujeitos pesquisados foram trinta professores das diversas disciplinas do 1º e 2º ciclos do Ensino Fundamental. A metodologia de pesquisa tem caráter qualitativo. O instrumento de pesquisa foi um questionário semi-estruturado contendo onze questões, respondido pelos docentes nas próprias instituições. A análise de dados dos questionários revelou a concepção dos professores de Ensino Fundamental sobre a Educação Sexual na escola. A análise demonstra que a maioria dos professores, para trabalhar a questão da sexualidade na escola, mantêm uma visão restrita, coerente com a concepção médico-higienista da sexualidade. As dificuldades, os tabus, o preconceito, o constrangimento e a desinformação colocam barreiras na abordagem do tema. Diante disso, o estudo sugere uma reflexão acerca da formação específica dos professores interessados em atuar como educadores sexuais, possibilitando um repensar sobre a Educação Sexual. Palavras-chave: Educação Sexual, Parâmetros Curriculares Nacionais, Ensino Fundamental, Práticas Pedagógicas, Sexualidade. ABSTRACT This paper considers education and its pedagogical practices as a matter for reflexion and chooses sexual education to be the theme. The research is focused on the conception presented by teachers who work in two Curitiba’s Public elementary schools. The study aimed to contextualize sexuality considering the free perspective in search of support for a free and political education which approaches sexuality in the biopsychosocial view inside a cultural context in which behavior rules, beliefs and moral values have been defining the life experience, conceiving sexuality as a political factor relevant to the formation of the human beings’ subjectivity with a centered purpose in the individuals’ growth. The field research took place in two public schools whose thirty first-and-second-cycle teachers in different subjects were interviewed. It was applied the qualitative research methodology. It was used a questionnaire, consisting of 11 questions, which was answered by the teachers in the corresponding school. The questionnaire data analysis revealed the teachers’ conception about sexual education in schools. The analysis demonstrates that most teachers, in order to work with the sexuality issue in school, keep a restrict view coherent with the medical-sanitary conception of sexuality. The difficulties, taboos, prejudice, embarrassment and misleading information establish barriers to the issue’s approach. Taking this into consideration, the study suggests a reflexion concerning the specific qualification of the teachers interested in working as sexuality educators, enabling a rethink about sexual education. Key words: Sexual Education, National Curricular Parameters, Elementary School, pedagogical practices and Sexuality. LISTA DE TABELAS TABELA 01 - ENTENDIMENTO SOBRE SEXUALIDADE ..................................... 178 TABELA 02 - ENTENDIMENTO SOBRE EDUCAÇÃO SEXUAL........................... 186 TABELA 03 - ENTENDIMENTO SOBRE TEMA TRANSVERSAL......................... 192 TABELA 04 - COMO SE DEVE TRABALHAR NA TRANSVERSALIDADE?......... 195 TABELA 05 - A ESCOLA REALIZA ATIVIDADES DE EDUCAÇÃO SEXUAL COM ALUNOS?................................................................................................................ 199 TABELA 06 - POR QUE A ESCOLA TRABALHA OU NÃO COM O TEMA? JUSTIFIQUE........................................................................................................... 202 TABELA 07 - QUAIS SÃO OS PROFESSORES OU PROFISSIONAIS RESPONSÁVEIS POR ESTA QUESTÃO?........................................................... 208 TABELA 08 - VOCÊ TRABALHA COM EDUCAÇÃO SEXUAL?........................... 209 TABELA 09 - RECEBEU TREINAMENTO PARA TRABALHAR COM O TEMA?. 211 TABELA 10 - A ESCOLA PROMOVE CURSOS PARA HABILITAR A TRABALHAR COM O TEMA?...................................................................................................... 216 TABELA 11 - SUGESTÕES PARA TRABALHAR O TEMA EDUCAÇÃO SEXUAL COM SEUS ALUNOS............................................................................................ 220 LISTA DE SIGLAS AIDS – Síndrome da Imunodeficiência Adquirida CEFURIA – Centro de Formação Urbano Rural Irmã Araújo DST – Doença Sexualmente Transmissível GTPOS – Grupo de Trabalho e Pesquisa em Orientação Sexual HIV – Vírus da Imunodeficiência Humana LDB – Lei de Diretrizes e Bases MEC – Ministério da Educação e do Desporto OMS – Organização Mundial da Saúde PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento UNAIDS – The United Nations Joint Programme on HIV/AIDS UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 11 2 UM PASSEIO PELA HISTÓRIA DA SEXUALIDADE HUMANA NO OCIDENTE............................................................................................................... 18 2.1 SEXUALIDADE: SOB A CONCEPÇÃO MÉDICO-HIGIENISTA ........................ 22 2.2 SEXUALIDADE EM DIFERENTES CONTEXTOS HISTÓRICOS ..................... 27 2.2.1 Grécia e Roma: forma naturalista do sexo ...................................................... 27 2.2.2 Cristianismo: surgimento da repressão sexual ............................................... 32 2.2.3 Idade Média: intensificação da repressão sexual ........................................... 36 2.2.4 Renascimento: entre a repressão e a liberação sexual ................................. 38 2.2.5 Século XVI a XIX: sexualidade associada à procriação .................................. 41 2.2.6 Século XX: modernização da vida sexual ....................................................... 46 3 SEXO x CONCEPÇÕES DA SEXUALIDADE x EDUCAÇÃO SEXUAL.............. 55 3.1 AS INFLUÊNCIAS DAS CONCEPÇÕES DA EDUCAÇÃO SEXUAL NO BRASIL A PARTIR DO SÉCULO XX ..................................................................................... 55 3.1.1 Concepção médica da Educação Sexual ....................................................... 55 3.1.2 A concepção emancipatória ou política da Educação Sexual ........................ 65 3.2 CONCEITO DE SEXO E SEXUALIDADE ...........................................................71 3.3 REVENDO O CONCEITO DE EDUCAÇÃO SEXUAL E ORIENTAÇÃO SEXUAL.................................................................................................................... 76 3.4 EDUCAÇÃO SEXUAL NA ESCOLA .................................................................. 82 4 PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS .................................................. 90 4.1 EDUCAÇÃO SEXUAL NOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS.... 94 4.2 EDUCAÇÃO SEXUAL COMO TEMA TRANSVERSAL ..................................... 98 4.3 EDUCAÇÃO SEXUAL NO CURRÍCULO DA ESCOLA DO ENSINO FUNDAMENTAL .................................................................................................... 101 4.4 A INCLUSÃO DA EDUCAÇÃO SEXUAL COMO TEMA TRANSVERSAL NO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO BÁSICA DO ENSINO FUNDAMENTAL (1º E 2º CICLOS) ................................................................................................................. 106 4.5 OS TRÊS EIXOS TEMÁTICOS PROPOSTOS PELOS PCNs ........................ 112 4.5.1 Corpo: matriz da sexualidade ....................................................................... 113 4.5.2 Relações de gênero ...................................................................................... 118 4.5.3 Prevenção às Doenças Sexualmente Transmissíveis/AIDS ......................... 122 4.6 EDUCAÇÃO SEXUAL E O CONTEÚDO PEDAGÓGICO APLICADO NO CURRÍCULO DO ENSINO FUNDAMENTAL ..........................................................125 4.7 O (A) PROFESSOR (A) COMO EDUCADOR (A) SEXUAL ............................ 131 4.8 O PREPARO DO (A) PROFESSOR (A) ENVOLVIDO (A) COM A EDUCAÇÃO SEXUAL ..................................................................................................................144 5 PESQUISA DE CAMPO...................................................................................... 150 5.1 METODOLOGIA DA PESQUISA...................................................................... 150 5.1.1 Universo da pesquisa .....................................................................................155 5.2 RESULTADOS DA PESQUISA ........................................................................ 160 5.3 ANÁLISE DOS DADOS .................................................................................... 178 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 226 REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 237 APÊNDICE.............................................................................................................. 246 ANEXO ................................................................................................................... 249 11 1 INTRODUÇÃO A civilização está vivenciando, neste século XXI, uma situação de crise, dos valores morais e éticos, que vem se arrastando há muito tempo e se manifesta em várias frentes. Essa situação é resultado de muitos fatos ocorridos em nossa história longínqua, a exemplo do acelerado processo de urbanização que trouxe conseqüências para o estilo de vida das pessoas, fazendo com que se dispenda mais tempo no trânsito, que de algum modo prejudica o tempo dedicado à família ou ao lazer. Não podemos deixar de mencionar que vivemos no século do “desempenho e competitividade”, o que faz com que as pessoas tenham que dedicar muito do seu tempo ao preparo, ao treino e às jornadas de trabalho exaustivas para ser um (a) profissional mais qualificado (a), prejudicando sobremaneira as outras áreas da vida. Dessa forma, as pessoas tendem progressivamente a cultivar um menor círculo de amizades. Na realidade, passamos a ter cada vez mais “conhecidos” (as) e cada vez menos amigos (as). Podemos constatar, também, que mudamos a constituição familiar. Daquela família maior, cujos elementos conviviam num mesmo espaço, passou-se à família nuclear na qual convivem somente os pais e dois ou três filhos (as) apenas. Observa-se um aumento de casais com apenas um (a) filho (a). Encontram-se também numa sala de aula muitos (as) alunos (as) de pais e mães separados, que moram com outra (o) parceira (o) e que também tem filhos (as), ou de mães solteiras que criam seus filhos (as) sozinha. Neste novo modelo de família que acabou se constituindo, o tempo de convivência diminuiu. Essa mudança na estrutura familiar afrouxou os laços de união entre seus membros e trouxe como conseqüência a abolição da transferência de conhecimentos, tradições e costumes entre as 12 gerações. E acabou ocorrendo uma fenda de prestígio das gerações mais idosas, que perde muito de seu papel de transmissores culturais para os meios de comunicação de massa. Não podemos deixar de mencionar a televisão e a Internet como um importante modificador da sociedade, demonstrando um padrão de beleza ideal, passando a exercer uma influência com relação à exigência pelo corpo perfeito, com modelos de beleza, saúde e formas estereotipadas impostas pela mesma mídia. A vivência da sexualidade dos (as) jovens tem sido apresentada, então, pelos veículos de comunicação de massa como um problema na sociedade. Os fatores citados superficialmente, e muitos outros, contribuem para uma nova maneira de viver, modificando, por conseqüência, a sociedade e, com ela, mudando todos os indivíduos a ela pertencente. Dentre essas mudanças, sem dúvida, assumem grande importância aquelas ocorridas no padrão de exercício da sexualidade. É difícil precisar, mas é assustador o número de alunos (as) do Ensino Fundamental que vêm se iniciando sexualmente nessa fase da vida. Podemos dizer isso a julgar pelas conseqüências de muitas jovens abandonarem os estudos devido à gestação. Na maioria das vezes, essa iniciação sexual é feita sem qualquer preparo, tanto formal como informal, que possa diminuir as probabilidades do advento de traumas, experiências frustrantes ou mesmo conseqüências orgânicas, como as Doenças Sexualmente Transmissíveis/AIDS – DSTs/AIDS e as gestações inesperadas. Nosso século tem assistido a importantes mudanças no que se refere ao padrão de enfoque da sexualidade e dos comportamentos sexuais. Embora ainda haja muita repressão, mitos e concepções errôneas acerca da sexualidade, 13 gradativamente, vem passando a ser melhor compreendida, deixando de ser exercida sem permissão social. Na atualidade, admitimos que a sexualidade se manifesta desde o início da vida, acompanhando o desenvolvimento geral do indivíduo. Diversas instituições foram indicadas para a disseminação das informações para meninos e meninas terem acesso ao planejamento familiar e a programas de prevenção a DSTs/AIDS, com o objetivo de diminuir os problemas sociais causados pela ausência de controle sobre as relações sexuais ocorridas precocemente. Mas a instituição que recebeu destaque como principal responsável pela Educação Sexual foi a escola. Desde que classificado como questão social, o tema sexualidade, envolvendo crianças e jovens, remete a responsabilidade de seu controle para a escola como o principal agente que a sociedade usa para transmitir cultura, do modo de vida de uma geração para outra. Acredita-se que seja necessário destacar que, como “problema social”, as preocupações com a sexualidade são dirigidas a uma camada específica da população, ou seja, com rendimentos financeiros menores, poucos instruídos e dependentes do sistema público de saúde. Nesse sentido é que esta pesquisa foi feita em escolas públicas. No entanto, seria incorreto negar a existência de problemas sexuais como gravidez inesperada e DSTs/AIDS em alunos de escolas particulares, enfim, em jovens mais favorecidos economicamente. Porém, esses eventos não são considerados problemas sociais, mas familiares. Não são classificados como problema de saúde pública porque, por exemplo, os bebês, no caso de gravidez precoce, são incorporados às famílias de origem e as mães geralmente podem dar andamento a seus projetos de vida. 14 A expectativa de que a escola promova programas de Educação Sexual para alunos (as) desde o Ensino Fundamental, tanto do 1º quanto do 2º Ciclo, demonstra a ampliação das funções dos sistemas educacionais na sociedade brasileira contemporânea. É guiada pela crença de que os processos formais de educação podem contribuir para mudanças culturais consideradas necessárias para o desenvolvimento das novas gerações. Diante da relevância do tema, o presente estudo teve como problema o seguinte: como o Tema Transversal – Educação Sexual – proposto nos PCNs foi incorporado nas escolas de Ensino Fundamental da rede pública de Curitiba?. Tem como objetivos específicos: 1) Investigar que espaço vem sendo destinado para a Educação Sexual pelos (as) professores (as); 2) analisar as dificuldades e os desafios que os (as) professores (as) enfrentam em relação à Educação Sexual; 3) delinear a maneira que a Educação Sexual é vista pelos (as) professores (as) considerando que a proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais insere nos Temas Transversais a Educação Sexual. O trabalho foi dividido em quatro capítulos nos quais serão abordados, no capítulo 2, a história da sexualidade humana no Ocidente, contextualizando historicamente as atitudes em relação à sexualidade, ressaltando as ligações existentes entre as condições políticas, religiosas, sociais, psicológicas, antropológicas, filosóficas e econômicas, além do ponto de vista médico com relação à dimensão sexual do ser humano. Pontuamos momentos representativos ao longo da história da sexualidade na Antiguidade clássica para facilitar a problematização no Ocidente e para uma melhor compreensão destes fatos que tanto interferiram para a modernização da vida sexual, assim como nas influências das concepções da Educação Sexual no Brasil. 15 No capítulo 3 procuramos diferenciar o conceito de sexo e sexualidade utilizando um referencial teórico que nos embarca na compreensão da sexualidade humana, sendo o sexo uma caracterização biológica e hereditária que diferencia fisicamente o homem da mulher. Mas, no senso comum, sexo é utilizado e conhecido como a relação sexual, os órgãos genitais, e a sexualidade amplia esse conceito, incorporando a reflexão de seu significado no contexto biológico, psicológico e sociocultural. Procuramos, ainda nesse capítulo, demonstrar por intermédio de vários teóricos que defendem a visão emancipatória da Sexualidade como Goldberg, Nunes, Figueiró e Vitiello, que a Sexualidade envolve a pessoa na sua globalidade e é uma dimensão exclusiva do ser humano, por abranger os aspectos biológicos, psicológicos e socioculturais. Desta forma é que procuramos abordar o conceito e a diferença destas terminologias, assim como revemos os conceitos de Educação Sexual e Orientação Sexual à luz de vários teóricos, por ser motivo de grande confusão e utilizadas como sinônimos. Há autores que procuram posicionamentos opostos quanto à terminologia e qual justificativa da importância de uma compreensão clara do que seja Educação Sexual e Orientação Sexual para o posicionamento de uma escolha consciente do seu significado. Nesse mesmo capítulo, passamos a falar sobre Educação Sexual na escola para que seja entendida como um saber amplo, universal e necessário à esfera pública, pois conquistou sua legalidade com as preocupações dos próprios governos por meio dos PCNs e sua forma de entrada na escola como Tema Transversal e sua intencionalidade. Já no capítulo 4, abordamos os PCNs, a Educação Sexual nos Parâmetros Curriculares Nacionais, a compreensão dos Temas Transversais, assim como a 16 abordagem dos três eixos temáticos propostos pelos PCNs para nortear o (a) professor (a) que atua como educador (a) sexual. O capítulo trata também da Educação Sexual no currículo escolar do Ensino Fundamental e a forma em que estão postos os conteúdos pedagógicos aplicados neste currículo como uma proposta pelos PCNs com os três blocos temáticos e o papel do (a) professor (a) e seu preparo para atuar como educador (a) sexual. Após o referencial teórico, passamos à segunda fase do projeto, que é a pesquisa de campo no capítulo 5. Descreve-se detalhadamente, nesse capítulo, que a pesquisa de campo foi realizada em duas escolas da rede estadual, sendo os sujeitos da pesquisa 30 (trinta) professores (as), 22 do sexo feminino e 8 do sexo masculino, das diversas disciplinas do 1º e 2º ciclos do Ensino Fundamental que voluntariamente participaram da pesquisa e que foram escolhidos (as) aleatoriamente, optando pelo anonimato. Descreve-se, também, a metodologia da pesquisa, o universo da pesquisa de campo que inclui caracterização das escolas pesquisadas, assim como os dados dos (as) professores (as) investigados (as). Nesse capítulo serão apresentados os resultados da pesquisa e a análise dos dados. Assim como os critérios de seleção das Escolas, que foram duas Escolas públicas com numerosos (as) alunos (as) e por uma Escola apresentar projeto de Educação Sexual previsto na proposta pedagógica da Escola e a outra não prever nenhum projeto de Educação Sexual na proposta pedagógica da Escola. A metodologia tem caráter qualitativo e o instrumento de pesquisa foi um questionário contendo onze questões norteadoras, para facilitar a compreensão e a interpretação das questões investigadas pelos participantes da pesquisa. Os (as) 17 professores (as) que concordaram em participar da investigação responderam individualmente o questionário. O critério de inclusão foi ser professor (a), no nível de Ensino Fundamental (1º e 2º ciclos), bem como desejar participar, voluntariamente, da pesquisa. A análise dos dados pretende revelar como os (as) professores (as) se sentem em relação à questão da Educação Sexual na escola e sua visão acerca da sexualidade. Partindo dessa questão, deseja-se refletir sobre o lugar da Educação Sexual na escola a partir da concepção dos (as) professores (as): - Se os (as) professores (as) implementam ações de Educação Sexual no ambiente escolar e qual sua concepção sobre este tipo de trabalho? - Por que desenvolvem ou não ações de Educação Sexual e por qual razão? - Qual a importância ou não para os (as) professores (as) da realização de ações educativas no que diz respeito às questões sexuais? - Como está o entendimento sobre os diversos assuntos pertinentes à Educação Sexual como os PCNs, Temas Transversais etc? - Como o (a) professor (a) se sente para desenvolver a Educação Sexual na escola? Para o tratamento e a leitura dos dados, serão selecionados e tabulados, elaborados com as respostas categorizadas, o que possibilitará a execução da percentagem para o planejamento das tabelas. Assim como, analisar a leitura atenta dos resultados, com base no referencial teórico. Após as análises dos dados, passamos às considerações finais deste estudo. Pretende-se tecer considerações pertinentes à Educação Sexual na escola do Ensino Fundamental deixando, neste capítulo, algumas sugestões para outros estudos. 18 2 UM PASSEIO PELA HISTÓRIA DA SEXUALIDADE HUMANA NO OCIDENTE Este texto pretende contextualizar sob o prisma da História as atitudes em relação à sexualidade, sem deixar de fora a relação existente entre as condições políticas, religiosas, sociais, psicológicas e econômicas e a dimensão sexual do ser humano para que, mediante os pontos representativos, possamos compreender a sexualidade no Ocidente. Como Mahatma Gandhi já disse, citado por Silva no curso que ministrou no XI Congresso Brasileiro de Sexualidade Humana, em 2007: “se queremos progredir, não devemos repetir a história, mas fazer uma história nova”. Revendo os fatos históricos, procuramos confrontar o passado com o presente, buscando na história passada da humanidade a explicação e as coincidências de sua história presente, para que possamos compreender como chegamos a ser o que somos, como mudam os valores e comportamentos e como tais processos influenciam o correr do que chamamos história para conseguirmos reinventar e lutar para o acontecimento de novas histórias. Afirma Freire (1992, p. 87): “A luta é uma categoria histórica; a questão que se coloca não é parar de lutar, mas reinventar a forma também histórica de lutar”. A história tem algo de vivo e dinâmico porque a humanidade, a respeito das diferenças culturais, continua a ser basicamente a mesma, sofrendo até dos mesmos problemas que antigamente. Já existiam, por exemplo, as discriminações sociais em relação à homossexualidade, prostituição, assim como a questão do machismo, e parece que tanto os homens quanto as mulheres estão ainda tentando se livrar de problemas sexuais, assim como as DSTs que aterrorizam tanto a 19 humanidade como nos tempos mais remotos, com os avanços e recuos a respeito da sexualidade, com suas fraquezas e grandezas. Podemos observar que, muitas vezes, o passado chega a superar a criatividade do presente, e a humanidade é surpreendida revivendo o que de alguma forma já foi vivenciado no passado. Os tempos mudam, mas algo essencial da história está sempre em círculos. Alguns conceitos sexuais como o de beleza, do erótico, da sexualidade associada apenas à reprodução e (ou) prazer, da mesma forma, questões como virgindade e masturbação modificam e às até invertem a conotação, que lhes é dada através dos tempos e locais . Os fatos ocorridos na história da Sexualidade no Ocidente nos ajudam a refletir acerca dos mitos, do que é socialmente aceito, educando-se, como comer, crescer, falar, relacionar-se etc. Quando refletimos sobre a educação, o ser humano ganha limites para poder viver em sociedade e ser aceito em termos de comportamento. Chamamos de aceitável o que não fere e nem desestrutura os padrões de determinado grupo social. Em toda a história da humanidade, os conceitos de comportamento sexual adequado variam bastante. Os valores envolvidos mudam muito, conforme as situações, mas sempre envolvendo instituições. Problemas sexuais como DSTs, família, adultério, homossexualidade, submissão da mulher ao homem, são tratados de diferentes formas e, sem dúvida, o permissível é uma questão de época. Esse passeio pela história da sexualidade feita neste capítulo pretende desmitificar a problemática da sexualidade humana e aprimorar a relação teórica e prática nos processos educativos, em que os seres humanos devem ser compreendidos em todas as suas dimensões, partindo da premissa de que, se 20 desejarmos uma Educação Sexual emancipatória, devemos rever nossos próprios valores, pois educar para a vida implica rever o sentido e a importância que damos às práticas educativas. Silva, no XI Congresso Brasileiro de Sexualidade Humana, realizado em Recife, em 2007, ministrou um curso sob o título “O trabalho com a sexualidade na e da escola: O que é possível apesar do controle?” no qual trouxe algumas definições centrais como, por exemplo: • • • Escola – Sistema de controle – Campo de força – Lugar de resistência; Sexualidade – dispositivo de controle; Adolescência – dispositivo de controle – o exercício da não definição. Adolescentes são pessoas que possuem compromisso pessoal e social e que também contribuem com as soluções e que vivem presentes, nos dias de hoje, como todos nós. Silva (2007), ainda em seu curso, refere-se ao conceito de disciplina como técnicas de individuação do poder, do vigiar e controlar um comportamento, sua perfomance, multiplicando as capacidades e colocando as pessoas onde serão mais úteis. Define também o termo Dispositivo como sendo: Um conjunto heterogêneo que engloba discursos, instituições, organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais e filantrópicas. O dispositivo, em suma, é a rede que se pode estabelecer entre estes elementos. Seguindo esse raciocínio, podemos concluir que educação pode ser utilizado para controle, e que, neste sentido, a escola pode ser utilizada como um sistema de controle, um campo de força e um lugar de resistência. O (a) educador (a) exerce o poder de direcionar comportamentos e tendências. 21 Segundo Ribeiro e Silva (2002, p. 218), “falar de sexualidade não como questão pessoal e privada, mas como uma produção histórica, uma questão social e política, na qual se exercem relações de poder”. Para Foucault (1999, p. 296), “são os elementos sociais, o dito e o não dito que compõem o dispositivo”. Nesse contexto, ao falarmos da Educação Sexual na escola, estamos falando do dispositivo de controle que pode ser acionado pelo dito e o não-dito, do controle de necessidades básicas. Ribeiro e Souza (2002, p. 218) comentam: Nesse sentido, entendemos que as proposições e os discursos que normatizam os projetos de Educação Sexual nas escolas, vem atuando como uma estratégia regulamentadora da sexualidade, a qual tem como matriz a biopolítica. Essa tecnologia de poder regula a sexualidade através de mecanismos de controle e intervenção centrados nos fenômenos biológicos: como natalidade, DSTs... Integrando tal tecnologia existe outra, a disciplinar, dirigida ao corpo, regulando a sexualidade através do controle do mesmo, nos gestos, atitudes, comportamentos, hábitos e discursos. Segundo Foucault (1997a, p. 89), “biopolítica é a maneira pela qual se tentou desde o século XVIII, racionalizar os problemas propostos à prática governamental, pelos fenômenos próprios a um conjunto de seres vivos constituídos em população, saúde, higiene, natalidade, raças”. Ainda Foucault (1999, p. 297) complementa: “tecnologia de poder é centrada no corpo, que produz efeitos individualizantes, manipula o corpo como foco de forças que é preciso tornar úteis e dóceis ao mesmo tempo”. Pela vertente de uma reflexão filosófica, na história da sexualidade, encontraremos subsídios para o conhecimento de nosso próprio pensamento acerca da Sexualidade, a fim de compreender os mistérios, as dúvidas e os desafios que enfrentamos com o tema sexualidade humana. 22 Para Louro (1997, p. 141): Abordar a sexualidade não é tarefa fácil nem trivial. Trata-se de assumir que todos os sujeitos são constituídos socialmente, que a diferença (seja ela qual for) é uma construção feita a partir de um dado lugar que se toma como norma ou como centro. É preciso pôr a norma em questão, discutir o centro, duvidar do natural. 2.1 SEXUALIDADE: SOB A CONCEPÇÃO MÉDICO-HIGIENISTA Como a ciência já demonstrou que a noção do tempo é relativa, vamos nos voltar para a época do Renascimento para exemplificar que um acontecimento tão antigo é tão parecido com o que vivemos na contemporaneidade. Vamos relembrar a Europa no ano de 1494, há aproximadamente 514 anos. O Brasil, nessa época, nem tinha sido colonizado pelos europeus. A América tinha sido colonizada há pouco tempo. Foi declarada guerra na Europa, que durou de 1495 a 1498 para a conquista de Nápoles. Essa guerra em si não teve relevância, não ganhou muito destaque em livros, mas se revestiu de um importante valor, não pela campanha das tropas francesas e nem pela rivalidade dos reis, mas acabou ganhando destaque porque, durante o deslocamento das tropas da França, se alastrou uma epidemia de Morbus fallicus, a sífilis. Nenhuma região foi poupada e foi palco da história da sexualidade, associando o sexo a uma doença letal. E o curioso desta história é que, como hoje, em relação à AIDS, ninguém queria assumir a responsabilidade pelos fatos desagradáveis, sendo os mais fracos, pobres e os menos avançados nos progressos tecnológicos apontados como os responsáveis pelas calamidades da humanidade. Na época, os “bodes expiatórios” eram as caravelas de Colombo. Portanto, passaram a afirmar que a doença não nasceu na Europa e que a sífilis fora contraída pelos nativos do Novo Mundo, que contagiaram 23 os marinheiros das caravelas de Colombo. Enfim, contaminados com os macacos americanos. Aliás, uma bela solução, afinal, os macacos não falam e povos pouco importantes não têm vez no conceito das nações. E a civilização européia poderia ficar de consciência tranqüila. (SUSSMAN, 1976) Mas o Novo Mundo não tinha qualquer comprometimento com a epidemia da sífilis. Muito pelo contrário. Ele é que foi mais tarde contaminado pela colonização européia. No Brasil, a sífilis não existia antes da colonização européia. Apenas 50 anos depois é que Padre Manoel da Nóbrega noticiou a morte de pessoas com sífilis. (SUSSMAN, 1976) Freire (1978, p.73) é muito feliz quando afirma que o Brasil “foi sifilizado antes de ser civilizado”. E a sífilis, na época, era uma doença difícil de ser combatida, pois vinha encoberta no manto do prazer erótico. O espírito moralista daquele tempo considerava a sífilis como um castigo dos céus, prova do pecado da carne e, conseqüentemente, seu castigo. Não demorou muito para recair sobre os homossexuais e prostitutas como sendo os que vendiam sexo misturado à sífilis. Aproveita-se o momento da tragédia para demonstrar que a atividade sexual era basicamente uma característica da natureza do homem, apenas vinculado e aceito com a finalidade de procriação, jamais permitida em busca do prazer. Foram 400 anos sem o remédio contra a sífilis. A única solução eram as medidas preventivas. Aconselhava a Educação Sexual que evitasse parceiros desconhecidos e quando isso não fosse possível, que usassem “camisinha” que, nos primeiros tempos, era fabricada de linho. Não tardou a encontrar resistência daqueles que não se conformavam em ter que vestir aquele “paletó peniano de linho” para ter relações sexuais. Vivia-se numa época de “sifilofobia”. Quem contraísse a doença sentia vergonha, culpa, e procurava esconder que tinha a 24 enfermidade, porque as pessoas fugiam do sifilítico, discriminavam-no e o abandonavam. (SUSSMAN, 1976) Os hábitos sexuais mudaram nessa época mas, superado o susto, a humanidade continuava a “arriscar a pele” em busca do prazer erótico. E as prostitutas e homossexuais continuam a existir. Aqueles acontecimentos da época da história remota da nossa civilização podem ser comparados com os eventos ocorridos na atualidade. Desde o século XX, na década de 1980, com o surgimento da AIDS, que veio da África para a América, dos negros que se contaminaram com os macacos africanos, destes para os homossexuais e, finalmente, para a população branca dos Estados Unidos e do mundo. Vivemos agora no tempo da “aidofobia”, quem contrai a doença se cobre de vergonha, de culpa, procurando esconder até onde pode a doença dos amigos, conhecidos e da sociedade. Ainda não há uma cura, nem existe uma vacina contra soro HIV positivo, assim como na época da epidemia da sífilis também não havia. Portanto, resta-nos como profilaxia a prevenção pela Educação Sexual. Como foi mencionado no início do texto, os tempos mudaram, mas algo pode voltar a se repetir na história. Na fase da contemporaneidade, estamos repetindo uma história de mais de 500 anos. A única diferença entre sífilis e AIDS nesse tempo é que agora mudou a tecnologia na fabricação do preservativo, que não é mais de linho. Mas não deixou de ter os manifestos moralistas que aproveitaram a apologia contra a sexualidade. Assim como houve uma fase de perseguição contra homossexuais e prostitutas. E as propagandas associando a sexualidade a uma doença letal. Assim como na epidemia de sífilis, e agora com a epidemia da AIDS, no começo, houve uma mudança de hábitos sexuais. (SUSSMAN, 1976) 25 Mas o que é interessante de se refletir é que em 500 anos não se avançou um passo sequer naquilo que realmente deveria: conscientizar o ser humano do uso adequado de sua sexualidade. Muito pelo contrário, em época de segundo milênio, o sexo é visto como veículo de morte, quando basicamente deveria ser reconhecido como um veiculador da vida. É válido fazer um passeio pela história, pois, dessa forma, tem-se a oportunidade de esclarecer muitas das perguntas atuais sobre sexualidade, porque elas foram questionadas ou respondidas por nossos antepassados e é nos ciclos culturais sucessivos que podemos atuar e descobrir a gênese dos comportamentos sexuais de hoje. A sexualidade que vivemos nada mais é do que aquilo que a humanidade fez dela. Nosso estudo não se propõe a ser exaustivo, intentamos apenas em pinçar pontos representativos para a problematização da sexualidade no Ocidente. Para tanto, abordaremos a sexualidade na Antigüidade Clássica, representada pela Grécia e por Roma pré-Cristo, pois forma o berço cultural no qual se desenvolveu o Cristianismo. E, a partir daí, podemos já compreender muito da origem da repressão sexual. Depois passamos ao estudo do Cristianismo, com sua origem judaica, pela importância que teve na determinação das atitudes sexuais, pois, por razões políticas, sua influência não se restringiu apenas ao plano religioso, pelo contrário, a transmissão de valores sexuais se deu muito pela ascendência que a Igreja teve na Idade Média, por ser, acima de tudo, detentora do poder não só religioso como também civil. Nesse sentido, Santo Agostinho, bispo de Hipona, foi uma personalidade que contribuiu para a problematização da sexualidade na nossa sociedade. 26 Enfocaremos o Renascimento que fez com que a religião se separasse da ciência e da moral. A reforma protestante, com suas reformulações na Teologia e na moral, assumiu papel importante para nossa sociedade, bem como a contra-reforma, que enrijeceu as normas da Igreja Católica. Os séculos que se seguiram ao Renascimento foram palco de intensas transformações, tanto nos costumes quanto na ciência, pois criaram um novo ser humano, preocupado com a ascensão social e com a família. Abordaremos também o século XX, com suas duas grandes guerras mundiais, com a comercialização da pílula anticoncepcional, a revolução sexual e a AIDS. Ressaltamos a importância do Estado no acompanhamento da evolução sociocultural, da saúde e da educação, necessárias aos novos papéis sociossexuais de homens e mulheres no sentido de tentar ampliar seu âmbito e liberdade perseguindo na luta pela emancipação do indivíduo, devolvendo-lhes o papel de ser humano emancipado e sujeito de sua própria história. Optamos por seguir a linha de raciocínio desenvolvida por vários teóricos brasileiros e estrangeiros que explicitam a história da sexualidade ocidental e nos fornecem respaldo para compreender a história da sexualidade da humanidade: Van Ussel (1980), Tannahill (1983), Belzer (1974), Wood (1967), Sussman (1976), Araújo (1995), Ariés (1981), Kinsey et al. (1954), Gregersen (1983), Kaplan (1977), Masters e Johnson (1966), Figueiró (2001), Foucault (1985), Vainfas (1986) e Parker (1991). 27 2.2 SEXUALIDADE EM DIFERENTES CONTEXTOS HISTÓRICOS 2.2.1 Grécia e Roma: forma naturalista do sexo Na civilização grega, o sexo era visto de forma naturalista. Procurava-se atingir a harmonia em todos os aspectos, combinando beleza física e o desenvolvimento intelectual. O sexo era visto como uma atividade inerente à natureza humana. Dois fatores contribuíram para uma visão da sexualidade sadia: o enfoque à beleza e à harmonia, chegando a idealizar o corpo nu que aparecia glorificado nas artes plásticas, e a sexualidade atribuída a seus deuses. A figura masculina grega gozava de mais privilégios que a feminina. Mulheres, crianças e escravos não desfrutavam dos mesmos direitos dos homens. O casamento era monogâmico por razões seculares, não por religiosas, mas, ao homem, entretanto, era permitido ter envolvimento extraconjugal. Para a mulher, havia três posições sociais passíveis de ocupação: esposa, hetera ou prostituta. Esperava-se que a esposa fosse mãe e dona-de-casa. Não acompanhava o marido em viagens ou reuniões sociais. A virgindade até o casamento era considerado status, que Belzer (1974) nomeava de virgo intactus, mas não era considerada uma virtude em si, apenas aumentava a nubilidade. Sussman (1976, p. 10), refererindo-se a hetera: “geralmente, a hetera era bem educada e culta. Podia acompanhar o homem nas viagens ou em acontecimentos sociais”. Complementa Belzer (1974, p. 288): “Diz-se que as heteras eram sexualmente ativas”. Havia, também, as prostitutas, que trabalhavam em bordéis e eram reconhecidas socialmente. 28 De acordo com Tannahill (1983, p. 190): Havia também as concubinas, que tinham parceiros fixos, mas não gozam do prestígio das heteras nem da proteção prestada às esposas. E se um companheiro de uma concubina não a quisesse mais, poderia vendê-la para um bordel e, então, ela se tornaria uma prostituta. A homossexualidade era comum entre os gregos. As mulheres também tomavam parte em relações homoeróticas. Sussman (1976, p. 113) diz que “as mulheres homossexuais eram designadas pelo nome de tríbades, que significa ‘pessoa que se esfrega’”. A prática de pederastia, atração sexual de um adulto por um jovem imaturo que já passou da puberdade, mas ainda não é adulto, era largamente difundida entre o povo grego. Tannahill (1983, p. 194) complementa: “um menino, ao terminar seus estudos, era tomado por um adulto mais velho, geralmente na casa dos trinta anos, que se tornava seu protetor e professor, em troca teria dedicação e sexo por parte do jovem”. É importante ressaltar que o pederasta não era considerado um desviante sexual e nem a pederastia era uma atividade condenada, pelo contrário, era aceita. Sussman (1976, p. 110) explica a pederastia da época: “a pederastia era uma forma do homem chegar à perfeição física e intelectual, e a relação servia para despertar no jovem as qualidades desejáveis de seu amante”. A filosofia grega foi o início da especulação sobre a origem do ser humano e do mundo no Ocidente. Sócrates, Platão e Aristóteles foram de grande importância para o pensamento ocidental. A moral é assunto também da filosofia. O pensamento de Agostiniano teve como base o Neoplatonismo, que teve influência decisiva na forma de pensar a sexualidade no Ocidente cristão, e Aristóteles foi o grande inspirador de São Tomás de Aquino, como podemos confirmar com as palavras de 29 Gregersen (1982, p. 25): “foi considerado o pai da sexologia ocidental, foi o pensador mais influente na moral sexual, cujas idéias foram adaptadas centenas de anos depois por Avicema e São Tomás de Aquino”. Araújo (1995, p. 63) acrescenta: “São Tomás de Aquino, outra figura de vital importância para a normatização da sexualidade no Ocidente”. Através da moralização, referia-se à sexualidade somente para procriação. Desde os tempos de Platão (séc. V a. C.), a alma, dicotomizada do corpo e superior a ela, deveria controlar os desejos e paixões suscitadas por esta. Era uma moral estética, na qual o belo apreciado era ter domínio de si mesmo. Na era cristã, a sociedade romana priorizava as práticas acéticas com objetivo de reproduzir virtudes morais. O povo romano tinha uma atitude naturalista em relação ao sexo: encarava como naturais todos os comportamentos sexuais e havia uma profunda ligação entre sexo e religião. Não era reprimido o comportamento sexual pela religião e seus deuses eram intimamente ligados à sexualidade. Segundo Wood (1967, p. 42): “Da Grécia, os romanos assimilaram grande parte de seus deuses, contudo mantiveram diferenças profundas em suas convenções sociais e sexuais”. O povo romano tinha uma atitude naturalista em relação ao sexo: encarava como naturais todos os comportamento sexuais e havia uma profunda ligação entre sexo e religião. Sua religião não reprimia o comportamento sexual e seus deuses estavam intimamente ligados à sexualidade. Os romanos eram politeístas e tinham profunda fé nos poderes divinos. Uma das maiores diferenças entre gregos e romanos era que o comportamento sexual grego parecia livre de brutalidade. (SUSSMAN, 1976) 30 Os romanos tinham na arena uma de suas maiores diversões. Lá, havia atividades cruéis observados por centenas de pessoas que se excitavam com espetáculos como, por exemplo, de casais que eram forçados a ter relações sexuais na frente dos espectadores, feras violentando seres humanos etc. “Este era um esporte nacional de Roma e havia numerosos bordéis nas imediações do Coliseu, onde se desenrolavam tais espetáculos”. (SUSSMAN, 1976, p. 23) Com o passar do tempo, em Roma, a situação transforma-se um pouco. A matrona ganha espaço na vida comunitária. Aparecem legislações condicionando a procriação à posse da herança familiar. Os não-cidadãos, os sem-terra e semclasse, vivendo amontoados em casebres, sem normas rígidas de comportamento, procriando sem controle. Nesta periferia da cidade, aparece um novo culto muito bem aceito. A ausência de propriedades, a fome e a pobreza passam a ser caminhos para esperança de uma redenção futura. A ausência de prazer era uma meta. O prazer é controlado pela promoção de uma moral culposa e condenável, na qual ceder à sexualidade era perder a vida espiritual e afastar-se de si o paraíso e a civilização. (BELZER, 1974) Os cultos afirmaram-se e ganharam força com status de Estado. O prazer é confinado à produção de filhos. Controla-se a população que margeia a cidade, valoriza-se e sacramenta-se a família, órgão básica social, unidade produtora, engrenagem fundamental do Estado. O controle sofistica-se. Filósofos ensinam os comportamentos adequados, definem graus de insanidade, discretamente coniventes com o poder instituído. Os profissionais de saúde da época também pontificam os seus dogmas. O masturbar enlouquece, o prazer feminino é doentio e indecente, deflorar virgens é uma excelente forma de contrair doenças venéreas. 31 Os profissionais da saúde, anos depois, afirmaram que as mulheres e crianças eram seres inferiores, aptos ao trabalho semi-escravo. Wood (1967, p. 680) diz: A virgindade era altamente valorizada na aristocracia. O ritual do defloramento era muito importante e era dito que Virginiensis ajudava o marido a desafivelar o cinto da noiva. Subigus e Prema levavam a noiva à cama e garantiam sua submissão às exigências sexuais do marido. Pertunda vinha em ajuda ao marido, na consumação do ato sexual. Ainda Wood (1967, p. 682): “o casamento romano era uma instituição predominantemente social, o homem poderia ter atividades extraconjugais, embora não pudesse ter uma ligação fixa, mas era exigida a fidelidade da mulher”. Tannahill (1983, p. 193) compara vantagens das esposas romanas em relação às gregas: “as esposas romanas gozavam de considerável liberdade e confiança; elas acompanhavam os maridos a reuniões sociais, saíam durante o dia e tinham uma certa influência nas decisões da família, bem ao contrário das gregas”. A prostituição e a homossexualidade eram aceitas e difundidas em Roma. Havia muitos bordéis e prostitutas que não pertenciam a nenhum deles, vagueavam pelas ruas escuras da cidade. Segundo Wood (1967, p. 689), “a prostituta profissional era obrigada a se inscrever nas listas de edilidade”. Roma foi um grande império, mas este vasto império entrou em decadência e sua queda se deu no século V da era Cristã. A partir da queda do Império Romano, o Ocidente entra num período que durou cerca de mil anos e é denominado Idade Média. Daí em diante, a Igreja apoderou-se de qualquer tentativa de libertação consciente da sexualidade, reservando para si o direito da educação moral e espiritual dos homens no Ocidente. 32 2.2.2 Cristianismo: surgimento da repressão sexual O Cristianismo surgiu numa época em que as civilizações greco-romanas estavam em decadência. O pensamento judaico contribuiu para o início do Cristianismo, que se caracterizava por uma intensa repressão sexual. Seu Deus Jeová não tinha caráter sexual, nem era invocado em rituais de fertilidade. “A essência da visão judaica sobre sexualidade era uma crença de que a procriação seria a razão básica para o intercurso sexual”. (SUSSMAN, 1976, p. 129) Este dado deve ser analisado no contexto da história do povo que, enfrentando guerras e tentativas de extermínio, tem a necessidade do aumento da população. O importante é que, mesmo havendo o intuito da procriação, não ocorre a desvinculação do desejo e do prazer. Já no Cristianismo inicial se caracteriza pela repressão à sexualidade, valorizando muito a virgindade e a castidade. Porém, observa-se à luz de posições filosóficas da época judaica. Foucault (1985, p. 43) menciona: “o Cristianismo adotou um “vínculo obrigatório” da relação sexual com o casamento, onde, então, o princípio de uma fidelidade conjugal passa a ser “dever incondicional” para quem se preocupa com a própria salvação”. Ariés (1987, p. 53) faz questão de frisar que toda moral adotada pelo Cristianismo é anterior ao próprio Cristianismo. Assim, por exemplo, “a procriação tornou-se logo, na sociedade cristã, o que já era na moral dos estóicos, uma das razões de ser da sexualidade”. Já Vidal (apud Nunes, 1987, p. 14) diz: “além da orientação para procriação, a moral sexual cristã recebeu da filosofia platônica a visão dualista do homem, alma/corpo, onde o corpo é visto como inimigo da alma”. 33 Foucault (1985, p. 54) comenta: “embora sejam filosóficas as raízes da tradição judaica-cristã, são os precursores do Cristianismo que implantaram a idéia de sexo como pecado”. Grande parte dos ensinamentos evangélicos em relação à sexualidade se encontra em Paulo. A ligação entre sexo e pecado e o preconceito cristão contra a atividade sexual começaram com São Paulo. E suas idéias tiveram muita influência no pensamento de outros teólogos. Em 1 Coríntios 6: 12-20, São Paulo fala sobre a fornicação, imoralidade que homem e mulher unidos formam num só corpo, portanto se o homem se juntar a uma prostituta, maculará a carne que nem lhe pertence e sim ao Senhor. “É melhor casar-se do que abrasar-se”. (BÍBLIA, N. T., 1 Cor, 7: 9) Os casados ficaram divididos entre os deveres do lar e do Senhor, porém, de modo algum estaria pecando. Também reafirma a indissolubilidade do matrimônio, além de preservar a mulher que ficaria desamparada. Mas se a separação fosse inevitável, o casal deveria permanecer em celibato e em estado de castidade o resto da vida. “O novo casamento só era permitido em caso de morte de um dos cônjuges”. (BÍBLIA, N. T., 1 Cor, 7: 1-11; 22-28) A homossexualidade também é condenada por São Paulo, e diz que os homossexuais não herdarão o reino de Deus, pois sexo só era permitido no casamento entre homens e mulheres. (BÍBLIA, N. T., 1 Cor, 7: 1-11; 22-28) O apóstolo Paulo é o único que fala de moral sexual no Novo Testamento. Inclusive, menciona a submissão e a obediência da mulher ao marido: As mulheres sejam submissas a seus maridos, como ao Senhor, pois o marido é cabeça da mulher assim como Cristo é cabeça da Igreja, seu corpo, do qual Ele é o Salvador. E, como a Igreja está sujeita a Cristo, assim também as mulheres devem se submeter em tudo a seus maridos. (BÍBLIA, N. T., 1 Cor, 5: 22-24) 34 Observa-se com isto que a submissão da mulher é talvez o condicionamento cultural que mais resiste a mudanças. Inclusive a raiz da discriminação com a mulher e também com homossexuais, que era visto como pecado, crime, doença. A dicotomia corpo-alma não tem origem na Bíblia, mas nas formulações filosóficas gregas que estavam em voga na época. Kosnik et al. (1982) observam que no Antigo Testamento descreve-se a sexualidade como desejada por Deus, criada como algo bom, diante da qual as criaturas humanas não precisam ficar desconcertadas ou envergonhadas de qualquer modo. Os relatos de criação na Gênese não revelam qualquer sinal de desprezo pela natureza sexual humana, como se pertencesse esta a uma ordem inferior da natureza, abaixo do espiritual ou intelectual. O sexo é simplesmente um aspecto da vida humana, nem desprezada nem dominante, pois nunca é considerada realidade isolada. Ele está num contexto mais amplo, juntamente com outros aspectos da vida. Na Bíblia, o homem tem uma natureza sexuada, é claro que os estímulos sexuais provocam sensações agradáveis. Portanto, a rejeição ao prazer físico não tem origem nos textos bíblicos, mas nas interpretações calcadas no pensamento da época. Podemos dizer que foi no Cristianismo a origem da aversão ao prazer de forma geral e, por extensão, ao prazer sexual. Para Cunha (1981, p. 21), “o que São Paulo fez de pior para nossos preconceitos e tabus sexuais foi dizer que a mulher é uma tentação em potencial, desviadora das energias do homem para Deus e para a Salvação”. De acordo com Nunes (1987), Santo Agostinho (354 – 430 d. C.) foi a personalidade que mais influenciou a formação moral sexual no Ocidente. Seu pensamento, apoiado também na filosofia grega da Antigüidade e em São Paulo, 35 passou a constituir a base da filosofia e da teologia da Igreja Católica. Influenciou toda a teologia moral. Pregava que a perfeição do ser humano não seria possível com a prática sexual. Agostinho se converteu, mas não foi apenas no plano religioso. Após importantes transformações em sua vida, converteu-se e formulou uma moral sexual que implicou a repressão à sexualidade, propondo que, mesmo no casamento, a relação sexual deveria se dar sem prazer, atendendo apenas ao objetivo da procriação. Segundo Araújo (1995), Agostinho deixou inúmeras obras nas quais expõe sua teologia moral e a moral sexual, mas, talvez, a mais contundente no sentido de compreender-se a sua luta contra a sexualidade sejam as “confissões”, nas quais entende-se que, para se converter, teve que sublimar sua energia sexual. As interpretações de suas obras e vivências referentes a Santo Agostinho não levaram em consideração o contexto histórico, social e pessoal na qual foram escritas e acabou por referendar seus posicionamentos teóricos sem levar em consideração seu contexto. Isto resultou numa visão da sexualidade distanciada da Bíblia, sendo considerada fonte de pecado e não como constituinte da natureza humana. Cunha (1981, p. 21) salienta que Santo Agostinho viveu intensamente a vida sexual até seus 33 anos (...) “e resolveu seu conflito entre a carne e o espírito pela rejeição total da vida carnal (...), que a Igreja passou a ver a relação sexual como permitida apenas entre marido e mulher para a procriação somente, jamais para o prazer”. Ensinou que toda relação sexual era antiespiritual e vergonhosa, mesmo no casamento. De acordo com a citação, aprende-se que a doutrina sexual cristã, com 36 sua rigidez moral, foi se consolidando mediante um lento processo de fusão de idéias, de escritos religiosos, com idéias da filosofia. Segundo Cunha (1981, p. 22), São Paulo, Santo Agostinho e São Tomás de Aquino viam o homem como muito superior à mulher e pareciam ter um medo imenso da paixão e do amor carnal. Suas idéias, bem como as de alguns outros Santos Padres da época, tornavam-se instrumentos usados pela Igreja Católica Apostólica Romana, para o controle político e comportamental das pessoas. No século IV, o imperador Constantino se aliou aos cristãos. A decisão dele não foi apenas religiosa, mas política também. A religião cristã se apresentou como uma esperança para a unificação do Império Romano. E cada vez tinha mais novos adeptos. Isto implicará em uma influência muito grande da Igreja nos assuntos seculares, pois passou a ser detentora de um poder até então jamais possuído por nenhuma religião. 2.2.3 Idade Média: intensificação da repressão sexual Período que vai da queda do Império Romano (476) até a tomada de Constantinopla (1453), é denominado Idade Média. A Igreja tem total domínio da sociedade em uma fase que dura um milênio. Nesta época, segundo Tannahill (1983), a Igreja elaborou ensinamentos anti-sexuais rígidos e se encarregou de difundi-los. A crença básica em relação ao sexo era que o prazer sexual é condenável e há regras para manter-se longe do pecado. O sexo, nesta época, era desvalorizado, só sendo permitido no casamento, para servir à procriação. O sexo prazeroso é rejeitado e se torna pecado. O celibato é exaltado como uma virtude desejada, um ideal da pureza que só os fortes 37 conseguem vencer a tentação da carne. Mudam as atitudes em relação ao sexo para medo e culpa. Belzer (1974, p. 35) diz: “a mulher ocupava uma posição medíocre na sociedade medieval, não tendo nem existência legal”. A mulher saía do domínio do pai e passava para do marido. A esposa servia para gerar filhos e cuidar deles, a amante para satisfazer a luxúria. A nobreza tinha liberdade de usar e até violentar impunemente as mulheres de classes mais baixas. Sussman (1976) diz que as atitudes em relação ao amor e ao sexo começaram a mudar no final do obscurantismo. Busca-se o amor puro, que excluía totalmente o amor sexual. Surgiu o amor cortesão, um novo ideal, filosofia e sentimentos sobre a relação homem/mulher. Portanto, no final do século VII, começaram a cultivar este ideal, separando a paixão da relação sexual, sendo que o amor era um sentimento que não se podia realizar no casamento. Houve a crença de que o homem que amasse ardentemente sua mulher seria um adúltero. O amor verdadeiro, apaixonado, se distinguindo do amor falso por incluir apenas beijos e carícias na relação dos amantes enquanto que um incluiria o outro. Segundo Tannahill (1983, p. 288), “no início do século XIV, surge outro fenômeno medieval, que é o medo da bruxaria. Em 1348, surgiu a peste bubônica, que matou um terço ou metade da população na Europa”. Outras epidemias eclodiram em 1362 e 1374, mas com menos intensidade. A igreja via-se questionada e surgiram controvérsias em relação ao seu poder. No final do século XIV e início do século XV, surge o medo de demônios e de criaturas sobrenaturais que pudessem causar o mal. “As mulheres eram acusadas de injustiçarem os homens. Qualquer coisa que não tivesse explicação 38 seria considerado bruxaria. As mulheres e os doentes mentais foram os grandes perseguidos, condenados à morte e à tortura”. (SUSSMAN, 1976, p. 33) O mundo começava a sair da Idade Média, que se caracterizou por uma repressão ao livre desenvolvimento intelectual e artístico do ser humano. 2.2.4 Renascimento: entre a repressão e a liberação sexual Na história sexual da humanidade, pode-se assinalar duas polaridades distintas: períodos de repressão sexual e períodos de extrema liberdade sexual. Distinguem-se, claramente, visões culturais diferentes e antagônicas. E que as circunstâncias políticas, sociais e religiosas influenciam as atitudes sexuais. No século XV, surgiu um movimento em Florença, espalhando-se para outras partes da Itália e depois para o resto da Europa, denominado Renascença ou Renascimento. De acordo com Sussman (1976, p. 37): As pessoas passaram a pensar em si mesmas como indivíduos e a aceitar como naturais seus desejos, percepções e impulsos. Houve uma abertura maior na arte, literatura e vida cotidiana, criando uma nova realidade social: o sexo poderia ser abertamente possuído, idealizado e desfrutado. A mudança dos ideais medievais para os renascentistas foi gradual e não abrupta. O declínio da espiritualidade, que caracterizou os séculos XIV, XV e XVI, esteve ligado à baixa reputação espiritual da Igreja, chegando ao clímax com os papas Alexandre VI (1492-1503), que era pai de cinco filhos ilegítimos. “Roma vivia novamente uma fase de extrema liberdade sexual, inclusive havia bordéis funcionando com autorização da Igreja”. (SUSSMAN, 1976, p. 38) 39 Durante a Renascença, pela primeira vez desde a Antigüidade, as prostitutas puderam trabalhar em suas próprias casas. Segundo Sussman (1976), em Roma e Veneza elas eram chamadas de “cortesãs honestas” e eram membros respeitáveis da sociedade. De acordo com Sussman (1976, p. 142): Em 1494, cerca de dois anos após a volta de Colombo do Novo Mundo, houve uma epidemia de sífilis na Europa e, desta época em diante, a doença cuja transmissão se dá pelo contato sexual, tornou-se um flagelo para a humanidade, deixando entrever a permissividade da época. Conforme já visto anteriormente, a sífilis foi considerada um castigo de Deus para punir a promiscuidade e teve como conseqüência uma isenção à prostituição. O Renascimento eclodiu após séculos de trevas da Idade Média como uma forma livre de expressão, principalmente na arte, que retratou a permissividade sexual vivida pelos seus artistas. As modelos posavam nuas para os pintores ou escultores. A arte renascentista explodiu com tamanha força que se tornou imortal. Sussman (1976, p. 48) diz que: Cellini, Rafael, Leonardo da Vinci, Felipo Lippi e Michelangelo foram alguns dos pintores que deixaram um acervo artístico inigualável. O artista foi o grande herói do Renascimento. Ele deu expressão visual ao ideal e ao espírito de sua época. Através da biografia dos artistas renascentistas mais famosos, constatou-se que vários deles eram filhos ilegítimos e que suas vidas foram pautadas por uma grande liberdade sexual. Nesta época, surge o Humanismo e a razão e a Igreja Católica vivia uma fase de permissividade, mas mantinha seu ponto de vista sobre o celibato para os padres e freiras, e também sobre a indissolubilidade do casamento. Porém, era comum os padres manterem concubinas e terem filhos ilegítimos. 40 Ainda Sussman (1976, p. 50): Quando da construção da Igreja de São Pedro foram vendidas indulgências para a remissão dos pecados. Martinho Lutero, padre católico, se insurgiu contra isto e liderou a Reforma Protestante, separando-se da Igreja Católica e não aceitando as doutrinas referentes à indissolubilidade do casamento, ao celibato dos padres, à virgindade. Ele reconhecia o impulso sexual e aqueles que não pudessem viver em castidade deveriam se casar, sem prejuízo dos seus deveres religiosos. Deu-se início, então, na Europa, o movimento da Reforma. Martinho Lutero, um monge agostiniano do século XVI que, além de visar disciplinar e moralizar todo o clero, queria também, como o próprio nome do movimento aponta, reformar toda a doutrina cristã. Contou com a ajuda de Calvino. Num momento posterior, as teorias da Reforma acabaram por culminar no sistema teológico denominado Calvinismo. Dentre o amplo conjunto de atitudes revolucionárias de Lutero, citam-se: a negação da autoridade espiritual dos padres e da infalibilidade do Papa e a defesa da abolição do celibato eclesiástico, bem como a defesa e a valorização do matrimônio. Esse movimento foi significativo, pois dele originaram-se numerosas seitas protestantes, as quais a Igreja Católica reagiu com a Contra-Reforma. O movimento de Contra-Reforma, que emergiu do Concílio de Trento (concluído em 1563) e envolveu os séculos XVI e XVII, deu origem à moral tridentina, na qual a sexualidade popular passa a ter ligação direta com a noção de condenação ao inferno, apresentando, de acordo com Nunes (1987, p. 63): “como lugar dos pecadores e fornicadores, prostitutas e invertidos”. Araújo (1995) relata que foi elaborado um catecismo com toda a doutrina católica conhecido como catecismo romano do Concílio de Trento. A moral tridentina foi adotada por toda a Igreja até os dias atuais. Só recentemente foi elaborado um 41 novo catecismo, o qual contém as mesmas posições contra-reformistas em relação à sexualidade. Tanto a Reforma como a Contra-Reforma foram portadores de pedagogia e moral bastante negativas, austeras e castradoras, e o sexo permanecia reduzido à procriação. E isto foi ao encontro das necessidades do mundo capitalista, onde é preciso reprimir o sexo para que a energia libidinosa seja direcionada para o trabalho. 2.2.5 Século XVI ao século XIX: sexualidade associada à procriação Toda a liberdade do Renascimento se prolongou pelos séculos XVI e XVII marcando a transição da sociedade medieval para a moderna. A partir do século XVI a sociedade européia passou por um processo de aburguesamento. Foi um processo lento e profundo, havendo mudanças de valores sociais e morais. A nobreza deixou de ser um grupo dominante e passou a ser alvo de crítica por seu comportamento libertino. Houve desenvolvimento intelectual nos séculos XVII e XVIII, que ressaltava a Razão, sendo o movimento do século XVIII denominado Iluminismo. De acordo com Sussman (1976), as contribuições científicas de homens como Descartes, Galileu, Kepler, Newton, Boyle e Hooke influenciaram a redefinição de muitas idéias existentes de assuntos humanos, incluindo a sexualidade com o impacto de suas descobertas. À medida que as cidades foram crescendo, estabeleceu-se uma maior diferenciação no grupo de trabalho. O homem também podia sobreviver praticamente sozinho no campo, junto com seu grupo familiar. 42 Van Ussel (1980, p. 53) diz: “quanto mais complexo se torna uma civilização, mais numerosa podem ser as inovações, e isto num lapso de tempo mais breve. Uma maior diferenciação significa uma divisão de trabalho num maior número de funções”. A partir do século XV, começa a mudar o sentimento de família. Isto acontece de uma forma lenta e profunda. Ariés (1981, p. 232) cita: Essa educação correspondeu a uma necessidade nova de rigor moral da parte dos educadores, a uma preocupação de isolar a juventude do mundo sujo dos adultos para mantê-la na inocência primitiva, a um desejo de treiná-la para melhor resistir às tentações dos adultos. Mas ela correspondeu também a uma preocupação dos pais de vigiar seus filhos mais de perto, de ficar mais perto deles e não abandoná-los mais, mesmo temporariamente, aos cuidados de uma outra família. A substituição da aprendizagem pela escola exprime também uma aproximação da família e das crianças dos sentimentos da infância, outrora separados. A família concentrou-se em torno da criança. (...) O clima sentimental era completamente diferente, mais próximo do nosso, como se a família moderna tivesse nascido ao mesmo tempo em que a escola, ou, ao menos hábito geral de educar as crianças na escola. No início, a escolaridade era apenas para os meninos. As meninas continuavam em casa, sendo educadas em casa de parentes ou vizinhos. Outra mudança, na segunda metade do século XVII foi a primogenitura. Portanto, a herança deveria ser dividida igualmente entre todos os filhos, tendo cada um os mesmo direitos. Ariés (1981, p. 236) diz que “o sentimento de igualdade entre os irmãos pode desenvolver-se num novo clima afetivo e moral, graças a uma intimidade maior entre pais e filhos”. Van Ussel menciona em seu livro (1980) que, por volta do século XVIII, houve um aumento da masturbação que é uma atividade sexual solitária. 43 Van Ussel (1980) relaciona o processo de dessociabilização a muitos fenômenos sexuais, a exemplo da masturbação, como sendo resultado das mudanças sociais ocorridas pelo aburguesamento da sociedade. Por se tornar mais complexa socialmente, acabou gerando contatos cada vez mais superficiais entre seus membros e, com isto, há um crescente afastamento de si e dos outros. Em relação ao corpo, também houve mudanças. Passa-se a esconder o próprio corpo debaixo de tecidos superpostos e também passam a dissimular seu odor com desodorantes. A partir deste momento, passa-se a ter maior regulação da vida afetiva mediante o autocontrole. “O burguês se caracterizou pelo grande domínio que deveria ter de si, quem conseguir se dominar poderá trabalhar melhor e adaptar-se mais facilmente à sociedade”. (VAN USSEL, 1980, p. 56) Suas emoções deveriam ser contidas e isto se manifestou também no plano sexual. Van Ussel (1980, p. 56) diz que “o prazer pelo prazer era um pecado. O corpo foi transformado, de órgãos de prazer que eram, em órgão de realização, tornando impossível a experiência voluptuosa do sexo e de Eros”. A partir deste sentimento de pecado, o homem passou a se autojulgar. A auto-imposição tem conseqüências mais vantajosas que desvantajosas, pois nos dá a segurança de podermos agir com mais liberdade, sem temer a explosão de emoções. Segundo Van Ussel (1980, p. 59): Uma grande liberdade sexual só é possível quando há certeza de se estar protegido contra o choque da violência física. (...) Uma liberdade exige arranjos inconscientes, uma imposição interior, invisível. A co-educação, a “liberdade” da linguagem, o biquíni, o strip-tease, o dançar abraçado pressupõe a certeza de que os outros pensam segundo as mesmas normas, em suma, que estão em condições de conter e transformar as emoções. 44 É uma outra transformação profunda no sentimento de infância, graças a um novo contexto socioeconômico. Com isto, os pais passaram a mandar os filhos à escola, mas mantendo sob sua responsabilidade. Ariés (1981, p. 245) define civilidade nos séculos XVI e XVII “como a soma dos conhecimentos práticos necessários para se viver em sociedade”. Um dos ideais do século XVII era a ambição. Essa preocupação com a ascensão era cultivada como um valor. Também era um ideal a ser cultivado desde criança para desejar chegar a um nível cada vez mais alto da sociedade para alcançar status social. O processo de modernização provocou uma maior intimização das emoções, o sexo passou ao domínio privado da existência. Gradativamente, as casas se transformaram. Passou a haver muros que separavam a casa da rua, as portas passaram a ser fechadas e se alguém quisesse entrar, teria que se anunciar. No século XVII, a progressiva intimização se manifestou também nas construções e imobiliário. A casa ganhou quartos, camas fixas e passaram a ser construídas salas de refeições e de estar. Van Ussel (1980, p. 58) comenta: “progressivamente a família se isola em sua intimidade”. A partir daí, tem-se a casa moderna, com os cômodos independentes, abrindo-se para um corredor. De acordo com as palavras de Ariés (1981, p. 265), “o conforto desta época: ele nasceu ao mesmo tempo que a intimidade, a discrição e o isolamento, e foi uma das manifestações desses fenômenos”. Van Ussel (1980, p. 60) diz que “a interiorização conduz a uma tensão interior. A repressão à sexualidade determina uma série de regras de boa educação 45 e, mais tarde, preceitos morais que preconizavam um respeito mútuo constante, a fim de não aumentar as tensões latentes”. A partir do século XVIII, os jovens foram educados de forma a dirigir sua atenção para os estudos para canalizar a energia sexual reprimida. Nos colégios eram evitadas todas as situações que propiciassem contato de natureza sexual entre os jovens. Combate-se a masturbação, de forma que até os dormitórios eram vigiados e as roupas confeccionadas para dificultar a masturbação. Toda esta repressão sexual provocou uma sexualização de estímulos que até então eram neutros. Aparece então uma erotização maior, fruto da modernização. O século XVIII é realmente o grande marco na mudança de atitude em relação ao sexo. Van Ussel (1980, p. 68) diz: “Laço entre a sexualidade e prazer não só foi omitido em toda a informação sexual do século XVIII até meados do século XX como mesmo nos livros para adultos ocupava um lugar cada vez menor”. A sexualidade foi associada à procriação, como conseqüência foi rejeitada toda atividade destinada apenas ao prazer, inclusive a atividade pré-conjugal. O sexo era aceito dentro do casamento, mas associado à concepção. O interesse pela sexualidade tende a ser considerado indecente, associado à imoralidade. O ideal da esposa vitoriana era a mulher frígida, que despreza o sexo. No final do século XVIII, os educadores ainda aceitavam a expressão do instinto sexual, mas no início do século XIX este passou a ser considerado concepção moral. Pouco a pouco, a sexualidade deixou de ser integrada à vida. Havia fortes tabus, o indivíduo era obrigado a renegar a sua sexualidade. Sussman (1976, p. 59) comenta: “Apareceu então a hipocrisia e o duplo padrão moral era comum”. Relata que, na Inglaterra, foi uma época em que floresceram bordéis e houve um aumento da prostituição. 46 Thomas R. Malthus formula uma teoria que depois seria denominada malthusianismo, em que postula que os meios de subsistência crescem em progressão aritmética e a população cresce em progressão geométrica. Sussman (1976, p. 63): “era preciso que se limitasse a natalidade. A solução proposta por Malthus era que as pessoas se casassem mais tarde, em torno dos 30 anos, para que tivessem menos filhos. Até então, deveriam se manter em total abstinência sexual”. Mas essa preocupação com o controle da natalidade existe ainda hoje, por conta do medo de uma explosão demográfica, pois com a modernização da sociedade, as condições de vida melhoraram e a mortalidade infantil diminuiu muito e o índice de longevidade aumentou. 2.2.6 Século XX – modernização da vida sexual Foi ao adentrar no século XX que o poder médico voltou-se para a tarefa de higienizar a classe proletária, tendo em vista a percepção pelos médicos, da degradação física e moral que vinha marcando essa classe. Segundo Figueiró (2001, p. 55), “predominava, nessa época, uma forte preocupação da classe médica quanto à sujeira e contaminação, os trabalhadores, por sua vez, eram percebidos como carentes de higiene pessoal “. Segundo nos mostra o trabalho elaborado por Rego (1985, p. 12): Indícios de uma anormalidade social, as práticas populares de vida e lazer dos trabalhadores fabris, dos improdutivos, dos pobres, das mulheres públicas, das crianças que vagueiam abandonadas nas ruas vão se tornando objeto de profunda preocupação de médicos-higienistas, de autoridades públicas, de setores da burguesia industrial, de filantropos e reformadores sociais, nas décadas iniciais do século XX. 47 De acordo com Van Ussel (1980), inicia-se, assim, na entrada do século XX, um novo período, em que a medicina passa a estar em condições de poder contribuir mais positivamente para a vivência da sexualidade. Portanto, nesse início de século, a visão de sexologia era ainda muito influenciada pela medicina. Procurava-se sanear as doenças venéreas e diminuir a prostituição. Lutavase por melhores condições socioeconômicas, mas a visão da problemática sexual ainda era individual e não social. Os primeiros estudos em sexologia aparecem na Europa Central, e em países anglo-saxões. Estes estudos eram, sobretudo, biológicos, e a problemática era abordada por médicos. Foi necessário que surgisse Sigmund Freud, no apagar das luzes do século XIX, para que mudassem o modo de pensar sobre a sexualidade durante toda a duração da vida humana. A obra de Freud foi de grande impacto pela formulação da noção de motivação inconsciente. Em 1905, publicou “Três ensaios sobre sexualidade”, introduzindo a teoria da libido que postula a sexualidade infantil. Grande parte da mudança de enfoque sobre a sexualidade que hoje vivenciamos é devido à divulgação das idéias de Freud, que pela primeira vez afirmou a existência da sexualidade na infância, correlacionando-a com as fases de desenvolvimento da criança. É claro que as considerações de Freud foram muito contestadas na época em que a sociedade ainda relacionava a criança à inocência, pureza e com ausência de sexualidade. Freud ainda ousou declarar que todos praticavam o sexo e que estava inserido na natureza humana desde o nascimento e tratando a questão não como um “pecado”. 48 Houve também influência da Antropologia e Etnologia. Havia alcançado grande progresso também os meios de comunicação. A ciência avançava rapidamente. Nessa época, já havia rádio, telefone, cinema, automóvel, avião, entre outros. Isto contribuiu para que a sociedade modificasse. No século XX, a mulher passou a reivindicar um lugar para si na sociedade, não queria ser mais a sombra do marido ou até mesmo precisar se casar para obtenção de status de adulta. Passou a lutar pelo direito de votar. Tannahill (1983, p. 299) comenta: “a luta pelo direito de voto foi uma as principais reivindicações empreendidas pelas mulheres no início do século”. O cinema criou ídolos e ideais de mulheres, influenciando em grande parte os costumes. A nova mulher passou a usar saias curtas, cabelos curtos etc. Kinsey et al. (1954, p. 30) dizem: “observem que há nítida diferença de comportamento sexual entre as mulheres nascidas antes de 1900 e as que nasceram após, atribuindo esta mudança de hábitos às condições sociais enfrentadas pelas últimas”. Na segunda década do século XX, temos que citar as importantes publicações de Van de Velde, entre as quais, um livro no qual discutia o casamento e técnicas de relações sexuais, tais como posições sexuais, sexo oral e outros. Segundo Gregersen (1993, p. 51) relata: Em 1928, Forel, Ellis e Herschfield fundaram a associação mundial para a reforma sexual. E em 1929, Malinowsky publicou uma importante obra sobre a vida sexual dos habitantes das ilhas Trobiand, na qual analisa o namoro, o casamento, as relações de família com os respectivos sistemas de crenças e valores dos trobianenses. Esta obra foi importantíssima para os estudos da sexualidade humana. 49 Van Ussel (1980, p. 228) comenta: “os movimentos libertadores da sexualidade ainda eram restritos a uma pequena elite, não atingiam as classes menos favorecidas, nem havia esta preocupação”. Porém, o maior progresso e as mudanças de costumes significativos aconteceram após a Segunda Guerra Mundial. O mundo teria de passar pela reconstrução da Europa e do Japão, arrasado pela bomba atômica. Surgiu a televisão nesta época, portanto, os meios de comunicação entre os povos se tornaram mais rápidos. Ao mesmo tempo em que passou a retratar a guerra, começaram a propagar o ideal romântico. O jovem tornou-se mais livre de influência paterna. Em 1948, os estudos de Kinsey e seus colaboradores sobre sexualidade humana relataram sobre o comportamento sexual do homem americano. E em 1953, esse autor publicou os dados referentes ao comportamento sexual da mulher. Estes relatórios de Kinsey serviram para responder muitas questões sexuais até então não respondidas, tornando-se um referencial objetivo do comportamento sexual humano em torno da metade do século XX. Na década de 1940 e 1950, vêm os ideais dos movimentos feministas mais radicais e extremistas questionando casamento, virgindade, aborto, enfim, questionando tudo sobre a mulher. Em 1956, Gregory Pincus e seus colaboradores desenvolveram o primeiro contraceptivo oral eficaz, a chamada pílula anticoncepcional. Passou a ser comercializada na década de 1960 e, com sua eficácia comprovada, foi possível desvincular o sexo da procriação. Nessa mesma década, com o advento da chamada Revolução de Costumes, as declarações de Freud foram ainda mais valorizadas. 50 Segundo Vitiello (2000, p. 33), Nessa época, os questionamentos sobre o valor da repressão sexual e o reconhecimento do sexo como matéria de estudo, conduziram à noção de ser a vida sexuada um direito e não um pecado, levando a sociedade à busca do entendimento de sua própria sexualidade. Durante essa busca, foi encontrada uma infância que, embora sexualizada, estava exposta à acentuada repressão. Gregersen (1983, p. 167): Entre as feministas, a mais conhecida foi Belty Friedan, que fez conferências pelo mundo, escreveu livro divulgando suas idéias da mulher impor-se como força de trabalho necessária para a subsistência da família. Com influências como esta e outras, apareceu uma nova situação, a de divisão de poder com o marido. Criou-se uma nova estrutura familiar que deixou de ser patriarcal para se tornar democrática em um grande número de famílias. Com todas essas influências, houve uma mudança de crenças e atitudes em relação à sexualidade, como a luta pelos direitos da mulher pela sua liberdade sexual, igualdade de direitos sociais, profissionais e sexuais, levando a um questionamento dos valores. Porém, as mudanças não ocorreram na mesma época nas diferentes camadas sociais e em diferentes sociedades. Uma outra contribuição importante ocorreu em 1966, com Masters e Johnson, que publicaram o livro Resposta Sexual Humana, no qual eles e sua equipe pesquisaram o ciclo da resposta sexual humana, com todas as variações anátomo-fisiológicas. Esse trabalho foi reconhecido pelo rigor científico. O segundo trabalho destes pesquisadores foi na década de 1970, um segundo livro intitulado Inadequações sexuais, que propõem uma terapia focal para pessoas com problemas sexuais que passou a se chamar disfunção sexual, baseado em princípios comportamentais. Após esses trabalhos, surgiram inúmeros pesquisadores que 51 enfocavam as disfunções sexuais e seu tratamento, dentre eles, destaca-se Hellen Kaplan em 1977. Em 1978, nasceu o primeiro bebê de proveta, que teve repercussão mundial, provocando inúmeras discussões éticas e religiosas. Araújo (1985, p. 03) comenta: “uma mulher já poderia ter seu óvulo fecundado fora do corpo e depois, então, implantado no útero para se desenvolver normalmente como qualquer bebê”. A partir da década de 1970, jornais, programas de TV e revistas passaram a fazer reportagens sobre gestação e parto. O nu passa a ser permitido no cinema e nas revistas. Debates sobre sexo são veiculados pelos meios de comunicação. As feministas ganharam a luta pelo aborto em muitos países, embora sob forte pressão da Igreja Católica. Estes movimentos para emancipação começam pela elite cultural, depois é que se estendem às demais classes. Mas a emancipação sexual ainda não era um fato mundial na década de 1970. Pelo contrário, as distorções ainda eram enormes na sociedade referente à sexualidade. A década de 1980 foi marcada pelo surgimento da AIDS, doença que pode ser sexualmente transmissível, trouxe para ambos os sexos uma nova consciência sobre as conseqüências do exercício da sexualidade. Essa doença foi superestimada e usada como fator de repressão por estruturas sociais mais conservadoras, levando à possibilidade de discussão mais aberta sobre sexo, passando o sexo então a ter uma associação à morte. O exercício da sexualidade passa a ser afetada para a maioria das pessoas, sendo comum o uso do termo promiscuidade sexual e à prática inconseqüente do sexo como sendo estes os responsáveis pela propagação da AIDS.A partir da década de 1980, os governos se mobilizaram para o combate à doença, mas, acima de tudo, ficou provado que é com diálogo aberto que se pode combatê-la. Mais uma vez se constatou a 52 necessidade da Educação Sexual, mas não apenas enfocando a procriação e as DSTs, mas principalmente, o sexo como um dos constituintes da vida do homem. Sayão (1997, p. 73) cita: Nesta década, muitas escolas abriram espaço para a discussão da sexualidade através de palestras, encontros, debates a cargo de médicos e psicólogos pela abordagem dos conteúdos relativos à reprodução humana nas disciplinas de Ciências e Biologia. Esses espaços tiveram como principais motivações as questões vinculadas à AIDS/DSTs, gravidez indesejada ou inesperada na adolescência. Cabral (1995, p. 13) diz: Percebe-se que a AIDS (re) colocou a educação sexual na escola. A sexualidade humana constitui um dos temas amplamente investigados nos últimos 30 anos, por causa de sua importância para os diversos campos da ciência. Mas, recentemente, esta investigação tem se voltado para a educação, uma vez que a humanidade contemporânea se vê estarrecida diante de uma ameaça chamada AIDS. Ao longo da década de 1990, inúmeros projetos de Educação Sexual foram implantados em muitas escolas de vários países, inclusive Brasil. A escola buscou mostrar que não há um silêncio por parte da escola em relação à sexualidade. Passou a poder falar de sexualidade das crianças, mas ainda dentro de regras que controlam e legitimam o discurso autorizado como biológico, o de famíliareprodução, da criança inocente-assexuada e o pedagógico. Iniciou a modernização da vida sexual, que ocorreu no sentido de racionalização da sexualidade que caracteriza, então, uma nova etapa da influência da Medicina na vivência da sexualidade das pessoas. A Medicina passa, então, a estar em condições de contribuir para o conhecimento da sexualidade. 53 Segundo Figueiró (2001, p. 60), “apesar dessas aberturas e avanços, as idéias antes veiculadas pela Higiene (século XIX e início de XX) não foram eliminadas de todo, sendo ainda possível encontrar resquícios das mesmas”. A racionalização da sexualidade segue atingindo, como mostra Parker (1991, p. 139): “pessoas da elite e da classe média emergente, que têm acesso a cultura. Pessoas das classes populares, em sua maioria, estariam ainda mais influenciadas pela abordagem religiosa”. Van Ussel (1980, p. 230) faz a seguinte reflexão: Não concebo às igrejas influência na atitude anti-sexual e sim aceito o fato de que elas favoreceram a revolução cultural que possibilitou todas as mudanças sociais e psicológicas que resultaram na modernização da sociedade. Portanto, não se pode explicar só por influências religiosas as mudanças culturais ocorridas no mundo ocidental, pois em diferentes seitas religiosas, as pessoas apresentam praticamente os mesmos comportamentos. O protestante alemão do século XIX agia da mesma forma que o católico francês da mesma época. O que se pode argumentar é que um conjunto de fatores culturais, religiosos, econômicos, sociais, biológicos e psicológicos determina a atitude que o indivíduo tem perante a sua sexualidade. Então, para analisar a atitude e o comportamento sexual é preciso que se entenda o anacronismo. É necessário compreender o momento histórico, assim como todas as influências que o determinaram. De acordo com a análise dos diferentes momentos históricos, o ser humano estará sempre acompanhando todas as transformações históricas. Portanto, podemos concluir que os estudos sobre sexualidade humana devem estar em sintonia com o momento histórico. Hoje, tem-se a coragem de admitir o prazer no sexo como sendo um direito e não associando à culpa, pecado etc. Procura-se resgatar a vivência da sexualidade como sendo algo inerente ao ser humano, um aspecto de sua existência. Ver o sexo simplesmente como forma de reprodução dá 54 uma idéia incompleta da sexualidade e não satisfaz o ser humano, porque ele é tanto um quanto outro. Figueiró (2001, p. 88) afirma que “a humanidade deu um grande salto ao separar os prazeres do sexo e de seu propósito biológico meramente reprodutivo”. O ser humano é a única forma de vida deste planeta, até então descoberto, capaz de fazer semelhante arranjo, somente com a visão de sexo como uma comunicação amorosa, como diversão e prazer. Se lançarmos um olhar crítico sobre cada momento histórico, podemos reconhecer as abordagens de Educação Sexual. Ao longo deste capítulo, dialogamos com as abordagens religiosas como a católica e a protestante, assim como as abordagens médica, pedagógica e política ou emancipatória. E as respectivas concepções filosóficas, pedagógicas e metodológicas que sustentam as abordagens e que as originou. O reconhecimento da influência destas quatro abordagens nos dá sustentação necessária para compreender como cada uma delas influenciou a Educação Sexual no Brasil e emergiu ao longo da história do país. Perpassando por todas elas é que se pode compreender porque se adere efetivamente, neste trabalho, ao posicionamento teórico da abordagem Emancipatória da Educação Sexual. Posicionamento este descrito por Goldberg (1988) como Educação Sexual na dimensão política ou emancipatória. É importante esclarecer que o termo política é usado no sentido de engajamento com a transformação social. As idéias e reflexões sobre a abordagem política ou emancipatória feita por Goldberg (1988) são bastante apropriadas e de grande valia para que a Educação Sexual seja cada vez mais comprometida com a transformação social. 55 3 SEXO x CONCEPÇÕES DA SEXUALIDADE x EDUCAÇÃO SEXUAL 3.1 AS INFLUÊNCIAS DAS CONCEPÇÕES DA EDUCAÇÃO SEXUAL NO BRASIL A PARTIR DO SÉCULO XX Revendo a história da Educação Sexual no Brasil, verificamos que a Educação Sexual no século XIX foi marcada pelas influências médico-higienistas, mas ao final do século XX, a discussão da Educação Sexual nas escolas parece estar em destaque a partir dos problemas e das questões suscitadas pela AIDS, um dispositivo que vem atuando para controlar e regular a população. Políticos, médicos (as), educadores (as), psicólogos (as), feministas e outros começaram a mostrar interesse pela Educação Sexual. 3.1.1 Concepção médica da Educação Sexual Juntamente com o processo de urbanização e modernização, começaram a emergir várias transformações sociais como: - Impessoalidade nas relações entre pessoas; - Retrocesso da autoridade religiosa; - Retrocesso do significado da família na sua forma de estruturação; - Avanço no combate à autoridade patriarcal e início dos processos de modificações de papéis e do status da mulher. Não se pode deixar de fora a influência de ideais liberais advindas da Europa e dos Estados Unidos, neste contexto histórico que iniciou a modernização da vida sexual no século XX. 56 - Racionalização da sexualidade. O sexo passou a ser discutido publicamente, as informações pautadas em estudos científicos começaram a ser valorizadas em contraposição às superstições e à ignorância. Neste momento, abriu espaço para discussão sobre a repressão à masturbação, o teste de virgindade, o aborto, bem como sobre as várias práticas sexuais. Parker (1991, p. 141) comenta: Práticas sexuais como masturbação são reintegradas como a expressão do tema sexualidade completamente normal, parte de um ciclo, complexo de desenvolvimento psicossexual e um meio fundamentalmente saudável para descarregar o excesso de energia sexual. Aquilo que era considerado pela própria Medicina como “conduta desviante”, que incluía a prática da masturbação, dando uma noção de doença, passou a obter mudanças. Complementa Parker (1991, p. 141): “Se existe doença, não é encontrada no próprio sexo, mas no sentimento de culpa e vergonha que os indivíduos têm de enfrentar, em face de preconceitos e proibições antiquadas”. Uma nova etapa de influência da Medicina começa a ocorrer na leitura de vivência da sexualidade das pessoas. Não só no que se refere à prática da masturbação passou por uma reviravolta, assim como na ênfase dada à procriação que, por muito tempo, era considerada como um dever para com a pátria, passou a ser dada a ênfase à “escolha pessoal”, na qual o indivíduo passa a assumir um controle sobre o seu próprio corpo e sobre a escolha da concepção. Mas, segundo Werebe (1998, p. 97): Outros discursos, como por exemplo da Neomalthusianos: foram recriados para continuar exercendo o controle desse direito humano. Neomalthusianos, doutrina do economista Malthus (1766-1834), que defendeu a restrição da reprodução da espécie humana por motivos de ordem econômica. Malthus preconizava a limitação de nascimentos por meio de castidade e do retardo da idade do casamento, mas não admitia a contracepção. 57 Apesar de ter iniciado um novo período, na entrada do século XX, em que a Medicina passa a ter uma contribuição mais positiva para a vivência de sexualidade, mas as idéias do século XIX e início do século XX, vinculadas à higiene, não foram eliminadas de todo. Com isso, mesmo no final do século XX, ainda permanece a noção de doença para explicar algumas condutas sexuais, sendo possível encontrar resquícios das mesmas até na atualidade. Segundo Parker (1991, p. 135), “A racionalização da sexualidade segue atingindo pessoas da elite e da classe média emergente, que têm acesso à cultura. Pessoas das classes populares, em sua maioria, estariam sendo mais influenciadas pela abordagem religiosa”. Outro fato muito importante para a contribuição do processo de modernização da vida sexual e, conseqüentemente, para avanços na Educação Sexual, foi o surgimento das variadas disciplinas como a Psicologia, a Sociologia e até a Sexologia. É claro que muitas contradições também surgiram, juntamente com as desta área, em relação a tentativas de definir formas de expressão sexual. Chauí (1985, p. 182) esclarece: A ciência sexual nascida no final do século XVIII e desenvolvida durante o século XIX e XX, é, na verdade, um conjunto de disciplinas e técnicas relativas ao comportamento sexual: pedagogia, medicina, direito, economia, demografia, psiquiatria e psicanálise seriam seus principais componentes. Autores como Chauí (1985), Costa (1983) e Foucault (1988) manifestaram a preocupação sobre a atuação dessas disciplinas, no sentido em que elas possam ainda estar comprometidas politicamente com interesses do Estado, mesmo que muitos especialistas façam-no sem perceber. Pode-se dizer que a Abordagem médica de Educação Sexual, seu ponto fundamental, é o fornecimento, para a clientela, de informações relacionadas à 58 biologia do sexo e ao uso adequado da sexualidade, com o fim maior de assegurar a saúde sexual do indivíduo e da coletividade. Assim como é importante: - A compreensão dos fatores pessoais e familiares que afetam positiva ou negativamente a sexualidade do indivíduo ou do casal; - O empenho na ação terapêutica para tratamento dos desajustes sexuais. De acordo com Sayão (1997), em 1920 a bióloga feminista Berta Lutz reivindicou o desenvolvimento de um programa de Educação Sexual nas escolas brasileiras; seus objetivos divergiam das correntes médico-higienistas em voga na Europa, que propunham o combate à masturbação e às doenças venéreas, além da preocupação da mulher para o papel social da esposa e mãe. A feminista apresentava uma proposta divergente das idéias de Educação Sexual dos europeus visto que acreditava que a função da escola não era implementar qualquer tipo de controle sanitário. A Educação Sexual não deveria ser organizada por meio da repressão às práticas sexuais. Ao contrário, era necessário que ela incentivasse a reflexão individual acerca da importância da maternidade, da paternidade e da infância na sociedade brasileira. Em 1938, foi publicado o livro “Iniciação Sexual”. Leitura direcionada somente aos rapazes, propunha-se a orientar a iniciação sexual de rapazes que pretendessem constituir famílias numerosas e saudáveis. O autor entendia que a responsabilidade pela iniciação sexual era exclusivamente masculina. Eles deveriam ser educados para que pudessem apresentar o sexo as suas futuras esposas. A leitura era restrita aos rapazes. Assim, as meninas não podiam ter acesso ao livro para que não fossem afastadas da inocência sexual pré-matrimonial. Também não deveriam ter acesso à vida sexual antes do casamento. Perder a virgindade antes 59 do casamento manchava a honra da menina e de toda a família. O autor do livro Iniciação Sexual Educacional foi Oswaldo Brandão da Silva. Segundo Sayão (1997), outras iniciativas ocorreram entre 1930 e 1970. Alguns colégios, tanto públicos quanto particulares, incluíram o ensino de evolução das espécies e de Educação Sexual em seus currículos, mas sofreram severas repressões por parte da Igreja Católica, além da resistência das famílias dos estudantes. A educação era entendida como incentivo à iniciação sexual. O perigo estava na possibilidade de poluição da pureza virginal das moças casadouras. A alternativa à “poluição da pureza” era a manutenção da ignorância relativa à vivência sexual, que era garantida pela construção social de diversos segredos relativos à iniciação sexual. Em 1968, outra proposta, também elaborada por uma mulher, propunha a introdução da Educação Sexual nos currículos escolares. A deputada federal Julia Steimbrude, na época filiada ao PMDB, apresentou um projeto de Lei que usaria a introdução obrigatória da educação sexual em todas as escolas de nível primário e secundário (Ensino Fundamental de 1º e 2º ciclo). Considerado inovador e polêmico, o projeto foi encaminhado à Comissão Nacional de Moral e Civismo do Ministério da Educação e Cultura. Tal comissão era composta por padres, militares e deputados federais. A proposta não foi aprovada, pois a comissão entendeu que o projeto viria a contaminar a infância e a adolescência. A afirmação do General Moacir Araújo Soares, sublinha este entendimento. O Militar negou a proposta da deputada dizendo que “não se abre à força um botão de rosa, sobretudo com mãos sujas”. (Almeida, 1994). Sua afirmação representa alguns dos significados atribuídos na década de 1960. ao aludir o órgão sexual feminino e compará-lo a uma rosa, o general apresenta os projetos de educação sexual como mãos sujas que poluiriam a 60 pureza das moças. A partir deste entendimento, educar para o sexo seria sinônimo de incentivo à iniciação sexual. A rosa, quando fechada seria pura, sagrada e deveria ser defendida de quaisquer contatos impuros. Esta “Educação para pureza” foi materializada na Lei n.º 869 de 12/09/69, que criou o ensino obrigatório de educação moral e cívica nas escolas. A reprovação da Educação Sexual e a aprovação da moral e cívica parece resultado de classificações que representavam a sexualidade como antimoral, anticívicas e desestruturadora da sociedade. Dois anos após a promulgação desta Lei, em 1971, foi criada junto a Lei n.º 5692/71, Lei de Diretrizes e Bases de Educação Nacional, a disciplina programa de Saúde, em que a educação sexual foi articulada ao grupo de conhecimentos de evolução puberal, gestação, puericultura e saúde mental (Almeida, 1994), o que limitava seus ensinamentos aos aspectos biológicos da sexualidade, desconsiderando suas características psicológicas e sociais. As palavras do General Moacyr Araújo Lopes e o projeto da deputada Julia Steimbruck revelam o conflito entre duas formas distintas de perceber a sexualidade, infância, a adolescência e as funções sociais da escola. São diferentes formas de ver, mas que convivem em um mesmo contexto social. Tal conflito indica a continuidade de mudanças sociais profundas que viriam a se consolidar durante a segunda metade do século XX. Uma mudança progressiva nas representações e nas práticas sociais que vai redefinir os critérios de pureza e impureza relativos à vivência sexual. Talvez a gênese deste fenômeno possa estar na discriminação de idéias feministas já existentes no início do século, sublinhadas pelas divergências entre as propostas de Berta Lutz e de Oswaldo Brandão da Silva. Ambos visavam influenciar os currículos escolares, mas suas propostas eram bem diferentes, o que permite vislumbrar os processos de luta simbólica presente naquele momento 61 histórico. Enquanto a feminista defendia a mudança, a partir de uma educação sexual considerada moderna, o escritor pretendia orientar os rapazes para a reprodução dos ideais da masculinidade dominantes no período. De um lado, a feminista procurava disseminar novas idéias sobre a relação de gênero e sexualidade e pretendiam utilizar a escola como instrumento de transformação social. Por outro lado, o general desejava reforçar as relações de gênero e as representações sobre a sexualidade vigentes e também queria utilizar a escola para este intuito. Ambos pretendiam influenciar o campo de educação, mesmo que em sentidos opostos. A Educação Sexual, portanto, consolida-se como problema e a partir do momento em que agentes sociais com reconhecida competência passam a se preocupar com ela. A Educação Sexual no Brasil consolida-se como um problema a ser resolvido pela sociedade, especificamente pela escola, a partir da metade do século XX. Trata-se de uma mudança nas percepções acerca dos papéis sociais da família, igreja e da escola. De acordo com Bozon (2004), o fato de a escola ter sido privilegiada como local ideal para educação sexual pode estar ressaltando que parte das atitudes sexuais a serem questionadas tem origem no meio familiar. Ocorre em deslocamento do privado para o público de forma que uma tarefa antes circunscrita à família passa a ser entendida como função social da escola. Alguns fenômenos sociais tiveram papel fundamental nestas mudanças de representações: a eclosão do movimento feminista, as mudanças observadas no comportamento sexual dos adolescentes, o aumento das taxas de natalidade entre os adolescentes e a Aids passaram a exercer influência significativa nos campos de saúde e da educação, 62 unindo instituições sociais que antes não percebiam correlações entre suas atividades. Esta mudança social não diminuiu as coerções relativas à vida afetivo-sexual. Almeida (1994) identificou um processo na qual a sexualidade passou a ser progressivamente reduzida à prática do sexo considerado seguro. Ao invés da ampliação das fronteiras simbólicas construídas em torno do sexo, ocorreu o contrário. O contato sexual pré-matrimonial deixou de ser considerado o maior dos problemas, enquanto a ausência do sexo seguro passou a ser classificada como o grande perigo para os adolescentes. O “bom sexo” foi entendido como o ato sexual heterossexual orientado por critérios sanitários. Quaisquer práticas que diferissem desse modelo seriam perigosas para os indivíduos que as praticassem e para a sociedade como um todo. A partir dessa nova concepção, a sociedade reorganizou os critérios de coerção para que os indivíduos fossem incentivados a auto-regular suas práticas sexuais. E a escola teve papel fundamental na consolidação desta nova lógica discursiva. Os principais alvos destas novas formas de coerção foram algumas minorias: gays, prostitutas (os), consumidores (as) de drogas injetáveis. Com a diminuição do poder coercitivo do casamento, surgiram outras formas de coerção e controle da vida sexual. A sociedade entendeu que as crianças e os adolescentes deveriam ser orientados para o início da vida sexual e passou a delegar esta função à escola. Tal processo revela aspectos das relações intergeracionais porque foram orientadas pela crença de que os adultos, no caso os professores (as), estariam aptos a guiar os adolescentes para o caminho do “bom sexo”, seguro, higienizado e controlado por critérios sanitários. A partir da década de 1950 uma nova mentalidade com relação à sexualidade das crianças e adolescentes começa a se consolidar. Progressivamente, passa-se a 63 acreditar que a simples repressão da vida sexual pré-matrimonial não mais conseguiria afastar os jovens da vivência sexual e de suas possíveis conseqüências. Ao invés de proibir, a sociedade entende que deve educar e os professores ganham a legitimidade necessária para a condução dessa tarefa. O problema é que dentro do campo educacional não existe clareza sobre o que ensinar e os próprios professores não se sentiam preparados para esta nova função, antes circunscrita à família e à igreja. Considerando que os professores que atuavam naquele período foram formados em um momento em que a repressão sexual era organizada mediante a interdição dos corpos e das palavras, é possível entender as dificuldades que os (as) professores (as) possam enfrentar quando convocados a intervir neste “novo” problema social. Para Santos (1999), a Educação Sexual ganha força quando a conexão entre a prática sexual, contaminação pelo vírus da Aids e gravidez indesejada entre adolescentes passa a ter sentido junto à sociedade. A Aids acaba por aproximar os profissionais de saúde e educação que até aquele momento trabalham separados porque foram eles os agentes sociais considerados mais legítimos para a luta contra a doença. A Educação para a prática sexual entre os jovens passa para a “ordem do dia” das escolas a partir do momento em que é relacionada às dimensões epidêmicas e a mudanças nos padrões de comportamento sexual (Altmann, 2001). Acredita-se que ao colocar o sexo em discurso é possível produzir sujeitos autodisciplinados com relação à própria sexualidade, uma expectativa orientada pela perspectiva da existência de uma conexão entre saber _ poder _ sexualidade. Articulados, produziriam uma progressiva docilização dos corpos, da mesma maneira que Foucault (1999) percebeu nas sociedades européias. 64 Esse debate não ficou restrito à educação. Existem disputas pela influência neste campo desde o início do século XX, quando as primeiras tentativas de implementação de educação sexual foram frustradas. Bruschini (1981) faz uma crítica sobre a reformulação da proposta: “Por ser um projeto de saúde, a educação sexual poderia não oferecer as crianças e adolescentes uma visão positiva de sexualidade, consolidando apenas o tipo de comportamento reprodutivo, o adequado à política demográfica governamental.” Werebe (1981, p 99) faz outro tipo de crítica: “Por ser orientada por poderes institucionalizados, existia a possibilidade de privilegiar a medicalização e psiquiatrização da vida sexual, enfatizando principalmente os aspectos biológicos da sexualidade.” Percebe-se que ambos os críticos foram fundamentados no modelo analítico proposto por Foucault (1999). Interessante observar que o mesmo autor foi utilizado por aqueles que propunham políticas para a autodisciplinalização dos corpos e pelos que criticavam o excesso de controle que os projetos de educação sexual poderiam vir a implementar. A história da Educação Sexual no Brasil evidencia que a escola, a igreja, a medicina, a família e instituições governamentais foram e ainda continuam sendo instâncias que procuram regular a sexualidade das crianças, adolescentes, homens e mulheres por meio de uma educação sexual. A sexualidade tem sido motivo de desafios por várias instâncias sociais em que o corpo é o objeto e o alvo do poder. Há séculos e até hoje a Educação Sexual foi e se encontra relacionada com os problemas de saúde pública, à sífilis (passado), e neste momento à AIDS, e a regulação do comportamento da população pela sexualidade, por uma Educação Sexual centrada nos fenômenos biológicos ou 65 biopolíticos da espécie humana e dirigidas ao corpo, enfim, como disciplina anátomo-política do corpo humano, ainda pela influência das concepções médicohigienistas que, através da AIDS, colocou a Educação Sexual novamente em debate. A escola vem utilizando diferentes mecanismos de interdição para controlar e regular o que, como e quando falar a respeito da sexualidade das crianças. Nesse sentido, tem-se utilizado de diferentes discursos como o biológico, o pedagógico, o da criança inocente-assexuada e o da família-reprodução. 3.1.2 A concepção emancipatória ou política da Educação Sexual A Educação Sexual deixou de ser uma questão de domínio privado passando à esfera pública. Atualmente, tornou-se uma preocupação dos próprios governos. Desde que a escola foi convocada a oferecer um conjunto de saberes considerados necessários à iniciação e vivência sexual dos alunos ocorre um grande número de propostas públicas para o desenvolvimento de projetos de Educação Sexual que são justificados politicamente pela existência de dois problemas sociais contemporâneos: a ameaça da infecção pelo vírus HIV e demais DSTs e a gravidez na adolescência. O caráter fatal da AIDS impôs a necessidade urgente de intervenções preventivas. Portanto, a Educação Sexual no Brasil consolida-se como um problema a ser resolvido pela sociedade, especificamente pela escola, considerada ideal para a Educação Sexual. 66 Para Weeks (1993, p. 21): Não podemos esperar entender a sexualidade observando simplesmente seus componentes “naturais”. Esses só podem ser entendidos e adquirir significados graças a processos inconscientes e formas culturais. A “sexualidade” é uma experiência histórica e pessoal. Esta é uma preocupação apresentada neste trabalho, a desvinculação do trabalho de Educação Sexual na escola com objetivo único de resolver os problemas de gravidez indesejada e DSTs, mas também como direito dos alunos à Educação Sexual para que possam ter uma visão positiva da sexualidade. Buscamos pensar a sexualidade e as pedagogias escolares relacionadas à Educação Sexual emancipatória, ou seja, como uma construção sócio-histórica. O sentido primordial para o ensino da sexualidade está em que é um direito do educando conhecer a si próprio e conhecer tudo que está ligado à sexualidade. O significado do ensino da sexualidade está em formarmos jovens e adultos com conhecimento seguro de si mesmo e das questões da sexualidade, para que possam viver de maneira feliz, segura e responsável a sua sexualidade. Figueiró (2006, p. 67) comenta: Queremos formar cidadãos críticos e amadurecidos, participantes de transformação dos valores e das normas sociais ligadas às questões sexuais, incluindo-se, neste conjunto, a transformação das relações de gênero, a fim de assegurar a igualdade dos direitos e o respeito mútuo. Simonetti (1994, p. 02) diz que: Apesar de saber que a educação sexual pode ajudar a reduzir o índice de gravidez precoce/indesejada e a disseminação de DSTs, é preciso fazer com que os educadores entendam que a principal razão para desenvolvêla nas escolas é o direito que a criança e o adolescente têm de conhecer o seu corpo e a sexualidade, com uma visão positiva dessas realidades, e a necessidade de viver e transformar as formas de relação afetivo-sexual entre duas pessoas, sejam elas de sexo diferente ou igual. 67 O ensino escolar brasileiro, marcado por uma visão médico-biologista da sexualidade, assim como por uma visão normativo-institucional, tem manifestado resistência significativa em considerar e acolher a Educação Sexual como parte da educação global do indivíduo. Defende-se, neste estudo, a Educação Sexual com compromisso, com a transformação social. Como comenta Figueiró (2001, p. 91), “sexo foi, é e será sempre uma questão social, sem deixar de ser também uma questão individual”. A Educação Sexual na escola tem como propósito ajudar o aluno a reflexões e a conhecimentos que contribuam para que o aluno venha a viver de forma plena e satisfatória sua sexualidade. Werebe (1982) aponta que a Educação Sexual vai além de limitar-se à transmissão de informações científicas e a trabalhar os aspectos afetivos e psicológicos da sexualidade humana; considera fundamental que o educando conheça a realidade em que vive e os meios pelos quais pode, cooperativamente, ajudar a transformá-la. Esta é dita como a Educação Sexual “desejada”, proposta por Goldberg (1988). Uma proposta original da autora, que se alinha a uma concepção nova de Educação Sexual comprometida com a abordagem política ou emancipatória. Werebe (1982, p. 72) afirma que: Não somente leva em conta as múltiplas dimensões desta intervenção pedagógica, mas que procura também situar o educando no contexto amplo de seu meio social presente, com vistas a proporcionar e ampliar o registro de suas competências para se realizar e poder atuar como um ser humano completo e lúcido. 68 Ainda Werebe (1981, p. 99) frisa que: Essa proposta reconhece também a necessidade de se trabalhar com o educando as informações científicas, bem como aspectos afetivos e psicológicos, para ajudá-lo a encontrar prazer em sua sexualidade e para que isto contribua numa vida saudável e feliz. O presente estudo tem como entendimento da sexualidade a “abordagem emancipatória” e, ao invés de utilizar o termo “abordagem política”, escolheu-se a denominação abordagem emancipatória por considerar bastante adequada para a Educação Sexual no contexto institucional e educacional. Embora o termo “político” (não no sentido de governança) utilizado por Werebe seja no sentido de engajamento com a transformação social, tanto a denominação emancipatória como política são utilizadas no mesmo sentido para Werebe. Quando educamos, emancipamos. Sem dúvida, um processo de educação é necessário. É importante lembrar que ainda somos seres pertencentes a uma escola zoológica, e que vivemos numa sociedade estratificada, com diferentes graus de compreensão e de liberdade. Hoje convivem, às vezes em uma mesma cidade, Grécia, Roma e Europa do passado, não raro com os mesmos mitos e tabus. Devemos lembrar que o papel do educador é perseguir a emancipação do ser humano como um todo, no sentido de repensar a sexualidade nos dias atuais, respeitando as variadas tradições da pluralidade cultural que nos identificam como nação brasileira. Os padrões e normas sexuais foram mudando ao longo da história de nosso país, buscando a relação com todos os acontecimentos sociais, econômicos e políticos de cada época. Além dos determinantes externos que regulam e controlam o comportamento, uma Educação Sexual Política / Emancipatória tem que alertar as 69 pessoas para a auto-repressão, pois conforme afirma Chauí (1985, p.13), “A repressão perfeita é aquela que já não é sentida como tal, isto é, aquela que se realiza como auto-repressão graças à interiorização dos códigos de permissão, proibição e punição da sociedade”. É uma preocupação dos adeptos da concepção emancipatória da Educação Sexual, que um projeto de sexualidade não venha a se constituir como um meio disseminador de atitudes repressivas em relação ao sexo, muito menos de idéias neomalthusianas de controle de natalidade. De acordo com Petri (1988, p. 21), “Nossa educação sexual, hoje parcialmente travestida de liberal, tem ainda um caráter fortemente punitivo, com nuances de crime e castigo”. Uma Educação Sexual emancipatória é aquela que orienta para o resgate do gênero e do erótico na vida das pessoas. Segundo Figueiró (2001, p. 104): Uma educação sexual política é aquela que se pauta no questionamento das determinações rígidas do que é permitido e proibido, seja segundo a perspectiva religiosa, médica, seja na perspectiva de gênero. Também se coloca criticamente frente às injunções da perspectiva do erótico. Mesmo sendo possível reconhecer, ao longo do capítulo anterior sobre um passeio pela história da sexualidade no Ocidente, será registrada uma síntese das principais características das concepções da Educação Sexual de cada uma, feita por Figueiró (2001, p. 23, 68, 90, 108). Iniciamos com a síntese de uma Educação Sexual comprometida com a abordagem religiosa tradicional: 70 Abordagem Religiosa Tradicional: • liga a vivência da sexualidade ao amor a Deus e à submissão às normas religiosas oficiais; • tem como metas básicas a preservação dos valores morais cristãos e o desenvolvimento da vida espiritual; • vincula sexo ao amor pelo parceiro, ao casamento e à procriação; • encara o matrimônio e a virgindade/castidade como os dois únicos modos de viver a aliança com Deus; • valoriza a informação de conteúdos específicos da sexualidade (encarando-a, porém, como uma meta secundária); • pode estar comprometido com uma educação para o pudor. Por sua vez, comprometido com a Abordagem Religiosa Liberadora: • liga a vivência da sexualidade ao amor a Deus e ao próximo; • tem como metas básicas a conservação dos princípios cristãos fundamentais, o desenvolvimento da vida espiritual e a conscientização do cristão para a participação na transformação social; • valoriza a informação de conteúdos, num contexto de debate, para, através da discussão da sexualidade, levar a tomada de consciência da cidadania; • vê de maneira crítica as normas oficiais da Igreja sobre a sexualidade e procura levar o cristão a ser sujeito de sua sexualidade, com liberdade, consciência e responsabilidade; • vê a Educação Sexual como um ato político, ou seja, como uma atitude de engajamento com transformação social (é semelhante, portanto, à Abordagem Política, que será tratada mais adiante). De maneira resumida, um comprometimento com a Abordagem Médica da Educação Sexual: • busca compreender (ou aponta como importante que se compreenda) os fatores pessoais e familiares que afetam, positiva ou negativamente, a sexualidade do indivíduo (ou do casal); • aponta alternativas para melhorar a vivência sexual de um indivíduo, de um casal ou de um grupo de indivíduos; • dá ênfase à ação terapêutica para tratamentos de desajustes sexuais, de ansiedades e angústias relativas à sexualidade; • dá ênfase, primordialmente, ao fornecimento de informações, em contexto de relação terapêutica ou de programas preventivos de saúde pública, para assegurar a saúde sexual do indivíduo e da coletividade. Em síntese, um texto comprometido com a Abordagem Pedagógica de Educação Sexual: • volta-se mais diretamente para o processo ensino-aprendizagem de conteúdos relacionados com a sexualidade; • valoriza o aspecto informativo desse processo, podendo também dar ênfase ao aspecto formativo, onde se propicie a discussão de valores, atitudes e preconceitos; pode ainda considerar a importância da discussão de dúvidas, sentimentos e emoções; • direciona mais acentuadamente a reformulação de valores, atitudes e preconceitos, bem como todo o “processo de libertação”, para o nível individual. De maneira resumida, um texto comprometido com a Abordagem Política ou Emancipatória: orienta para o resgate do gênero, do erótico e do prazer na vida das pessoas; ajuda a compreender (ou alerta para a importância de se compreender) como as normas sexuais foram construídas socialmente; considera importante o fornecimento das informações de conteúdos pertinentes à sexualidade; 71 alerta (ou mostra importância de se alertar) para repressões e autorepressão; propicia questionamentos filosóficos e ideológicos (ou mostra a importância desses questionamentos); encara a questão sexual como uma questão ligada diretamente ao contexto social, influenciando e sendo influenciada por esse; dá ênfase à participação em lutas coletivas para transformações sociais; considera importantes as mudanças de valores, atitudes e preconceitos sexuais do indivíduo para o alcance de sua libertação e realização sexual. Porém, isto é encarado como um meio para se chegar a novos valores sexuais, que possibilitem a vivência de uma sexualidade com liberdade e responsabilidade, em nível não apenas do indivíduo, mas da sociedade como um todo. 3.2 CONCEITO DE SEXO E SEXUALIDADE Existe uma confusão no uso das terminologias “sexo” e “sexualidade”, utilizado no senso comum como se fossem sinônimas, motivo importante para conceituá-las. Quando se fala em sexo, estamos tratando do discurso biológico, o corpo concebido como pura anatomia dos sistemas reprodutores masculinos e femininos, como atributo concebido como genitalidade, compartilhado por todos os seres humanos independentes de sua história e cultura. O conceito de sexo para Vitiello (2000, p.127): Sexo – característica dos atributos envolvidos, em princípio, na reprodução. Existe o sexo cromossômico, que é definido pelo tipo de cromossomos sexuais possuídos; o sexo gonádico, definido pelo tipo de gônada; o sexo legal, que é aquele em que o indivíduo é registrado ao nascer, isto, sexo feminino ou masculino; o sexo de criação, que diz respeito a como a família cria cada indivíduo; o sexo social, que é apresentado à sociedade. Dentro de casa sexo social, as preferências sexuais das pessoas podem ser dirigidas a indivíduos do sexo oposto (heterossexuais), do mesmo sexo (homossexuais) ou a ambos (bissexuais) Já a sexualidade se manifesta desde o início da vida e acompanha o desenvolvimento geral do indivíduo. É entendida a partir de um enfoque abrangente. Inclui as dimensões fisiológicas, psicológicas e sociais. Dentro de um contexto mais 72 amplo, pode-se considerar que a influência da sexualidade permeia todas as manifestações humanas, do nascimento até a morte. De acordo com Foucault (1997), sexualidade é como um dispositivo que exerce saberes/poderes para o governo do corpo e da vida das pessoas. Para Britzman (1998), a sexualidade é a energia que leva o bebê a construir sua primeira forma de conhecimento: distinguir seu corpo do dos outros. É a energia que leva o ser humano a se movimentar e a interagir com o meio ambiente, impulsionando para suas ações na direção da satisfação das necessidades básicas e do premente desejo por prazer. Nesse ponto, há apenas um tipo de conhecimento: a urgência que busca satisfação e o desejo de aprender. Sem desconsiderar o aspecto social e construtivo da sexualidade, bem como sua ligação com o poder, isto é, com as formas de controle sobre a sexualidade, que a sociedade exerce na vida das pessoas, Britzman (1998, p. 56) defende que “a sexualidade é a primeira condição para a curiosidade humana e, conseqüentemente, a primeira condição ou força para a aprendizagem. Dito, simplesmente, sem sexualidade, o ser humano não desejaria aprender”. Neste estudo, concordando com a proposta de Goldberg (1988), estamos entendendo a sexualidade como uma construção sócio-histórica. Não podemos entender a sexualidade observando apenas seus componentes biológicos, instintivos e naturais. Sexualidade só pode ser entendida, adquirindo significado graças a processos inconscientes e formas culturais. A sexualidade deve ser vista como uma experiência histórica e pessoal. Dessa forma, integra comportamentos, linguagens, crenças, escolhas, posturas e identidades que se relacionam segundo algumas estratégias de poder, saber (LOURO, 1999). 73 Portanto, neste estudo, entendemos Educação Sexual associada às práticas culturais, privilegiando questões como cultura, significação, identidade e poder. Segundo Silva (1999), os estudos culturais têm buscado, em suas análises, caracterizar o objeto de estudo como artefatos culturais, isto é, como resultado de processos de construção social. Assim, entende-se a sexualidade como uma invenção que se constitui na correlação de múltiplos elementos sociais presentes na família, religião, educação, Medicina etc. A sexualidade tem sido motivo de debates e proposições por várias instâncias sociais cujo corpo é objeto e o alvo do poder. Até mesmo os Parâmetros Curriculares Nacionais vêm atuando como uma estratégia regulamentadora da sexualidade, a qual tem como matriz a biopolítica. Essa tecnologia de poder regula a sexualidade por meio de mecanismos de controle e intervenção centrados nos fenômenos biológicos. Portanto, falar da sexualidade nem sempre é tarefa fácil, girando em torno, geralmente, do sexo, do ato sexual, das funções do corpo humano, dos métodos anticoncepcionais e da prevenção de doenças. Isto significa que é enfatizado somente o biológico, isolando as dimensões psicológicas e sociais da sexualidade. Falar da sexualidade implica a inclusão da produção histórica, da questão social e política, na qual se exercem relações de poder. Para Louro (1997, p. 141), Abordar a sexualidade trata-se de assumir que todos os sujeitos são constituídos socialmente, que a diferença (seja ela qual for) é uma construção feita – sempre – a partir de um dado lugar (que se toma como norma ou como centro). É preciso, pois, pôr a norma em questão, discutir o centro, duvidar do natural. 74 Para conhecer e entender o conceito de sexualidade, é necessário adentrar no funcionamento dos elementos sociais que constituem a sexualidade, presentes nas práticas pedagógicas dos (as) professores (as) das séries iniciais do Ensino Fundamental. Discutir esta temática nas séries iniciais torna-se importante porque é necessário rever este entendimento das crianças como inocentes e assexuadas, para quem a Educação Sexual passa, muitas vezes, pelo não-dito. Essa foi a forma que a sociedade contemporânea encontrou de vigiar, normatizar e controlar a sexualidade. Até pode-se falar de sexualidade das crianças, desde que dentro de regras que controlem e legitimem o discurso autorizado, ou seja, o biológico. No discurso biológico, o corpo é concebido como pura anatomia na qual a sexualidade se reduz ao conhecimento de estruturas dos sistemas reprodutores masculino e feminino, um atributo biológico apenas, excluindo as outras dimensões que fazem parte da sexualidade (aspectos psicológicos e sociais), independente da história e da cultura. Figueiró (2006, p. 17) conceitua da seguinte forma: sexualidade é uma dimensão humana que vai além de sua determinação biológica, pois é, também, culturalmente determinada. As informações sobre ela trabalhadas na escola precisam envolver reflexões, tanto individual quanto coletiva, pois é esse exercício que permitirá ao educando reconhecer-se como sujeito de sua sexualidade, capaz de construir relações mais saudáveis e positivas de interferir no curso de sua vida e da coletividade. Se pensarmos que a finalidade maior da educação sexual é contribuir para que o educando possa viver bem a sua sexualidade, de forma saudável e feliz, e, ao mesmo tempo, contribuir para que ele esteja apto a participar da transformação social, em todas as questões ligadas direta ou indiretamente, de forma humanizadora, está sendo um mediador de esperanças e de projetos de vida. 75 Como afirma Nunes (1996, p. 145), a sexualidade humana é qualitativamente diversa da sexualidade (sexo?) animal; nela estão embutidos valores da comunidade humana, da história social, da economia, da cultura e até da espiritualidade conquistada na lenta construção da identidade do homem realizada pelo ser humano na sua trajetória histórica. Reconhecendo, também, a sexualidade como uma construção humana, Melo (2001, p. 132) afirma que ela é uma "dimensão existencial, parte inseparável da condição humana, histórica, processual e mutável, assim como o é o Ser no mundo junto a outros seres". Para uma compreensão mais ampla do significado da sexualidade é útil considerarmos as várias significações a ela atribuíveis em nosso contexto institucional e educacional, tomando como ponto de referência os cinco paradigmas de entendimento da sexualidade identificados por Nunes (1996). São eles: • a concepção médico-biologista que vê a sexualidade como uma dimensão biológica e procriativa do ser humano e como uma força propulsora, natural e instintiva da procriação. Implica considerar a natureza como determinante da condição humana; • a concepção terapêutico-descompressiva, na qual a sexualidade é entendida como uma dimensão meramente subjetivista, psicologizante, individual e ligada a uma força natural, supostamente instintiva ou selvagem do corpo humano. Sua essência está centralizada no fato de ser vista, unicamente, como fonte de prazer e gratificação; • a concepção normativo-institucional, que vê a sexualidade como um aspecto da vida humana ligado a um conjunto de comportamentos socialmente permitidos, por um lado, e proibidos, por outro. Implica a necessidade de passar as normas reguladoras da sexualidade, que até então eram transmitidas pela família; • a concepção consumista-quantitativa, que entende a sexualidade como uma energia do indivíduo, passível de regulação e controle social, que, por sua vez, pode ser transformada em produtividade. Nela está inserida, por exemplo, a idéia da instigação ao sexo quantitativo, da alienação do afeto e do apelo de venda e marketing; • a concepção dialética e política, que concebe a sexualidade como a dimensão mais ampla da condição humana, como uma construção pessoal e social, em que o ser humano é visto como participante ativo desse processo, uma vez que influencia na construção dos valores e normas sexuais e, ao mesmo tempo, é dialeticamente influenciado por eles. Implica que o indivíduo possa vir a ser sujeito de sua própria sexualidade. 76 É, pois, com esse último significado de sexualidade que se encontram vinculadas as reflexões deste trabalho, uma vez que este defende a educação sexual de cunho emancipatório. Com os conceitos de sexualidade e sexo utilizados pelos autores aqui citados é que este estudo se organiza, se estrutura e se efetiva, por compactuar com o pensamento deles, de que há muito mais do que auxiliar na redução da gravidez inesperada e de prevenir contra DSTs/AIDS. Enfim, atuar com Educação Sexual de forma reducionista, levando em conta somente o aspecto biológico da sexualidade torna-se inaceitável, pois a contribuição pode e deve ser no sentido do desenvolvimento integral da personalidade, visando a sua qualidade de vida, contribuindo com a visão de que uma sexualidade adequada aumenta o grau de felicidade e bem-estar. Como comenta Vitiello (1999, p. 02), “as pessoas devem ser educadas para serem felizes”, assim como reforça Cavalcanti (1993, p. 169) ao afirmar que “o compromisso da educação sexual é com a felicidade das pessoas”. Portanto, defende-se a idéia, neste estudo, do conceito de sexualidade como uma construção sócio-histórica e não algo como o discurso biológico, marcado por influências médico-higienistas, mas uma sexualidade livre de sentimentos de culpa e opressão social, banindo o autoritarismo sexual, eliminando preconceitos sexuais, as desigualdades e a violência sexual e comprometida com a transformação social. 3.3 REVENDO O ENTENDIMENTO DE EDUCAÇÃO SEXUAL E ORIENTAÇÃO SEXUAL É relevante e necessário enfocar aqui a polêmica, que existe entre as terminologias Educação Sexual e Orientação Sexual, tendo em vista que 77 publicações recentes o tem trazido à baila, sem, contudo, chegar a uma posição fundamentada e sólida. Citam-se, por exemplo: Louro (1997), Peres et al. (2000), Filgueiras (1999), Y. Sayão (1997) e Suplicy et al. (1999). Werebe (1998, p. 155) fala de sua preocupação com os termos e definições adotados e, ao criticar o uso da expressão "Orientação Sexual" para designar o trabalho feito por educadores, afirma que "se presta a ambigüidades, podendo ser confundido com a orientação no sentido de direção que a pessoa imprime em sua sexualidade. A estudiosa comenta também sobre a proposta de padronização do uso de educação sexual e, apoiando a idéia, reforça-a dizendo que "a expressão educação sexual já é consagrada e usada em praticamente todos os países" (WEREBE, 1998, p. 157). Constatou-se o predomínio significativo dessa terminologia. No entanto, o fato de os PCNs usarem “Orientação Sexual" fez com que esforços de reflexão realizados para a construção de uma linguagem comum entre os estudiosos fossem prejudicados. Houve a negação do termo Educação Sexual em prol de Orientação Sexual em 1997, com a publicação da proposta de “Orientação Sexual” contida nos Parâmetros Curriculares Nacionais. Articulados à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei n.º 9394/96 – os Parâmetros são uma proposta do Ministério da Educação que têm como princípio a consolidação de um sistema educacional moderno, que venha a atender às demandas sociais contemporâneas (MEC, 1997). Além de propor diretrizes para as disciplinas presentes no currículo da educação básica, criou os temas transversais: saúde, orientação sexual, pluralidade cultural, ética e meio ambiente. 78 Os PCNs adotaram a terminologia “Orientação Sexual”, mas não há explicação registrada do motivo desta escolha. Figueiró (2006) cita que a expressão "educação sexual" é mais apropriada porque é coerente com a concepção do método de educação, no qual o educando participa do processo de ensino e aprendizagem como sujeito ativo e não como mero receptor de conhecimentos, informações e (ou) orientações. Por outro lado, o (a) professor (a) é o (a) agente que cria as condições para o (a) aluno (a) aprender e que o auxilia em sua aprendizagem. Por sua vez, a expressão "Orientação Sexual" diz respeito à direção do desejo sexual do indivíduo, utilizado pela psicologia clínica, que pode ser heterossexual, homossexual ou bissexual, conforme já mencionado anteriormente. Essa conceituação é pautada no ponto de vista de diversos estudiosos, entre os quais se destacam, por exemplo, Cavalcanti (1993), Mott (2003), Sorj (1992) e Werebe (1998) e Vitiello (2000). Para reforçar o sentido de Orientação Sexual conforme descrito acima, vale a pena considerar a informação que vem a seguir: (...) o antropólogo Dr. Luiz Mott, (...) um dos grandes batalhadores contra a opressão a que estão sujeitos os homossexuais, informou que, na Constituição dos Estados de Sergipe, Mato Grosso e Distrito Federal, o direito à liberdade de Orientação Sexual, no sentido de poder ser homo, hetero ou bissexual, está incluído entre os direitos humanos. Acrescentou que este termo está presente - com este mesmo sentido - em setenta e três leis orgânicas municipais. (FIGUEIRÓ, 2006, p. 49) Existe a preocupação, sobremaneira, com a questão das terminologias e conceituações, pois, nas pesquisas que fez Figueiró sobre os trabalhos publicados no Brasil sobre Educação Sexual, foi constatado, nas publicações científicas, a falta de padronização de uma terminologia básica e a falta de posição teórica clara e 79 objetiva por parte dos autores quanto ao conceito de educação sexual e de Orientação Sexual. Em um número significativo de publicações, os autores conceituam diferentemente os termos, porém os usam como se fossem sinônimos. Em outros casos, não há cuidado em conceituar, nem sequer em diferenciar os termos. Acredita-se que as falhas, lacunas ou distorções possam comprometer a qualidade da produção científica e interferir no avanço do corpo teórico dessa área do conhecimento e por isso Figueiró (2006) defende a necessidade de padronização do uso do termo educação sexual. Evidentemente, a nomenclatura Educação Sexual não é a única existente e talvez nem a mais comum. No entanto, é a que aparenta ser mais funcional e, por essa razão, será adotada neste trabalho. Para Vitiello (2000, p. 95), A orientação implica num mecanismo mais elaborado, segundo o qual baseando-se na experiência e nos seus conhecimentos o orientador ajuda o orientando a analisar diferentes opões, tornando-o assim apto a descobrir novos conceitos. Educar, finalmente, embora possa passar por informar, por orientar e por aconselhar, é mais do que a soma dessas partes isoladas. Educar no sentido mais amplo, significa “formar”, não na acepção de que o educando seja uma cópia do educador, mas sim na de que o educar dá ao educando condições e meios para que cresça interiormente. A influência do educador, por isso mesmo, além de intensa, precisa ser contínua e duradoura, pois caso contrário não conseguirá seu intento. É necessário, além disso, que essa influência seja exercida por pessoas significativas. Nesse sentido, a Educação Sexual sistemática só pode ser feita por familiares ou por professores (as). Só eles conseguem atuar de maneira contínua e duradoura. Só estas podem ocorrer de forma sistemática. Já a Educação Sexual assistemática, ocasional, pode ocorrer de forma espontânea, na própria sociedade. Todo e qualquer contato humano pode ter uma conotação educadora, desde que seja feita por pessoas significativas. 80 Vitiello (2000) comenta que é importante também salientar conceitos de informação e aconselhamento. A passagem de informação, embora muito relevante e de fundamental importância para a evolução educativa, não se constitui no processo, ainda que informar seja uma atividade de ensino, de instrução, mas não de educação, principalmente se for passada de forma isolada. Aconselhar, por sua vez, consiste em auxiliar o aconselhando a escolher por um caminho dos vários possíveis que já se conhece. Aconselhar significa ajudar a decidir, auxiliar na tomada de decisões próprias. Para esclarecer essas definições, podemos observar que todos os indivíduos têm em sua biografia escolar a lembrança de alguns (umas) professores (as) que deixaram apontamentos marcantes cuja influência acompanha no decorrer de toda uma vida. Esse (a) professor (a), ou esses poucos, podem ser considerados (as) verdadeiros (as) educadores (as). Para Alves (1991), existem duas dimensões que devem ser consideradas por aqueles sujeitos que assumem a tarefa de ensinar: uma é a de educador e a outra de professor. Ao educador, refere-se à pessoa e ao professor, à função. Desta forma, de acordo com o autor, professor é profissão e educador é ter vocação para exercer esse papel. Educação Sexual, portanto, tem como maior finalidade contribuir para que o educando possa viver bem a sua sexualidade, de forma saudável e feliz, e que esteja apto a participar da transformação social nas questões ligadas direta ou indiretamente à sexualidade. Figueiró (1995, p. 08) conceitua a Educação Sexual como sendo “toda ação ensino-aprendizagem sobre a sexualidade humana, seja em nível de conhecimento 81 de informações básicas, seja em nível de conhecimento e/ou discussões e reflexões relacionadas à vida sexual”. Todos os indivíduos podem ser considerados educadores sexuais, pois todos recebem ou receberam educação sexual em casa, na escola, na igreja. Mesmo quando nada foi informado e orientado verbalmente, mas de forma silenciada, ainda assim ocorreu a educação sexual informal. Quando faz parte de um programa educacional, a Educação Sexual deve abranger tanto o componente informativo quanto formativo. Para Figueiró (1995), um conceito mais abrangente e completo de Educação Sexual é o que ela pode significar na vida humana, que papel pode exercer na formação e na história do ser humano, não apenas como “ser individual”, mas também como “ser coletivo”. Assim sendo, ela é definida como uma forma de engajamento pessoal nos esforços coletivos pela transformação de padrões de relacionamento sexual e social. Segundo Goldberg (1988), é esse exercício que oportuniza ao indivíduo educar-se sexualmente. Para isso, necessita desenvolver sua autonomia quanto a valores e atitudes ligados ao comportamento sexual e sua capacidade de exercer denúncias das situações repressoras de sexualidade. Esse modelo é denominado educação sexual emancipatória, pois está comprometido com a transformação social. Ao concluir essa reflexão sobre a padronização da terminologia, pondera-se a busca da solidez do corpo teórico de conhecimento, assim como as implicações da seleção de determinado tema, uma vez que cada um carrega consigo concepções pedagógicas quanto ao que é educação. 82 Mais importante do que padronizar uma terminologia é saber que o ensino de sexualidade está sendo inserido na escola, independente do nome que carrega. 3.4 EDUCAÇÃO SEXUAL NA ESCOLA A presença da proposta de Educação Sexual nos Parâmetros Curriculares Nacionais é resultado da aproximação entre a escola e outras instituições sociais. Dessa forma, a escola vem sendo convocada a intervir em campos antes circunscritos à atuação da família e da igreja. Com a disseminação da AIDS, trouxe à tona questões de domínio privado e íntimo, passando à esfera pública. Surgindo com isso a urgência de se discutir e investigar a respeito da sexualidade, desvelando este importante aspecto da vida humana. Em primeiro lugar, o significado de Educação Sexual na escola se justifica pelo fato de que é um direito do educando conhecer sobre seu corpo e sobre sua sexualidade, assim como ter a compreensão desses conhecimentos sobre a sexualidade serem tão importantes para a formação integral do aluno. É importante entender que a Educação Sexual pode estar comprometida com diferentes concepções filosóficas, metodológicas e pedagógicas, o que implica a existência de abordagens variadas de Educação Sexual. Oportunizar a escola a promover espaço para concretizar a Educação Sexual dos alunos é possibilitar que ela assuma a função do questionamento das normas e dos valores relativos à sexualidade. Bruschini e Barroso (1986), em contrapartida, acreditam que pode ser um efeito dinamizador das transformações pelas quais a instituição escolar, 83 especialmente a pública, precisa passar. Este pensamento é defendido também por Silva (1997, p. 299) quando diz que “a alternativa (...) pode bem começar com a educação sexual. Sexo é um assunto mobilizador como poucos (...), pode ser a grande força educativa”. No trabalho de Educação Sexual na escola é preciso criar condições para a formação. A Educação Sexual não pode se constituir como meio disseminador de atitudes repressivas em relação ao sexo ou visando apenas ao controle de natalidade e a emergência em conter o vírus da AIDS. A sexualidade acaba, dessa forma, sendo responsabilizada pelo caos social e encarada negativamente por boa parcela da sociedade e, assim, muitos (as) professores (as) acabam apenas falando de sexo associando a doenças, morte etc. Desta forma, deparamos-nos com uma Educação Sexual que é encarada como atividade que se preocupa apenas com interesses políticos de prevenir problemas sociais. Os (as) professores (as) ganham a legitimidade necessária para conduzir a Educação Sexual. O problema é que dentro do campo educacional não existe clareza sobre como ensinar acerca desta temática. A Educação Sexual, segundo Figueiró (2000), pôde ser incluída por vários critérios, mas o critério decisivo, sem dúvida, é a urgência social, o que é totalmente válido e fundamentado. Uma questão é bastante clara: se não fossem os problemas que a vivência da sexualidade traz para a sociedade, esta não estaria sendo inserida no currículo escolar. Mas ter sido incluída desta forma pode interferir no sentido assimilado pelo (a) professor (a), no ensino das questões da sexualidade, podendo se limitar ou enfatizar muito o aspecto biológico da sexualidade e a prevenção de problemas sexuais. 84 Não se pode negar que um trabalho preventivo em relação às DSTs, AIDS e gravidez precoce são questões urgentes e que devem fazer parte dos objetivos do ensino do (a) professor (a). Mas, a preocupação da escola em aplicar Educação Sexual e do (a) professor (a) de assimilar que seu trabalho com o tema sexualidade está ligado apenas a resolver os problemas de DSTs e gravidez, acaba tornando o trabalho do (a) professor (a) árduo, pesado, angustiante e desvirtua as energias que poderiam ser redobradas se falasse em sexualidade de forma alegre e bonita. Na mesma proporção de importância, estão também os temas quanto à discriminação com os homossexuais e até mesmo as violências praticadas contra eles e também à mulher, assim como seria importante trabalhar com os (as) alunos (as) sobre o tema abuso sexual, que acabam não recebendo destaque. Comenta Figueiró (1988, p. 96): embora se saiba que são as necessidades que, na prática, têm impulsionado o começar a falar sobre sexualidade, é preciso assegurar que a força propulsora do trabalho seja o reconhecimento do direito à educação sexual. Chegar a isto, sem dúvida, é um grande desafio para os profissionais que preparam educadores sexuais. De acordo com Forquin (1993, p. 09), “ninguém pode ensinar verdadeiramente se não ensina alguma coisa que seja verdadeira ou válida a seus próprios olhos”. Nas camadas populares a gravidez na adolescência e a contaminação por DSTs e Aids são classificadas como graves problemas sociais que necessitam de intervenção governamental. Entre as instituições responsáveis estão a escola que passou a ser convocada a intervir na Educação Sexual das crianças e adolescentes e se transforma em um local privilegiado para a gênese de novas formas de percepção sobre a sexualidade e a vivência sexual. (ALTMANN, 2005) 85 A instituição vem sendo alvo de intensos investimentos públicos e tecnologias de governo que pretendem organizar a vivência sexual dos alunos. Nos PCNs, o Ministério da Educação prevê o desenvolvimento de projetos de Educação Sexual em todas as escolas do Ensino Fundamental do país, com objetivo de incentivar reflexões a cerca da temática sexualidade. Os Parâmetros Curriculares Nacionais são norteadores, não têm força de Lei. Acredita-se que cada sistema educacional possui especificidades locais que devem ser respeitadas durante a formulação dos projetos de intervenção pública da sexualidade dos (as) alunos (as). O Ministério da Educação apenas oferece parâmetros que podem ser seguidos durante a formulação das propostas de intervenção da Educação Sexual na escola. O projeto de Educação Sexual na escola tem por base a proposta de disseminação de novas representações de vida sexual dos estudantes de Ensino Fundamental, além de questões mais pontuais como planejamento familiar, prevenção a DST e Aids. A expectativa de que a Educação Sexual na escola se relaciona com uma vivência sexual de forma mais responsável, aproveitando o prazer proporcionado pela prática sexual segura, sem perigo de conseqüências indesejadas. O significado do ensino da sexualidade está em formarmos jovens com conhecimento seguro de si mesmo e das questões de sexualidade, para que possam viver de maneira feliz, segura e responsável a sua sexualidade. Além disso, queremos formar cidadãos críticos e amadurecidos, participantes da transformação dos valores e das normas sociais ligadas às questões sexuais, inclui-se, nesse conjunto, a transformação das relações de gênero, a fim de assegurar o direito à igualdade entre homens e mulheres e o respeito mútuo. 86 Gusmão (2002, p. 08) comenta: Desde a consolidação da proposta dos PCNs, a escola tem ampliado suas funções sociais, o que faz com que seja apresentada como solução para os problemas sociais contemporâneos. O caráter fatal da Aids e gravidez na adolescência impôs a necessidade urgente de intervenções preventivas. A autora identifica um conjunto de representações sociais que legitimam a escola como uma instituição que deve enquadrar os alunos, preparando e conduzindo-os à vida adulta. Portanto a Educação Sexual no Brasil consolida-se como um problema a ser resolvido pela sociedade, especificamente pela escola, considerada ideal para a Educação Sexual na escola, segundo a proposta dos PCNs. Nas dinâmicas entre família e escola, principais instituições consideradas responsáveis pela educação sexual das crianças e adolescentes na modernidade, a escola estaria ganhando mais atribuições e, em conseqüência, “poder”. Segundo Sposito (2005, p. 71): A escola moderna acaba por exercer processos de mediação entre valores universais e individuais, disseminando normas que conformam os alunos à sociedade e ao mesmo tempo, os transformam em seres autônomos. Este trânsito constante entre valores universais e subjetivação consolida em um processo dinâmico de formação individual e coletiva necessário à manutenção da vida social. O mesmo diálogo ocorre quanto à implementação da Educação Sexual na escola, como tema transversal, segundo Vianna (1997, p. 95): A proposta dos PCNs traz alguns problemas. Primeiro porque existe a expectativa de que a geração adulta eduque, ou oriente os alunos para a “boa” vivência da sexualidade. Percebe-se com isto, a pré-suposição de que os adultos estão “resolvidos” em suas próprias vidas sexuais, além de dotados de um conjunto de saberes históricos, sociológicos, antropológicos e biológicos necessários ao desenvolvimento da temática proposta nos três blocos de conteúdo da Educação Sexual. Segundo, porque existe a crença de que categorias docentes e discentes podem discutir quaisquer questões relacionadas à sexualidade sem que seus pertencimentos de gênero e geração interfiram no debate e na organização das aulas. 87 Portanto, as crenças são alicerçadas por representações coletivas que percebem a idade adulta como o fim dos dilemas relativos à vivência sexual. Rosistolato (2004, p. 11) complementa esse pensamento de Vianna: As crenças expressam dinâmicas geracionais. E entendem que os professores têm o poder de se afastar de suas vivências de gênero, geração e classe diante as atividades docentes. A escola, no entanto, não se encontra isolada dos outros planos de organização da vida social, o que representa que existe um fluxo e refluxo de pensamentos e ações entre a vida cotidiana. Compactuamos do pensamento desses autores e pensamos que a escola não é isolada e quaisquer discussões ocorridas no decorrer das práticas educacionais serão perpassadas pelas vivências de gênero, classe e sexualidade dos (as) professores (as) e dos (as) alunos (as), assim como temos que considerar a diferença de geração. Porque a escola, assim como qualquer outra instituição social, é formada por indivíduos responsáveis pela implementação das políticas educacionais. Estes (as) professores (as) precisam promover o diálogo entre as suas próprias percepções da realidade e os que são apresentados nos documentos que orientam o trabalho na escola, além, é claro, das que são trazidas pelos alunos. Porque são eles que vivem os consensos e discutem os conflitos criados, afirmados, negados no cotidiano escolar. Simonetti (1994, p. 02) diz que: Apesar de saber que a educação sexual pode ajudar a reduzir o índice de gravidez precoce/indesejada e a disseminação de DSTs, é preciso fazer com que os educadores entendam que a principal razão para desenvolvêla nas escolas é o direito aos alunos de ter uma visão positiva da sexualidade, e a necessidade de viver e transformar as formas de relação afetivo-sexual entre duas pessoas, sejam elas de sexo diferente ou igual. 88 O ensino escolar brasileiro, marcado por uma visão médico-biologista da sexualidade, assim como por uma visão normativo-institucional, tem manifestado resistência significativa em considerar e acolher a Educação Sexual como parte da educação global do indivíduo. Defende-se, neste estudo, a Educação Sexual com compromisso, com a transformação social. Como comenta Figueiró (2001, p. 91), “sexo foi, é e será sempre uma questão social, sem deixar de ser também uma questão individual”. Werebe (1982) aponta que a Educação Sexual vai além de limitar-se à transmissão de informações científicas e a trabalhar os aspectos afetivos e psicológicos da sexualidade humana; considera fundamental que o educando conheça a realidade em que vive e os meios pelos quais pode, cooperativamente, ajudar a transformá-la. Esta é dita como a Educação Sexual “desejada”, proposta por Goldberg (1988). Uma proposta original da autora, que se alinha a uma concepção nova de Educação Sexual comprometida com a abordagem política ou emancipatória. Werebe (1982, p. 72) afirma que: Não somente leva em conta as múltiplas dimensões desta intervenção pedagógica, mas que procura também situar o educando no contexto amplo de seu meio social presente, com vistas a proporcionar e ampliar o registro de suas competências para se realizar e poder atuar como um ser humano completo e lúcido. Ainda Werebe (1981, p. 99) frisa que: Essa proposta reconhece também a necessidade de se trabalhar com o educando as informações científicas, bem como aspectos afetivos e psicológicos, para ajudá-lo a encontrar prazer em sua sexualidade e para que isto contribua numa vida saudável e feliz. 89 Os (as) professores (as) são considerados responsáveis pela implementação de ações que visam educar os (as) alunos (as), preparando-os para a vida sexual. Tanto a escola como os pais legitimam os professores (as) à responsabilidade pela difusão das informações necessárias a boa vivência da sexualidade dos alunos, todas previstas nos blocos de conteúdos da Educação Sexual proposta pelos PCNs, de forma transversal. Considerando que os (as) professores (as) e alunos (as), os (as) primeiros (as) freqüentemente representados (as) como detentores (as) do saber, portanto, há a expectativa social de que os (as) professores (as) possuem o conjunto de saberes necessários à Educação Sexual. 90 4 PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS Em 1990, o Brasil participou da Conferência Mundial de Educação para Todos, na Tailândia, convocada pela UNESCO, UNICEF, PNUD e Banco Mundial. Foi assinada a Declaração de Nova Delhi por nove países em desenvolvimento de meios contingente populacional do mundo, resultaram em acordos consensuais na luta pela satisfação das necessidades básicas de aprendizagem para todos, capazes de tornar universal a educação fundamental e de ampliar as oportunidades de aprendizagem para crianças, jovens e adultos. Tendo em vista o quadro atual da educação no Brasil e os compromissos assumidos internacionalmente, o Ministério da Educação e do Desporto coordenou a elaboração do Plano Decenal de Educação para Todos, voltado para a recuperação da escola fundamental, a partir do compromisso com a eqüidade e com o incremento da qualidade, bem como com a constante avaliação dos sistemas escolares, visando o contínuo aprimoramento. O Plano Decenal de Educação, em consonância com o que estabelece a Constituição Brasileira, afirma a necessidade e a obrigação de o Estado elaborar parâmetros claros no campo curricular capazes de orientar as ações educativas do ensino obrigatório, de forma a adequá-los aos ideais democráticos e à busca da melhoria da qualidade do ensino nas escolas brasileiras. A ampliação das responsabilidades do poder público para com a educação, juntamente com a Emenda Constitucional n.º 14 de 12 de setembro de 1996, priorizou o Ensino Fundamental, disciplinado a participação de Estados e Municípios no tocante ao financiamento desse nível de ensino. 91 A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Federal n.º 9.394), aprovada em geral e em particular para com o Ensino Fundamental. Fato que confere ao Ensino Fundamental, ao mesmo tempo, um caráter de terminalidade e de continuidade. A LDB consolida a organização curricular de modo a conferir uma maior flexibilidade no trato dos componentes curriculares, reafirmando, desse modo, o princípio de base nacional comum (PCNs), a ser complementada por uma parte diversificada em cada sistema de ensino e escola na prática, ou seja, pode-se afirmar que o currículo, para o Ensino Fundamental, deve proporcionar oportunidades para o estudo. O ensino proposto pela LDB está em função do objetivo maior do Ensino Fundamental, que é o de propiciar a todos formação básica para a cidadania, a partir da criação na escola de condições de aprendizagem. Verifica-se, com isso, como os atuais dispositivos relativos à organização curricular da educação escolar caminham no sentido de conferir ao aluno, dentro da estrutura federativa, efetivação dos objetivos da educação democrática. O processo de elaboração dos PCNs teve início a partir do estudo de propostas curriculares de Estados e Municípios brasileiros, da análise realizada pela Fundação Carlos Chagas sobre os currículos oficiais e do contato com informações relativas a experiências de outros países, seguindo a proposta da Transversalidade da Lei Básica da Reforma Educativa espanhola. Os Parâmetros Curriculares Nacionais foram elaborados pelo Ministério da Educação e do Desporto (MEC) e editados em formato de livros a partir de 1997, concomitantemente à elaboração da Lei de Diretrizes e Bases do Ensino – LDB 9.394/96. Mas, somente por volta de 1998 é que algumas escolas puderam começar 92 a estudar e planejar seus primeiros passos em direção à sua aplicação, outras em 1999 e 2000 e até estendeu-se a 2001 devido ao atraso na distribuição dos documentos em várias regiões do país. Todas as escolas tinham o direito de receber os documentos dos PCNs. Os Parâmetros Curriculares Nacionais constituem um referencial de qualidade para a educação fundamental em todo o país. Sua função é orientar e garantir a coerência dos investimentos no sistema educacional, socializando discussões , pesquisas e recomendações, subsidiando a participação de técnicos e professores brasileiros, principalmente daqueles que se encontram mais isolados, com menos contato com a produção pedagógica atual. Seu caráter não é impositivo e respeita a competência político-executiva dos Estados e Municípios, a diferença sociocultural das distintas regiões do país e a autonomia dos professores e equipes pedagógicas. Respeita também as diversidades culturais, étnicas, religiosas e políticas que ultrapassam uma sociedade múltipla, estratificada e complexa. Almeja a atuação decisiva da educação no processo de construção da cidadania, tendo como meta a crescente igualdade de direitos entre os cidadãos, baseada nos princípios democráticos. Essa igualdade implica necessariamente o acesso à totalidade dos bens públicos, entre os quais o conjunto dos documentos socialmente relevantes. As atividades escolares de ensino e aprendizagem e a questão curricular é de inegável importância para a política educacional da nação brasileira. Os PCNs têm como objetivo auxiliar na execução do trabalho do (a) professor (a), compartilhando com o seu esforço diário de fazer com que as crianças dominem os conhecimentos de que necessitam para crescer como cidadãos, 93 plenamente reconhecidos e conscientes de seus papéis em nossa sociedade e que os PCNs sirvam como um ponto de partida para uma educação científica e politicamente correta. Sabemos que isso só será alcançado se houver o acesso aos recursos culturais relevantes para a conquista de cidadania. Tais recursos incluem tantos os domínios do saber tradicionalmente presentes no trabalho escolar quanto as preocupações contemporâneas com o meio ambiente, saúde, sexualidade e também com as questões éticas relativas à igualdade de direitos e à dignidade e a solidariedade do ser humano. Educação, sem sentido amplo, consiste , segundo Fromm (1987, p. 06), em: Um conjunto de experiências pessoais, ativas, dinâmicas, mutáveis, por meio das quais o indivíduo seleciona, absorve e incorpora informações, relaciona-as com as que já dispõe em seu repertório e as organiza, expressa ou utiliza para criar novas informações, orientar suas ações, agir junto a outras pessoas ou modificar o ambiente. Nesse sentido, a proposta do MEC, aos consolidar os PCNs, é apontar metas que ajudem o aluno a enfrentar o mundo atual como cidadão participativo, reflexivo e autônomo, conhecedor de seus direitos e deveres. Os PCNs foram produzidos no contexto das discussões pedagógicas atuais e elaborados para servir de referencial para o trabalho do (a) professor (a), respeitando a sua concepção pedagógica e a pluralidade cultural brasileira. Os Parâmetros são um instrumento útil no apoio às discussões pedagógicas da escola, na elaboração de projetos educativos, no planejamento das aulas, na reflexão sobre a prática educativa e na análise do material didático. Os documentos dos PCNs apresentam uma coleção de dez volumes, sendo três deles contendo seis documentos referentes aos Temas Transversais. O primeiro 94 volume explica e justifica que é uma proposta de integrar questões sociais como Temas Transversais e o documento sobre Ética. No segundo, encontram-se os documentos de Pluralidade Cultural e Orientação Sexual∗, e no terceiro volume, os de Meio Ambiente e Saúde. A idéia do MEC era disponibilizar para cada educador um exemplar, a fim de que pudessem utilizá-lo como subsídio do projeto educativo de sua escola. Com essa proposta dos PCNs, objetiva-se a melhoria da qualidade da educação e, para tanto, é necessária a co-responsabilidade entre todos (as) os (as) educadores (as). Os PCNs, ao reconhecerem a complexidade da prática educativa, buscam auxiliar o (a) professor (a) na sua tarefa de assumir como profissional o lugar que lhe cabe pela responsabilidade e importância no processo de formação do povo brasileiro. Os documentos dos PCNs auxiliam o (a) professor (a) na tarefa de reflexão e discussão de aspectos do cotidiano da prática pedagógica a serem transformados continuamente pelo (a) professor (a), a fim de contribuir, de forma relevante, para que profundas e imprescindíveis transformações, há muito desejadas, se façam no panorama educacional brasileiro, posicionando o (a) professor (a) como o principal agente nesta grande empreitada. 4.1 EDUCAÇÃO SEXUAL NOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS No final da década de 1990, a Educação Sexual foi proposta como Tema Transversal pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, fazendo com que os (as) ∗ Termo utilizado pelos Parâmetros Curriculares Nacionais 95 professores (as) se deparassem com uma questão delicada a ser trabalhada, o tema sexualidade em sala de aula, assegurados de sua legitimidade por meio dos PCNs. O foco na educação afetiva sexual priorizou uma demanda transversal urgente à realidade escolar e ao seu entorno: sistematizar ações pedagógicas acerca da sexualidade e favorecer o debate dos tabus e preconceitos. O exercício da docência que vise contribuir para a construção de saberes a partir das necessidades de desafios exige do (a) professor (a) uma metodologia que priorize investigar, refletir, conhecer, aplicar e analisar. Para tanto, faz-se necessária a utilização de estratégias que favoreçam a transversalidade. No que diz respeito à Educação Sexual, os PCNs contribuem sobremaneira para que as escolas passem a proporcionar a ruptura do silêncio no que se refere aos tabus e preconceitos, e às situações de risco que envolvem a saúde sexual, a prevenção das DSTs/AIDS e a violência sexual. São temas que propiciaram o desenvolvimento da proposta dos PCNs devido ao caráter de urgência social. Foi a partir desta urgência que a Educação Sexual foi inserida no contexto escolar. Os PCNs prescrevem que seus conteúdos podem e devem ser trabalhados nas oito áreas de conhecimento da educação no Ensino Fundamental: Língua Portuguesa, História, Geografia, Matemática, Ciências Naturais, Arte, Educação Física e Língua Estrangeira. Estabelecem ainda os temas transversais: Ética, Educação Ambiental, Pluralidade Cultural, Saúde, Trabalho e Consumo e “Orientação Sexual”*. Ainda que os PCNs utilizem a expressão Orientação Sexual, optaremos por substituí-la neste estudo por Educação Sexual, mesmo quando se referir ao trabalho proposto pelos PCNs. * Termo utilizado pelos Parâmetros Curriculares Nacionais 96 Embora já tenha sido estabelecida a diferença da nomenclatura no capítulo anterior, é importante mencionar: liderados por Marta Suplicy, os membros do grupo paulista GTPOS – Grupo de Trabalho e Pesquisa em Orientação Sexual – propuseram o termo “orientação sexual” e criaram uma série de metodologias para o trabalho na escola. O GTPOS esteve diretamente envolvido na formulação dos Parâmetros Curriculares Nacionais e conseguiram que esta nomenclatura fizesse parte da proposta nacional, apesar de não se encontrar, nos próprios PCNs, uma justificativa pela opção desta nomenclatura. A partir do final da década de 1990, a escola então passou a ser o espaço social que abre possibilidades de discussão sobre Educação Sexual. Conclui-se que se fez necessária a Educação Sexual na escola como forma de complementar a educação recebida em casa e pela família (ou até mesmo pela ausência da Educação Sexual silenciada pela família), a fim de conscientizar sobre a prática do sexo seguro, orientada para uma vida mais saudável, evitando idéias preconceituosas e discriminatórias em relação à sexualidade, promovendo o respeito à diversidade, vinculando seus posicionamentos teóricos à abordagem política/emancipatória que considera a Educação Sexual dentro de um conceito mais abrangente, como um processo permanente de participação em lutas pela transformação dos padrões de relacionamento sexual. É este engajamento ativo que leva o indivíduo a educar-se sob o ponto de vista da sexualidade. Entre as instituições responsáveis está a escola, que passa a ser convocada a intervir na Educação Sexual dos alunos e se transformar em um locus privilegiado para tratar deste tema. Isto se justifica pela dificuldade enfrentada pelos pais. O governo se viu obrigado a se valer do ensino formal como sendo uma solução viável no momento histórico que nossa sociedade estava vivendo, iniciada no fim da 97 década de 1990 (com a AIDS) e ainda faz parte das preocupações atuais, tornandose necessário um trabalho de Educação Sexual formal, mesmo que os resultados possam aparecer em médio e longo prazo. Uma Educação Sexual adequada fornece informações e organiza espaço para realização de reflexões e questionamentos de todas as mensagens transmitidas pela mídia, pela família e pela sociedade, com as crianças e jovens. Trata-se de preencher lacunas nas informações que a criança já possui e, principalmente, criar a possibilidade de formar opinião a respeito do que lhe é ou foi apresentado. Nas palavras de Vitiello (1995, p. 21), “ao educarmos, estamos preparando o educando para a vida e despertando o potencial de humanização.” Portanto, uma Educação Sexual oferecida na escola como um tema transversal adequado fundamenta-se numa concepção pluralista da sexualidade, proporcionando uma reflexão, considerando cada indivíduo em sua singularidade e inserção cultural. Segundo Maia (2004, p. 167): Uma Educação Sexual adequada dá ênfase ao aspecto social e cultural, trabalhando os indivíduos em suas particularidades sem perder de vista o coletivo, não tendo, portanto, um caráter de aconselhamento individual ou psicoterapêutico isolado do contexto histórico. Fornece informações e promove discussões acerca de diferentes temáticas, considerando a sexualidade nas suas várias dimensões, articulando-se, portanto, a um projeto educativo que exerça uma ação ligada à vida, à saúde e ao bemestar de cada indivíduo. Nesse sentido, Ribeiro (1990, p. 18) esclarece enfaticamente essa preocupação: Torna-se necessário abordar a educação sexual criticamente, de forma que ela reflita a sexualidade partindo de um enfoque sócio-cultural, passando pelo psicológico, até chegar aos aspectos fisiológicos, sempre levando em consideração a importância do diálogo, ampliando o senso crítico e a visão de mundo do jovem, permitindo discussões e debates sem cairmos no erro de reduzir a educação sexual ao aspecto informativo, biológico e moralista. 98 A escola, ao propiciar informações atualizadas sobre a temática da sexualidade baseadas em suas experiências do dia-a-dia, mas visando ao conhecimento científico e também do ponto de vista científico explicitar os diversos valores associados à sexualidade e aos comportamentos sexuais existentes na sociedade, possibilita ao aluno desenvolver atitudes coerentes com os valores que ele próprio elegeu como seus, com vistas a promover reflexão acerca da temática sexual, contribuindo para o desenvolvimento de uma consciência crítica nos alunos. 4.2 EDUCAÇÃO SEXUAL COMO TEMA TRANSVERSAL A Educação Sexual vem consolidando sua inclusão formal nas escolas como um dos Temas Transversais. Para a implementação da Educação Sexual, uma nova metodologia foi proposta, a transversalidade. A Educação Sexual nos Parâmetros Curriculares Nacionais por meio da transversalidade significa que tanto a concepção quanto os objetivos e conteúdos propostos para a Educação Sexual encontram-se contemplados pelas diversas áreas do conhecimento. Dessa forma, o posicionamento proposto pelo tema de Educação Sexual, assim como acontece com todos os Temas Transversais, estará impregnando toda a prática educativa. Cada uma das disciplinas tratará da temática da sexualidade com sua própria proposta de trabalho. A Educação Sexual será articulada com os conteúdos das diversas áreas. Portanto, as dúvidas dos (as) alunos (as) relativas à sexualidade podem ser esclarecidas por todos (as) os (as) professores (as) a partir das demandas apresentadas pelos próprios alunos. 99 Pode também o trabalho de Educação Sexual aparecer como questões que nem sempre estão ligadas às diversas áreas dos conteúdos do currículo, seja porque tratam de questões singulares, seja porque permeiam o dia-a-dia na escola das mais diferentes formas, surgindo às vezes de maneira emergente, exigindo do (a) professor (a) flexibilidade, disponibilidade e abertura para trabalhar essas questões. A atitude do (a) professor (a), nestes casos, de acolhimento a essas expressões e da disposição para ouvir e responder a questões da sexualidade é fundamental para o trabalho de Educação Sexual que é proposto pelos PCNs como Tema Transversal. Nestes casos, o (a) professor (a) encontrará excelente oportunidade para desenvolver um trabalho extracurricular. A sexualidade provoca nas crianças uma grande variedade de sentimentos, assim como as dúvidas. Todas essas manifestações são objetos de trabalho do tema Educação Sexual. Embora sejam possíveis de serem programadas, elas acontecem inevitavelmente e, para isso, o (a) professor (a) precisa estar preparado (a). Poderá se planejar para trabalhar essas situações no momento em que elas acontecerem. O trabalho de Educação Sexual pode se dar de duas formas, de acordo com a transversalidade: • Dentro da programação: por meio dos conteúdos já transversalizados nas diferentes áreas do currículo; • Extraprogramação: sempre que surgirem questões relacionadas com a temática da sexualidade. A partir da quinta série, além da transversalização já apontada, a Educação Sexual comporta também uma sistematização e um espaço específico. Esse espaço, segundo os PCNs propõe, pode ocorrer na forma de uma hora-aula 100 semanal com os alunos (dentro ou fora da grade horária existente, a depender das condições de cada escola). Da quinta série em diante, os (as) alunos (as) já apresentam condições de canalizar suas dúvidas ou questões sobre sexualidade para um momento especialmente reservado para tal, com um professor disponível. Isso porque, a partir da puberdade, os (as) alunos (as) também já trazem questões mais polêmicas em sexualidade, já apresentam necessidade e melhores condições de refletir sobre as temáticas como aborto, virgindade, homossexualidade, pornografia, prostituição e as ansiedades que desempenham acerca da iniciação sexual, mitos sexuais etc. Se antes os (as) alunos (as) se informavam sobre o aborto, nessas séries surgem as discussões sobre as complexas questões que ele envolve. Se antes os (as) alunos (as) recebiam mensagens sobre os valores associados à sexualidade, agora vão discutir, questionar e configurar mais claramente seus próprios valores. É importante que a e Escola possa oferecer um espaço específico dentro da rotina escolar para essa finalidade. O trabalho de Educação Sexual pode ser planejado com maior detalhamento tendo de partida a montagem do programa feito por cada turma. Cabe então ao (à) educador (a) responsável a organização dos temas (a partir das questões trazidas pelos alunos), a inclusão de tópicos essenciais por vezes não levantadas pelos jovens (prevenção às doenças sexualmente transmissíveis, por exemplo) e o estabelecimento de regras necessárias para o trabalho. Essas regras devem garantir a privacidade de cada um, o respeito às posições divergentes, a construção de um clima de grupo amistoso e acolhedor em que possa ocorrer o diálogo. Ao questionar e criticar os tabus e preconceitos ligados à sexualidade e trabalhar com conhecimentos e informações que visem à promoção do bem-estar e 101 da saúde, esse trabalho se entrelaça com objetivos e conteúdos contemplados também em outros temas, principalmente Ética e Saúde. 4.3 EDUCAÇÃO SEXUAL NO CURRÍCULO DA ESCOLA DO ENSINO FUNDAMENTAL Neste cenário que contempla as novas propostas de reforma no sistema educacional brasileiro e, dentre as inovações, os chamados PCNs, visam ajudar o (a) aluno (a) do Ensino Fundamental a enfrentar o mundo atual como cidadão (ã) participativo (a), reflexivo (a) e autônomo (a), conhecedor (a) de seus direitos e deveres. (BRASIL, 1997). Os PCNs, voltados ao Ensino Fundamental, contém 10 volumes, sendo o 10º volume referente a Pluralidade Cultural e Educação Sexual. Os Temas Transversais são conteúdos informativos previstos para serem trabalhados a partir do currículo escolar em diferentes disciplinas. Examinar as inter-relações do currículo escolar com a Educação Sexual proposta como Tema Transversal é a finalidade deste tópico. Na escola e em outros contextos, os significados em torno da sexualidade que nos são ensinados ou dados por “verdadeiros”, constituem em dispositivos disciplinares que excluem tudo o que contradiz os discursos dominantes. O papel da escola deveria incidir na formação integral dos (as) alunos (as), contribuindo nesse processo e nas concepções que se tem de ensinar e aprender, bem como problematizar a educação como uma possibilidade de se alcançar a autonomia e a liberdade dos sujeitos em um sentido de ser, sentir e agir no mundo. 102 Trabalhar com uma proposta de abordar esses temas é uma luta e, ao mesmo tempo, um desafio para o (a) professor (a) devido aos tópicos ainda serem polêmicos e envolverem múltiplas visões historicamente construídas de uma cultura de negação do corpo, apesar de há dez anos já constarem nos PCNs a Educação Sexual como um dos Temas Transversais que devem ser tratados no currículo escolar. Os conteúdos dos Temas Transversais são todos de caráter social importantes de serem incluídos no currículo, de forma “transversal”, ou seja, não como área específica de conteúdo, mas ministrados no interior das várias áreas de conhecimento, perpassando cada disciplina do currículo básico do Ensino Fundamental. Ensinar sexualidade como Tema Transversal é descrito por Figueiró (1999, p. 65): De acordo com a proposta é possível de ser ensinada de duas formas: a) “dentro da programação”: o conteúdo de sexualidade proposto é organizado, planejado e dividido entre professores de cada série. Pode ser que, numa mesma série, sejam os professores de Português, História e Ciências que se considerem capazes e queiram ensinar sobre sexualidade e, assim, ensinarão o conteúdo de sexualidade dentro de suas próprias aulas. Em outra série, podem ser a professora de Matemática e a de Educação Física, por exemplo. Quando a professora é a única da sala, como acontece nas séries iniciais, necessita organizar-se para ensinar conteúdos estipulados em algumas áreas de conhecimento nas quais houver condições de inserir o tema. b) “como extraprogramação”: todo e qualquer professor, sem planejamento prévio, aproveita uma situação, um fato que acontece espontaneamente para, a partir daí, ensinar sobre sexualidade, ou transmitir uma mensagem positiva sobre ela. Aproveita, enfim, para educar sexualmente. Além das duas formas descritas de fazer a transversalidade, de acordo com os PCNs (Brasil, 1998, p. 67): Cada escola poderá criar, de 5ª a 8ª série, espaço e horário próprio para que os alunos tenham semanal ou quinzenalmente, por exemplo, aula específica de Educação Sexual. Pode ser durante o horário normal ou em horário extra, ou seja, num período no qual os alunos não tenham aula. Em cada escola, os profissionais analisarão qual a melhor forma de trabalhar e quais professores poderão se comprometer com o ensino planejado da sexualidade. 103 Os PCNs (Brasil, 1998, p. 122) delineiam possíveis resultados positivos da Educação Sexual: Experiências bem sucedidas com educação sexual em escolas que realizam este trabalho apontam para alguns resultados importantes: aumento do rendimento escolar (devido ao alívio de tensão e preocupação com questões da sexualidade), aumento da solidariedade e do respeito entre alunos. Quanto às crianças menores, os professores relatam que informações corretas ajudam a diminuir a angústia e a agitação em sala de aula. Segundo Figueiró (2006), o modelo de currículo que inclui Temas Transversais seguiu a experiência espanhola. Embora já tenha sido proposto muitos anos atrás um projeto de Educação Sexual nos moldes dos temas transversais, pos Martha Suplicy, entre outras propostas parecidas com as desenvolvidas pelos PCNs, como tema transversal. Somente após a experiência bem sucedida do modelo curricular espanhol é que foi elaborado pelo MEC, os PCNs. Chaves (1999, p. 107) afirma que, em seus estudos a respeito dos temas transversais, detectou em vários textos “aquele ranço sempre presente em que se tende a copiar tudo o que aparece no exterior.” Isto demonstra que temos muito que caminhar no sentido da valorização dos profissionais e projetos de Educação Sexual no Brasil. Ainda Chaves (1999, p. 112) argumenta sobre a importância dos Temas Transversais: Acredito que se realmente quisermos sair da situação em que nos encontramos, temos que buscar a solução mais nas humanidades do que nas disciplinas científicas, e os hoje chamados temas transversais poderão ser os nós básicos em torno dos quais eventualmente se reorganizarão os currículos escolares. O autor vai mais além em sua análise, ao defender que a introdução aos Temas Transversais em todas as disciplinas curriculares seria um primeiro passo, 104 que iria eventualmente culminar na substituição da atual matriz curricular disciplinar por uma matriz curricular temática, a ser desenvolvida em projetos. No entanto, ele próprio reconhece que seria uma tentativa brusca, nem possível, nem recomendável, no momento, de mudança de estrutura curricular. (CHAVES, 1999) Mas uma questão ficou clara a partir da proposta para os (as) professores (as) trabalharem a Educação Sexual como Tema Transversal. A Educação Sexual sistemática só pode ser feita por familiares ou por professores (as), pois apenas a família e a escola, como instituições sociais, conseguem preencher os pressupostos para atuarem de maneira contínua e duradoura. Portanto, o médico, o enfermeiro, o psicólogo ou o assistente social, quando ministram palestras em escolas, não estão exercendo a Educação Sexual sistemática, mas a assistemática, ocasional, funcionando como informadores. Claro que não podemos deixar de perceber que são tentativas que têm seus méritos e funcionam no sentido de esclarecer, desmistificar o tema, mas não podem ser consideradas medidas educadoras, mas informadoras, orientadoras, aconselhadoras. A Educação Sexual real ocorrerá com pessoas significativas (no caso da escola, a figura do professor), que podem atuar de forma contínua para a Educação Sexual. Conforme relata Figueiró (2006, p. 38) a respeito: De uma posição marginal no currículo, e mesmo na prática escolar cotidiana, abre-se um novo horizonte que, no entanto, requer um envolvimento sério e real dos profissionais da educação, para que sua inserção seja efetivada de forma concreta e qualitativamente positiva. A posição marginal na qual esteve e ainda está colocada a Educação Sexual tem sido caracterizada por diversas formas: • Não é considerada uma questão prioritária na educação escolar; • Não é colocada em prática na maioria das escolas brasileiras; 105 • É praticada em um número restrito de escolas, por iniciativa de alguns professores, isoladamente; • É praticada em algumas escolas da rede pública, por iniciativa, principalmente, de órgãos oficiais da educação e da saúde que, depois de um pequeno número de anos, interrompem o apoio efetivo; • É criticada por uma pequena parcela, porém relativamente significativa de professores e elementos da comunidade, como um trabalho não da escola, mas da família. Conforme escrevem Camargo e Ribeiro (1962), a Educação Sexual na escola brasileira, principalmente nos níveis da Educação Infantil e do Ensino Fundamental, tem sido bastante polêmica. Argumentam que muitos consideram, ainda hoje, a abordagem de questões sexuais na escola como algo não-sadio, pois estimularia precocemente a sexualidade da criança e do adolescente. Por outro lado, é fato que a discussão orientada de temas relacionados à sexualidade proporcionaria aos jovens o conhecimento da importância da vida sexual bem mais cedo e com maior profundidade. Mas isso não significa que estimula os (as) alunos (as) para uma vivência precoce da vida sexual. Ainda na ótica de Camargo e Ribeiro (2006), a discussão da necessidade da Educação Sexual na escola deveria estar resolvida. As conseqüências da ausência de informações sobre a sexualidade podem ser claramente sentidas em nossa sociedade, onde a liberdade de expressão é exercida quase na sua totalidade e a sexualidade é mostrada na televisão e em folhetins de forma fragmentada e freqüentemente deturpada. Dessa maneira, é inconcebível que o tema não seja tratado de forma sistemática, consciente e responsável na escola. 106 Diante disso, tendo-se compreendido a real necessidade da informação, segundo Camargo e Ribeiro (2006), o trabalho de Educação Sexual implica a discussão de questões sociais, éticas e morais; as relações entre liberdade, autonomia e respeito à intimidade devem estar presentes em todo trabalho educativo e, principalmente, naqueles que tratam da sexualidade. A liberdade de ação e decisão é condição fundamental para o homem e a mulher conhecerem as questões decisivas da sua vida e da sociedade na qual estão inseridos. A compreensão da sexualidade humana é essencial que ela possa ser entendida e discutida com liberdade. Segundo Camargo e Ribeiro (2006), são grandes os desafios, principalmente para o (a) educador (a) de hoje, pois o caminho do conhecimento da vida sexual se contrapõe à crescente complexidade da vida moderna. A tecnologia não favorece a reflexão sobre suas reais necessidades e vontades, pois o poder do consumo se apropriou da nossa liberdade, ou seja, nos tornou passivos. 4.4 A INCLUSÃO DA EDUCAÇÃO SEXUAL COMO TEMA TRANSVERSAL NO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO BÁSICA DO ENSINO FUNDAMENTAL (1º E 2º CICLOS) Tendo em vista o desenvolvimento do indivíduo, o conteúdo pedagógico é aplicado em cada ano do Ensino Fundamental, torna-se necessário adaptar os conteúdos específicos para cada ano, requerendo criatividade do (a) professor (a) para desenvolver atividades relacionadas ao conteúdo programático, para ser ministrado em todas as disciplinas, no 1º e 2º ciclos do Ensino Fundamental. 107 Rosistolato (2004), a sexualidade está presente na vida do ser humano desde o seu nascimento até a sua finitude. A construção da identidade sexual se dará a partir de um conjunto de fatores que incluem os aspectos biofisiológicos, socioculturais e psico-emocionais. Muitos estudiosos da Educação Sexual descrevem que até o 4º ano do ciclo inicial, os (as) educadores (a) não necessitam fazer inclusões formais sobre conceitos da esfera sexual, mas deve, sobretudo, responder a dúvidas que apareçam e trabalhar conceitos que digam respeito aos relacionamentos e à autoestima, principal correlação do ser humano para se sentir querido e crescer de forma saudável. Portanto, é a partir do 4º ano do ciclo inicial que a Educação Sexual passa a ter um caráter formal, sendo inserida nas disciplinas. Segundo Ribeiro (2002), a Educação Sexual no 1º ano pode aproveitar o processo de alfabetização para incluir alguns conceitos corporais e ir desmitificandoos sem, necessariamente, explicitar todos os significados desses conceitos, o que será feito mais tarde. Lembremos que o processo de aprendizagem é antes de tudo uma experiência emocional e sensorial, para depois ser entendida racionalmente. A criança do 2º ano do ciclo inicial pouco difere do 1º ano, a não ser quanto à estatura e ao arsenal de conhecimento, que é um pouco maior. Nesse período, normalmente o (a) professor (a) faz uma retomada da alfabetização e aprofunda os conteúdos do ano anterior. O progresso na aprendizagem é medido pela habilidade de leitura e escrita. A auto-estima também aumenta à medida que novas habilidades são apreendidas e, por conseqüência, novas conquistas alcançadas. Em Ciências, os (as) alunos (as) já adquiriram noções sobre o seu próprio corpo, as partes que o compõem e suas funções, o que possibilita ao (à) professor (a) mais elasticidade para trabalhar os conteúdos de Educação Sexual. 108 Ao passar para o 3º ano do ciclo inicial, aumentam as responsabilidades da criança quanto às tarefas escolares. Os conteúdos das disciplinas são aprofundados, novos conceitos introduzidos ou ampliados. As preferências literárias dos alunos estão voltadas para livros de aventuras, bruxas, contos de fadas, super-heróis ou histórias em quadrinhos. Aproveitar esse material para trabalhar a Educação Sexual é uma forma eficaz de fazer as emoções se organizarem e terem um significado inteligível para a criança. Perceber que as pessoas se unem amorosamente na juventude, pelos contos de fadas, por exemplo, pode auxiliar nas sensações ainda desajeitadas e não totalmente compreensível para a criança nesta faixa etária. Por vezes, relatam já sentir algo diferente por outras crianças. Também estas estórias prestam-se ao trabalho de Educação Sexual nos conteúdos das relações de gênero, papéis sexuais, relacionamentos etc. Nas aulas de História, os conteúdos estão voltados mais para datas cívicas ou outros acontecimentos históricos. Trabalhar esse conteúdo com a Educação Sexual de forma transversal a construção de uma identidade da pátria pode ser um interessante instrumento para que a criança comece a entender suas origens e os diferentes padrões de comportamento familiar e inicie um processo mais intenso de comparação em relação aos demais. Sayão (1997), o (a) educador (a), tanto da disciplina de História quanto de Geografia, pode aproveitar para trabalhar na transversalidade a Educação Sexual através de provocar a curiosidade de seus (as) alunos (as) para a observação do comportamento das pessoas de diferentes cidades, seus costumes e forma de relacionamento. Isso também sugere a construção de um “saber” sexual na medida 109 em que envolvemos o ser humano num todo, sendo seu comportamento sexual também influenciado pelo ambiente. Em Ciências, estudam-se a Terra e os recursos naturais, o ar, a água, o solo, as plantas, os animais e os programas de saúde. Os conteúdos de Ciências, mais do que quaisquer outros componentes curriculares, prestam-se à introdução de questões relativas à sexualidade humana. Caberá ao (à) professor (a) aproveitar de forma transversal todo esse arsenal de conhecimento e passar aos alunos noções sobre a sexualidade humana tão necessária ao seu desenvolvimento. Ribeiro (2002), geralmente, os (as) alunos (as) do 3º ano do ciclo inicial interessam-se por experimentos científicos, e não raro, podemos observá-los colecionando pequenos animais ou insetos ou realizando experiências como a germinação de feijões ou outras sementes, um bom gancho para abordar a questão da reprodução de forma a cumprir com a transversalidade em Educação Sexual. O 4º ano do ciclo inicial é um período da vida escolar em que os (as) alunos (as) sofrem nítidas transformações, não só quanto à parte comportamental, mas também quanto à parte física. Nesta fase, término do 1º ciclo, os (as) alunos (as) vêem aumentada a sua responsabilidade, os conceitos são ampliados em função da preparação para enfrentar o 2º ciclo, bem como em relação aos (às) professores (as) responsáveis, cada qual por uma área do conhecimento. É um estágio em que meninos andam sempre em grupos, tendo objetivos comuns como brincar ou jogar bola, e geralmente com os cabelos espetados por gel, bermudas grandes e folgadas e tênis. As meninas, mais precoces com relação à sexualidade, pintam os lábios, usam sapatos com saltinho, portam diários e agendas cheios de corações, músicas ou poesias. Costumam escrever bilhetinhos ou cartas apaixonadas com corações e 110 beijos estampados. Quando brigam entre elas, a razão é a disputa pelo menino mais bonito da sala. Algumas delas são brindadas pela 1ª menstruação ou menarca. Essas transformações hormonais ocorrem de maneira mais ou menos perceptível, ocasionando choro e irritabilidade. Esse é um período dos mais ricos em exteriorização da sexualidade humana, e caberá ao (à) professor (a) capacitado (a) fornecer aos (às) alunos (as) subsídios sobre sua própria sexualidade. É nessa fase que ocorre uma ruptura da metodologia utilizada pelo (a) professor (a) do ano anterior, além do distanciamento na relação professor-aluno, uma vez que o (a) aluno (a) irá se defrontar com seis a sete professores diferentes. O fato também é agravado pelas transformações físicas e psicológicas pelos quais o (a) aluno (a) passa ao entrar para a puberdade. Todos esses entraves fazem do 1º ano do 2º ciclo, o 5º ano, um dos mais difíceis em termos de indisciplina e adaptação dos (as) alunos (as) na escola. A partir da quinta série, além da transversalidade, a Educação Sexual comporta também uma sistematização e um espaço específico. Esse espaço pode ocorrer, por exemplo, na forma de uma hora-aula semanal, dentro ou fora da grade horária existente, a depender da condição de cada escola. Rosistolato (2004), da quinta série em diante, os (as) alunos (as) já apresentam condições de canalizar suas dúvidas ou questões sobre sexualidade para um momento especialmente reservado para tal. Isso porque, a partir da puberdade, os (as) alunos (as) também já trazem questões sobre sexualidade e já apresentam necessidade e melhores condições para refletir sobre temáticas como aborto, virgindade, homossexualidade, pornografia, prostituição, relacionamento sexual, desempenho sexual, disfunção sexual e outras. início de 111 São temas que refletem as preocupações e ansiedades dos (as) jovens, dizem respeito ao que eles (as) vêem, lêem e ouvem, despertando curiosidades. As novelas também participam ativamente nesse processo ao colocarem esses temas na ordem do dia-a-dia. Questões como mãe de aluguel, hermafroditismo, homossexualidade, novas tecnologias reprodutivas, por exemplo, são trazidas por meio da veiculação da mídia, aparecendo como demanda efetiva de conhecimento e debate. Mediante a reflexão, é possível desvendar os valores que os orientam, possibilitando questionamentos e posicionamentos que precisam ultrapassar os estreitos limites dos preconceitos, desenvolvendo o pensamento crítico. Ao questionar tabus e preconceitos ligados à sexualidade e trabalhar com conhecimentos e informações que visam à promoção do bem-estar e da saúde, o trabalho de Educação Sexual se entrelaça com objetivos e conteúdos contemplados também nos outros temas transversais (Ética, Saúde, Trabalho e Consumo, Pluralidade Cultural e Meio Ambiente), pois a finalidade do trabalho de Educação Sexual é preparar o indivíduo para a vida sexual, propiciando um crescimento de dentro para fora, num processo reflexivo voltado para a formação de atitudes referentes à maneira de viver a sexualidade de forma feliz e responsável. Esse tema vincula-se ao exercício da cidadania na medida em que propõe o desenvolvimento do respeito a si e ao outro e contribui para garantir direitos básicos a todos, como a saúde, a informação e o conhecimento. Ao educarmos, entretanto, estamos preparando o educando para a vida e despertando o potencial de humanização. Aliás, Santo Tomás de Aquino já dizia que educação não é algo que se transmita ao aluno, mas sim algo que nele se desperta. 112 Os assuntos de relevância social podem ser objeto do trabalho de Educação Sexual, quaisquer que sejam eles. Porém, os eixos básicos de atuação permanecem, já que todos os assuntos precisam incluir as dimensões do corpo, as relações de gênero e a prevenção das doenças sexualmente transmissíveis/AIDS na sua discussão do currículo escolar como Tema Transversal. 4.5 OS TRÊS EIXOS TEMÁTICOS PROPOSTOS PELOS PCNs Os blocos de conteúdo foram organizados seguindo critérios de seleção. Segundo Brasil, PCNs (1996), a vivência da sexualidade em cada indivíduo inclui fatores oriundos de ordens distintas: aprendizado, descoberta e invenção. O trabalho de Educação Sexual pode se nortear pelas questões que pertencem à ordem do que pode ser apreendido socialmente, preservando assim a vivência singular das infinitas possibilidades da sexualidade humana, e pela ordem do que pode ser prazerosamente aprendido, descoberto e (ou) inventado no espaço da privacidade de cada um. Assim, buscou-se selecionar os conteúdos segundo os seguintes critérios: • Relevância sociocultural, isto é, conteúdos que correspondam às questões apresentadas pela sociedade no momento atual; • Consideração às dimensões biológica, psíquica e sociocultural, buscando contemplar uma visão ampla e não reducionista das questões que envolvem a sexualidade e o seu desenvolvimento no ambiente pessoal; • Possibilidade de conceder a sexualidade de forma saudável, prazerosa e responsável. 113 A Educação Pedagógica da Sexualidade visa intervir numa dada situação, promovendo reflexão e mudança no (a) aluno (a). Com os PCNs, a escola passou a ser incentivada a desenvolver projetos de Educação Sexual que viessem a contemplar o debate sobre os três pontos específicos utilizados como eixos norteadores: corpo humano como matriz da sexualidade, relações de gênero e prevenção de doenças sexualmente transmissíveis/AIDS. 4.5.1 Corpo: matriz da sexualidade Este eixo de conteúdo proposto pelos PCNs faz uma diferenciação entre corpo e organismo, sendo este último um aparato herdado e constitucional, ao passo que no conceito de corpo estão incluídas as dimensões da aprendizagem e todas as potencialidades do indivíduo para a apropriação de suas vivências, seguem a linha de uma visão atual como das concepções da sexualidade emancipatória e política, porque considera o corpo também como uma construção histórica e cultural. A partir dessa diferenciação, vê-se que a abordagem sobre corpo deve ir além das informações sobre sua anatomia e funcionamento, pois os órgãos não existiriam fora de um corpo que pulsa e sente. O corpo é concebido como um todo integrado, de sistemas interligados e que inclui emoções, sentimentos, sensações de prazer/desprazer, assim como as transformações nele ocorridas ao longo do tempo. Há que se considerar, portanto, os fatores culturais que intervêm na construção da percepção do corpo, que inclui as dimensões biológica, psicológica e social. O que se busca é construir noções, imagens, conceitos e valores a respeito do corpo em que esteja incluída a sexualidade como algo inerente, saudável, necessária e desejável da vida humana. As idéias e concepções veiculadas pelas 114 diferentes áreas (Língua Portuguesa, Matemática, Ciências Naturais, História, Geografia, Artes e Educação Física) contribuem para a construção dessa visão do corpo pela explicitação das dimensões da sexualidade nos seus conteúdos. Por exemplo, a inclusão de conhecimentos a respeito de como a sexualidade é vivida em diferentes culturas, em diferentes tempos, em diferentes lugares e como se expressa por meio de vestuário, cuidados pessoais, regras, interdições e valorização de comportamentos (o hábito presente em algumas culturas de as mulheres tomarem banho vestidas, a nudez e a liberdade entre as crianças indígenas brasileiras etc.). A Educação Física, que privilegia o uso do corpo e a construção de uma “cultura corporal”, é um excelente espaço onde o conhecimento, o respeito e a relação prazerosa com o próprio corpo podem ser trabalhados. Da mesma forma, a dança e o teatro, na área de Artes, podem ser trabalhados na transversalidade em relação ao conteúdo do corpo. Em Ciências, ao ser abordado o corpo (infantil e adulto, do homem e da mulher) e suas anatomias interna e externa, é importante incluir o fato de que os sentimentos, as emoções e o pensamento se produzem a partir do corpo e se expressam nele, marcando-o e constituindo o que é cada pessoa. A integração entre as dimensões físicas, emocionais, cognitivas e sensíveis, cada uma se expressando e interferindo na outra, necessita ser explicitada no estudo do corpo humano, para que não se reproduza a sua concepção de conjunto fragmentado de partes. Com o mesmo cuidado devem necessariamente ser abordados as transformações do corpo que ocorrem na puberdade, os mecanismos da concepção, gravidez e parto, assim como a existência de diferentes métodos contraceptivos e sua ação no corpo do homem e da mulher. Todos esses itens são trabalhados de forma que, ao mesmo tempo que se referem a processos corporais individuais de uma pessoa, se possa 115 pensar sobre eles também na relação com outras pessoas, enfatizando o aspecto dos vínculos estabelecidos ao longo de toda a vida. Dessa forma, podem ser trabalhadas questões fundamentais ligadas à sexualidade, como gostar e cuidar do corpo que se tem, respeitá-lo tanto no aspecto físico como psicológico. O respeito a si próprio, ao seu corpo e aos seus sentimentos é a base para haver possibilidade de um relacionamento saudável com o outro. O questionamento da imposição de certos padrões de beleza veiculados pela mídia, principalmente a propaganda, se faz pertinente na medida em que interferem na auto-imagem das crianças e jovens. O conhecimento do corpo e de seu funcionamento propicia uma maior conscientização da importância da saúde e da necessidade de ações não só curativas mas também preventivas. A escola pode, então, atuar de forma integrada com os serviços públicos de saúde da região. Num trabalho inicial, ou com crianças menores, o estudo do corpo infantil e adulto deve incluir os órgãos envolvidos na reprodução e zonas erógenas privilegiadas, em sua anatomia externa. Deve também favorecer a percepção das relações existentes entre sentimentos e expressões corporais; reações corporais diante de diferentes estimulações sensoriais; e observação das características do próprio corpo. Deve ainda abordar a participação diferenciada do homem e da mulher no processo da fecundação, estabelecer a comparação no processo reprodutivo de diferentes espécies animais, gestação e nascimento. A continuidade do trabalho se dá pela retomada desses conteúdos de forma ampliada e aprofundada. A ampliação deste bloco de conteúdos é feita com a inclusão do estudo sobre as transformações globais da puberdade. Estas devem ser 116 vistas no plano corporal e no aspecto relacional/social. As transformações do corpo consistem em: aceleração do crescimento, surgimento dos caracteres sexuais secundários diferenciados nos meninos e nas meninas e amadurecimento das potencialidades sexuais e reprodutivas. O aprofundamento deve ser feito de forma a detalhar as questões já vistas, complementando-as com novas informações (por exemplo, no estudo da anatomia do corpo humano, incluir o estudo dos órgãos internos do aparelho reprodutor e seu funcionamento, a amamentação etc.). O educador, coerentemente com a abordagem proposta, não deve descuidar da vivência dessas mudanças pelos (as) alunos (as). Propõe-se, portanto, que o (a) professor (a) acolha a necessidade de discussão dos medos provocados por essas mudanças, o ritmo e o tempo em que elas ocorrem e que variam bastante de jovem para jovem, as mudanças gestuais e posturais que se dão em conseqüência do crescimento rápido; enfim, a acomodação necessária a esse novo corpo que muda. São também abordadas as mudanças socialmente estabelecidas e relacionadas à idade e sua repercussão nas relações familiares e sociais. Essa abordagem deve facilitar às crianças maior contato, conhecimento e conseqüentemente a apropriação de seu próprio corpo; a partir daí, propiciar a extensão desse conhecimento para o corpo em transformação do (a) adolescente e o corpo do adulto, destacando então as potencialidades reprodutivas. O (a) educador (a) pode utilizar diferentes materiais para essa finalidade (didáticos, científicos, artísticos etc.), analisando e comparando a abordagem dada ao corpo pela ciência e pela propaganda, por exemplo; discutindo e questionando o uso de um certo padrão estético veiculado pela mídia. Pode também incentivar a produção (coletiva e individual) das representações que as crianças têm sobre o corpo, por meio de desenhos, colagens, modelagem, etc. 117 Nas atividades relacionadas com este bloco é importante que nenhum (a) aluno (a) se sinta exposto diante dos demais. Um recurso possível para evitar que isso aconteça é o da criação/adoção de um personagem imaginário pelo grupo de crianças. Por intermédio desse personagem pode-se trabalhar dúvidas, medos, informações e questões das crianças ligadas ao corpo, de forma a ninguém se sentir ameaçado ou invadido em sua intimidade. Com relação à linguagem a ser utilizada para designar partes do corpo, o mais indicado é acolher a linguagem utilizada pelas crianças e apresentar as denominações correspondente adotadas pela ciência. Ao iniciar o trabalho relativo às mudanças do corpo ou às potencialidades reprodutivas, é importante investigar o conhecimento prévio que os (as) alunos (as) têm sobre o assunto. Em geral, mesmo quando não têm informações objetivas, as crianças imaginam algo a respeito, pois são questões muito significativas e que mobilizam nelas uma grande curiosidade e ansiedade. A explicitação dessas informações/fantasias a respeito da reprodução possibilita abordar o assunto de modo claro, diminuir a ansiedade, e assimilar noções corretas do ponto de vista científico. O (a) educador (a) deve estar atento para a necessidade de repetir o mesmo conteúdo já abordado. As crianças vivem suas curiosidades e interesses na área da sexualidade em momentos próprios e diferentes umas das outras, ocorrendo muitas vezes estudo e a discussão de um tema com pouca apropriação desse conhecimento passa-se para outro. A retomada é importante e deve ser feita sempre que as questões trazidas pelos alunos apontarem sua pertinência. Conteúdos a serem trabalhados: 118 • As transformações do corpo do homem e da mulher nas diferentes fases da vida, dentro de uma perspectiva de corpo integrado, envolvendo emoções, sentimentos e sensações ligadas ao bem-estar e ao prazer do autocuidado; • Os mecanismos de concepção, gravidez e parto e a existência de métodos contraceptivos; • As mudanças decorrentes da puberdade: amadurecimento das funções sexuais e reprodutivas; • Aparecimento de caracteres sexuais secundários; variação de idade em que inicia a puberdade; • Transformações decorrentes de crescimento físico acelerado; • O respeito ao próprio corpo e ao corpo do outro; • O respeito aos (às) colegas que apresentam desenvolvimento físico e emocional diferentes; • O fortalecimento da auto-estima; • A tranqüilidade na relação com a sexualidade. 4.5.2 Relações de Gênero Neste segundo eixo de conteúdo proposto pelos PCNs, apresentam uma proposta de trabalhar as desigualdades de gênero como sendo um dos pilares de sustentação das atividades de Educação Sexual de forma transversal na escola. Tem como objetivo a inclusão desse núcleo, o resgate da dignidade e igualdade da pessoa humana, a participação ativa de ambos os gêneros na sociedade e a responsabilidade pela vida social, além das oportunidades entre homens e mulheres em direito de igualdade. 119 Ao abordar a relação de gênero no sentido de construção da eqüidade, os PCNs consideram a escola como uma forma de divulgação de idéias de eqüidade, com uma visão baseada na construção de direitos de cidadania. Afinal, não adiantaria falar de métodos contraceptivos, por exemplo, sem discutir a coresponsabilidade pelo seu uso. Desde muito cedo, são transmitidos padrões de comportamento diferenciados para homens e mulheres. O conceito de gênero diz respeito ao conjunto das representações sociais e culturais construídas a partir da diferença biológica dos sexos. Enquanto o sexo diz respeito ao atributo anatômico, no conceito de gênero toma-se o desenvolvimento das noções de “masculino” e “feminino” como construção social. O uso desse conceito permite abandonar a explicação da natureza como a responsável pela grande diferença existente entre os comportamentos e lugares ocupados por homens e mulheres na sociedade. Essa diferença historicamente tem privilegiado os homens, na medida em que a sociedade não tem oferecido as mesmas oportunidades a ambos. Mesmo com a grande transformação dos costumes e valores que vêm ocorrendo nas últimas décadas ainda persistem muitas discriminações, por vezes encobertas, relacionadas ao gênero. Todas as diferenças existentes no comportamento de homens e mulheres refletem-se na vivência da sexualidade de cada um, nos relacionamentos a dois e nas relações humanas em geral. A discussão sobre relações de gênero tem como objetivo combater relações autoritárias, questionar a rigidez dos padrões de conduta estabelecidos para homens e mulheres e apontar para sua transformação. A flexibilização dos padrões visa permitir a expressão de potencialidades existentes em cada ser humano e que são 120 dificultadas pelos estereótipos de gênero. Como exemplo comum pode-se lembrar a repressão das expressões de sensibilidade, intuição e meiguice nos meninos ou de objetividade e agressividade nas meninas. As diferenças não devem ficar aprisionadas em padrões pré-estabelecidos, mas podem e devem ser vividas a partir da singularidade de cada um, apontando para a eqüidade entre os sexos. Ao se observar o comportamento diferenciado dos (as) alunos (as) dos primeiros ciclos, vêem-se inúmeras situações que dizem respeito à questão dos gêneros. No primeiro ciclo, geralmente ocorre o agrupamento espontâneo das crianças por sexo, sendo mais dificultado o relacionamento entre meninos e meninas. Esse movimento pode e deve ser respeitado, desde que não implique a desvalorização do outro. Trata-se de um movimento que se relaciona com a construção da identidade de cada criança, em que primeiramente é preciso afirmarse como menino ou como menina a partir das semelhanças e afinidade de interesses típica da idade e sexo. Vêem-se então os “clubes do bolinha” ou “da luluzinha” e também as amizades exclusivas entre pares. Já no segundo ciclo costuma haver, espontaneamente também, uma aproximação entre eles, revelandose mais claramente a curiosidade pelas diferenças. Com a puberdade há maior entrosamento e atração entre meninos e meninas. Essa aproximação não se dá sem conflitos, medos e por vezes agressões de diferentes intensidades. Muitas vezes o (a) professor (a) é chamado (a) a intervir nesses conflitos ao mesmo tempo em que pode propor situações de trabalho em conjunto como estratégia de facilitação das relações entre meninos e meninas. Para os conteúdos desse bloco as articulações privilegiadas são relacionadas com as áreas de História, Educação Física e todas as situações de convívio escolar. 121 A abordagem das relações de gênero com as crianças dessas faixas etárias, convém esclarecer, é uma tarefa delicada. A rigor, pode-se trabalhar as relações de gênero em qualquer situação do convívio escolar. Elas se apresentam de forma nítida nas relações entre os (as) alunos (as) e nas brincadeiras diretamente ligadas à sexualidade. Também estão presentes nas demais brincadeiras, no modo de realizar as tarefas escolares, na organização do material de estudo, enfim, nos comportamentos diferenciados de meninos e meninas. Nessas situações, o (a) professor (a), estando atento (a), pode intervir de modo a combater as discriminações e questionar os estereótipos associados ao gênero. Os momentos e as situações em que se faz necessária essa intervenção são os que implicam discriminação de um aluno em seu grupo, com apelidos jocosos e às vezes questionamento sobre sua sexualidade. O (a) professor (a) deve então sinalizar a rigidez das regras existentes que definem o que é ser menino ou menina, apontando para a imensa diversidade dos jeitos de ser. Também as situações de depreciação ou menosprezo por colegas do outro sexo demandam a intervenção do (a) professor (a) a fim de se trabalhar o respeito ao outro e às diferenças. A intervenção, por parte do (a) professor (a), de momentos de convivência e de trabalho com alunos (as) pode ajudar a diminuir a hostilidade entre eles, além de propiciar observação, descobertas e tolerância das diferenças. Essa convivência, mesmo quando vivida de forma conflituosa, é também facilitadora dessas relações, pois oferece oportunidades concretas para os questionamentos dos estereótipos associados ao gênero. É igualmente importante que se eleja um (ou mais) momento(s) em que esse tema seja diretamente abordado, como trabalho planejado e sistematizado. Leitura e análise de notícias ou de obras literárias são boas formas de informar e promover 122 discussões a respeito de valores e atitudes ligados à questão. No estudo dos conteúdos de História, podem ser trabalhados os comportamentos diferenciados de homens e mulheres em diferentes culturas e momentos históricos, o que auxilia os (as) alunos (as) a entenderem as determinações da cultura em comportamentos individuais. Conteúdos a serem trabalhados: • A diversidade de comportamento de homens e mulheres em função da época e do local onde vivem; • A relatividade das concepções tradicionalmente associadas ao masculino e ao feminino; • O respeito pelo outro sexo, na figura das pessoas com as quais se convive; • O respeito às muitas e variadas expressões do feminino e do masculino. Nesse bloco, os (as) professores (as) podem incluir o item relacionamento porque os tems afeitos às emoções (amor, raiva, tristeza, paixão etc), bem como os tipos de relacionamento possíveis (amizade, namoro, casamento, união estável etc) cabem nas relações de gênero, mas não estão necessariamente focadas no conceito “gênero”. Dentro de cada bloco, podemos desenvolver os mais variados temas. 4.5.3 Prevenção às Doenças Sexualmente Transmissíveis/AIDS Os conteúdos principais a serem trabalhados neste eixo são as informações sobre a existência de doenças sexualmente transmissíveis (colocadas genericamente, não sendo necessário enumerar as mais conhecidas), em especial a AIDS, incluindo esclarecimentos sobre os fatos e os preconceitos a ela associados. 123 Se, de uma maneira geral, o trabalho de Educação Sexual visa desvincular a sexualidade dos tabus e preconceitos, afirmando-a como algo ligado ao prazer e à vida, na discussão das doenças sexualmente transmissíveis/AIDS o enfoque deve ser coerente com os princípios gerais e não deve acentuar a ligação entre sexualidade e doença ou morte. As informações sobre as doenças devem ter sempre como foco a promoção de condutas preventivas, enfatizando-se a distinção entre as formas de contato que propiciam risco de contágio daquelas que, na vida cotidiana, não envolvem risco algum. Particularmente em relação à AIDS, o tratamento que esse tema deve ter em Educação Sexual é o oposto ao que foi dado por algumas campanhas de prevenção veiculadas pela mídia: “AIDS mata”. Essa mensagem contribui para o aumento do medo e da angústia, desencadeando reações defensivas. A mensagem fundamental a ser trabalhada é “AIDS, previna-se!” O trabalho com esse tema, ao mesmo tempo em que fornece informações sobre AIDS, possibilita a explicitação dos medos e das angústias suscitados e a abordagem dos diferentes mitos e obstáculos emocionais e culturais que impedem a mudança de comportamento necessária à adoção de práticas de sexo seguro. Dentre os obstáculos emocionais vale destacar os mecanismos de onipotência e de negação entre os (as) adolescentes, que demandam um espaço contínuo de discussão para que possam vir à tona e modificar-se. Deve-se discutir a discriminação social e o preconceito de que são vítimas os (as) portadores (as) do HIV e os (as) doentes de AIDS, por intermédio dos direitos de cidadania e da proposição da adoção de valores como a solidariedade, o respeito ao outro e a participação de todos no combate aos preconceitos, apresentando 124 como contraponto os direitos individuais e sociais existentes e explicitando a importância desses valores para a manutenção da vida nas pessoas contaminadas. A maioria das crianças a partir de sete anos já entrou em contato de alguma forma com a existência da AIDS, inclusive porque nos últimos anos intensificaram-se as campanhas preventivas veiculadas pela mídia. Essas campanhas priorizam os públicos adolescente e adulto ao enfatizar as formas de prevenção como o uso de preservativo (proteção necessária para inibir o contágio por contato sexual). Dada a idade das crianças dos primeiros ciclos, deve-se abordar a repercussão dessas informações, esclarecer e informar sobre a doença e tratar da prevenção por contato sangüíneo, essa sim passível de ocorrer com crianças dessa faixa etária. Esses conteúdos articulam-se principalmente com as áreas de Ciências Naturais e Língua Portuguesa (mediante os textos escolhidos). O momento mais propício para se abordar esse tema é quando algo a ele referente é trazido pelos (as) próprios (as) alunos (as) ou é vivido por aquela comunidade escolar. Se isso não ocorrer, o (a) professor (a) deve abordar a questão. Também aqui se faz particularmente importante o levantamento do conhecimento prévio dos (as) alunos (as) sobre as doenças sexualmente transmissíveis e sobre a AIDS, pois se constata a existência de um grande volume de informações errôneas e equivocadas sobre elas. A diferença entre “doente de AIDS” e “portador (a) do vírus HIV” está na presença ou não dos sintomas. Também se deve retomar a discussão sobre o corpo e os cuidados oferecidos pelos serviços de saúde. O (a) professor (a) deve basear-se nas proposições gerais do tema Saúde, ou seja, o enfoque deve ser para a saúde e não para a doença. Conteúdos a serem trabalhados: • O conhecimento da existência de doenças sexualmente transmissíveis; 125 • A compreensão das formas de prevenção e vias de transmissão da AIDS; • A comparação entre as formas de contato que propiciam contágio e as que não envolvem riscos; • Recolher, analisar e processar informações sobre a AIDS, por meio de folhetos ilustrados, textos e artigos de jornais e revistas; • O conhecimento e a adoção dos procedimentos necessários em situações de acidente ou ferimentos que possibilitem o contato sangüíneo; • O repúdio às discriminações em relação aos (às) portadores (as) de HIV e doentes de AIDS; • O respeito e a solidariedade na relação com pessoas portadoras do vírus HIV ou doentes de AIDS. 4.6 EDUCAÇÃO SEXUAL E O CONTEÚDO PEDAGÓGICO APLICADO NO CURRÍCULO DO ENSINO FUNDAMENTAL Educar tem um sentido amplo, implicando comprometimento, não somente com a instrução, ou seja, com o mero repasse de informações, mas, sobretudo, com a formação integral do indivíduo. E a escola é uma das instituições culturais que vem se orientando para cumprir esta função, abrangendo de forma holística a necessidade do (a) aluno (a). Não resta dúvida, a partir daqui, que a sexualidade é pedra de toque na existência de todos os indivíduos, e por isso, merece a atenção dos (as) educadores (as). Ribeiro (2002), no passado, a sexualidade era ignorada tanto pelos pais quanto pelos (as) professores (as). Crianças e adolescentes eram tratados como seres assexuados; falar sobre sexo nas salas de aula era considerado um estímulo 126 à atividade sexual. O (a) aluno (a), de sua parte, também não reivindicava este espaço. Não poderia ser diferente. Afinal, não se sabia fazer de outra forma, pois toda a sociedade encarava a sexualidade de forma pouco transparente. Em suma, o sexo era assunto a ser tratado entre quatro paredes. Em não se discutindo o assunto, imaginava-se que o conhecimento viria naturalmente, trazendo respostas às indagações. Essa alienação quanto à maturidade dos (as) filhos (as), a ausência da educação sexual e a propagação de informações errôneas acarretaram e acarretam conseqüências nas novas gerações. O número crescente de casos de gravidez não planejada entre adolescentes, os casos de abuso sexual, o aumento das doenças sexualmente transmissíveis - inclusive a AIDS - e o aumento do número de abortos demonstram a necessidade de discutir abertamente o assunto. Nesse contexto é que se ressalta a importância da implantação da Educação Sexual nas escolas, contemplando-se, desta forma, o desenvolvimento global do ser humano. De acordo com Castro et al. (2004), a escola vem assumindo cada vez mais a Educação Sexual, procurando a metodologia adequada de ensino na área da sexualidade humana. Concentra-se na democratização do acesso à escola, bem como na necessidade de socialização das crianças e a promoção do seu processo formativo como cidadãs. Busca também a demanda por uma educação continuada, que prepare crianças e jovens para as mudanças culturais e para a sociedade informatizada. Isso foi possível porque com o desenvolvimento das Ciências surgiram os desafios à Educação Sexual. A ciência moderna trouxe conhecimentos que modificaram a visão sobre a sexualidade e as questões de educação sexual. Freud foi um dos estudiosos que mais contribuiu para colocar em pauta a questão da sexualidade, na medida em que referia-se com clareza à existência da 127 sexualidade na criança, dando-lhe um caráter de normalidade. Depois, algumas áreas do conhecimento, tais como a psicologia, a biologia, a psicanálise e a pedagogia passaram a ocupar-se também da sexualidade infantil. Finalmente, os estudos de Michel Foucault deixaram heranças para o mundo contemporâneo com implicações na prática pedagógica. Hage (2006) explica que a afirmação de uma sexualidade reprimida na ótica de Foucault é acompanhada de um discurso destinado a dizer a verdade sobre o sexo. Ele coloca a hipótese repressiva numa economia geral dos discursos sobre sexo a partir do século XVII. Mostra que todos esses elementos negativos ligados ao sexo (proibição, repressão etc.) têm uma função local e tática numa colocação discursiva por parte dos teóricos da sexualidade, que enfatizam a necessidade de que se diga a verdade nos bancos escolares. Como diz Aratangy (1998, p.14): “A escola tem de falar de sexo, é impossível que não se fale. Porque a sexualidade está lá, nas conversas de corredor, na ansiedade de sala dos professores, nos grafites das carteiras e dos banheiros”. Portanto, a escola não pode mais se omitir perante essa temática. Falar a respeito da sexualidade já é válido, por si só, uma vez que significará mais que o silêncio, a mudez que tem predominado na história de Educação Sexual na escola. O simples fato de os (as) alunos (as) perceberem que os (as) professores (as) da escola estão dispostos a conversar sobre a sexualidade pode gerar efeitos positivos. De acordo com a proposta dos PCNs, as dúvidas relativas à vivência afetivosexual deveriam ser esclarecidas por todos (as) os (as) professores (as) a partir das demandas apresentadas pelos (as) alunos (as). Esta nova metodologia implantada pelos PCNs pelo trabalho da Educação Sexual como tema transversal, teve a intenção que diluísse o caráter impositivo do currículo educacional, fazendo com que 128 os (as) alunos (as) apenas recebessem informações suficientes para que pudessem refletir e tomar decisões individuais. Trata-se de uma mudança significativa uma vez que desloca o foco das ações dos (as) professores (as) acostumados (as) com um currículo tradicional. Ao organizar-se para cumprir essas novas funções, a escola acaba por promover alterações em seus currículos da seguinte forma: - As atividades devem ser incluídas na programação anual, o que promove mudanças significativas na organização dos tempos e dos espaços escolares. - Os PCNs prevêem que as escolas devem se organizar para adequar os temas transversais à sua própria realidade. - Pretende que a proposta não seja impositiva. - Permite a manutenção da diversidade e pluralidade cultural existente em cada escola. Gusmão comenta (1997, p. 58): Os currículos escolares refletem um conjunto de expectativas sociais sobre os estudantes e as funções sociais da escola. Tais definições ocorrem através de diálogo entre a instituição e a sociedade de forma que os currículos escolares são a materialização daquilo que cada cultura entende que deva ser ensinado as crianças e adolescentes. São, portanto, o resultado das classificações sociais existentes entre os profissionais da escola, explicitados a partir de sua autopercepção como profissionais da educação e também das classificações sociais geradas em processos mais amplos que envolvem toda a sociedade. 129 Segundo Figueiró (2006, p. 56): Os conteúdos a serem incluídos no currículo como tema transversal foram relacionados com base nos seguintes critérios estabelecidos: - Urgência social; - Abrangência nacional; - Possibilidade de ensino e aprendizagem no ensino fundamental; - Possibilidade de favorecer a compreensão da realidade e a participação social. De acordo com Figueiró (2000, p. 9): A Educação Sexual pode ser incluída, então, por atender a todos os critérios acima. Penso que o fator mais decisivo foi, sem dúvida, a urgência social, o que é totalmente válido e fundamentado. Uma coisa fica clara: se não fossem os problemas que a vivência da sexualidade trouxe para a sociedade, ele não estava entrando no currículo escolar. Sem dúvida, um trabalho preventivo é importante que faça parte dos objetivos do ensino escolar. Com relação a ser uma “cópia da experiência espanhola”, Figueiró (2006 p. 70) faz uma complementação relevante: “No Brasil no período de 1961 a 1969, os colégios vocacionais do Estado de São Paulo desenvolveram um trabalho de Educação Sexual, a meu ver, nos moldes da transversalidade”. Pimentel (1971, p. 79) relatam essa experiência: Explicitam claramente como a Educação Sexual era inserida no currículo e no processo educativo como um todo. Para isso, citam exemplos de programação das disciplinas, mostrando como estavam integradas com a orientação educacional no desenvolvimento do plano de Educação Sexual. Essa explanação é feita com relação às quatro séries ginasiais (que correspondem às 5ª, 6ª, 7ª e 8ª séries do 2º ciclo do Ensino Fundamental) e engloba a programação das seguintes disciplinas: Estudos Sociais; Português; Ciências; Educação Física; Educação Musical; Educação Doméstica; Artes Plásticas; Artes Industriais. Figueiró (2006, p.71) conclui sua análise quanto a este ponto: “Isso vem demonstrar que, “infelizmente”, não temos atitude profissional de buscar conhecer e 130 valorizar as nossas próprias experiências. É um descaso para com a nossa história da educação sexual”. Suplicy também há tempos já defendia a idéia da transversalidade, porém sem usar a mesma denominação. Vejamos a afirmação de Suplicy (1998, p.15): E diversas matérias do currículo ensejam discussões paralelas _ textos históricos, de literatura nacional e em língua estrangeira, em biologia ou ciências podem contribuir para uma abordagem sistemática da “Orientação Sexual”. Assim como atividades extracurriculares: teatro na escola, por exemplo. Todos contribuem. Os PCNs (Brasil, 1997 p. 64) conceituam temas transversais: Não constituem novas áreas no currículo da Educação Básica, mas antes um conjunto de temas que aparecem transversalizados no currículo das áreas definidas, isto é, permeando a concepção, os objetivos, os conteúdos e as orientações didáticas de cada área no decorrer de toda a escolaridade obrigatória. A transversalidade pressupõe um tratamento integrado das áreas e um compromisso das relações interpessoais e sociais escolares com as questões que estão envolvidas nos temas, a fim que haja uma coerência entre valores experimentados na vivência que a escola propicia aos alunos e o contexto intelectual com tais valores. A escola há muito tempo está organizada em uma concepção de currículo tradicional. E o conceito de transversalidade proposto pelos PCNs para ser implantado na escola, está fundamentado em concepções diferentes do currículo tradicional fundamentado em que as disciplinas e os conteúdos são fragmentados. Dentro da proposta dos PCNs a transversalidade baseia-se na inter/transdisciplinaridade. Vechia (2007, p. 08) comenta: A história da educação nos revela que este modelo de escola que temos estruturado em séries ou anos e, principalmente a concepção de currículo tem suas raízes no século XIX, fragmentava as tarefas e conhecimento. Em diversos países europeus e no Brasil a sua inclusão no currículo escolar se faz sentir de forma mais marcante a partir da segunda década do século XX. 131 É certo que a implantação e efetivação da educação sexual no currículo escolar na sua transversalidade é um processo lento e moroso, mas é imprescindível conjugar esforços dos vários setores, no que as universidades devem ter um papel preponderante, na realização de pesquisas, a formação de educadores, e o trabalho em conjunto com Secretarias Municipais e Estaduais para acompanhar e dar suporte às experiências propostas pelo PCN, de colocar a Educação Sexual no currículo escolar de forma transversal. Para isso, tornam-se imprescindíveis: - A necessidade e a importância de se incluir nos cursos de Pedagogia, Licenciatura, Psicologia, Medicina e demais áreas da saúde, em sua grade curricular ao menos uma disciplina da área Sexologia e Educação Sexual. - Assim como incluir no currículo a sexualidade e desenvolvimento. - Reflexões sobre os papéis de gênero. Porque como trabalhar a sexualidade como um tema transversal, se em nenhum momento dos cursos da área de Educação pára-se para estudar um tema tão controvertido e porque não dizer difícil. Abrangente mas de grande importância na vida do ser Humano. 4.7 O (A) PROFESSOR (A) COMO EDUCADOR (A) SEXUAL A proposta de Educação Sexual como Tema Transversal pelos PCNs fez com quem os (as) professores (as) se deparassem com uma questão delicada a ser trabalhada em sala de aula. Segundo os PCNs, a Educação Sexual foi proposta para que todos (as) os (as) professores (as) pudessem atuar, por entender que é o (a) professor (a) agente 132 que cria as condições para o (a) aluno (a) aprender e que o auxilia em sua aprendizagem. A proposta dos PCNs quanto à Educação Sexual foi formulada por Marta Suplicy e pelo GTPOS, composto por psicólogos (as), médicos (as), educadores (as) etc. Porém, professores (as) do Ensino Fundamental não participaram deste grupo que formulou os PCNs no que se refere à Educação Sexual. Este pode ter sido um ponto limitador inerente ao processo de elaboração dos PCNs. Silva (1996, p. 81) comenta que outro ponto limitador da proposta dos PCNs “é quanto ao viés psicologizante que permeia tanto a noção do currículo e de educação quanto a fundamentação teórica dos textos, especialmente no volume introdutório”. Há quem se mostre descrente em relação à viabilidade dos temas transversais, a exemplo de Nunes e Silva (2000 p. 67): “Nossa preocupação é quanto a metodologia e ao suporte teórico aos professores para o trabalho cotidiano com o tema, especialmente no caso da sexualidade”. Aguiar (1996), Moreira (1995) e Silva Junior (1998) salientam alguns limites e riscos na aplicação dos PCNs, como o de incorrer numa atuação voluntarista e de forma improvisada, que pode levar ao ecletismo e à banalização do assunto. Segundo eles o tratamento transversal do tema não exige que o trabalho seja assumido com o rigor científico necessário para a compreensão da abrangência da sexualidade na vida cultural do ser humano. Nunes e Silva (2000, p. 65): “Reconhecem que a introdução da Educação Sexual, como tema transversal é uma conquista e um caminho para nos aproximarmos de algo mais objetivo, no sentido e direção de uma Educação Sexual emancipatória”. 133 Figueiró (2000, p. 23), comenta sobre a viabilidade dos temas transversais: “A Educação Sexual pode ser dificultada por vários fatores. Entre eles incluem-se: Os limites impostos pela bagagem dos professores (as); Precariedade dos seus contextos de formação e de atuação profissional”. Todos esses autores citados defendem a concepção emancipatória e política da Educação Sexual. E parece que esses pontos limitadores inerentes à proposta dos PCNs levantados por esses autores encontram-se em ressonância com o pensamento contido nos documentos dos PCNs, porque no volume introdutório dos PCNs, está explícito o reconhecimento do MEC, das reais condições precárias em que a escola se encontra e de que, para que as propostas contidas nos PCNs possam concretizar-se com qualidade, são necessárias: De acordo com os PCNs (Brasil, 2000, p. 38): Uma política que contemple a formação inicial e continuada dos professores, uma decisiva revisão das condições salariais, além da organização de uma estrutura de apoio que favoreça, o desenvolvimento do trabalho, acervo de livros e obras de referência, equipe técnica para a realização do trabalho de qualidade, aspectos que, sem dúvida, implicam a valorização da atividade do professor. Mas, infelizmente, pouco se tem visto de esforços governamentais nesta direção. Existem alguns projetos pilotos ocorrendo em algumas escolas dos vários estados do país, mas sem uma abrangência maior em que todas as escolas públicas pudessem ser beneficiadas. Assim como auxílio e suporte de algumas ONGs no trabalho de capacitação de professores (as) como a exemplo de uma das escolas pesquisadas neste estudo, que recebe apoio oferecido pela ONG “Rede da Vida” que professores (as) que voluntariamente manifestem interesse de participar do projeto de Educação Sexual para professores (as) e alunos (as), com objetivo de se tornarem multiplicadores (as). 134 Portanto, para que os temas transversais possam inserir-se, efetivamente, no processo de ensino, torna-se fundamental que os (as) professores (as) possam atuar interdisciplinarmente, que tenham a possibilidade de reunir-se para poder planejar em conjunto, para dar conta de um ensino sistematizado. Mas para que isto aconteça é necessário encarar a escola pública como um local de trabalho, onde os (as) professores (as) possam permanecer nas instituições tempo suficiente para se fazer este planejamento. Silva Junior (1995, p. 17): “Para que as pessoas se organizem ou sejam organizadas, é preciso, antes de tudo, que elas se encontrem em seu cotidiano de trabalho. Sem a presença física do trabalhador individual o trabalho coletivo não se constitui, e também o projeto político não se elabora”. Estamos nos referindo neste momento sobre a jornada de trabalho do (a) professor (a), que se não ocorrer uma renovação do ensino no que se refere à delimitação do local de trabalho. Isto significa lutar para que o (a) professor (a) possa vir a atuar em uma única escola para que possa passar nela o tempo suficiente para desenvolver trabalho com qualidade e satisfação. E dessa forma tornar-se viável, ao menos possível o ensino da sexualidade, segundo a proposta de transversalidade. Para não se esbarrar no limite da falta de tempo, na dispersão do trabalho do (a) professor (a), que muitas vezes tem que se deslocar rapidamente de uma escola para chegar a tempo de lecionar em outra instituição, que freqüentemente é distante uma da outra. Isto quando o (a) professor (a) não atua em até mais de duas instituições, tendo uma jornada de trabalho longa e exaustiva. 135 De acordo com Perrenoud (1997, p.58): O professor vê-se freqüentemente dividido entre os seus projetos de longo prazo e a preparação do dia seguinte; cada atividade ocupá-lo-ia horas a fio se quisesse fazer as coisas a sério, até o fim, refletindo o tempo necessário. O professor limita-se a ir ao essencial, com um sentimento de culpa, em numerosas atividades, por não ter podido fazer mais e melhor. De acordo com o autor, a prática pedagógica caracteriza-se por numerosos momentos de dispersão ao longo do dia de trabalho, porque o (a) professor (a) precisa realizar muitas atividades como planejar aula, corrigir trabalhos, relatórios de aula, atender solicitações de alunos (as), pais, colegas, enfim, tudo que envolver o trabalho pedagógico. O Sociólogo Perrenoud (1997 p. 59) prossegue na análise da dispersão do trabalho do professor: Alguns professores conseguem, sem dúvida, dentro do tempo de que dispõem, administrar de forma clara, as prioridades, a começar pelas coisas mais importantes, só investindo nas atividades secundárias quando o essencial está assegurado. Essa organização racional, que evita ao máximo a dispersão, não é certamente adotada por todos os professores. Mas, uma certa desordem e uma certa dispersão são, sem dúvida, inseparáveis do fazer e da criatividade que existem no trabalho solitário do professor. É claro que, além do deslocamento de uma escola a outra, com esse tempo despendido no trânsito, uma longa jornada de dois e até três períodos de aulas que lecione, não podemos deixar de fora a vida pessoal, as emergências com a saúde da família, os desejos inerentes ao ser humano, que mesmo não tendo prioridade, acabam por muitas vezes cedendo a estes desejos de fazer coisas simples, como comprar alguma coisa etc. Acaba contribuindo para a dispersão na profissão docente, mesmo no caso daquele professor (a) metódico (a) prático (a) rotineiro (a) e principalmente daquele professor (a) criativo (a) e inovador (a). 136 Nóvoa (1997, p. 87) diz: “Chama a atenção para o perigo da sobrecarga permanente de atividades. Que são eles os fatores que contribuem para a proletarização do trabalho docente.” Temos que fazer a seguinte reflexão: O (a) professor (a) assumindo o compromisso com a transversalidade, não aumentaria ainda mais a vertigem da dispersão? Acredita-se que sim, uma vez que o (a) professor (a) vai acabar despendendo parte de seu tempo para organizar formas de ensinar, que possibilitem a transversalidade dos temas propostos pelos PCNs. E, além disso, os conteúdos da transversalidade só poderão ser cumpridos com a reunião e o planejamento em conjunto com os outros professores (as) da instituição. Perrenoud (1997 p. 66) comenta: É no envolver-se em “montes de coisas”, ao dizer, constantemente, de muitos projetos e pôr em prática, que uma pessoa sente que vive plenamente. A dispersão, bem como o stress e a exaustão que a acompanham são uma forma de escapar à rotina e ao aborrecimento. As mesmas coisas feitas tranqüilamente, de forma ordenada, despenderiam, sem dúvida, menos energia, mas seriam, ao mesmo tempo, mas banais. Figueiró (2006 p. 65): É possível crer que o ensino dos temas transversais, pelo fato de os temas sociais, poder ajudar a caracterizar, de uma nova forma, o processo de dispersão. Permitindo ao professor ampliar os horizontes de sua área de conhecimento e envolver-se com projetos variados, desta forma pode leválo a obter mais prazer ao ato de ensinar e retroalimentar o sentido e o significado que atribui para seu trabalho. Trabalhar temas como sexualidade pode fazer com que o (a) professor (a) sinta satisfação, por ver que seu trabalho como educador (a) tem mais chances de 137 estar ligado à vida, para aqueles (as) professores (as) que se preocupam com a formação integral do educando. Como aponta Bono (1998, p. 32): “O entendimento claro do sentido e do significado do trabalho docente é fundamental para promover mudanças na prática pedagógica. Na confluência dos temas transversais os professores podem chegar ao processo de redimensionamento da forma como vêem seu trabalho”. É na escola, com os (as) professores (as), que os (as) alunos (as) entram em contato com outros valores e significados, diferentes daqueles adquiridos pela família, religião etc. A partir daí o trabalho do (a) professor (a) com o tema transversal sexualidade torna-se importante de ser observado. Visto que é através dos valores confrontados que os alunos poderão elaborar sua própria conduta. Esse papel que ao (à) professor (a) foi delegado, de trabalhar o tema sexualidade, torna-se mais importante ainda, porque a família, muitas vezes, esquiva-se dos assuntos e vivências sexuais dos jovens, acaba por não lhes oferecer uma Educação Sexual que realmente os auxilie em suas dúvidas e (ou) dificuldades. Ao contrário, os pais mediante o não-dito, muitas vezes passam mais ainda a repressão, assimilado pela criança o prisma monolísta da sexualidade. Embora assistindo a muitas modificações nestas últimas décadas, a sexualidade continua ainda muito velada, mesmo de modo não consciente. É essa visão de mundo que recebemos da família, por meio de seus sistemas e valores. Segundo Lane (1981, p. 45): “Só irá ser confrontada no processo de socialização secundária, através da escolarização e profissionalização”. Assim como a família, a escola, nos moldes tradicionais nas quais a conhecemos, é uma instituição que tende a reproduzir o descomprometimento da família. Até porque, os (as) professores (as) são seres humanos oriundos do mesmo 138 contexto. Portanto, passíveis dos mesmos despreparos em relação à sexualidade, com ditos e não ditos inadequados ao desenvolvimento de uma sexualidade sadia. Então, como abordar a sexualidade adequada se esta estiver ausente no (a) próprio (a) professor (a)? Em outras palavras, quem educa o (a) educador (a)? Pois, como todos sabemos, os cursos profissionalizantes, de maneira geral, muito pouco ou às vezes nada ensinam sobre sexualidade, sequer sobre os preceitos mais básicos de anatomia e fisiologia, quanto menos sobre o comportamento sexual. Quando a escola propicia treino ao (à) professor (a) ou ele (a) próprio (a) busca, por sua conta, um preparo sobre o tema sexualidade, pode assumir uma postura que promova discussão participativa entre os (as) alunos (as) e não emite julgamento de valor, do que é “certo” ou “errado”. A metodologia utilizada, segundo Vitiello (2000, p. 103), deve ter as seguintes características: • • • • • • Participativa: deve haver comunicação horizontal entre todos os participantes, tendo todos iguais direitos de serem ouvidos e terem suas dúvidas discutidas; Dialógica: o núcleo de atenção dessa metodologia deve ser o livre diálogo, sendo todos os aspectos dos temas discutidos com ampla participação. Deve-se partir do princípio que todos, inclusive o “educador”, tem algo a ganhar com o diálogo; Baseada na realidade sócio-cultural: as situações devem ser apresentadas e analisadas dentro de um contexto sócio-cultural em que se valorize o quotidiano dos participantes; Desenvolvida com criatividade: não devem existir fórmulas prontas, mas sim um roteiro genérico onde irão se inserindo, com criatividade, soluções para situações emergentes das discussões; Intimista: todos os participantes devem ter suas vivências pessoais compartilhadas, sem censura e sem julgamentos; Lúdica: finalmente, é importante que se acentue o lado lúdico da educação. É importantíssimo que fique claro para todos que o ganho de conhecimentos e o desenvolvimento de atitudes não precisa ser um processo aborrecido e desagradável. Devemos lembrar que pode-se dizer sizudamente grandes asneiras, e que sorrindo também se pode expressar grandes verdades. 139 Outro fato que vale a pena ressaltar sobre os (as) professores (as) que assumem o trabalho de Educação Sexual é que não tem que ser o (a) professor (a) de Biologia, como geralmente se pensa. Segundo a proposta dos PCNs, todos (as) os (as) professores (as) podem atuar como educador (a) sexual. O (a) professor (a) de Biologia está freqüentemente comprometido (a) com os aspectos biológicos da sexualidade. Portanto, é preferível para exercer essa atividade uma pessoa que tenha uma visão mais abrangente do tema, porque se o sexo é biológico, a sexualidade é, sobretudo, cultural. É claro que podem ter professores (as) de Biologia empenhados (as) com o tema sexualidade de forma mais abrangente e preparados (as) para atuarem como educadores (as) sexuais. No entanto, o que é importante deixar claro é que a Educação Sexual pode ser exercida por professor (a) de qualquer formação e disciplina. Geralmente, o (a) professor (a) que vai poder atuar como educador (a) sexual acaba sendo eleito (a) pelos (as) próprios (as) alunos (as). São aqueles (as) que são procurados (as) pelos (as) alunos (as) para dar um conselho ou um esclarecimento, seja qual disciplina o (a) professor (a) ministre. Mas, por ser de confiança do (a) aluno (a) para poder influenciar o (a) educando (a) oferecendo condições e meios para que cresça interiormente e cuja influência positiva possa acompanhar o (a) aluno (a) no decorrer de toda a sua vida. E o quanto à educação de todos nós não será mais bela e real quando formos inteiros (as), repensando nossa sexualidade em diálogo aberto e franco com nós mesmos (as) e com os outros, para sermos mais humanos como educadores (as). O (a) professor (a) que assume o trabalho com Educação Sexual em seu cotidiano escolar pode ser professor (a) de qualquer disciplina. O importante é que seja uma pessoa que tenha um bom contato com os (as) alunos (as) e, portanto, um 140 (a) interlocutor (a) confiável e significativo para acolher as expectativas, opiniões e dúvidas, sem impor as suas próprias opiniões. Importante é que o (a) professor (a) tenha interesse e disponibilidade para esse trabalho, assim como flexibilidade e disposição pessoal para conhecer e questionar seus próprios valores, respeitando a diversidade dos valores atribuídos à sexualidade na sociedade atual. Para Cavalcanti (1993), o (a) educador (a) sexual deve ser uma pessoa que tenha consciência e segurança para lidar com as angústias, as confusões, os medos e conflitos sexuais gerados por múltiplas pressões familiares e sociais. Deve ser flexível, sensível, inspirar confiança e ser ágil para abrir espaço no qual o adolescente converse sobre várias coisas. Sobretudo, ser aquele que mostre neutralidade, evitando dizer o que está certo ou errado, pois cada família tem seus valores. E valores “são uma espécie de farol que orienta nossa conduta, dependendo muito dos nossos conhecimentos e das nossas crenças”. (CAVALCANTI, 1993, p. 89) Os Parâmetros Curriculares Nacionais questionam as dificuldades enfrentadas pelos pais e mães que não têm preparo para conversar com seus (suas) filhos (as) sobre sexualidade. Algumas das perguntas mais freqüentes são: Como falar? Quando começar? O que dizer? Dado os avanços tecnológicos como, por exemplo, a Internet e a televisão a cabo colocam o (a) jovem em contato com todo o tipo de informação, inclusive, de cunho sexual. Dessa maneira, surge o risco de o (a) jovem envolver-se com pornografia ou ser vítima de pedofilia. Assim, não se pode negar que a Educação Sexual, nos dias atuais, é fundamental na idade escolar, trazendo o esclarecimento para a própria defesa do (a) jovem. Embora ainda haja dificuldades para a implantação, sua relevância e 141 necessidade já foram reconhecidas. Entretanto, quem é o (a) profissional que atua hoje nas escolas? Estará ele (a) capacitado (a) para cumprir esta tarefa? Como a escola pode melhor promover a Educação Sexual de seus (suas) alunos (as)? O número de profissionais preparados (as) para Educação Sexual continua insuficiente, não obstante seja grande o número de estabelecimentos de ensino que procuram promovê-la. Em sua formação, seja nos cursos de magistério, seja nas universidades, os (as) professores (as) não recebem qualquer orientação em educação sexual. Por esse motivo, falar sobre sexo na escola continua sendo uma tarefa complicada. Contudo, a proposta de incluir temas sobre sexualidade no plano pedagógico da escola tem incentivado o desenvolvimento das ações, na sala de aula, pelo (a) professor (a). A tentativa de atender aos Parâmetros Curriculares Nacionais (1997) implica em uma definição clara dos princípios que deverão nortear o trabalho de Educação Sexual e sua explicação para toda a comunidade escolar envolvida no processo educativo dos (as) alunos (as). Esses princípios determinarão desde a postura que se deve ter em relação às questões relacionadas à sexualidade e suas manifestações na escola até os conteúdos a serem trabalhados com os (as) alunos (as). A coerência entre os princípios adotados e a prática cotidiana da escola deverá pautar todo o trabalho. Ainda segundo os PCNs, nas séries iniciais, os temas podem ser abordados, com naturalidade, quando, por exemplo, estiver sendo enfocado o estudo do corpo humano. A observação do funcionamento corporal, das diferenças entre meninos e meninas ou, ainda, a discussão a respeito de como os bebês nascem podem servir como ponto de partida. Estar atento ao nível de maturidade da 142 turma é importante, pois indicará ao (à) professor (a) até que ponto poderá aprofundar nos temas. Perceber que é mais fácil lidar com assuntos sobre as quais detêm maior conhecimento pode ser um dos caminhos para diminuir dificuldades. Buscar a capacitação profissional, ampliar a compreensão sobre a sexualidade, aprofundar conceitos, revisar valores e instrumentalizar-se com técnicas de dinâmica de grupo auxiliam na formação profissional dos (as) professores (as). Contribuem, de outro modo, para diminuir a transmissão de preconceitos aos (às) alunos (as). Segundo os Parâmetros, a educação sexual deve ser iniciada o mais cedo possível pelos adultos que convivem com a criança, a partir de um diálogo franco e num clima de confiança e respeito mútuo. Não há necessidade, nem seria adequado, determinar um espaço de tempo especial para esse começo. As crianças, pela observação das diferenças biológicas entre o homem e a mulher (genitálias externas, caracteres secundários), logo começam a formar sua identidade sexual. Um menino percebe que é biologicamente igual ao pai e diferente da mãe e da irmã dando início, dessa forma, ao processo da construção da identidade cultural. O mesmo acontece com as meninas. Na perspectiva dos PCNs (1997), diante da curiosidade infantil acerca de temas sexuais, algumas observações simples facilitam o processo de esclarecimento: • encarar com naturalidade as perguntas feitas pela criança; • respeitar a curiosidade infantil; • responder aos questionamentos com segurança; • deixar espaço aberto para outras perguntas (não responder mais do que foi perguntado); • falar sempre a verdade; • utilizar os termos corretos e adequados à idade da criança; • reagir com naturalidade; • não temer desconhecer a resposta (quando não souber, dizer que vai buscar a informação); • não dar respostas prontas, mas ajudar a pensar. 143 Não se deve esquecer que a família e a escola devem estar unidas na tarefa; ambas têm responsabilidade quando se trata de esclarecer o (a) jovem sobre a sua sexualidade e, portanto, devem estar articuladas na sua realização. A educação sexual deverá fazer parte do projeto pedagógico da escola e ser desenvolvida pelos (as) próprios (as) professores (as), em suas turmas. Os PCNs propõem que os temas sejam apresentados por meio da transversalidade dos conteúdos (isto é, presentes em todas as áreas do conhecimento). Uma vez discutidos, os assuntos devem voltar, com conteúdo mais aprofundado, todas as vezes que houver interesse, por parte dos (as) alunos (as). Muitas escolas, por não se sentirem plenamente capacitadas para a discussão, convidam pessoas de fora do universo escolar (médicos, psicólogos, especialistas) para realizarem palestras aos (às) alunos (as). A prática demonstrou que esse recurso é considerado ineficaz. Falar sobre sexualidade requer intimidade e ela só acontece entre pessoas conhecidas e confiáveis. Assim, aqueles (as) profissionais podem contribuir, e muito, na capacitação dos (as) professores (as) para que estes possam, então, desenvolver ações com as crianças e com os (as) adolescentes que objetivem a construção de uma visão positiva da sexualidade. Cita Aquino (1997) que a escola, ao oferecer a educação sexual, estará contribuindo efetivamente para que seus (suas) alunos (as) desenvolvam a comunicação clara nas relações interpessoais, elaborem valores a partir do pensamento crítico, compreendam o próprio comportamento e tomem decisões responsáveis a respeito de sua vida sexual, agora e no futuro. 144 4.8 O PREPARO DO (A) PROFESSOR (A) ENVOLVIDO (A) COM A EDUCAÇÃO SEXUAL De acordo com Camargo e Ribeiro (2006), o trabalho de Educação Sexual na escola deve ser realizado de tal forma que permita a participação constante dos (as) alunos (as) por meio de discussões que privilegiem o posicionamento de cada um (a) quanto ao tema em debate, assim como o levantamento e discussão das dúvidas, das divergências e dos pontos em comum. As autoras acreditam que a formação do (a) professor (a) implica a formação de uma atitude crítica e de compromisso em relação ao sexo, buscando favorecer a reflexão e o estudo dos fatos que influem na vida sexual e facilitando as relações interpessoais e uma interpretação positiva e consciente da própria sexualidade. De acordo com Vitiello (1997, p. 81), para atuar junto aos (às) alunos (as), o (a) educador (a) sexual deverá conquistar os seguintes atributos: • Estar satisfeito com sua própria sexualidade; • Ter coragem para desafiar seus próprios tabus e preconceitos acerca do tema; • Reconhecer suas falhas; • Ter facilidade para comunicar-se com os educandos, ter abertura intelectual, moral e afetiva para não se sentir no direito de fazer julgamentos sobre o que é certo ou errado; • Ter tolerância para com a orientação sexual do outro e ter conhecimentos adequados sobre os diversos aspectos da sexualidade. Segundo Camargo e Ribeiro (2006), o conjunto dessas reflexões indica que, atualmente, não é mais possível que as questões relativas à sexualidade passem despercebidas ou que sejam tratadas com deboche ou indignação moral. Felizmente 145 se começam a incluir tais questões no círculo dos grandes problemas e a discuti-Ias, em qualquer faixa etária, com a seriedade que sua importância merece. Explicam Camargo e Ribeiro (2006) que, para que ocorram transformações e inovações pedagógicas no ensino e nas escolas, há necessidade e urgência de uma organização diferente do processo didático, do espaço físico e do tempo para que as crianças se constituam por meio de interações, da integração e da participação. A autodisciplina, a autonomia, a liderança, a atividade criadora fazem parte da dimensão metodológica em que o aluno e a aluna produzem o seu conhecimento a partir de materiais e desafios constantes. Dessa maneira, o material didático e pedagógico deve sair das fronteiras da sala de aula e utilizar os recursos da comunidade, que se transformam em laboratório vivo e permanente. Segundo Camargo e Ribeiro (2006), os PCNs oferecem a idéia de que o (a) educador (a) proporcione ao (à) aluno (a) um espaço onde haja estímulo à invenção, em um clima em que o interesse e a curiosidade da criança sejam considerados. Assim, o exercício de escolha ante um leque de possibilidades gera a coordenação de pontos de vista e a integração com os demais membros de um grupo: a criança tem possibilidade de conviver com as decisões coletivas, com a organização de normas de convivência. Considerando a teoria de Candau (1985), o papel do (a) professor (a) que lida com a educação sexual deve se empenhar pelas múltiplas dimensões da didática. O papel não é apenas buscar novos procedimentos de ensino como meio de facilitar o trabalho do educador e da educadora e a aprendizagem do educando e da educanda, mas considerá-los no contexto em que foram gerados que envolvem a visão de ser humano, de sociedade e de conhecimento. 146 Os Temas Transversais referem-se às preocupações emergentes em nossa época e objetivam a formação integral do ser humano, não rejeitando as disciplinas curriculares. Essa forma de trabalho por parte do (a) professor (a) envolvido (a) com a Educação Sexual implica, entretanto, uma mudança de postura. Devem buscar compreender a realidade escolar não como algo fragmentado, mas tendo como eixos a autonomia da vida diária, a educação da afetividade, as formas de convivência e a cooperação, a ajuda e os direitos e deveres mais elementares. Candau (1985) cita que o compromisso, portanto, dos Temas Transversais, é com a construção da cidadania, o que implica praticar princípios éticos - respeito, solidariedade, responsabilidade, uso construtivo da cidadania, liberdade e autonomia - e princípios políticos - direitos e deveres da vida cidadã. Tais princípios devem ser exercidos a partir das instituições governamentais federais, estaduais e municipais, das coordenadorias de ensino, das direções de escolas, dos (as) professores (as), dos alunos e alunas e das famílias. O desenvolvimento da autonomia possibilitado pelo professor permite aprimorar as relações interpessoais; a sociedade necessita de pessoas capazes de respeitar as opiniões dos demais e, por sua vez, defender os próprios direitos. De acordo com Busquets et al. (1993), com esta iniciativa, a inventividade da criança e do (a) educador (a), o levantamento de hipóteses sobre os assuntos, o interesse e a curiosidade permeariam todo o processo educativo. Na maioria das vezes, os conhecimentos que dizem respeito à afetividade: relacionamentos pessoais, cidadania, direitos e deveres, considerados pilares da solidariedade e da cooperação humana, em geral são omitidos pela escola. Além de a afetividade estar ausente nos currículos, a agressividade encontra-se presente, quer em estudos acríticos das guerras e conflitos, quer na competitividade do dia-a-dia da escola. 147 É importante lembrar que todos os conteúdos que podem ser abordados em um programa de Educação Sexual, em maior ou menor grau, têm um componente afetivo. O (a) educador (a) pode favorecer atividades para aprofundar as concepções que as crianças têm sobre a afetividade e para conhecer o modo como se relacionam com a sexualidade, permitindo assim a construção dos afetos. Compreende-se que o grande princípio do respeito mútuo é necessário ao convívio social. No caso da sexualidade, suas relações com a moral não devem se restringir a direitos, embora deva contemplá-los necessariamente, mas deve também procurar situar a vida sexual na procura da felicidade pessoal. Os currículos dos cursos de formação de professores (as) deveriam conter falas e vivências sobre a sexualidade humana, despertando as possibilidades do corpo e das emoções. De acordo com Camargo e Ribeiro (1999, p. 50), “conhecer a sexualidade não significa aprender a estrutura dos genitais. Educação Sexual centrada na genitalidade advém de uma educação que disciplina, organiza e concentra o prazer nos genitais; assim procedendo, anestesia o resto do corpo”. Nesse sentido, não há um silêncio na escola em relação à sexualidade. O que vem ocorrendo é o funcionamento do mecanismo de interdição, ou seja, podese falar de sexualidade das crianças, mas dentro de regras que controlam e legitimam o discurso autorizado, como o biológico, o da família, da criança inocenteassexuada e o pedagógico. No discurso biológico presente na escola, o corpo é concebido como pura anatomia, em que a sexualidade se reduz ao conhecimento das estruturas dos sistemas reprodutores masculinos e femininos. Nesse discurso, a sexualidade é concebida como genitalidade, um atributo biológico, compartilhado por todos os seres humanos, independente de sua história cultural. 148 Reiteramos que neste estudo buscamos pensar a sexualidade e as pedagogias escolares de outra maneira, ou seja, como uma construção sóciohistórica, privilegiando uma Educação Sexual emancipatória. No Brasil, a Educação Sexual passou e passa por movimentos que avançam e recuam e ainda não está incorporada ao sistema educacional. Considera-se também que mesmo uma proposta intencional e sistematizada carrega a concepção de mundo idealista, a-histórica e maniqueísta demandando aprofundamento na temática. A metodologia de trabalho para a Educação Sexual, segundo Fernández (1994), deve contemplar o ser humano como uma realidade única, singular, que articula construtivamente um organismo individual herdado, a inteligência interacionalmente construída e a estrutura do desejo, transversalizados em um corpo e em um contexto sociocultural. Todos, educadores (as) e alunos (as), ao lidar com a temática da sexualidade, devem organizar, estruturar, explicar, em um contexto de vida e também de ação, os objetos do conhecimento que estão imersos em um sistema de relações sociais no qual a informação, produzida pela sociedade capitalista, digital, informatizada, globalizada e complexa, é cada vez mais rápida. A sociabilidade, os costumes, os sonhos, os desejos sociais, ecológicos, culturais, de gênero encontram-se em plena mutação, segundo Rolnik (1986). A competência do (a) profissional da educação implica, dessa forma, enxergar o processo educativo sob uma perspectiva multidimensional, considerando a internalidade e a comunicabilidade de suas próprias experiências. Essa opção metodológica permite dar visibilidade ao cotidiano e às suas contradições. 149 Comenta Gonçalves e Palhaes (2005, p. 14): Mas foi lançado um desafio ao professor, implementar o seu plano de ensino, colocando a educação sexual como tema transversal, desde os primeiros anos escolares. Para tanto, é importante que o professor busque conhecimento sobre sexualidade para não transmitir conhecimentos errôneos, tendo em vista a capacidade cognitiva e o entendimento de seus alunos, sempre levando em conta: informação, formação e prevenção. A maioria dos (as) professores (as) de nosso país não teve a felicidade de aprender a refletir sobre a sexologia e também sobre educação sexual em sua formação profissional. Grande parte não teve a oportunidade de conviver com adultos capazes de discutir sobre sexo em sua infância. Portanto, o (a) educador (a) tem razões compreensíveis ao enfrentar dificuldades em tratar dos temas ligados à sexualidade humana que não sejam aqueles circunscritos aos fenômenos biológicos. 150 5 PESQUISA DE CAMPO 5.1 METODOLOGIA DA PESQUISA Buscando saber se estão implementando ações de Educação Sexual segundo a concepção dos (as) professores (as) de duas escolas públicas da cidade de Curitiba/PR. Optou-se por um enfoque qualitativo por se tratar de pesquisa exploratória, ou seja, estimula os (as) investigados (as) a pensarem livremente sobre algum tema, objeto ou conceito. Elas fazem emergir aspectos subjetivos e atingem motivações não explícitas, ou mesmo inconscientes, de maneira espontânea. São usadas quando se buscam percepções e entendimento sobre a natureza geral de uma questão, abrindo espaço para a interpretação. Segundo Bueno (2001, p. 263), Busca-se com a pesquisa qualitativa, significados profundos, permitindo compreender particularmente aquilo que se pretende estudar. A forma pela qual os dados são coletados faz-se através da comunicação entre os sujeitos pesquisados e o tratamento dos dados é feito pela interpretação. Cada um dos sujeitos da pesquisa foi contatado individualmente, sendo-lhes explicado o objetivo da pesquisa e, ainda, aproveitando a oportunidade, foram colhidos alguns dados pessoais dos envolvidos, a sua formação etc. Nesse contato informal, os (as) professores (as) colocaram vários aspectos sobre a sua visão de ser professor (a), o grau de contentamento ou não na profissão. Após essa etapa, o questionário foi entregue a cada professor (a), individualmente, os quais foram respondidos no mesmo dia, nas próprias instituições onde lecionam, e devolvidos também na mesma data para a pesquisadora. 151 Bueno (2001, p. 264) diz: “os significados que as pessoas dão às coisas ou à sua vida, são focos de atenção especial pelo pesquisador e existe sempre uma preocupação em captar como os sujeitos encaram as questões que estão sendo focalizadas”. O questionário utilizado é composto por onze questões, cinco perguntas abertas e seis semi-abertas, com espaço para justificativas, a trinta professores de ambos os sexos de duas escolas da Rede Estadual de Ensino Fundamental. O questionário foi elaborado com as seguintes intenções: na pergunta 1, sobre o entendimento sobre a sexualidade, teve como intencionalidade compreender qual concepção do investigado sobre a sexualidade humana, procurando compreender como o (a) professor (a) contextualiza a sexualidade e em que perspectiva o (a) professor (a) entende a sexualidade, que é uma questão tão polêmica na atualidade. No mesmo sentido, elaboramos a segunda questão referente ao entendimento do (a) professor (a) sobre a Educação Sexual, almejando encontrar professores (as) com uma compreensão da Educação Sexual na abordagem emancipatória ou verificar que seus entendimentos sobre Educação Sexual estão associados a outras abordagens, reducionistas ou não, para perceber se os (as) investigados (as) relacionam a Educação Sexual ao compromisso com a transformação social e se percebe a influência histórico-cultural na Educação Sexual. Quanto à questão 3 e 4, sobre o significado do Tema Transversal e se compreendem o trabalho proposto pelos PCNs na transversalidade, tivemos como intenção perceber se, após 10 anos de implantação da legalização da Educação 152 Sexual na escola, os (as) professores (as) mais antigos quanto os mais novos tiveram acesso a este projeto do MEC e o que compreendem acerca do tema. Na questão 5 verifica-se a realização ou não de atividades de Educação Sexual com os (as) alunos (as) no cotidiano escolar e também se os (as) professores (as) estão implementando ações sobre Educação Sexual ou não e de alguma forma tem cumprido esta proposta dos PCNs e se encontra apoio e incentivo por parte da escola. A 6ª questão complementa ou contradiz a questão anterior, quando se quer saber se a escola trabalha ou não com o tema e qual a justificativa para o trabalho com o tema ou não. Tivemos a intenção de saber a percepção ou não da importância do trabalho de Educação Sexual na escola. Na questão 7, sobre quais professores (as) ou profissionais responsáveis por esta questão, desejamos compreender se realmente o (a) professor (a) incorporou como sendo sua a responsabilidade pela Educação Sexual ou se pensam que são outros (as) profissionais de fora da instituição que são convidados (as) a implementar ações de Educação Sexual e, se for feito pelos (as) professores (as), quais deles (as) estão efetivamente trabalhando com a Educação Sexual, para saber se ainda estão nos moldes antigos, em que só o (a) professor (a) de Biologia e Ciências falavam sobre o tema, ou se estão de acordo com os PCNs, que dizem que todos (as) os (as) professores (as) das várias disciplinas que se sentem à vontade podem trabalhar com a Educação Sexual. Na questão 8, verifica-se se o (a) investigado (a), embora considere importante o trabalho com Educação Sexual, se implementa ações, de que maneira e como se sente ao realizar este trabalho. 153 A questão 9 refere-se ao recebimento ou não do treinamento para trabalhar com Educação Sexual na própria escola ou se o (a) professor (a) buscou por conta própria esclarecimentos, conhecimento e treinamento para este trabalho. Na questão 10, é possível saber se a escola promove algum curso para habilitar o (a) professor (a) a trabalhar com o tema ou não, especificando de que forma isso ocorre, a fim de conhecer a valorização e incentivo que a escola oferece aos (às) professores (as) no trabalho com a Educação Sexual. Por fim, a pergunta 11, com intenção de fazer o (a) professor (a) se expressar livremente, propondo metodologias para abordar o tema ou fazer comentários, depoimentos etc, já que são eles os sujeitos diretamente envolvidos com o trabalho de Educação Sexual. Pela própria experiência profissional, devem compreender o que poderia viabilizar um trabalho de Educação Sexual adequado na escola. As escolas foram selecionadas por serem da rede pública do Ensino Fundamental (1º e 2º ciclos) porque atendem crianças de maneira geral, de todas as classes sociais, sem pertencerem apenas à classe A, que tem mais recursos. Desta forma, nos ofereceu um panorama mais completo de nossa realidade social. As escolas foram escolhidas por apresentarem alguns critérios: primeiro critério de seleção foi, a escola (A) apresentar projeto de Educação Sexual e a escola (B) não apresentar projeto de Educação Sexual. A escola (A) apresenta um projeto de Educação Sexual oferecido por uma ONG, na qual participam alguns (umas) professores (as) interessados (as); a outra escola, por sua vez, foi escolhida justamente por não apresentar nenhum projeto de Educação Sexual. Esse contraste apresentado entre uma e outra admite verificar se na escola que tem projeto de Educação Sexual, os (as) professores (as) são mais preparados (as) para trabalhar 154 com a Educação Sexual e se estão trabalhando com o tema de forma transversal, de acordo com a proposta dos PCNs, que os (as) professores (as) daquela escola que não promove nenhum projeto de Educação Sexual. O segundo critério adotado para a escolha da escola, foi que ambas as escolas pesquisadas fossem escolas com grande número de alunos (as). Através de um levantamento juntamente com a Secretaria de Educação de Curitiba, foi nos oferecido o nome das escolas com maior número de alunos (as). E destas escolas optamos por uma escola que situasse no centro da cidade de Curitiba e outra na periferia da cidade. Ambas escolas escolhidas ao serem contatadas aceitaram fazer parte dessa pesquisa. Para a realização deste estudo, procuramos traçar os seguintes passos: 1) Aplicação do instrumento – questionário – entregue aos (às) professores (as) e respondido por eles (as) individualmente e na frente da pesquisadora, sendo devolvidos após a conclusão das questões; 2) De posse dos questionários respondidos, os dados foram levantados e as respostas foram agrupadas por categorias de semelhança; 3) Elaboração das tabelas com o percentual de respostas para cada categoria; 4) Tratamento e leitura dos dados. As análises foram norteadas pelo instrumento utilizado. O questionário respondido possibilitou a elaboração das tabelas com as respostas categorizadas, passando para a etapa de processar a leitura das observações e respostas emitidas pelos sujeitos pesquisados, fazendo um recorte do texto, selecionando frases ou palavras repetidas em maior freqüência ou colocadas com maior ênfase pelos (as) investigados (as). Aqui, é possível reunir o pensamento para depois unir os (as) pesquisandos (as) com elementos em 155 comum. São selecionados em ordem definida, algumas palavras e (ou) frases que possam ser agrupadas pela riqueza temática, codificando-se os temas geradores, reunindo desta forma grandes temas, ordenando pedagogicamente numa seqüência lógica e analisados com base no referencial teórico, a fim de chegar à compreensão do que foi feito neste estudo. Como sugere Freire (1992, p. 72): A organização do material da coleta de dados ocorre através do conteúdo registrado que resulta da emissão dos significados e do pensamento dos educandos, captados através da observação participante e/ou da aplicação de um instrumento, possibilitando interpretação e seleção dos assuntos centrais. 5.1.1 Universo da pesquisa No início pretendia pesquisar qual o entendimento do (a) professor (a) sobre a Educação Sexual. A ambição foi contida na qualificação, pois o instrumento utilizado para a pesquisa, que foi um questionário, não conseguiria esta abrangência. Por não ter mais tempo de fazer uma pesquisa mais abrangente. Optamos por limitar a pesquisa, investigar como a Educação Sexual vem sendo abordada nas escolas pesquisadas a partir da concepção dos (as) professores (as). Eco (1998) identificou o mesmo problema em outras pesquisas. Ele diz que quase todos os estudantes enfrentam dificuldades ao propor o recorte do objeto da pesquisa e o problema a ser desenvolvido. Os estudantes, segundo o autor, tendem a pegar temas que requereriam, no mínimo, uma vida inteira dedicada e estudos e reflexões. Procurou-se então limitar a pesquisa acerca da investigação da implantação dos (as) professores (as) do Ensino Fundamental do 1º e 2º ciclo da proposta do 156 PCN, quanto ao tema Educação Sexual. A fim de saber, se após 10 anos da legalização dos PCNs nas escolas, os (as) professores (as) estão implementando ações de Educação Sexual de acordo com esta proposta ou não. De acordo com as respostas dos (as) professores (as) investigados (as) que se voluntariaram a responder o questionário. As duas escolas investigadas têm uma clientela muito diversificada. Atende a alunos (as) pertencentes às classes média-baixa e, principalmente, aos (às) filhos (as) das classes trabalhadoras e alunos (as) com moradias que circundam os bairros vizinhos e até distantes das instituições. Embora o instrumento utilizado para investigar os (as) professores (as) tenha sido um questionário, como foi aplicado individualmente e na frente da pesquisadora houve momentos de descontração em que alguns (umas) professores (as), ao iniciar ou finalizar as respostas do questionário, fizeram alguns comentários que foram registrados e analisados. Caracterização das Escolas: Colégio Estadual “A” Possui projeto de Sexualidade oferecido pela ONG “Rede da Vida” com o apoio CEFURIA – Centro de Formação Urbana Rural Irmã Araújo – ONG. Dados sobre a ONG em anexo. A ONG contribui na formação e orientação do conjunto da escola, incluindo: professores (as), alunos (as), pais e funcionários (as), tendo em vista que a Educação Sexual nas escolas é um tema transversal apresentado pela Secretaria de Educação do Paraná. 157 O Colégio “A” está situado no Centro de Curitiba, tem cerca de 800 alunos e oferece ensino fundamental e médio. É uma das escolas públicas mais antigas do Paraná. No período diurno são atendidos (as) alunos (as) de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental. O período noturno é reservado a alunos (as) do Ensino Fundamental e Médio na modalidade de Educação de Jovens e Adultos. É o primeiro estabelecimento com características atípicas em relação às demais escolas por atender também aos níveis de ensino regular e Educação de Jovens e Adultos (17 a 75 anos). Capacidade para 1.200 alunos. Diretor da Escola – 20 anos de direção do Colégio. História – oferece ensino noturno desde 1998, deu início ao uso de uniformes nas escolas públicas do Estado. Colégio Estadual “B” A escola não possui projeto de Educação Sexual no projeto pedagógico. Situado no bairro Boqueirão, em Curitiba, o colégio atende 1.131 alunos (as), divididos em 30 turmas. O colégio solicitou policiamento nas suas imediações nos horários de entrada e saída, no período da manhã, e há anos conta com esta segurança do policiamento próximo à escola por ter se tornado um ponto de tráfico de drogas. Com esta iniciativa, alunos (as), pais, mães e professores (as) desta instituição sentiram-se mais seguros (as). 158 Dados dos (as) professores (as) Os dados coletados dos (as) professores (as) aqui mencionados serão posteriormente analisados. Os (as) professores (as) investigados (as) fizeram com que houvesse o abandono de algumas das visões pré-concebidas sobre esta profissão. É freqüente a associação do (a) professor (a) da rede pública como um profissional desanimado que realiza seu trabalho por obrigação. Alguns (umas) investigados (as) encontravam-se exatamente numa posição contrária. Professores (as) vibrantes, engajados (as), alegres e sem qualquer interesse de abandono da profissão, aproveitando sempre que podem para se aperfeiçoarem com cursos de especialização, pós-graduação etc. Demonstraram alegria de ser professor (a). Apontaram também as dificuldades e os desafios inerentes ao seu papel social. Um deles comentou que “hoje somos muito mais exigentes porque os alunos dependem cada vez mais da escola. Temos que ensinar valores que muitas vezes a família não faz pelo aluno”. Durante o trabalho de campo foi aplicado o questionário com 30 professores (as). Sendo 15 respondentes de cada escola. Dos (as) professores (as) convidados (as) a participar da investigação através do questionário, somente oito eram do sexo masculino, sendo que três deles não aceitaram participar da investigação alegando falta de tempo, foram convidados outros três professores do sexo masculino para participar da pesquisa. Portanto foram 8 professores do sexo masculino a participar da pesquisa de campo e 22 eram do sexo feminino, sendo que todas aceitaram participar da pesquisa. As que não podiam naquele momento marcaram data e horário. Os (as) investigados (as) são, Historiadores (as) (5), Biólogo (a) (1), pedagogos (as) (3), professores (as) de Educação Física (3), Geografia (3), 159 Matemática (6), Artes (1), Ciências (2), Língua Portuguesa (4), Língua Inglesa (1) e Química (1). Alguns (umas) professores (as) lecionam mais de uma disciplina. Todos (as) residem em Curitiba ou em cidades satélites como São José dos Pinhais. A maioria dos (as) professores (as), 24 deles (as), possui diploma de pósgraduação lato sensu e um professor investigado realizou mestrado. Somente três dos (as) investigados (as) possui apenas a graduação. Os (as) professores (as) iniciaram sua atividade docente no município de Curitiba por concurso público. Alguns vieram transferidos de outras cidades. A docência no ensino fundamental não foi a primeira opção da maioria. Para alguns, ela veio em substituição à expectativa profissional frustrada, proporcionando mudanças significativas em sua história de vida. Alguns (umas) já tiveram microempresas, outros (as) trabalham como autônomos (as) etc. Alguns (umas) mencionaram ter tentado outros concursos e acabaram passando por acaso no concurso para professores (as). E alguns (umas) professores (as) manifestaram estar se preparando para outros concursos e outros têm outro tipo de atividade em período diferente. Devido a problemas financeiros teve também professores (as) que tiveram suas expectativas profissionais reorganizadas, inclusive dois dos professores homens referiam-se a este fato. Existem muitos (as) investigados (as) que trabalham em dois ou três turnos, alguns na mesma escola e a maioria em escolas diferentes, dobrando o seu horário de aula ou até mesmo triplicando seu horário na sala de aula. Um professor de História comentou trabalhar 45 horas semanais, 9 dos professores trabalham 40 160 horas, um professor de Matemática com 32 horas e outros trabalham 20 horas, por manter outras atividades profissionais. A professora mais antiga de uma das escolas atua há 22 anos. O professor de História está há 20 anos na mesma escola, assim como o professor de Matemática. Tanto o professor de Inglês como de Ciências e Biologia lecionam há 18 anos. Um professor de Matemática atua há 10 anos, um professor de Geografia há 9 e os demais há menos de 5 anos na mesma instituição. Estes dados pessoais dos (as) professores (as) serão utilizados na análise dos dados. 5.2 RESULTADOS DA PESQUISA Professores (as) Pesquisados (as) Esta primeira parte será dedicada à análise da questão 11, na qual o (a) professor (a) tinha a opção de fazer, voluntariamente, comentários, deixar depoimentos de vivências em sala de aula com os (as) alunos (as) ou sobre o que pensam acerca da Educação Sexual na escola. Nesta questão, poderiam também fazer sugestões para trabalhar com o tema com os (as) alunos (as). A partir desta 11ª questão do questionário, destacar-se-ão alguns depoimentos, que serão expostos a seguir. Existe uma característica entre os (as) profissionais que lecionam que chamou atenção desde os primeiros (as) investigados (as) do trabalho de campo: a maioria de professores (as) é do sexo feminino. Dentre os (as) investigados (as) havia apenas cinco homens e, dentre eles, três se negaram a participar. 161 Nas duas escolas investigadas a quantidade de mulheres era maior. Talvez seja porque o universo de mulheres no magistério é muito maior. Os homens lecionam, principalmente, História, Filosofia, Educação Física, sendo apenas um em Pedagogia. De acordo com Rosemberg (2001), o percentual de mulheres lecionando no Ensino Fundamental no Brasil era de 91% em 1999. A autora analisou os dados da PNAD e percebeu que o magistério na educação básica é uma profissão que predomina o gênero feminino. Vietsman (1994) percebeu que a opção feminina pelo cargo de professores do Ensino Fundamental, principalmente do 1º ciclo (1ª a 4ª série), reflete uma estratégia histórica das mulheres para permanecer, ao mesmo tempo, no mundo do trabalho e na família. Além disso, a profissão é vista como uma extensão do trabalho feminino dentro do lar: o cuidado e a educação das crianças. Entre os três professores homens que se negaram a responder o questionário, alegaram falta de tempo. Um deles fez uma brincadeira dizendo que: “não gosto de falar sobre sexo, gosto de fazer.” Com risadas, se desculpou pela brincadeira e disse que não responderia devido, realmente, à falta de tempo. Altmann (2005) indica que um dos efeitos da Educação Sexual na escola é a transformação dos saberes oferecidos em critério de verdade na reflexão sobre sexo. Nas interações entre meninos e meninas na escola, os rapazes precisam elaborar estratégias para ter acesso aos saberes sobre o sexo sem que ninguém perceba que eles ainda não sabiam. Os meninos têm vergonha de perguntar porque cultivam o mito de que por ser homem tem que saber de tudo. Acredito que assumir que não sabe perante a sala, fica muito difícil. 162 Rosistolato (2003, p. 12): “Assumir que não sabem tudo sobre sexo é uma vergonha para os meninos porque mesmo quando ainda são virgens preferem fingir que já perderam a virgindade.” Talvez esses professores que se negaram a responder cultivam o medo de não saber responder alguma coisa, podendo dar conotação de não entender de sexo ou que ainda não sabem o suficiente. E a brincadeira que um deles fez nos remete à nossa cultura marcada pelo machismo, em que o papel de gênero masculino tem que constantemente afirmar sua masculinidade e “gostar de fazer sexo”, oferecendo “status” de macho, incentivado por uma cultura que supervaloriza o sexo masculino, sendo motivo de “orgulho ou inveja” o homem com desejo hiperativo. São comportamentos construídos socialmente sobre a masculinidade. Mas são apenas hipóteses para pensar e refletir. Temos que mencionar que nenhuma professora do sexo feminino se negou a responder. As que não podiam por falta de tempo, perguntaram se eu poderia deixar a entrevista para outro dia e foi então combinada uma data e um horário disponível para responderem o questionário. As professoras demonstraram, ao contrário dos professores, uma tranqüilidade em admitir algum desconhecimento sobre as questões contidas no questionário. E por vezes faziam comentários e depoimentos voluntários, como por exemplo, de que “precisavam aprender sobre sexo antes de ensinar os alunos”. Mas, como já dizia Freud, “Às vezes um charuto é só um charuto”. Também podemos pensar que a maior disponibilidade das mulheres seja só porque existe mesmo a diferença de gênero e que as mulheres em sua maioria é da natureza de falar mais. 163 Algumas professoras comentaram que quando falam de sexualidade com os (as) alunos (as), as meninas falam mais do que eles e querem informações minuciosas sobre os assuntos relativos ao sexo, ou sobre o ato sexual deixando às vezes a professora com certo desconforto ou receio de que a menina acabe ficando rotulada ou estigmatizada preferindo, por vezes, responder e comentar a pergunta individualmente. Embora deixam claro para os (as) alunos (as) que devam evitar depoimentos pessoais, para evitar a ultrapassar as fronteiras da sala de aula e que os (as) colegas acabam comentando fora da sala sobre os (as) alunos (as) que acabaram se expondo. Os meninos também são incentivados pelos (as) professores (as), que implementam ações de Educação Sexual em sala de aula, para não falar sobre suas vidas sexuais durante a aula fazendo, desta forma, perguntas generalizadas para preservá-los, mas caso falem não criam problemas. O mesmo não ocorre com as meninas, que acabam sendo motivo de piada e de conotações pejorativas. Devido à construção social da masculinidade, eles precisam falar de suas aventuras sexuais, mesmo que inventadas. Goldenberg (1995) concluiu que Leila Diniz se transformou em um mito porque sintetizou publicamente os anseios de libertação das mulheres de uma época. A inovação personificada por ela a eternizou como símbolo de um novo modelo de ser mulher no Brasil. Ao invés de “esposa mãe”, simplesmente Leila Diniz. Não houve superação do modelo “esposa mãe” e as mulheres continuam a viver conflitos íntimos constantes, resolvidos a partir dos mais diversos arranjos e rearranjos nos mundos público e privado. Quando as professoras resolvem falar de sexo na escola vivem dilemas de gênero “difíceis de resolver internamente” porque não conseguem equacionar a 164 tensão entre igualdade e diferenciação de gênero. Elas entendem que precisam proteger as alunas das classificações pejorativas de que elas podem se tornar alvo quando ocorre a declaração pública da vida sexual, pela pergunta que faz. E todos, meninos e meninas, são estimulados a fazer perguntas. Mas na realidade temem a exposição da menina na sala de aula. Porém, o trabalho de Educação Sexual propõe que o assunto ligado a gêneros seja tratado como direitos iguais. Outra questão referente ao conteúdo de gênero foi relatada por outra professora. “Eu me sinto uma mulher diferente do que tento passar para meus alunos. Porque quero educar os alunos para uma nova concepção de gênero, diferente do que fui educada, mas não consigo fazer o mesmo com meus dois filhos homens”. É claro que se referiu ao ser mulher, mas certamente apresenta dois modelos de ser homem. Um da forma que sente sobre o papel de gênero masculino e outro que a professora quer educar os alunos a partir de uma visão igualitária de gêneros, mas não consegue, na sua vivência diária com a família, fazer o mesmo com os filhos homens. Porque a forma como se relaciona com seu marido acaba passando mensagem de como realmente sente e vivencia o papel de gênero, servindo como um modelo aos filhos a sua forma de agir. A preocupação da professora expressa a convivência de dois sistemas de percepção em uma mesma pessoa. Ela acredita na necessidade de ampliar a igualdade de gênero, mas não consegue deixar de agir na sua vida pessoal, especialmente com os dois filhos homens dentro de um padrão do machismo, assimilado pela educação que teve. Não consegue deixar de raciocinar e sentir a partir de idéias hegemônicas de masculinidade. É interessante observar que a proximidade, a presença de atitudes femininas deixa de ser uma constatação e 165 passa a ser uma preocupação. A professora pode até constatar atitudes femininas nos alunos meninos e não demonstra preocupação, considera normal. Com os filhos é o contrário. Ela se diz preocupada porque eles podem “virar gay”. E a professora termina seu discurso dizendo “A gente cria os filhos da gente querendo que eles sejam homens”. Um professor relatou que tinha uma aluna grávida na sala e que era sempre motivo de piadinhas e discriminação. Resolveu marcar para a próxima aula falar sobre gravidez e todas as questões referentes a sexo que a turma quisesse conversar. Na aula seguinte, marcada para tratar a temática sobre sexualidade, foi o pai de um aluno dizendo que a próxima vez que fosse falar de sexo em sala de aula era para avisar antes que o aluno faltaria nesse dia, e levou o menino embora. E desde que passou por esse episódio fica com receio de que reação terá no dia seguinte que enfrentar em relação aos pais, quando tem que tratar de alguns assuntos sobre sexualidade que surgir por algum evento sobre o tema ou dúvida de algum aluno trazidas em sala de aula. Nesse caso é necessário que o (a) professor (a) tenha muito “jogo de cintura” para conseguir controlar a situação, principalmente quando se trata das relações entre a família e a escola. Embora tenha recebido total apoio por parte da escola. Esta professora percebeu na prática que as visões da família e da escola sobre Educação Sexual não são necessariamente as mesmas, neste caso, opostas. Porque se a família não quiser que o filho ou a filha participe de aulas sobre educação sexual a escola tem que aceitar. Neste caso específico desta família, era devido a crenças religiosas. Essas situações mostram impasse na proposta dos PCNs que propõem que nem sempre precisa ser programada uma aula que vai abordar a sexualidade, como 166 tema transversal, pode-se aproveitar alguma situação surgida no momento, um comentário de algum aluno etc. para naquele momento aproveitar e fazer reflexões a cerca da temática que surgiu. Nesse caso não dá para mandar o aluno sair da sala porque vai falar ou explicar alguma questão sobre a sexualidade. Mas, no dia seguinte, quem trabalhar algum tema sobre sexualidade de forma transversal, de acordo com a proposta dos PCNs, provavelmente terá a presença de um pai ou uma mãe reclamando. Estamos falando sobre as relações entre a diferença da teoria, proposta pelos PCNs, e a prática pedagógica no desenvolvimento da proposta dos trabalhos de Educação Sexual de forma transversal. Deixando os (as) professores (as) às vezes numa situação em que terá que apelar para seu bom senso para contornar a situação como esta, vivida por esta professora, que se apresentou de forma inesperada e sem poder contar com um apoio de suporte técnico para saber como conduzir situações como desta docente, que terminou dizendo que não sabia como agir e resolveu não implementar mais ações de Educação Sexual para se proteger. Nunes e Silva (2000, p. 75) dizem que “na verdade, o medo da reação dos pais é um sentimento bastante comum e requer tempo e trabalho pessoal para ser vencido”. A atuação do (a) professor (a) com a Educação Sexual não é tão simples como possa parecer. Essa dificuldade demonstrada neste depoimento é comum a muitos (as) outros (as) professores (as), referente ao medo da reação dos pais. Esta dificuldade parece ser um fator emocional forte que, por mais que se tenha apoio da escola, parece não ser o suficiente para convencer uma professora, como no caso deste relato, de não se deixarem dominar por esse sentimento, levando à desistência de colocar em prática um projeto de Educação Sexual. 167 Parece que ter um espaço onde se possa falar e trabalhar este sentimento é fundamental para encorajar os (as) professores (as) no enfrentamento destas resistências que lhe aparecem. Mas como julgar errado a atitude da professora em desistir de discutir a educação em sala de aula. Que preparo, apoio, curso, capacitação, supervisão recebeu por parte do Ministério da Educação para implantar uma proposta com parâmetros para trabalhar a educação sexual, como tema transversal e elegeu o (a) professor (a) para a realização dessas ações, mas não ofereceu nenhum recurso que pudesse preparar o (a) professor (a) para esta proposta. Portanto, os (as) poucos (as) professores (as) que assumem este trabalho, o fazem como podem. Porque nem sua formação acadêmica recebeu preparo para trabalhar a educação sexual. Se nem no curso de pedagogia tem na sua grade curricular a Educação Sexual, imagine num curso de matemática, geografia etc. como fica difícil para estes (as) professores (as) se engajarem no trabalho com um tema tão polêmico quanto à sexualidade em sala de aula. Por isso, insiste-se na idéia de um espaço, um grupo, onde se possa falar sobre estas situações vivenciadas para poder reconhecê-las, admiti-las e, enfim, pensar ao invés de negá-los. Esse processo aumentaria a possibilidade de superação. Uma professora de Biologia disse que as alunas de 5ª a 8ª série têm muita revolta e perguntam de forma recorrente para a professora se ela acha justo que elas tenham obrigação de limpar a casa, lavar louça, enquanto seus irmãos não fazem nada. Os (as) professores (as), no contato diário com os (as) alunos (as), percebem que a proposta educacional segundo os parâmetros propõe igualdade dos gêneros, mas que é diferente da educação que eles (as) próprios (as) tiveram. Até manifesta 168 que queria pensar diferente, enfim mudar, mas acham difícil agir diferente do papel de gênero em que foram socializados. Porque confessa a professora que entende e concorda com as alunas, mas em casa com o filho homem acaba não concordando na prática e repetindo este padrão do “filho macho”, mesmo sem perceber, e diz: “Acabo não exigindo dele divisão de tarefas domésticas, porque tenho receio que amigos tirem sarro e isto possa fazer com que ele se sinta diferente dos outros e sei lá no que isso possa causar”. Esta professora comentou que conseguia pensar em oferecer uma Educação Sexual igualitária para seus alunos, mas não conseguia implantar na prática com seu próprio filho sendo educado da mesma maneira. Continuou, “sei que é contraditório que a gente contesta a posição social do macho, mas eu ao mesmo tempo quero que meu filho seja macho, e prefiro macho a gay, embora não gostaria de estar alimentando o machismo, mas tenho medo do resultado ser pior.” Com esse discurso da professora, percebe-se que ela tem consciência desta contradição entre a teoria assimilada e a prática é mesmo uma inquietação que demonstrou por não conseguir implementar o que pensa como certo, demonstrando que uma pré-disposição interna para lidar com estas questões não é suficiente para uma mudança de conduta: talvez se tivesse passado por uma capacitação teria mais coerência entre a dicotomia teórica e prática. Louro (1997, p. 64) faz um embasamento teórico sobre o assunto: Alerta para a necessidade de que os educadores aprendam a observar e a identificar as desigualdades presentes na escola e a interferir nelas, desestabilizando-as e problematizando a conformidade como o “natural” (...) Dispostos a implodir a idéia de um binarismo rígido nas relações de gênero, teremos de ser capazes de um olhar mais aberto, de uma problematização mais ampla que terá de lidar, necessariamente, com as múltiplas e complicadas combinações de gênero, sexualidade, classe, raça, etnia. Se estas dimensões estão presentes em todos os arranjos escolares, se estamos nós próprios, os envolvidos nesses arranjos, não há como negar que essa é uma tarefa difícil. 169 De acordo com Forquin (1993, p. 09): “Ninguém pode ensinar verdadeiramente se não ensina alguma coisa que seja verdadeira ou válida a seus próprios olhos”. É necessário ainda considerar outros aspectos do sentido do trabalho docente. Defende-se a idéia do (a) professor (a) interessado (a) em atuar com Educação Sexual com seus (suas) alunos (as), uma vez que os PCNs estão postos e se faz necessário o envolvimento de todos (as) os (as) profissionais da escola. Para isso, acredita-se que seja fundamental olhar os (as) profissionais da escola como uma pessoa que precisa ter a oportunidade e acesso, não só aos documentos dos PCNs, mas também à formação continuada e alicerçada em seu crescimento pessoal. Nisso está incluída a atenção ao autoconhecimento e à compreensão da história da vida do (a) professor (a) com espaço para repensar sua própria sexualidade, seus sentimentos, atitudes e valores. Para esta vertente nos apoiamos na análise feita por Basso (1998 p. 28), na qual afirma que o motivo que incita o (a) professor (a) a realizar seu trabalho: Não é totalmente subjetivo, mas relacionado à necessidade real instigadora da ação do professor, captada por sua consciência e ligada às condições materiais ou objetivos em que a atividade se efetiva. Essas condições referem-se aos recursos físicos da escola, aos materiais didáticos, à organização da escola em termos de planejamento, gestão e possibilidade de trocas de experiências, estudo coletivo, a duração da forma de trabalho, ao tempo de contrato de trabalho, ao salário, etc. quando uma das condições objetivas de trabalho não permitem que o professor se realize como gênero humano, aprimorando-se e desenvolvendo novas capacidades, conduzindo com autonomia suas ações, criando necessidades de outro nível e possibilitando satisfazê-las... esse trabalho é realizado nas situações de alienação e senso comum. O ensino em torno das questões ligadas à sexualidade não deve ter em vista a figura do (a) professor (a) apenas como um instrumento ou um meio de Educação 170 Sexual para os alunos. Aprendizado, reflexão sobre o tema e oportunidades de reeducação sexual também são necessidades dos (as) profissionais. É coerente a citação de Alves (1983, p. 22): “Não sei como preparar o educador, talvez porque isto não seja necessário e nem possível (...) É necessário acordá-lo. E para acordá-lo, uma experiência de anos é necessária”. Ainda nas palavras de Alves (1983, p. 28): Primeiramente, acredito que um trabalho inicial sério que leve o educador a olhar para dentro de si próprio, a repensar-se como pessoa nas questões ligadas à sexualidade e ao gênero é um caminho que pode despertar para a temática de forma a estimular o (a) professor (a) para facilitar a aprendizagem. Apenas complementando a reflexão de Alves (1983), é importante o envolvimento intelectual e afetivo com o (a) professor (a), respeitando suas dificuldades e tendo como objetivo maior seu crescimento pessoal e profissional, vislumbrando, num segundo momento, o crescimento dos (as) alunos (as), que deve ser vivida como uma “experiência de amor”. Essa consideração encontra-se respaldada em Machado (1955, p. 52): “O amor é tudo o que faz com que uma pessoa ajude a outra a ser melhor. E o amor abrange: sentimento de bem-querer; preocupação com o outro; respeito pelo que o outro é e pensa; aceitação da individualidade do outro.” Para Figueiró (2006, p. 287), Tanto a sexualidade quanto o gênero fazem parte do que cada um é como pessoa, ou seja, da identidade de cada sujeito. E se a meta maior é o desenvolvimento do (a) professor (a) como pessoa e como profissional, as reflexões não podem prescindir de nenhum dos dois elementos. Na verdade, relações de gênero é um conteúdo que faz parte de programas de educação sexual. No entanto, se faz necessário reservar um tempo suficiente para esta temática, devido à sua complexidade e ao que é preciso fazer para compreendê-las e transformá-las. 171 De acordo ainda com Figueiró (2006, . 288): Como parte do processo de reeducação nas questões de gênero, o educador precisa compreender: - O processo de construção sócio-histórico-cultural das relações de gênero; - A formação como se dá a cristalização das desigualdades entre os gêneros feminino e masculino, nas práticas cotidianas escolares, assim como na sexualidade, de forma geral; - As redes de poder que constituem as hierarquias entre os gêneros; - As múltiplas formas que podem assumir a masculinidade e a feminilidade, ou seja: os muitos jeitos de ser homem e de ser mulher; - Os modos de proceder, como cidadão e educador, para desconstruir a polarização entre masculino e feminino. Discurso do professor de Filosofia: “As crianças não querem falar de sexo, não. Elas querem fazer mesmo. Na hora do intervalo tem que trancar a sala porque senão eles vão debaixo da mesa para praticar sexo e os banheiros tem que ficar constantemente monitorados e assim que acaba a aula tem que trancar a sala. Foi adotado este controle na escola e mesmo assim outro dia foi achado um preservativo usado jogado no chão da sala. Não se deram ao trabalho de colocar na lixeira. Justifica o professor na escola tem que colocar limite. Tem que dizer o que pode e o que não pode. Uma coisa é uma criança descobrindo e explorando as curiosidades sexuais. Outra, é a criança experimentando o sexo”. Esse professor parece que tinha o objetivo neste discurso de enfatizar o “papel da escola” no sentido de poder controlar e com uma tendência a querer resolver tudo. Pareceu-nos uma disputa de controle que a escola está fazendo com o (a) aluno (a). Quanto mais controlam e proíbem, mais os (as) alunos (as) querem provar que a escola não tem controle nenhum sobre eles (as), que ainda transam na sala e deixam a prova, do preservativo usado, como uma testemunha da falta de controle da escola. Numa tentativa de agredir, mas também dizer, “não adianta querer 172 impedir, se eu quiser eu transo”, e ainda na escola, como se dissessem “não vão nos controlar”. Uma das dificuldades listadas é pertinente porque parece ser a queixa de muitos (as) dos (as) professores (as). Diz respeito à ausência de fundamentos científicos na análise das manifestações da sexualidade das crianças no espaço da escola, o que, por sua vez, tem levado os (as) professores (as) a adotar atitudes conservadoras e tradicionais da cultura repressiva e negativista do sexo. Muitas vezes, por não saber como lidar, o (a) professor (a) adota uma “atitude patrulhadora”. Nunes e Silva (2000, p. 74) comentam: “O patrulhamento como aquela atitude de delegar funções informativas para a escola e, ao mesmo tempo, agir de maneira intimidatória a quaisquer eventuais críticas e ações dos professores que não estejam dentro da normalidade patriarcal vigente”. Comentário de uma professora: “Hoje os alunos levam tudo para o lado do sexo. Nós não estamos preparados para isso. Principalmente os professores mais antigos da escola, como eu. Bem da verdade, a escola também está despreparada para tratar da sexualidade. Outro dia um aluno pegou o meu livro e foi direto para o verbo comer que achou no livro. Ele criou um verdadeiro alvoroço na sala, eu não conseguia nem manter a disciplina e fiquei sem saber o que dizer e pensando no que os pais iriam dizer.” Aproveitamos esses depoimentos dos (as) professores (as) para refletir sobre o limite da escola, até onde pode e consegue ir. A escola deve querer resolver o que está a seu alcance. Definir tal fronteira de até aonde ir é uma tarefa difícil que deve ser feita pelos (as) professores (as) e pela 173 escola. O papel do (a) professor (a) na Educação Sexual, ao invés de normatizar, tentar conter, controlar, vigiar a vivência da sexualidade, e sim ampliar o processo auto-reflexivo e discursivo com os (as) alunos (as), estando assim coerente com a proposta dos PCNs. É claro que existem momentos em que a escola é convocada a normatizar o comportamento dos (as) alunos (as). O difícil é o (a) professor (a) sozinho (a), somente com os parâmetros propostos pelos PCNs e o seu autoconhecimento, para poder saber dosar e equilibrar a construção da reflexão e controle na construção de uma Educação Sexual na escola. E que os (as) alunos (as) só passarão a ser reflexivos (as) quando o “emocional” for incluído no trabalho de Educação Sexual por meio do afeto e do vínculo estabelecido com o (a) educador (a) sexual, no caso o (a) professor (a), assim como com a escola, para que possa ocorrer o respeito mútuo. Não é necessário salientar que quando um assunto tem relação com sexo, os (as) alunos (as) riem e fazem piadas entre si, porque assimilaram que falar sobre sexo é uma conversa proibida, escondida e entre amigos (as). Portanto, é importante deixar que riam, pois precisam disso, é a forma como conseguem tocar no assunto sexual aliviando o constrangimento que sentem perante o assunto. Se forem compreendidos (as), quase que a única forma dos (as) alunos (as), principalmente o menino, que permeia o mito de que nasce sabendo tudo sobre sexo, é a piada como sendo um mecanismo de defesa. Esses risos não mais incomodarão os (as) professores (as) e eles saberão lidar com a situação para não perder o controle da disciplina e não assumir uma postura repressora. Geralmente, esses risos, quando permitidos, perdem a graça, porque não encontram respaldo na censura e acabam deixando de acontecer em 174 pouco tempo. Se o (a) professor (a) conseguir ter uma dose de aceitação, acabará respondendo com tranqüilidade o tema levantado pelo (a) aluno (a), respondendo a verdade de forma natural e serena, pois isso vai ajudar a desmitificar as associações com o sexo como sendo algo feio, sujo e vergonhoso. Pelo contrário, a naturalidade do (a) professor (a) pode ajudar os (as) alunos (as) a pensar a questão de forma límpida e ir vencendo, aos poucos, esse constrangimento acerca da sexualidade. Para Nóvoa (1997, p. 26): A primeira questão é reconhecer os (as) professores (as) como pessoas e como profissionais produtores (as) de saber e de saber-fazer. O cuidado que é preciso ter é em considerá-los como: - Profissionais reflexivos – em vez de funcionários; - Investigadores – em vez de técnicos; - Conceptores de currículos – em vez de aplicadores de currículo. O principal dilema da Educação Sexual na escola ocorre quando se percebe a distância entre a proposta de Educação Sexual, dos PCNs, que teoricamente são bem assimiladas pelos (as) professores (as) (cognitivo) e a educação que oferecem a seus (suas) filhos (as), que acabam seguindo outros moldes devido a seus valores anteriormente assimilados (emoções). As diferenças geracionais também foram afirmadas e negadas a partir da comparação entre os (as) professores (as) e os (as) alunos (as), que ora criticam, ora demonstram admiração, pois queriam ter tido a oportunidade que esta nova geração tem, despertando sentimentos contraditórios por parte dos mais velhos, assim como dos (as) professores (as). Apontaram também a diferença da infância e adolescência deles e as formas de viver das crianças e adolescentes na atualidade. Mas que passam por dilemas, transformações e mudanças constantes com os adolescentes, como no caso do depoimento de uma professora de Português, de 54 anos: “Tenho inveja das 175 crianças e adolescentes de hoje, que têm acesso a informações, a vivenciar o “ficar”, o experimentar sem culpa a experiência sexual, tendo mais liberdade para fazer suas escolhas para falar em sexo. Não foi como eu, que casei virgem com um homem que meu pai aprovou porque considerava que seria um bom marido para mim. Nunca tive nenhum acesso a outras experiências sexuais e nem à Educação Sexual formal, nem por parte da família, nem por parte da escola. Através da religião, assimilei que sexo era sujo, pecado etc. Então, tenho que primeiro aprender para depois ensinar algo sobre sexualidade. Aliás, os alunos é que têm mais para ensinar do que eu a eles. É brincadeira... Quanto aos alunos, vem o medo de falar sobre sexo e eles não entenderem que o sexo não deve ser banalizado como tem sido, eles acham tudo careta. E também de entrar em choque com a formação familiar e porque não sei usar a nomenclatura deles. Enfim, são vários os meus receios para conseguir implementar ações de Educação Sexual”. Cabe, na fala dessa professora, vários questionamentos que podem ser pertinentes, por ser encontradas estas mesmas questões em outras falas de professores (as) que, de maneiras diferentes, expressaram sentir esse mesmo conflito de gerações. Nunes e Silva (2000, p. 25) afirmam que “os professores, em seus depoimentos, falam da dificuldade pessoal advinda da repressão da própria sexualidade”. A partir do comentário da professora, percebe-se a falta de espaço para o processo de formação dos (as) professores (as) para refletir sobre as próprias concepções, pontos de vista e pré-conceitos. A fim de elaborar suas ansiedades e tomar contato com as mesmas, estão abertos a ouvir novas idéias e compreender diferentes valores e concepções do sexo e da sexualidade. Daí porque se torna 176 importante para a educação do (a) professor (a) no tema da sexualidade um espaço para reflexão sobre sua própria sexualidade, através de debates e discussões, a fim de dar mais segurança ao educador para discutir com os alunos um tema tão polêmico e diversificado. Assim, pode-se contribuir para que o (a) professor (a) possa “ouvir o outro” e não impor suas próprias idéias, tecendo juízo de valores quando se trata de um trabalho de Educação Sexual formal. Portanto, além do embasamento teórico oferecido pelos PCNs, na proposta da Educação Sexual parece não ser o suficiente para uma atuação mais segura do (a) professor (a), embora oriente caminhos a serem buscados para o (a) professor (a) interessado na implementação de ações de Educação Sexual na escola. A partir dos PCNs, pode ser o começo da caminhada, dos primeiros passos em direção ao conhecimento sobre Educação Sexual. Mas há muito ainda para caminhar para que o (a) professor (a) possa se sentir apto (a) e encorajado (a) a trabalhar com Educação Sexual de acordo com a proposta dos PCNs. Os Parâmetros estão postos a serviço da escola para facilitar o trabalho do (a) professor (a), mas percebe-se em discursos, como dessa professora, que sem a formação oferecida aos professores (as) para atuarem como educadores (as) sexuais, fica inoperante a proposta dos PCNs, de que os (as) professores (as) sejam facilitadores (as) e criadores (as) de condições psicossociais do desenvolvimento da sexualidade dos educandos (as). Segundo Nunes (1996, p. 34), “O saber é o sabor lá na frente da estrada, quando você já está há muito tempo neste caminho. No início, o saber é um trabalho, um hábito, uma disciplina”. Este tópico foi dedicado a analisar primeiramente os depoimentos dos professores (as) investigados (as). 177 Após o depoimento destes (as) professores (as), percebe-se que eles (as) têm consciência da lacuna existente entre a teoria proposta pelos PCNs da Educação Sexual como Tema Transversal e a ausência da Educação Sexual na formação dos (as) professores (as) que necessitam de ajuda para aprender a lidar com as questões do cotidiano em sala de aula. Os (as) professores (as), com os depoimentos, mostraram maturidade e entendimento de suas limitações e possibilidades de concretizar a Educação Sexual na realidade, mas necessitam de oportunidades de crescimento pessoal e cursos especializados para poderem se sentir seguros (as) para a implementação da Educação Sexual de acordo com a proposta dos PCNs. Guimarães (1995, p. 79) complementa essa idéia: Os professores interessados no trabalho de educação sexual sentem a necessidade de aperfeiçoamento como sede de saber mais, mais subsídios para uma reflexão sobre a responsabilidade de educar sexualmente, troca de experiências necessárias ao nosso dia-a-dia de aulas, rever tabus e preconceitos e rever conhecimentos científicos. Esses educadores nada tem de alienados, acomodados ou de inertes, como é comum rotulá-los hoje. Os (as) professores (as) que responderam a questão 11 do questionário em forma de depoimentos anteriormente citados, enquadram-se na citação de Guimarães (1995), referente à pesquisa que fez com professores (as) na sua dissertação. 178 5.3 ANÁLISE DOS DADOS Mediante a análise das respostas de educadores (as) do Ensino Fundamental, será possível saber se os (as) professores (as) estão realizando ações educativas sobre Educação Sexual no ambiente escolar. A seguir, apresentaremos os resultados sobre as questões propriamente ditas, referente ao estudo da Educação. Uma análise da concepção dos (as) professores (as) em escolas do Ensino Fundamental de Curitiba. 1) Entendimento sobre sexualidade TABELA 1: ENTENDIMENTO SOBRE SEXUALIDADE Opinião Professores % É construída desde o nascimento 7 24 Não tem conhecimento ou preparo, não se sentem à vontade para discutir esse tema É inerente ao ser humano e acompanha a vida toda 9 31 4 13 Envolve todas as nossas atividades 4 13 Compreensão e percepção do próprio corpo 4 13 Busca de informações sobre o assunto 1 03 Intimidade e respeito para com as outras pessoas 1 03 TOTAL 30 100 A partir dos dados apresentados na Tabela 1, podemos perceber que 24% dos (as) professores (as) apontaram que entendem a sexualidade como uma construção, desde o nascimento. Tal dado, embora não faça parte de um percentual muito significativo, corresponde com a literatura sobre a sexualidade, porque não há como discordar desses (as) professores (as), como diz Ribeiro (2005, p. 34): 179 A sexualidade é um dos aspectos da identidade pessoal e social de cada um. Logo ao nascer, a criança é identificada como menino ou menina, levando em conta seus órgãos sexuais. A partir daí, integrado a outros aspectos do desenvolvimento, começa a ser estruturada a identidade sexual, componente da sexualidade” Vitiello (2000, p. 13), apoiando a afirmação desses (as) professores (as): “a sexualidade, entendida a partir de um enfoque amplo e abrangente, manifesta-se em todas as fases da vida de um ser humano. Pode-se considerar que a influência da sexualidade permeia todas as manifestações humanas, do nascimento até a morte”. No entanto, deve-se ressaltar que o maior percentual, 31% dos (as) professores (as), respondeu não ter conhecimento e que não se sentem à vontade para discutir esse tema. Segue a resposta de um professor da disciplina de História do sexo masculino: “A sexualidade ainda se constitui um tabu, as pessoas e até os professores ainda não se sentem à vontade de discutir sobre o assunto. Principalmente as mulheres, muitas por questão social e cultural têm muita vergonha. A sexualidade é algo próprio do ser humano, portanto deve ser encarado com naturalidade, mas, em geral, os professores não sabem como trabalhar”. Nesta questão, optamos por analisar detalhadamente a resposta de um dos professores investigados ao invés de citar várias respostas de diferentes professores (as). Com o registro da fala deste professor respondente, pudemos observar a grande dificuldade dos (as) professores (as) no trabalho com a sexualidade, embora este professor tenha uma compreensão positiva da sexualidade quando diz que a sexualidade é algo próprio do ser humano, devendo ser encarado com naturalidade. Enfim, pareceu-nos uma cisão entre o pensamento e o sentimento acerca da sexualidade, demonstrando que cognitivamente tem um pensamento positivo, coerente com as teorias atuais sobre uma “sexualidade como própria da vida”. Formada de sentimentos, relacionamentos, sensualidade, prazer, erotismo, direitos 180 e deveres, a sexualidade envolve a pessoa na sua globalidade e dimensão. Ela é uma dimensão exclusiva do ser humano, devido a sua complexidade que abrange bio-psicossocial, compreendendo a sexualidade do ser humano dentro do contexto histórico e cultural. Por outro lado, esse professor se contradiz demonstrando sentimento que aborda posturas preconceituosas embasadas apenas no senso comum, quando diz que “a sexualidade se constitui um tabu” e usando-se de terceira pessoa, diz que “as pessoas e até os professores ainda não se sentem à vontade para discutir sobre o assunto”. A desinformação sobre a sexualidade, o aprendizado insuficiente e distorcido sobre a sexualidade tanto para o homem como para a mulher acaba perpetuando mitos, tabus, crendices e concepções errôneas acerca da sexualidade, com maior ou menor força, dependendo do grupo sociocultural no qual se desenvolveram, passando de geração em geração. O homem e a mulher vão sentindo a sexualidade e até se comportando à semelhança de seus pais, avós etc. Se pensarmos desta forma, saberemos que os professores são seres humanos oriundos desta visão de mundo que recebemos dos pais através de seus sistemas de valores. Portanto, passíveis dos mesmos vícios a respeito da sexualidade. O que temos então, a exemplo do discurso do professor, é uma comprovação de que se estes (as) professores (as) não passarem por uma profissionalização sobre Educação Sexual com profissionais capacitados (as), não terão a oportunidade de romper esta cisão de cognição (razão), coerente com uma visão atual de uma sexualidade saudável, prazerosa e feliz, confrontados com os sentimentos de culpa, pecado, feio, sujo, errado sobre a sexualidade pelos sistemas de valores assimilados ao longo da história da civilização. Podemos pensar que a 181 resposta deste professor possa ser uma amostra de muitos que têm a mesma concepção da sexualidade. Segundo Bernardi (1985, p. 25), A família tende a imprimir na personalidade dos subordinados uma determinada estrutura psíquica gravada pela sociedade, e para isto, vale-se de meios sugeridos pela própria sociedade. Em sua versão tradicional, a família desenvolve as funções de impor a própria autoridade, controlar a sexualidade dos filhos e de se apresentar como modelo ideal de comportamento sexual. A identidade sexual e social de cada um de nós é construída, portanto, segundo este contexto no qual estamos inseridos. Pelo recorte da fala desse professor ao discorrer na terceira pessoa, embora demonstre não fazer parte deste grupo de despreparados, podemos perceber, que mesmo indiretamente, na sua fala nos mostra que reconhece ser o (a) professor (a) o (a) convocado (a) a falar sobre Educação Sexual. Corresponde com a teoria de muitos outros autores, que compactuam desde pensamento, inclusive os documentos dos PCNs, que legitima os (as) professores (as) a implementar ações de Educação Sexual. Sobre essa reflexão sobre o entendimento que o professor tem sobre sexualidade, podemos dizer que como entende ou sente a sexualidade é como irá atuar como educador sexual com seus (suas) alunos (as) em sala de aula. De acordo com Vitiello (2000, p. 98): Não devemos nos esquecer que além do conhecimento teórico que é um processo que ocorre a nível consciente e racional, entram em jogo as crenças, que muitas vezes, atuam no campo do irracional e até mesmo do inconsciente. Enquanto o conhecimento apela para a lógica, a crença é baseada na aceitação acrítica de algo como sendo verdadeiro, independente de comprovações racionais. Nossos valores pessoais que se constituem numa espécie traçados de nossas linhas de conduta, dependem muito de conhecimentos e crenças. Por isso, quando se valoriza alguma coisa, tende a modelar a vida de acordo com este padrão de conduta e mesmo que de forma inconsciente, sem 182 intencionalidade tende-se a querer e às vezes até exigir que as outras pessoas valorizem as mesmas coisas, porque acaba modelando a vida de acordo com este padrão de conduta. Enfim, o que o indivíduo pensa e sente é o motor de sua forma de agir. Portanto, é fundamental que o (a) professor (a) que vai atuar com a Educação Sexual deva entender a sexualidade como algo sadio e positivo, estando ele bem adequado com sua sexualidade, tendo coragem de desafiar suas próprias limitações para conseguir a difícil tarefa de cultivar um alto grau à tolerância com relação a diferença, furtando-se de julgamentos. Aproveitando para analisar a rica resposta do professor de História, é interessante relembrar seu discurso: “Principalmente as mulheres, muitas por questões sociais e culturais, têm muita vergonha”. Sem entrar na questão se esta afirmativa do professor procede ou não, até porque não foram encontradas estatísticas que demonstrem, através de trabalhos científicos, ser ou não verídico que as mulheres têm mais vergonha de discutir sobre a sexualidade com os (as) alunos (as). Pode até mesmo ser um mito do professor, advindo da nossa cultura, que o “homem gosta mais de sexo que a mulher”, ou que tem mais facilidade em falar a respeito da sexualidade porque o papel de gênero masculino foi sempre valorizado e incentivada a sexualidade. Assim como podemos levantar a hipótese de mais um mito, de que o homem nasceu sabendo sobre sexo e que, pensando assim, terá mais facilidade para falar sobre sexualidade do que a mulher. O que realmente percebemos é um alto índice de mulheres em busca própria de ler materiais, participar de debates em rádio e TV. Para reforçar esta idéia, insere-se aqui o comentário do ginecologista e obstetra Malcolm Montgomery, feito no Congresso Brasileiro de Sexualidade Humana, em 2002, em sua 183 conferência sobre a sexualidade da mulher moderna, ao se referir a seu livro feito para o pai orientar seus filhos sobre sexualidade: “o engraçado é que fiz um livro direcionado para o pai e quem compra meu livro é a mãe para dar para o marido ou para ler para ele. E na minha conferência sobre este livro, a maioria da platéia são mães”. Mas, queremos direcionar esta afirmação do (a) professor (a) investigado (a) para a análise do pensamento dele (a), abordando a questão do papel de gênero homem e mulher, procurando contextualizar na história as causas sócio-culturais deste pensamento que nos pareceu “machista”. Vivemos numa sociedade que valoriza o padrão “heterossexual, machista, de brancos e católicos”. Portanto, quem estiver fora deste contexto sofre de discriminação por estar à margem. Para ilustrar essa afirmativa, seguem alguns exemplos. Em pesquisa da Unesco, feita em 2000, e publicada em 2004, com título Juventudes e Sexualidade, de um grupo local com professores (as) de uma escola privada de Porto Alegre, descreve o relato de um professor: “respeitar o negro, respeitar a mulher, respeitar o homossexual e a religião... tem coisas que eu mesma tenho dificuldade de aceitar. Eu respeito, mas não aceito ainda. Eu vi dois homossexuais caminhando de mãos dadas, dois homens, e eu fiquei olhando e não acreditando no que eu estava vendo”. Segue um trecho do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros (1987): “O jornalista não pode: d) concordar com a prática de perseguição ou discriminação por motivos sociais, políticos, religiosos, raciais, de sexo e de orientação sexual”. A Declaração dos Direitos Sexuais, Associação Mundial de Sexualidade, Organização Mundial da Saúde (2006) diz: “É prerrogativa de todo ser humano: 4 – o direito à igualdade sexual, contrário a todas as formas de discriminação, 184 independentemente do sexo, gênero, orientação sexual, idade, raça, classe social, religião, deficiência mental ou física”. Essa Educação Sexual que repousa num passado eminentemente patriarcal resulta em concepções do ser homem e do ser mulher, definidos em oposição. O ser homem implica em ter como características: superioridade, poder, força etc, e ser mulher é ter associada as condições de inferioridade e submissão em relação ao homem, beleza, passividade e docilidade. Bourdieu (1995, p. 142) relata que: Cada vez que um dominado emprega para se julgar constitutivos do dominante por exemplo: único/comum etc... Ele aplica a si mesmo, sem o saber, o ponto de vista dominante, adotando, de algum modo, para se avaliar, a lógica do preconceito desfavorável. Nesta época, a mulher introjeta a condição feminina impregnada de sentidos de oposição na inferioridade, enquanto que o homem introjeta o masculino como sinônimo de superioridade e poder. Cornell (1990, p. 171) comenta: “a rígida separação de gêneros representa uma ofuscação ideológica daquilo que partilhamos. Dividir-nos contra é limitar potenciais da expressão humana”. Essas diferenças construídas socialmente e impostas entre homens e mulheres, a história de meninos e meninas segue caminhos diferentes que se cruzam, determinados pelo meio e pela cultura que apresentam peculiaridade que variam no tempo e no espaço. E essas construções acabam interferindo diretamente nas vivências sexuais. Quando a Educação Sexual configura-se de forma primitiva e castrada, portanto inadequada, faz com que a pessoa desenvolva uma imagem errônea diante do entendimento da sexualidade. 185 Se for neste sentido o que o professor quis dizer “que a mulher tem mais vergonha para discutir sobre sexualidade”, devido à repressão, a sua fala reforça nosso pensamento de que a mulher foi mais alvo de repressão que o homem e, conseqüentemente, acontece com mais freqüência de a mulher sentir mais vergonha, culpa e associar a sexualidade a pecado, muitas vezes a ponto de impedir a resposta aos estímulos eróticos, exercendo sobre a mulher o condicionamento social que lhe impede de ser totalmente livre em seu desempenho sexual. Nesse sentido, a repressão sexual que atuou mais fortemente na figura feminina se traduz muitas vezes numa visão da mulher em relação à sexualidade associada a dever, compromisso com o parceiro e sem sensação de prazer, alterando desta forma o curso natural e espontâneo da sexualidade, bloqueando o fenômeno biológico do instinto sexual, por conseqüência da história da sexualidade que iniciou na Antiguidade clássica, influenciando no comportamento da mulher da sociedade atual, promovendo desta forma uma inadequação sexual. Por esse motivo, podemos encontrar em consultórios de psicoterapia sexual, homens e mulheres em descompasso no que se refere à motivação para o sexo, alterando sobremaneira as respostas sexuais humanas de desejo, excitação e orgasmo, devido ao acentuado peso conferido pela sociedade eminentemente machista. Neste ponto da reflexão, pode-se dizer que, com a experiência da pesquisadora como educadora sexual no trabalho de consultório como psicoterapeuta sexual, mesmo que o homem também administre inadequações sexuais devido à construção social da dicotomia dos papéis de gênero de forma estereotipada, reservando ao homem a imagem de sexo forte e a mulher sexo frágil, 186 ainda recai, em maior escala, sobre a mulher a administração de não se realizar sexualmente. Segundo Silva (1989, p. 39), “o casal é resultado da união de duas pessoas, logo, duas realidades bio-psicossociais distintas, que devem se encontrar num objetivo comum e em atividades complementares para que o momento sexual exista”. E é claro de modo sistêmico, qualquer alteração num desses planos que compõe a complexidade da sexualidade: orgânico, psicológico e sociocultural de qualquer um dos dois envolvidos na relação, podem inviabilizar uma resposta sexual plena e satisfatória. Sendo assim, altera também a visão da sexualidade. Segue o pensamento de Pacovi (2002, p. 176): Somo seres humanos, portanto, mutáveis, tendo a capacidade de renovação a cada dia. Para tanto, faz-se necessário estudar nossa própria história, nossas transformações, evoluções, ocorridas em diferentes épocas, e seus reflexos em nossa cultura, nosso pensamento, sentimento e comportamento incluindo aí o entendimento sobre a sexualidade. 2) Entendimento sobre Educação Sexual TABELA 2: ENTENDIMENTO SOBRE EDUCAÇÃO SEXUAL Opinião Professores % Abrange vários fatores (gravidez, DSTs, Aids) 3 10 Orientação correta 8 27 Limites para o corpo 1 03 Melhor entendimento do corpo, do ser humano e o ato sexual Respeito por si mesmo e pelo outro 17 57 01 03 TOTAL 30 100 A partir dos dados apresentados na Tabela 2 (ver apêndice) acerca do entendimento do (a) professor (a) sobre a Educação Sexual, obtivemos os seguintes 187 resultados: 57% dos sujeitos apontaram que entendem a Educação Sexual como sendo um “melhor entendimento do corpo, do ser humano e do ato sexual”, 3% entendem como “limites para o corpo”. Estas respostas demonstram uma carência dos (as) professores (as) com o 1º dos eixos de conteúdos propostos pelos PCNs sobre o corpo como sendo a matriz da sexualidade. Nos PCNs (Brasil, 1998, p. 95), os conteúdos são organizados em três blocos: 1º - Corpo, matriz da sexualidade; 2º - Relação de gênero; 3º - Prevenção às DSTs/AIDS. Sendo que 3%, novamente, responderam entender a Educação Sexual como “respeito por si mesmo e pelo outro”. Nos documentos prescritos nos PCNs sobre a Educação Sexual, consideram a sexualidade como uma expressão cultural e o aborda em suas dimensões: biológica, psíquica e sócio-cultural, vinculando com a questão da cidadania. E estes 3% dos (as) professores (as) que entendem Educação Sexual como respeito a si mesmo e pelo outro corresponde com a visão dos PCNs, vinculando sexualidade e cidadania, a ética e os direitos humanos. E 10% entendem a Educação Sexual como uma abrangência de vários fatores como gravidez, DSTs/AIDS, que também estão em ressonância com o 3º bloco de conteúdos dos PCNs, que se refere à prevenção a estas doenças e que estão ligadas à educação voltada à saúde sexual. Sem dúvida, um trabalho preventivo em relação à AIDS e gravidez indesejada são questões de urgência social e sua relevância é indiscutível. 188 É possível identificar que a justificativa para a implantação da Educação Sexual pelo MEC é uma estratégia de prevenção das doenças sexualmente transmissíveis e também da gravidez precoce. De acordo com os PCNs (Brasil, 1997, p. 111): A partir dos anos 80, a demanda por trabalhos na área de sexualidade nas escolas aumentou devido à preocupação dos educadores com o grande crescimento da gravidez indesejada entre os adolescentes e com risco de contaminação pelo HIV (vírus da AIDS) entre os jovens. Enfim, a AIDS é um dispositivo que vem atuando para controlar e regular a população. Com as respostas obtidas dos (as) professores (as), evidenciou-se que a escola tem procurado regular a sexualidade das crianças, pré-adolescentes e adolescentes do Ensino Fundamental do 1º e 2º ciclos, com uma Educação Sexual centrada nos fenômenos biológicos, atendendo interesses políticos, a exemplo da resposta de uma professora de Geografia: “Educação sexual é o entendimento do corpo, seu funcionamento e alterações que ocorrem durante uma relação sexual”. Segue mais uma resposta do professor de Ciências e Biologia, que atua há 27 anos e tem 53 anos de idade: “Educação sexual é passar conhecimento sobre o aparelho reprodutor masculino e feminino e provocar no aluno o sentimento de responsabilidade em relação aos cuidados com o corpo (DSTs) e na possibilidade de gerar filho”. Encontramos essa visão médico-higienista nas respostas dos (as) professores (as). Vejamos mais um exemplo na resposta de um professor de Educação Física de 35 anos, do sexo masculino: ”Educação sexual é ensinar as pessoas a entender o próprio corpo, suas características e funções, e também como se relacionar com outras pessoas prevenção de doenças e gravidez precoce”. 189 Figueiró (2000, p. 19) comenta: A educação sexual ter sido incluída pelo critério de urgência social devido a problemas que a vivência sexual traz para sociedade, pode interferir no sentido dado pelo professor no ensino das questões da sexualidade. A preocupação da escola em resolver e controlar os problemas de DSTs e gravidez torna um trabalho pesado aos professore, porque sexualidade fica associada à doença, problema etc, e desvincula as energias dos professores que poderiam ser redobradas se falasse de sexualidade de forma alegre e honesta. Segundo o comentário de Figueiró (2000), podemos perceber que a Educação Sexual na escola, sob a concepção dos (as) professores (as) respondentes, tem o objetivo de controle da sexualidade. O (a) professor (a) não vê outra forma de educar sem acessar o sistema de controle proposto pela política. Neste sentido, têm-se utilizado diferentes discursos como o biológico, o pedagógico, o das crianças assexuadas e o da família-reprodução. Com a proposta dos PCNs sobre Educação Sexual como Tema Transversal, oferece parâmetros de que, como e quando falar a respeito da sexualidade das crianças do Ensino Fundamental. Neste sentido, não há um silêncio na escola em relação à sexualidade. O que vem ocorrendo é um mecanismo de interdição, como pudemos constatar nas respostas dos (as) professores (as), referente a esta questão, ou seja, pode-se falar de sexualidade das crianças, mas dentro de regras que controlam e legitimam o discurso autorizado, como o biológico. Para Foucault (1998, p. 09), “a interdição é um procedimento externo que regula os discursos: sabe-se bem que não se tem direito de dizer tudo, que não se pode falar tudo em qualquer circunstância, que qualquer um não pode falar de qualquer coisa”. Há uma expectativa social de que os (as) professores (as) possuem um conjunto de saberes necessários para implantação das políticas educativas referente 190 à Educação Sexual dos alunos. Os (as) professores (as) são legitimados (as) para o desenvolvimento de atividades de Educação Sexual e a escola amplia suas funções, sendo classificada como espaço para resolução de problemas sociais, a fim de enquadrar, preparar e conduzir os (as) alunos (as) à vida adulta e a escola vai ganhando mais atribuições. Conseqüentemente, ganham mais poder e a escola transfere para os (as) professores (as) a responsabilidade pela difusão das informações e formações necessárias à boa vivência da sexualidade. Mas trabalhar com uma proposta de Educação Sexual, mesmo pela via da transversalidade, é uma luta e um desafio para os (as) professores (as), devido aos tópicos ainda serem polêmicos e envolverem conhecimento sobre a temática de Educação Sexual através das múltiplas concepções históricas construídas de uma cultura de negação do corpo. Demonstrado nas respostas dadas pelos (as) professores (as) sobre o que é Educação Sexual apontando para respostas reducionistas da sexualidade humana, logo da mesma forma sobre o entendimento da Educação Sexual voltada para o biológico. Compreendemos que isto seja decorrente de uma trajetória repressiva, mas não podemos nos contentar com o reduzir da Educação Sexual a uma concepção de apenas controle e prevenção da saúde sexual, isto é, uma visão médico-higienista. Mediante constatações como essas, temos que procurar condições para que o professor pense a Educação Sexual como uma construção histórica, ajudando os (as) professores (as) a criar novas concepções sobre Educação Sexual, acreditando que as pedagogias escolares relacionadas à temática da sexualidade constituem uma possibilidade de estabelecer uma nova cultura de viver bem a sexualidade voltada para uma melhor qualidade de vida, ajudando os (as) alunos (as) no 191 conhecimento seguro de si mesmos (as) e das questões da sexualidade, para que possam viver de maneira feliz, segura e responsável a sua sexualidade. Complementando esta análise com as palavras de Vitiello (2000, p. 100): A Educação Sexual não deve manter-se nos estreitos – ainda que importantes, objetivos de evitar gestações indesejadas, DSTs/AIDS, mas sim, promover a felicidade das pessoas. Deve-se educar para uma liberdade responsável que façã com o indivíduo não apenas busque seu prazer sexual, mas respeite a liberdade sexual, os limites e a integridade dos outros. Dentro desses objetivos, evitar AIDS e gestações indesejadas serão conseqüências naturais. Podemos concordar com 27% dos sujeitos que entendem Educação Sexual como “orientação correta”, se for no sentido de promover a felicidade, preparando os alunos para usarem de maneira responsável sua liberdade, sendo então um agente promotor da felicidade individual e coletiva. Podemos dizer que esta é uma Educação Sexual adequada, porque orientação certa é difícil de definir, pois depende do momento e do lugar em que o indivíduo está inserido. Podemos, assim, verificar que nos foi dada uma resposta vaga sobre o que é Educação Sexual, por não entender o seu significado ou levantar a hipótese de uma posição rígida por parte dos (as) professores (as) do que seja certo na sua concepção, mas não especificar e nem explicar a resposta. Podemos também, com esta resposta, comentar a respeito da confusão de nomenclaturas, porque se pergunta o que é Educação Sexual e a resposta é orientação sexual certa. Para 27% dos (as) professores (as) os termos são considerados sinônimos, não tendo uma clareza da diferença entre Educação Sexual e Orientação Sexual. 192 3) Entendimento sobre Tema Transversal TABELA 3: ENTENDIMENTO SOBRE TEMA TRANSVERSAL Opinião Professores % É trabalhado em paralelo com conteúdo programático É trabalhado em conjunto com as demais disciplinas Conteúdo extracurricular 07 18 02 23 60 07 Trabalha com temas do cotidiano referente à sociedade, humanidade e cidadania Não sabe 01 03 02 07 TOTAL 30 100 Quanto à proposta dos Parâmetros Curriculares, perguntou-se aos (às) professores (as) se estes conheciam os temas transversais e 60% responderam, de acordo com a Tabela 3 (ver apêndice), que “é trabalhado em conjunto com as demais disciplinas”, sendo que 23% dos sujeitos responderam que o tema transversal é trabalhado em paralelo com conteúdos programáticos. Somente 7% responderam como sendo conteúdo extracurricular e 3% entenderam como um trabalho com temas do cotidiano referente à sociedade, humanidade e cidadania. Percebe-se que uma minoria tem uma visão mais abrangente do que seja tema transversal, segundo as propostas dos PCNs. Constatamos que somente 7% dos (as) entrevistados (as) não sabem nada acerca da transversalidade. Todos os outros percentuais demonstram algum conhecimento coerente com a proposta dos PCNs sobre transversalidade, mesmo que de forma fragmentada e pouco abrangente. Todos os demais estão certos em suas afirmações, pois a Educação Sexual passou a fazer parte do currículo escolar como tema transversal a partir de 1999, por determinação do Ministério da Educação. Portanto, a sexualidade deverá ser ensinada como um tema transversal por todas as áreas de conhecimento. 193 O documento dos PCNs oferece um parâmetro, em linhas gerais, o que deve ser ensinado em cada série. Estabelece seis Temas Transversais: Ética, Educação Ambiental, Pluralidade Cultural, Saúde e Orientação Sexual (como já foi dito inicialmente, neste estudo o termo utilizado é Educação Sexual). Os Temas Transversais dizem respeito a conteúdos de caráter social que devem ser incluídos no currículo de forma “transversal”, ou seja, não como uma matéria específica, mas como um conteúdo a ser ministrado dentro das várias áreas de conhecimento, perpassando cada uma delas. A exemplo da fala do professor de Educação Física, que diz: “são assuntos que não fazem parte do currículo básico de educação, mas devem ser trabalhados”. O professor de Matemática, por sua vez, acredita que são “questões sociais sendo trabalhados dentro de cada disciplina curricular”. Já o professor da Língua Portuguesa diz que “são assuntos referentes à sociedade e à humanidade que abordamos na escola, além dos conteúdos programáticos”. Uma outra fala, desta vez, do professor de Filosofia: “são temas que perpassam os conteúdos das disciplinas, tais como Educação Ambiental, Educação Sexual, Ética etc”. A professora de Ciências, em sua fala, cita que “são temas trabalhados em conjunto, com o planejamento”. O professor de História relata que “são temas universais que deveriam ser trabalhados por todas as disciplinas”. De acordo com a professora de Artes, são “temas que podem ser trabalhados de forma interdisciplinar como, por exemplo, a sexualidade, Ética etc”. A Educação Sexual, assim como os outros temas, pode ser ensinada por todos (as) os (as) professores (as), de 1ª a 8ª série, de duas formas, de acordo com Figueiró (1999, p. 65): 194 Dentro da programação: é quando o conteúdo de sexualidade proposto para cada série é organizado, planejado e dividido entre os professores, para ver quem vai ensinar o que. Pode ser que numa série, sejam os professores de Português, História e Ciências que se sentem capazes e querem ensinar sobre sexualidade. Então, ensinarão o conteúdo da sexualidade dentro de suas próprias aulas. Em outra série, ou escola, pode ser a professora de Matemática e a de Educação Física, por exemplo. Quando a professora é única da sala, como acontece nas séries iniciais, deve organizar-se para ensinar os conteúdos estipulados para aquela série, dentro de algumas matérias, onde perceber condições de encaixar. Como extra-programação: é quando todo e qualquer professor, sem ter planejado, aproveita uma situação, um fato que acontece espontaneamente, para, a partir daí, ensinar sobre sexualidade, ou passar uma mensagem positiva sobre a sexualidade; aproveita, enfim, para educar sexualmente. Entre os (as) respondentes, 7% vêem a transversalidade como conteúdo extracurricular e podemos encaixar dentro desta segunda forma descrita como extraprogramação. E nesta última forma de cumprir a transversalidade que se encaixam na Educação Sexual informal. Tudo o que se aprendeu sobre o lidar com cada fato ou situação que envolve a sexualidade ilustra o que é atuar na extra-programação. Vejamos uma descrição de um professor de Biologia: “são temas que podemos fazer “ganchos” com o conteúdo programado para cada série”. Podemos concluir que, de alguma forma, a maioria demonstra ter algum conhecimento do que seja Tema Transversal, com exceção daqueles 7% que não sabem absolutamente nada, a exemplo do que descreve a professora de Geografia: “não sei o que é tema transversal, nunca ouvi falar sobre estes temas, não tenho conhecimento”. Felizmente, poucos responderam não saber sobre o Tema Transversal. 195 4) Como trabalhar na transversalidade TABELA 4: COMO SE DEVE TRABALHAR NA TRANSVERSALIDADE? Opinião Professores % Simultaneamente com o conteúdo curricular 22 74 Deve ser abordado fora da sala de aula em forma de: Projetos, palestras, seminários etc Não sabe e nunca teve contato 06 20 01 03 Resposta incoerente (é necessário saber trabalhar...) TOTAL 01 30 03 100 Trabalhar simultaneamente com o conteúdo curricular foi a resposta de 74% dos (as) professores (as), como pode ser observado na Tabela 4 (ver apêndice). Segue a resposta de uma professora de Educação Física: “deve se trabalhar transversalidade das várias matérias, dentro do seu contexto, aproveitando o tema para trabalhar em sala de aula”. É útil dizer que, além das duas formas descritas na questão anterior de trabalhar a transversalidade “dentro do programa” e como “extracurricular”, de acordo com os PCNs, descrito por Figueiró (1999, p. 66): Cada escola precisa criar, de 5ª a 8ª série, um espaço próprio para que os alunos tenham, semanal ou quinzenalmente, por exemplo, aula específica de Educação Sexual, num horário próprio. Pode ser dentro do horário normal dos alunos, ou em horário extra, ou seja, num período no qual os alunos não tenham aula. Em cada escola, os profissionais terão que estudar, discutir e planejar para ver qual melhor forma de trabalhar, e ver quais os professores que poderão comprometer-se com o ensino planejado da sexualidade. Elucida esta explicação de Figueiró (1999) a resposta do professor de Português, quando diz: “acho interessante o envolvimento do tema na disciplina de cada professor de forma que seja trabalhado de maneira multidisciplinar”. Mas 20% responderam que o trabalho na transversalidade deve ser abordado fora da sala de aula em forma de projetos, palestras ou seminários. A 196 exemplo de outro professor de Português, “estes temas devem ser abordados em forma de palestras, teatros, seminários, exposições, feiras por outros profissionais”. Esta posição não corresponde com a proposta dos PCNs, cujos (as) profissionais responsáveis por uma Educação Sexual sistemática são os (as) próprios (as) professores (as) e não profissionais de fora da escola que ministrarão palestras, cursos ou venham para desenvolver projetos com os (as) alunos (as). Como esclarece Vitiello (2000, p. 96), Estes profissionais vindos de fora da escola não estão exercendo verdadeiramente a educação sexual, mas sim funcionando como meros informadores. Claro que essas tentativas são bem intencionadas, mas funcionam no sentido de desmitificar o tema, mas são absolutamente contraproducentes enquanto medidas educadoras. Portanto, reafirmamos que o caminho é capacitar professores (as) interessados (as) para a tarefa de Educação Sexual e não levar profissionais às escolas. Se fosse suficiente levar informação aos (às) alunos (as), poderíamos então nos perguntar qual seria a causa de ainda existirem tantas gestações indesejadas e tantas doenças sexualmente transmissíveis, se o uso de métodos anticoncepcionais são, na atualidade, tão seguros e os preservativos tão simples, baratos e de larga divulgação em meio à população. É evidente que não se trata de falta de informação, mas de atitude. Vitiello (2000, p. 57) define: Atitude pode ser definida como sendo a disposição que uma pessoa tem para agir de forma favorável ou desfavorável em relação a uma participação e depende não só de conhecimentos, mas também da forma como sentimos os fatos expressos por esse conhecimento. É dessa interação que se origina a maneira de agir, o comportamento de cada pessoa, pois a maneira de pensar de cada um depende muito de suas 197 vivências e da maneira como decorreu seu aprendizado social. Com base nessa maneira de sentir é que a pessoa vai estruturar seu pensamento. Além do conhecimento, entram em jogo as crenças que aqui atuam no campo do inconsciente. Nossos valores pessoais se constituem numa espécie, traçadas de nossas linhas de conduta, dependem muito de conhecimentos e crenças. Firmamos assim, com esse raciocínio desenvolvido por Vitiello (2000), que a educação não se constitui só em informação. A educação que compreende a modificação da atitude é ampla. O processo educativo propicia um crescimento de dentro para fora, num processo reflexivo que ocorre com pessoas significativas e numa relação duradoura e de continuidade. Por isso, somente os familiares e professores (as) são indicados (as) para o trabalho de Educação Sexual formal. Além dos 20% dos (as) professores (as) que vêem o trabalho da transversalidade diferente dos PCNs, encontramos 3% que sequer sabem como seria um trabalho na transversalidade, dizendo nunca terem tido contato. Exemplificamos com a resposta de uma professora de História: “não sei e nunca tive contato com isso”. Também aparecem 3% de respostas incoerentes, vazias e sem sentido, como podemos verificar na resposta do professor de Ciências: “sempre que você pode enriquecer o conteúdo, fazer com que ele se torne mais atrativo para o aluno”. Isso demonstra um desconhecimento sobre o que seja o trabalho na transversalidade. Alguns autores demonstram preocupação com a possibilidade de a Educação Sexual ter sido oficializada nas escolas, dado o risco de que caia em mãos de professores (as) despreparados (as) e repressores (as). 198 Guimarães (1995, p. 85) faz o seguinte alerta: A Educação Sexual apresenta um grande risco de tornar-se essencialmente repressiva se oficializada ao acaso, isto é, sem devido planejamento e preparo dos professores. Há entre nós, latinos, forte herança de educação moralista, com influências repressivas (todas as religiões) muito presentes e que podem dominar a educação sexual como uma doutrinação. Um outro tipo de preocupação é apontado por Nunes e Silva (2000, p. 65) quando afirmam: “ainda não temos oportunidades institucionais suficientes e condições materiais e afetivas para preparar os professores que irão assumir os trabalhos escolares em sexualidade humana”. Nesse sentido, é útil considerar a proposta presente no texto de apresentação dos Temas Transversais: O desafio aqui proposto é o de não esperar por professores que só depois de prontos ou formados poderão trabalhar com os alunos. Sem desconhecer a necessidade de investir na formação inicial e de criar programas de formação continuada, é possível afirmar-se que o debate sobre as questões sociais (os temas transversais) e a eleição conjunta como a formulação e a implementação dos projeto educativo, já iniciam em processo de formação e mudança. (BRASIL, 1998, P. 32) Embora possamos ver descritos nos PCNs de que existem riscos devido ao despreparo do (a) professor (a), acredita-se que só assim podemos ver as escolas envolvidas, de fato, com o trabalho da Educação Sexual. Pior seria continuar no silêncio das escolas no que se refere à sexualidade. 199 5) Realização de atividades de educação sexual com alunos TABELA 5: A ESCOLA REALIZA ATIVIDADES DE EDUCAÇÃO SEXUAL COM ALUNOS? Opinião Professores % Sim (Projeto Rede da Vida, palestras e produção de textos) Sim (Alunos participam do projeto) 25 85 01 03 Sim (Só alguns professores participam) 01 03 Sim (Produção de texto para os alunos perceberem responsabilidades) Não 01 03 01 03 Não sabe 01 03 TOTAL 30 100 Na escola A, que mantém há anos projeto de sexualidade oferecida pela ONG, 14 professores (as) (93%) investigados (as), referem-se à realização de atividades de Educação Sexual oferecida pela ONG. Sendo que apenas 1 professor diz desconhecer se a escola realiza ou não atividades de Educação Sexual aos (às) alunos (as). Segundo a resposta do professor: “Já vi cartaz na parede da escola, sobre o projeto da ONG, mas não envolve todos os professores. Eu mesmo nem sei se é trabalhado e nem a forma como é trabalhado”. Na resposta afirmativa da maioria dos (as) professores (as) sobre a existência de Educação Sexual na escola seguem algumas respostas dos (as) professores (as) para ilustrar tal afirmativa: Professor (a) 1: “Existe Educação Sexual oferecida pela ONG Rede da Vida. Eu não realizo atividades de educação sexual em sala de aula, somente se há alguma pergunta, mas o resto dos professores fazem... Eu trabalho pouco. Mas sei que a escola oferece palestras, teatro, cursos, mas não é sempre.” Professor (a) 2: “Existe trabalho oferecido pela ONG, mas sobre o tema sexualidade eu não trabalho diretamente, às vezes trago alguns textos.” 200 Professor (a) 3: “ONG realiza atividades. Palestras, teatro sobre saúde do corpo, gravidez precoce na adolescência e de prevenção de DST / Aids. E imagino que nas aulas de Ciências e Biologia que ensina sobre o aparelho reprodutor, deva aproveitar para trabalhar sobre a educação sexual.” Professor (a) 4: “Existe há muito tempo trabalho oferecido pela ONG Rede da Vida com palestra para professores interessados e alguns alunos participam também, teatro. Na sala de aula cada professor(a) trabalha do seu jeito, sobre saúde, gravidez, DSTs, etc.” Percebe-se que a maioria deposita confiança de que alguém está promovendo atividade de Educação Sexual na escola, ONG ou algum (uma) professor (a), mas o (a) próprio (a) professor (a) investigado (a) refere-se não implementar ações de Educação Sexual em sala de aula com os (as) alunos (as). Mas sabe-se que a escola está promovendo estas ações através de palestras oferecidas pela ONG Rede da Vida, teatros que participam professores (as) e alunos (as) voluntários (as). Portanto, nesta escola A é realizado atividades de Educação Sexual com os (as) alunos (as). Mas não dentro da proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais, como sendo a Educação Sexual um tema transversal. O que ocorre é um projeto de sexualidade a fim de diminuir o índice de gravidez na adolescência e prevenção de DST / Aids. E participam desde projeto alguns (umas) professores (as) voluntários (as) e alunos (as), com objetivo de atuarem como multiplicadores (as). Uma proposta interessante e válida, mas diferente da transversalidade da educação sexual proposta pelos PCNs. Na escola B, que não possui nenhum projeto de Educação Sexual previsto no projeto pedagógico da escola, os (as) professores (as) que participaram da pesquisa 201 responderam que a escola realiza algum tipo de atividade de Educação Sexual com os (as) alunos (as), sendo que 6 responderam que a escola não oferece nenhuma atividade de Educação Sexual. Os (as) 9 professores (as) que responderam afirmativamente para realização da escola com projeto de Educação Sexual, responderam da seguinte forma. Seguem algumas respostas dadas por estes (as) professores (as): Professor (a) 1: “Quando necessário eu falo sobre sexualidade, em certos momentos das aulas.” Professor (a) 2: “Eu não trabalho Educação Sexual com os alunos, mas as disciplinas de Ciências e Biologia devem trabalhar.” Professor (a) 3: “Cabe a disciplina de Ciência e na disciplina de Educação Física que trabalhem o corpo.” Professor (a) 4: “Com certeza o professor de Biologia trabalha educação sexual quando surge o tema corpo humano.” Professor (a) 5: “É realizado atividade de Educação Sexual com todos os professores que se sintam a vontade e capacitados para esse trabalho. Mas eu não me sinto a vontade, não tenho jeito embora tenha participado de curso de Educação Sexual oferecido pelo MEC há alguns anos atrás. Mas imagino que o professor de Ciências e Biologia realizem essa atividade de Educação Sexual quando tem que falar de anatomia do corpo, daí devem aproveitar para prevenir sobre gravidez e DST, uso de preservativo e anticoncepcional.” Com exemplo destas respostas dadas pelos (as) investigados (as) percebe-se que o (a) professor (a) não implementa ações de Educação Sexual nem nos moldes dos PCNs, nem de outra forma, mas considera importante, porque acredita que algum (a) professor (a) deva estar implementando ações de Educação Sexual na 202 escola. A maioria atribui que deva ser ministrada a educação sexual nas aulas de Ciências e Biologia. Mostrando que a proposta dos PCNs que considera a Educação Sexual um trabalho para todas as disciplinas, não foi bem assimilado na prática pedagógica desta escola. Também podemos pontuar que mesmo com a oferta de curso que o (a) professor (a) tenha participado sobre Educação Sexual, não é suficiente para que o (a) professor (a) implemente ações de Educação Sexual, como foi o discurso do professor que recebeu o curso oferecido pelo MEC, mas não implementa ações por não se sentir à vontade, referindo não ter jeito. Reflete que a capacitação vai além de cursos preparatórios sobre Educação Sexual, isto é, além do aperfeiçoamento contínuo sobre a temática, o professor se tiver “jeito”, “carisma”, enfim, uma habilidade inerente à pessoa, facilita a atuação com a temática da sexualidade, mesmo não sendo tão importante quanto o conhecimento científico sobre o tema. Esta espontaneidade do (a) professor (a) pode facilitar o contato do tema com os (as) alunos (as). 6) Por que a escola trabalha ou não com o tema? TABELA 6: POR QUE A ESCOLA TRABALHA OU NÃO COM O TEMA? JUSTIFIQUE. Opinião Professores % Para orientar, conscientizar os alunos 17 57 Para prevenir a gravidez na adolescência 04 13 A escola reconhece como um trabalho necessário, mas não prepara os professores para trabalhar com o tema Para prevenção de DSTs, Aids devido à relação sexual precoce na adolescência Não trabalha por falta de pessoal capacitado 03 10 02 07 03 10 Não trabalha por ainda ser um tabu 01 03 TOTAL 30 100 203 Os (as) educadores (as), de uma forma geral, têm consciência da importância de um programa de Educação Sexual (87%) e se referem à omissão das famílias às discussões sobre questões sexuais, como demonstra a Tabela 6 (ver apêndice). Assim, é delegada à escola a responsabilidade da realização deste trabalho. Essa maioria dos (as) respondentes (as) favoráveis à implantação de um projeto de Educação Sexual justificou essa necessidade por diversos motivos que podem ser observados na tabela 6 a seguir. As opiniões sobre a importância de um programa de Educação Sexual dentro das escolas divergem, embora num contexto geral afirmem pela real necessidade da implantação de projetos voltados ao tema. Inseridas nessa maioria, estão as justificativas que valorizam o trabalho de orientação e conscientização dos alunos (57%), a prevenção da gravidez precoce (13%) e das DSTs/AIDS (07%), além do reconhecimento dos (as) próprios (as) professores (as) de que esse trabalho é necessário, mas que não há uma capacitação qualificada para sua execução. De acordo com Bruns et al. (1995), a importância de se falar em questões relativas à sexualidade nas escolas deve-se ao fato de que, na maioria das vezes, é na escola que o jovem entra em contato com outros valores e significados referentes às questões sexuais e tem a oportunidade de fazer o confronto e elaborar sua própria conduta. O autor ainda afirma que: Isto é importante porque a família esquivando-se dos assuntos e vivências sexuais dos jovens, acaba por não lhes oferecer uma orientação sexual que realmente os auxilie em suas dúvidas e/ou dificuldades, delegando para a escola tarefas primordialmente suas. (BRUNS et al, 1995, p. 62) Os (as) professores (as) demonstram uma forma tímida e limitada da abordagem do tema na escola, tal como evidenciado no depoimento de alguns 204 (umas) professores (as), como o exemplo a seguir: “Quando surge esse tipo de assunto dentro de sala, aí eu paro a aula e respondo as questões que os alunos têm, ou tento responder, porque nem tudo a gente sabe na hora.” Neste caso, aparece o (a) professor (a) trabalhando o tema de Educação Sexual de acordo com a proposta dos PCNs, de forma transversal ao conteúdo do programa. O (a) professor (a) aborda a temática sexualidade em sala de aula de acordo com a necessidade manifestada pelos (as) alunos (as), o que nos leva a pensar que essa atitude pode conduzir a um silenciamento desse assunto, caso os (as) alunos (as) não manifestem dúvidas por motivos de timidez, insegurança, repressão ou medo de serem repreendidos ou ridicularizados pelos outros. A proposta de trabalhos de forma integrada à Educação Sexual e saúde na escola, ou seja, de modo transversal e não em momentos estanques e em horários previamente determinados, pode levar à reflexão na escola sobre a importância da Educação Sexual em contraturnos, isto é, abordando o tema de formas diferentes para discutir o assunto sempre que houver oportunidade em sala de aula no horário escolar e também de forma extracurricular. A seguir, o depoimento de outro professor: “Bem, a primeira coisa é que o tema tem que estar relacionado com o programa da série. Então, na programação normal, 7ª série que trabalha com o corpo humano. Então, vem a questão da sexualidade na 7ª série. Com relação à 5ª, 6ª e 8ª séries vem como mais ou menos um tema transversal (...) Então, tento responder e orientar na medida que eles precisam. E na 7ª série é específico o conteúdo do corpo humano. Aí aproveito para conscientizar os alunos para que eles possam evitar problemas sexuais como gravidez precoce e DSTs”. 205 Como foi mencionado na fundamentação teórica deste estudo, o (a) professor (a), ao exercer ações de educação sexual no contexto escolar, deve ir além do aspecto biológico. A Educação Sexual como parte da educação geral das pessoas vem se processando nos diferentes contextos sociais, segundo intenções diversas, tais como: morais, religiosas, médico-higienistas, pedagógicas ou político- emancipatórias. A identificação da abordagem higienista-médica predomina no discurso dos (as) professores (as) pesquisados (as). Esta constatação pode ser feita pelas observações da atuação ou até mesmo por meio de seu relato, como no discurso acima, sobre a forma como desenvolve seu trabalho em sala de aula. A escola pode ser considerada o espaço privilegiado para informar e conscientizar o (a) jovem de que sexo pode ser dissociado de problema e doença e associado com prazer e vida. Os PCNs, a partir de 1997, vem contemplar a Educação Sexual dentro das escolas, com vistas à promoção da saúde das crianças e dos (as) adolescentes “e a realização de ações preventivas às doenças sexualmente transmissíveis/AIDS de forma mais eficaz (...) prevenção de problemas graves como abuso e a gravidez indesejada”. (BRASIL, 1997, p. 114) Na visão de Maia et al. (1993), existem duas tendências a serem consideradas em relação ao tipo de Educação Sexual que deve ser passada ao adolescente. A primeira em que se assume a postura sexualmente ativa do adolescente e o instrumentaliza para prevenir-se de gravidez indesejada e DSTs/AIDS. A outra tende para uma visualização holística da sexualidade e facilita, 206 para a criança e para o adolescente, o entendimento das razões de seu comportamento e a introdução de noção de auto-estima, afeto e responsabilidade. Ao trabalhar a questão da Educação Sexual, a maioria dos (as) professores (as) mostrou realizar tal atividade baseada predominantemente no conteúdo programático. Assim, a temática é abordada quase que unicamente na 7ª série, pelo estudo do corpo humano com enfoque no aspecto biológico e, muitas vezes, não incorpora temas que ressaltam a sexualidade como um todo. Não abrange as ansiedades e curiosidades das crianças e não inclui as dimensões culturais, afetivas e sociais contidos no mesmo corpo. Essa atitude pode estar ligada às deficiências em sua formação profissional. Na maioria das vezes, o (a) professor (a) não teve a oportunidade de fazer uma reflexão mais aprofundada sobre as relações interpessoais e o enfoque biopsicossocial da sexualidade durante sua formação. O (a) professor (a), muitas vezes, não planeja as ações de Educação Sexual e discute o assunto a partir de solicitação dos (as) próprios (as) alunos (as). Cabe também reforçar que o (a) educador (a), sem perceber, transmite valores com relação à sexualidade no seu trabalho cotidiano. A prática tem apontado o (a) professor (a) de Ciências ou Biologia como aquele (a) que, prioritariamente, realiza as ações de Educação Sexual no ambiente escolar. Mesmo abordando o aspecto biológico, nada garante que ele (a) esteja ou se sinta preparado (a) para trabalhar as questões mais abrangentes que envolvem a sexualidade. De acordo com Vitiello (1994, p. 210), “não é obrigatório, como habitualmente se pensa, que o (a) professor (a) para fazer Educação Sexual seja sempre o de Biologia, que aliás está freqüentemente muito comprometido com os aspectos biológicos da sexualidade”. Independente da formação inicial do (a) 207 professor (a), é importante que o (a) mesmo (a) tenha uma visão mais abrangente sobre o tema e que esteja atualizado (a) e capacitado (a) para discutir com os (as) alunos (as) os assuntos referentes às questões sexuais, sem impor valores e normas morais. Para Meyer (s/d, p. 12), “a prática de instruir crianças e adolescentes a adquirirem bons hábitos de saúde (...) com um forte componente moral e disciplinas” entrou na escola a partir do movimento higienista, no início do século XX. Essa prática não é uma pontuação adequada por associar a sexualidade apenas ao biológico, sendo que o objetivo é um enfoque emancipatório para a Educação Sexual, que consiste em ajudar as pessoas a viverem sua sexualidade de maneira saudável e feliz, participando construtivamente da transformação de valores e normas sociais relacionados à sexualidade. Vitiello (1994, p. 207), ao discutir a temática, ressalta que “a educação sexual, especificamente, deve ter o objetivo de promover a felicidade, preparando as pessoas para usarem de maneira responsável sua liberdade, sendo assim um agente de promoção da felicidade individual e coletiva”. Para o autor, a Educação Sexual não deve se manter ligada, predominantemente, aos objetivos de prevenir as DSTs e as gestações não planejadas, mas promover a felicidade das pessoas. Observa ainda que se deve educar para uma liberdade sexual consciente e responsável, baseada no respeito para consigo e para com o outro. Agindo assim, as pessoas estarão, conseqüentemente, fazendo a prevenção de doenças e de gravidez não planejada. 208 Enfim, a escola tem a função de contribuir para uma visão positiva da sexualidade, como fonte de prazer e realização do ser humano, assim como somar consciência e responsabilidades. 7) Professores ou profissionais responsáveis pelo tema? TABELA 7: QUAIS SÃO OS PROFESSORES OU PROFISSIONAIS RESPONSÁVEIS POR ESTA QUESTÃO? Opinião Professores % Responsáveis pela ONG 01 03 Professores que participaram do curso (multiplicadores) Responsáveis pela ONG e professores capacitados Professores 07 23 03 04 10 13 Todos 13 44 Não sabe 02 07 TOTAL 30 100 Na escola A, 27% dos (as) professores (as) responderam que os (as) responsáveis pela Educação Sexual são os profissionais envolvidos pelo Projeto da ONG, 46% responderam que são os (as) responsáveis os (as) professores (as) que participaram do curso de multiplicadores, 20% responderam que consideram todos (as) os (as) professores (as) são responsáveis pelo tema e apenas 7% não soube dizer quem considera responsável pelo tema. Percebe-se que 20% responderam como sendo todos (as) os (as) professores (as) os (as) responsáveis pela Educação Sexual, demonstrando conhecimento da proposta dos PCNs, de que todas as disciplinas podem implementar ações de Educação Sexual. Os (as) demais parecem ter respondido de acordo com o que ocorre na instituição, ou seja, que os (as) responsáveis pela Educação Sexual são os (as) profissionais que promovem o projeto de sexualidade 209 oferecido pela ONG denominada Rede da Vida e os (as) professores (as) que participam deste projeto. Na escola B, 69% consideram ser os (as) professores (as) responsáveis pela Educação Sexual, demonstrando a maioria estar coerente com a proposta dos PCNs, ao menos no quesito saber de quem é a responsabilidade pelo tema, independente da sua aplicabilidade no cotidiano de sala de aula. Mas, nota-se que os (as) professores (as) percebem o que se espera deles (as) no que se refere à Educação Sexual, que corresponde com a proposta dos PCNs. Dos (as) investigados (as), 25% responderam que os (as) responsáveis são os (as) profissionais e professores (as) que se sentem capacitados (as) para implementar ações de Educação Sexual e apenas 6% não souberam responder. Os (as) professores (as) desta escola (B), que não promove e nem tem previsto no projeto pedagógico ações de Educação Sexual, demonstraram responder teoricamente sobre quem seriam os (as) profissionais responsáveis, de forma idealizada. E a resposta da maioria demonstra conhecimento do papel do (a) professor (a), segundo a proposta dos PCNs, mesmo não correspondendo com a prática pedagógica aplicada por esses (as) mesmos (as) professores (as) investigados (as). 8) Você trabalha com Educação Sexual? TABELA 8: VOCÊ TRABALHA COM EDUCAÇÃO SEXUAL? Opinião Professores % Sim (conforme orientação do Projeto Rede da Vida) 01 03 Sim (debates, palestras, atividades em grupo etc) 17 57 Não 12 40 TOTAL 30 100 210 Na escola A, que tem projeto de sexualidade oferecido pela ONG, 67% dos (as) professores (as) responderam que a escola realiza atividades de Educação Sexual com os (as) alunos (as). Apenas 33% relatam não ter nenhuma atividade oferecida aos (às) alunos (as). A escola B não tem previsto nenhum projeto pedagógico de Educação Sexual, mas 56% afirmam que ocorre algum tipo de trabalho de Educação Sexual na escola durante o ano e os demais 44% relatam que a escola não realiza tais trabalhos com os (as) alunos (as). A intenção da pesquisa foi comparar duas escolas, uma que promovesse projeto de Educação Sexual e outra que não a fizesse, a fim de verificar se na escola que há projeto, os (as) professores (as) estão implementando ações de Educação Sexual de acordo com os PCNs ou não, assim como verificar se haveria mais professores (as) implementando ações com seus (suas) alunos (as) do que a escola que não oferece nenhum projeto de Educação Sexual previsto no projeto pedagógico da escola. Com essas respostas dos (as) professores (as) de ambas as escolas, pudemos perceber que não existem diferenças significativas entre a escola que tem projetos de Educação Sexual e a outra que não os tem. O número de professores (as) implementando ações de Educação Sexual não é muito diferente, assim como ambas as escolas que tem professores (as) trabalhando com a Educação Sexual, não o fazem nos moldes propostos pelos PCNs, como Tema Transversal, e sim como uma Educação Sexual tradicional. Inclusive, na escola que possui o projeto de sexualidade oferecido pela ONG, refere-se a promover palestras, atividades em grupo de alunos (as) e professores (as) que, voluntariamente, manifestaram 211 interesse em atuar como multiplicadores (as), tal como é oferecido o teatro, as palestras etc. 9) Recebeu algum curso, capacitação etc. para trabalhar com o tema? TABELA 9: RECEBEU TREINAMENTO PARA TRABALHAR COM O TEMA? Opinião Professores % Sim (Projeto Rede da Vida) 16 53 Não 14 47 TOTAL 30 100 Na escola A, 67%, ou seja, dez professores (as) referiram-se a ter recebido curso promovido na própria escola pela ONG e recebem acompanhamento de professores (as) multiplicadores (as) quando necessário. Os demais 33% disseram não ter recebido nenhuma capacitação para trabalhar com Educação Sexual. Um dos professores respondeu: “Recebi orientação e capacitação de como lidar, por exemplo, em caso de gravidez em sala de aula e com relação ao tema namoro”. Outro professor respondeu: “Participei de oficinas para professores, ministrado pelo Projeto no Colégio Estadual São Pedro Apóstolo”. Outra resposta de uma professora: “Fiz um curso há dois anos pelo MEC”. Já um professor de Biologia diz: “Em nível do Estado, nunca recebi nenhum curso e não participei de nenhuma atividade oferecida pela escola através da parceria com a ONG”. Na escola B, as respostas foram inversamente proporcionais à escola A em termos de percentual, pois 62% dos (as) professores (as) investigados (as) não receberam nenhum curso para atuar com Educação Sexual, nem de acordo com a proposta dos PCNs como Tema Transversal nem de forma tradicional. Por outro 212 lado, 38% dizem ter recebido algum curso ao longo de suas carreiras como professores (as) para trabalhar com Educação Sexual. Seguem algumas respostas que foram consideradas ilustrativas quanto aos (às) professores (as) que participaram de algum tipo de capacitação para o trabalho de Educação Sexual. Foram comentários feitos nesta questão, num espaço oferecido para especificar o tipo de preparo que receberam. Serão destacadas algumas a seguir: Professor (a) 1: “No curso que fiz, cheguei com vontade de saber tudo, porque tinha muito medo de transmitir aos alunos algum conteúdo que fosse interpretada como “incentivadora sexual”. E com o desenvolvimento do curso que fiz fui abrindo minha mente e minha ansiedade baixou. Ao final do curso, vi que não sabia tudo, bem longe disso, mas sei agora mais do que quando entrei”. Professor (a) 2: “Penso que aprendi muito em cursos e participando de grupo de estudo para professores sobre sexualidade, pude ver que nós professores passamos por situações difíceis e que a maioria de nós não sabe como lidar quando surge alguma situação sobre sexo em sala de aula. Só isto já foi ótimo. É uma pena que poucos professores participam destes cursos, porque participando de grupos de estudo ou cursos, podemos perceber que não precisamos “cortar” a curiosidade dos alunos ou querer resolver de forma conservadora, repressiva. Eu, pelo menos, hoje sei ouvir e acho que consigo trabalhar melhor com as crianças e adolescentes sobre a temática sexualidade”. Professor (a) 3: “O que mais gostei de verdade no curso que participei foi a dinâmica de grupo, de dar sinônimos aos órgãos sexuais, a masturbação etc. Além de ter rido muito naquela dinâmica, de tantas besteiras que escutei. Ajudou-me muito porque eu sempre ficava constrangida quando escutava algum termo 213 pejorativo, popular ou da moda por parte dos alunos, e demonstrava isso aos alunos, ficando vermelha. Eu me sentia exposta com esta reação que tinha toda vez que escutava um palavrão ou termo que não fosse científico. Agora sei muito bem como lidar, embora eu não ouse repetir a terminologia utilizada de forma pejorativa pelos alunos, pelo menos não fico mais constrangida e deixo que eles riam sem me incomodar”. Professor (a) 4: “Eu fiz um curso há dois anos sobre sexualidade, mas continuo me sentindo despreparada para trabalhar a Educação Sexual com os alunos. E bem da verdade, só respondo perguntas dos alunos. Embora seja professora de Ciências e tendo que abordar o aparelho reprodutor, sei que está ligado à sexualidade e virão perguntas, mas tento deixar para o final do ano ou o mais tarde possível, porque não me sinto à vontade”. Pelos depoimentos acima citados, parece que, de forma geral, a maioria dos (as) professores (as) que participaram de algum curso de capacitação, auxiliou no crescimento, no sentido de aprender um, mesmo que não seja para trabalhar com a Educação Sexual. A dificuldade do (a) professor (a) ouvir os alunos da forma como eles conseguem se expressar é outro entrave para o bom andamento do trabalho de Educação Sexual em sala de aula na qual, segundo o relato desta professora, uma simples participação de uma dinâmica de grupo resolveu o problema, ao menos no que se refere a saber lidar com a terminologia adotada pelos (as) alunos (as). Outro dificultador no trabalho com a temática da sexualidade podemos identificar em algumas destas falas, como o não-domínio do conteúdo específico de sexualidade, fazendo com que professores (as) cheguem aos cursos querendo, como relatou o Professor 1, “aprender tudo”. Pode-se identificar uma dificuldade de alguns (umas) professores (as) no planejamento de aulas, em especial na escolha 214 das estratégias de ensino sobre a sexualidade a fim de evitar esta sensação relatada pela professora, sobre o medo de que alguns conteúdos fossem interpretados como incentivadores da vivência da sexualidade precoce, demonstrando, com isso, sua insegurança, desconhecimento e receio de ser mal interpretado pela escola ou pelos (as) professores (as), pais e mães dos (as) alunos (as). Este sentimento tem ligação com a visão da criança assexuada, ingênua e pura, e que falar de sexo poderia incentivar a prática do sexo a partir do despertar da curiosidade da criança. Outra questão levantada para reflexões refere-se ao constrangimento sobre palavrões, apelidos das terminologias muitas vezes usadas pelos (as) alunos (as), que acaba fazendo com que a sala toda ria, constrangendo o (a) professor (a), como no relato do Professor (a) 3. Figueiró (1999, p. 78) comenta: “Encarar os apelidos vai ajudar a ver o nome correto dos órgãos sexuais com mais naturalidade e aceitação e, principalmente, pode contribuir para ter uma imagem não repulsiva dos mesmos”. Em nossa cultura, apelidos ligados ao sexo e ao ato sexual são tidos como palavrões e Vitiello (1997, p. 30), em um livro que apresenta dinâmicas para trabalhos sobre a sexualidade, sugere a “dissensibilização pela palavra”, que consiste em criar oportunidades para que os (as) educadores (as) pronunciem, em situações de grupo, as terminologias científicas e, em especial, os apelidos ligados aos órgãos sexuais, assim como todas as palavras que têm relação com sexo, em voz alta, para o grande grupo, dando depois espaço para refletir e falar sobre os sentimentos que as palavras mobilizam durante o exercício. Geralmente, obtêm-se bons resultados com esta dinâmica, como foi o caso apontado no relato do Professor 3. 215 Nunes (1996, p. 249) apresenta crítica sobre a questão da linguagem: “Enquanto a linguagem científica é fria e calculista e a linguagem comum é acentuadamente machista e preconceituosa”. Ainda Nunes (1996, p. 250) complementa dizendo que: Na grande maioria dos textos sobre a sexualidade, buscando criar uma linguagem humanizada, contrapondo-se à linguagem de caráter científico (...) a questão da linguagem deveria ser mais amplamente discutida nos cursos institucionais de investigação e pesquisa sobre sexualidade e educação, pois envolve dimensões essenciais da cultura e da expressão existencial. A visão humanizada da sexualidade e, conseqüentemente, os termos científicos, assim como alguns apelidos, se bem trabalhados, poderão ser pronunciados com mais naturalidade. Segundo Figueiró (1999, p. 62): É importante deixar que os alunos riam quando falam sobre a sexualidade. Eles precisam disso, pois é uma forma de aliviar o constrangimento que sentem perante o assunto. Esses risos, se permitidos sem censura, deixam de acontecer aos poucos. Se você professor (a) sente incomodado (a) com o riso dos alunos, deve refletir, será que também não está encarando o assunto com uma certa dose de reserva... A fala da Professora 4 é agora oportuna, pois fez curso, recebeu capacitação para trabalhar a Educação Sexual, embora há dois anos, mas disse que, mesmo assim, não se sente à vontade para implementar ações de Educação Sexual com os (as) alunos (as), mesmo sendo professora de Ciências que, teoricamente, acaba falando, ainda que indiretamente, sobre a temática. Tem uma parte do conteúdo programático que poderia fazer “gancho” com a temática. Isto nos faz pensar que, mesmo sendo submetido a curso, isto não significa capacitar o (a) professor (a) a se sentir à vontade de falar sobre sexo. Parece que tem que haver uma motivação a 216 mais no (a) professor (a) e, por que não dizer, uma habilidade, carisma, que nem todos desenvolverão, mesmo com cursos de capacitação. 10) Promoção de cursos para habilitar o trabalho com o tema TABELA 10: A ESCOLA PROMOVE CURSOS PARA HABILITAR A TRABALHAR COM O TEMA? Opinião Professores % Sim (Projeto Rede da Vida, palestras, cursos) 20 67 Não 10 33 TOTAL 30 100 Na escola A, 87% das respostas se referem à promoção de cursos que habilitam o (a) professor (a) a trabalhar com o tema Educação Sexual. E, na justificativa, todos (as) estes (as) professores (as) dizem que a escola promove cursos por meio da parceria que a escola tem com a ONG – Projeto Rede da Vida, com apoio do CEFURIA. E apenas 13% dos (as) professores (as) responderam que a escola não promove qualquer curso de capacitação ao (à) professor (a) para que ele (a) possa trabalhar com a Educação Sexual em sala de aula. Mas apenas uma minoria participa desses cursos promovidos pela ONG dentro da escola. Portanto, toda e qualquer promoção da escola sobre Educação Sexual aos (às) professores (as) é feita pela ONG. Na escola B, 44% dos (as) professores (as) responderam que a escola promove Educação Sexual aos (às) professores (as) por meio de cursos, palestras, através de revistas, oferecendo livre acesso à Internet etc. Mas não existe nenhum trabalho contínuo e isso não está previsto no projeto pedagógico da escola. Portanto, ocorre de maneira isolada e pouco freqüente. Mesmo entre estes (as) professores (as) que responderam afirmativamente que a escola promove capacitação à Educação Sexual aos (às) professores (as), 217 alguns (umas) responderam que esta promoção é feita pela escola como uma oportunidade oferecida para aprender sobre a Educação Sexual, porque alguns (umas) citaram ainda a disponibilidade à pesquisa na Internet e revistas que a escola possui sobre sexualidade como sendo uma promoção para habilitar o (a) professor (a) . Os (as) demais 56% dos (as) professores (as) responderam que a escola não promove nenhum curso para capacitá-los (as) em relação à Educação Sexual. Outro comentário pertinente nesta questão refere-se à promoção de palestras vindas de profissionais de fora da escola, como ilustrada na resposta de alguns (umas) professores (a): Professor (a) 1: “Já assisti palestras ao longo destes anos que trabalho na instituição. São palestras de profissionais da saúde e sempre que assisti, gostei. Sempre que posso, assisto e sempre aprendo algo. Mas a participação é voluntária, então, acabam participando poucos professores, e talvez seja por isso que não ocorre com mais freqüência, acho que pela falta de um número suficiente de professores interessados”. Professor (a) 2: “Tem de vez em quando palestras para alunos, sobre sexualidade, com temas pertinentes como aborto, gravidez, DST, prevenção etc. Às vezes, é aberto para a família e já ocorreu também palestras com os professores, ministrado por profissionais geralmente da área da saúde. É muito instrutiva sempre, deveria ter mais vezes durante o ano, para que mais professores pudessem participar, porque nem sempre podemos participar. Às vezes, é marcado num dia que temos que dar aula bem naquele horário”. Professor (a) 3: “Já assisti palestras interessantes sobre sexualidade aqui na escola, ministrada por casais de igreja que oferecem palestras para comunidade, 218 dentro da escola, e também por profissionais como assistente social, médico, enfermeiro, psicólogo e especialistas em sexualidade humana, sempre acrescenta algo, mas nem sempre posso assistir”. Percebe-se, com os exemplos acima, que apóiam a iniciativa da escola em trazer profissionais de fora para implementar ações de sexualidade. Com isso, verifica-se que o (a) professor (a) não incorporou como sendo o (a) profissional mais indicado (a) para falar de sexualidade com os (as) alunos (as) são os (as) profissionais especialistas na área de sexualidade e saúde e não eles (as) próprios (as), como é a proposta dos PCNs. Parece que o enfoque dado aos temas das palestras refere-se à concepção médico-higienista da sexualidade. Na escola A, os (as) professores (as) se sentem com suporte oferecido pela ONG e estão satisfeitos (as) por poder contar com este apoio na escola, demonstrando contentamento com o trabalho oferecido. Na escola B, parece se repetir essa mesma sensação de alívio, quando recebem profissionais voluntários (as), geralmente da área de saúde para trazer informações e conhecimentos, tanto aos (às) professores (as) quanto aos pais, mães e alunos (as). Com os discursos dos (as) professores (as) da segunda escola, parece que eles (as) se colocam no mesmo patamar dos (as) alunos (as), em termos de necessidade de aprender questões relativas à sexualidade, demonstrando interesse em participar sempre que possível. Por sua vez, a escola é bem intencionada, cedendo espaço para profissionais voluntários (as) que queiram contribuir com professores (as) e alunos (as), pais, mães e até comunidade. Por outro lado, não oferece condições para todos participarem, pois nos horários das palestras, os (as) professores (as) não podem optar por não dar aula e participar das 219 palestras. Dessa forma, acaba dificultando o acesso às informações que seriam pertinentes a todos (as) os (as) professores (as). Muitos autores apontam como ineficaz o trabalho e profissionais vindos de fora da escola, mesmo que especialistas em sexualidade humana. Porque ações isoladas não podem ser consideradas como Educação Sexual. Para tanto, deveria fazer parte de um processo contínuo e ser ministrado por professores (as) que estabeleçam bons vínculos com os (as) alunos (as). Geralmente, estes (as) professores (as) são escolhidos (as) pelos próprios alunos e alunas. É claro que não se pode negar o efeito positivo desta intencionalidade, de trazer informações de cunho científico para dentro da escola sobre sexualidade. Mas não pode ser encarada como promoção da Educação Sexual, mas como um dos componentes da Educação Sexual, que é a informação e a orientação dentro de um trabalho que é mais complexo e abrangente dentro da escola. Essa quase unanimidade parece apontar para a dificuldade do (a) professor (a) para a abordagem do tema sexualidade. Olavarría (1999, p. 172) comenta sobre a dificuldade para abordagem do tema sexualidade tanto na família quanto na escola: A sexualidade vista como desejo e prazer, e não apenas como genitalidade e reprodução, é um espaço de reflexão, ensino e aprendizado que seria evitado, em geral, pelas famílias e escolas. Não há uma linguagem que permita tratar o tema e socializar com os filhos ou alunos essas vivências, em um clima de respeito mútuo, tolerância e aceitação da diversidade. Isso fica evidente na pobreza da linguagem para expressar distintas vivências, intensidades ou situações. Isso não ocorre, por sua vez, quando se fala do trabalho ou da profissão. Além de não ser fácil de abordar, dada sua complexidade, o tema sexualidade exige formação, informação, em termos acadêmicos e humanos, do professor e da professora para atender a proposta dos PCNs (Brasil, 1996, p. 30) : 220 Outro ponto a ser considerado para as intervenções do professor nas situações de manifestação de sexualidade de seus alunos em sala de aula é o referente aos valores a ela associados. O professor não deve emitir juízo de valor sobre essas atitudes, e sim contextualizá-las. Os PCNs parecem partir da idéia de que todos os professores e professoras têm uma formação universitária e humana que lhes permite fazer essa distinção e agir de acordo com ela. Não é de admirar, portanto que professores e professoras sintam dificuldades em tratar temas relativos à sexualidade ou só os abordem em rodinhas com alguns (umas) alunos (as). Além da falta de formação de muitos (as) desses (as) docentes, há também a questão do sexo, de poder despertar o descontentamento das famílias. Dessa forma, os (as) professores (as) das escolas investigadas nesta pesquisa de maneira geral não estão realizando ações concretas de Educação Sexual com seus (suas) alunos (as), nos moldes da transversalidade proposta pelos PCNs, nem na forma de projeto de Educação Sexual tradicional, que seria de tornar alguns (umas) professores (as) em multiplicadores (as). 11) Sugestões para trabalhar o tema Educação Sexual com seus alunos ou registrar depoimentos, comentários etc. TABELA 11: SUGESTÕES PARA TRABALHAR O TEMA EDUCAÇÃO SEXUAL COM SEUS ALUNOS Opinião Debates, palestras, trabalhos em salas de aula, dinâmicas TOTAL Professores % 30 100 30 100 Esta questão será analisada sem dados percentuais por ser uma pergunta aberta a depoimentos e a maioria dos (as) respondentes optou em fazer algum comentário ou deixar depoimentos, registrados no início desta análise, 221 Esta última questão contém respostas dos (as) professores (as) das duas escolas. Os (as) professores (as) que optaram por responder em forma de depoimento foram citados e analisados no início do texto. Neste espaço faremos citações dos (as) professores (as) que responderam em forma de sugestões, de como deveria ser o trabalho de Educação Sexual com os (as) alunos (as). Foram selecionadas as sugestões que apareceram de forma repetida pelos (as) professores (as) e também aquelas consideradas relevantes para a análise, segundo o tema proposto na pesquisa. Professor (a) 1: “Eu sugiro que a escola incentive mais a participação do professor, porque eu me interesso por aprender, através de cursos que surgem, a trabalhar com a Educação Sexual dos alunos, mas percebo que são poucos professores que se interessam pelo assunto. Talvez seja porque eu trabalho somente 20 horas e outros tenham carga horária dobrada da minha. E não existe nenhum benefício e facilidade para o professor que resolve investir seu tempo livre em cursos e preparação para trabalhar com Educação Sexual. Mesmo tendo aqui na escola o projeto, só pode participar o professor que não tiver aula naquele horário, então, nem que o professor que tem que dar aula naquele momento tivesse interesse, não pode participar. Acho que se a escola desse mais suporte ao professor, acredito que aumentaria o número de professores implementando ações de Educação Sexual em suas disciplinas, porque se sentiriam preparados pois puderam participar de um processo de capacitação para esta atuação.” Consideremos importante citar a fala deste professor porque apareceram cinco respostas com esse mesmo conteúdo. Outros enfocaram de forma mais enfática a acomodação dos (as) professores (as) que não se empenham em atingir maior nível de conhecimento profissional. Segue um exemplo: 222 Professor (a) 2: “Acho o professor, de modo geral, acomodado, não só na área de Educação Sexual, mas no ensino como um todo. Só ensina aquele “basiquinho”. Eu percebo o professor com falta de preparo até para lecionar a sua própria disciplina, quem dirá ensinar sexualidade. Minha sugestão é que os professores não sejam tão acomodados. Se não se sentem preparados, vão se preparar. É assim que penso e faço!” É válido mencionar que nesta escola que possui o projeto de sexualidade oferecido pela ONG, são poucos (as) os (as) professores (as) que participam e quem participa é de forma voluntária. O curso é gratuito e ocorre fora do período de aula, mas se o (a) professor (a) atuar com a Educação Sexual com os (as) alunos (as), não tem nenhum benefício extra oferecido pela escola. Se participar, é por iniciativa própria. O projeto existe dentro de um campo de possibilidades de atuação profissional fora da regência da aula que leciona. Embora a proposta dos PCNs com a Educação Sexual legitime os (as) professores (as) a implementar ações de Educação Sexual com os (as) alunos (as), parece que os (as) professores (as) reconhecem que é impossível separar a atuação do (a) professor (a) da temática da sexualidade com os (as) alunos (as) sem o envolvimento da escola. Portanto, acredita-se que uma formação gradativa, prolongada e contínua possa despertar mais interesse no (a) professor (a) e a necessidade de conhecer mais e a conscientizar-se da responsabilidade da escola em educar sexualmente e de forma reflexiva. Do que foi apresentado nas últimas falas, pode-se depreender os seguintes fatores apontados como limitantes do envolvimento de alguns com a Educação Sexual: 223 - Falta de interesse pessoal sobre o assunto; - Não ser o “momento de cada um”, que pode estar relacionado à etapa de um ciclo de vida profissional e pessoal em que se encontra o (a) professor (a); - Falta de amadurecimento profissional, sem consciência da responsabilidade de estudos constantes; - Resistência pessoal; - Desmotivação para o trabalho ligada à baixa remuneração; - Desânimo e apatia em relação à própria profissão; - Falta de apoio e incentivo por parte da escola para com o (a) professor (a). Segundo Figueiró (2006, p. 281), algumas condições para um bom trabalho de Educação Sexual é: A conscientização de que a educação sexual é tarefa da escola. E a realização do trabalho de formação continuada, de maneira sistemática, prolongada e com assessoria para a prática pedagógica. E a terceira condição é dar atenção especial para a história de vida dos professores, uma vez que o desenvolvimento pessoa e o profissional caminham sempre interligados. Estas três condições indicadas por Figueiró (2006) são necessárias para assegurar o envolvimento e o comprometimento efetivo do maior número de professores (as) envolvidos (as) e motivados (as) para atuar em sala de aula com relação à Educação Sexual. Ainda que, por um lado, existam fatores pessoais que levem alguns (umas) professores (as) a interessar-se em buscar aperfeiçoamento do estudo da temática, por outro lado, há professores (as) que têm motivos pessoais que podem dificultar o envolvimento e provocar desinteresse. Este é um grande desafio para as universidades e formadores, que devem estar compromissados com a formação inicial e continuada dos (as) professores (as), uma vez que os PCNs estão postos e 224 se faz necessário o envolvimento de todos os profissionais da escola, não somente do (a) professor (a). De acordo com Figueiró (2006, p. 289), nosso papel como formadores (as) constitui em: • • • • Envolver os professores em reflexões que levam ao crescimento pessoal; Auxiliá-los no espaço pedagógico a vencer barreiras pessoais e profissionais que dificultam a implementação do professor de ações de Educação Sexual de acordo com os PCNs na prática pedagógica; Sensibilizar para o reconhecimento que a educação sexual é também função da escola, é importante e necessária, assim como também um direito dos alunos; Motivá-los para o trabalho de ensino da sexualidade. Tendo chegado ao final das análises do questionário, embora as reflexões não se esgotem, reconhecemos que é uma posição coerente com as concepções que permearam este estudo, apontando para o processo de formação continuada do (a) professor (a) através da construção feita pelas sugestões, idéias e depoimentos, comentários da vivência do (a) próprio (a) professor (a) dentro de um modelo reflexivo, a partir da concepção dos (as) profissionais que estão diretamente envolvidos (as) com o trabalho de Educação Sexual em sala de aula. São eles (as) que fornecerão subsídios para a formação de forma incentivadora e facilitadora para “despertar” os (as) professores (as) para a aprendizagem e o crescimento pessoal e profissional, para que o (a) educador (a) se apodere dos conhecimentos científicos e inseridos na temática Educação Sexual e saberes pedagógicos próprios ao ensino da sexualidade. Se considerarmos que os (as) próprios (as) professores (as) constroem sua aprendizagem e que, fundamentalmente, ela se dá pela reflexão sobre sua prática pedagógica de forma a estimular e facilitar a aprendizagem, então, esta é uma caminhada difícil e requer paciência e muito empenho. 225 Figueiró (2006, p. 298) aponta para a seguinte situação: • • Por volta de 60%: professores com relativa facilidade e competência para aprender sobre a Educação Sexual; Por volta de 40%: professores que requerem um apoio e uma assessoria por um tempo maior que os demais, com atenção para dificuldades pessoais e/ou para deficiências em algum dos saberes pedagógicos. Conforme as palavras de Alves (1991, p. 19), ao referir-se ao trabalho do (a) professor (a), “fundadores de mundo, mediadores de esperança, pastores de projetos”. 226 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho consiste em uma análise das práticas pedagógicas de educação de um fenômeno social contemporâneo: a Educação Sexual nas escolas na concepção de professores (as) do Ensino Fundamental. Em 1997, por meio dos Parâmetros Curriculares Nacionais, a escola foi legitimada a desenvolver projetos que proporcionassem aos estudantes a discussão de temas relacionados à trajetória afetiva-sexual com os (as) professores (as) no cotidiano escolar. Os PCNs sintetizam idéias sobre a sexualidade humana presentes na sociedade brasileira contemporânea, transformando-as em propostas de intervenções e fazem com que circulem entre os sistemas educacionais, permitindo sua re-interpretação. A Educação Sexual aparece, portanto, como uma resposta às demandas sociais que solicitam sua intervenção na socialização afetiva-sexual dos (as) alunos (as). A proposta de Educação Sexual dos PCNs está dividida em três blocos de conteúdos: corpo, gênero e DST/AIDS. A partir desta matriz, cada escola deve organizar seus projetos de forma que cumpra as diretrizes nacionais e respeite a cultura local onde está inserida, criando propostas que façam dialogar as preocupações nacionais e locais. Assim, o tema e a questão desta pesquisa foi desenvolvida entre na Educação e pretende-se pensar a Educação como fenômeno da cultura, transformando a escola em local privilegiado para observações da Educação Sexual que visem compreender os fenômenos educacionais analisando as práticas pedagógicas. 227 A pesquisa foi desenvolvida a partir das respostas dos (as) professores (as) às questões do instrumento de pesquisa (questionário). Existe um conjunto de expectativas sociais sobre os (as) docentes que faz com que sejam considerados os mais apropriados para o desenvolvimento de Educação Sexual para alunos (as) do Ensino Fundamental. Eles mesmos, no entanto, entendem que precisam receber cursos e acompanhamento de outros profissionais especializados em sexualidade humana que possam contribuir para a capacitação dos (as) professores (as) para sentirem-se confiantes em desenvolver projetos de Educação Sexual. Mas, ainda assim, não são todos (as) os (as) professores (as) que se interessam em atuar como educadores (as) sexuais, mesmo que recebessem capacitação para tal trabalho, além de um salário extra ou algum benefício para que se dedicassem à implementação de ações de Educação Sexual com seus alunos (as). É muito importante que cada professor (a) possa perceber se gostaria ou não de trabalhar com a temática da sexualidade no cotidiano da sala de aula. Neste sentido, tem a opção de não fazê-lo se não sentem motivação com o trabalho de Educação Sexual com seus alunos (as). Os próprios PCNs referem-se à Educação Sexual como uma “proposta”. Ao nosso ver, é muito positivo, porque nem todos (as) os (as) professores (as) têm realmente habilidade, mesmo recebendo cursos e acompanhamento de profissionais especializados em sexualidade humana. A Educação Sexual é apresentada como um Tema Transversal pelos PCNs, isto é, constitui-se numa atividade diferente das aulas oferecidas na escola, e cada professor (a) deve perceber se possuem estas características para que possam ser um (a) bom (a) educador (a), aquele (a) que tenha “jeito” para o trabalho de Educação Sexual. 228 Para tanto, os (as) docentes interessados neste trabalho precisam passar por todo o ritual de formação para que possam orientar seus (as) alunos (as) acerca da sexualidade. Os (as) professores (as) participantes da pesquisa acreditam que, além de se sentirem despreparados (as) e com dificuldade de trabalhar com a Educação Sexual, a escola também está despreparada para a realização de tal atividade, necessitando igualmente de preparo. Demonstraram perceber a diferença da compreensão intelectual / cognitiva da proposta dos PCNs, na Educação Sexual e, mesmo tendo assimilado, reconhecem que valores e sentimentos pessoais acerca da sexualidade interferem na aplicabilidade. Dessa forma, os (as) professores (as) precisam de um espaço para reflexão, a fim de atingir a afetividade, a subjetividade. Os (as) professores (as) que demonstraram essa visão crítica, a racionalidade na concepção da sexualidade, pareceram-nos que, em algum momento profissional, participaram de aperfeiçoamentos, capacitações, cursos de Educação Sexual e até mesmo fazem parte de projetos de sexualidade que a escola oferece (por meio da ONG), como é o caso de uma das escolas pesquisadas. Contudo, a maioria deles não implementa ações de Educação Sexual, de acordo com a proposta dos PCNs, nem de outra forma, mesmo percebendo essa dicotomia entre o intelecto e o afeto, e reconhecendo que o conhecimento deve ser utilizado por meio de estratégias que façam com que seja entendido, não somente pela razão, mas também pelo corpo e pela emoção. Demonstraram não passar de uma percepção iniciada em cursos, mas que não se efetivou em uma mudança na própria forma de lidar com a sexualidade na vida pessoal, mantendo mitos, crendices e valores adquiridos pela família, religião, sociedade e por toda influência histórica e cultural. 229 A Educação Sexual na escola deve privilegiar o afeto, o estabelecimento de relações e a opressão dos sentimentos para que a sexualidade dos (as) alunos (as) se realize adequadamente. A partir da valorização das emoções, adquiridas numa formação e capacitação para professores (as), estes conseguirão promover a mudança comportamental porque equilibram a necessidade de individualização com a afetividade e a intimidade e, desta forma, poderão auxiliar seus (as) alunos (as). A escola é um local de apresentação de saberes que se pretendem universais, mas também local de particularidade e parcialidade de manifestações culturais de grupos específicos. Analisá-la a partir de um viés histórico é buscar compreender estas dinâmicas culturais e perceber um movimento contínuo de produção, reprodução e reformulação da cultura que tanto interfere e influencia na concepção da sexualidade e, conseqüentemente, na concepção dos (as) professores (as) quanto à Educação Sexual. Os (as) investigados (as) demonstraram entender que o aprendizado emocional acontece quando a escola consegue trabalhar com alguns valores: afeto, amizade, alegria e, principalmente, confiança. São eles que fazem com que possam aprender no emocional. Esta noção foi percebida no relato de muitos (as) investigados (as), que acreditam que o ensino depende de afeto e confiança para que as pessoas abandonem suas defesas internas e se encontrem com o outro em um clima afetivo, mas essa visão mais abrangente da sexualidade foi identificada em apenas alguns (umas) investigados (as). A partir da análise dos questionários, é possível dizer que a maioria dos (as) professores (as) investigados (as) percebe a importância de uma Educação Sexual mais voltada à prevenção de problemas com o corpo biológico, voltada para a saúde 230 sexual, isto é, ainda mantém uma visão restrita da sexualidade, de concepção médico-higienista. Esses (as) professores (as) demonstram coerência, pois o conhecimento da sexualidade só faz sentido quando apresentado por meio de um método que promova a relação, o contato afetivo e a construção da confiança entre aqueles que desejam aprender a trabalhar com Educação Sexual na escola. Eles precisam ter oportunidade de aprender no intelecto, no corpo e no emocional para que ensinem seus (as) alunos (as) da mesma maneira. Com efeito, necessário que as pessoas estejam em paz com seus corpos e mentes, para que entendam os sentidos da Educação Sexual na escola. A principal mudança esperada é a opção por atitudes reflexivas com relação à vida e, principalmente, à sexualidade. Acredita-se que o início da vida sexual do (a) aluno (a) deve ser reflexivo e não somente motivado pelo afetivo. Espera-se que a afetividade seja equilibrada por uma atitude que mescla custo e benefícios, para que os (as) alunos (as) aprendam a escolher. Ao superar essa visão, os (as) professores (as) estarão oferecendo uma Educação Sexual adequada, voltada para a intervenção na prática pedagógica sobre a socialização afetiva-sexual dos (as) alunos (as), a fim de promover uma vivência da sexualidade de forma responsável e prazerosa. O desenvolvimento deste trabalho fez com que experimentássemos momentos de sabores e dissabores com o objeto da pesquisa. Sabores no sentido de um estudo com um tema tão instigante e por encontrar professores que realmente percebem a necessidade da Educação Sexual na escola e até se preocupam com isso e gostariam de ter condições para implementar ações referentes à temática da sexualidade, e dissabores no sentido de perceber que, 231 embora já tenha se passado mais de 10 anos na legalização da Educação Sexual na escola, ainda encontramos a maioria dos (as) professores (as) com uma visão restrita da sexualidade, preocupados (as) mais com as doenças e a forma de preveni-las, e a constatação das dificuldades ainda encontradas pelos (as) professores (as) referente ao trabalho de Educação Sexual na escola pública do Ensino Fundamental. Mesmo sendo uma amostra pouco significativa no universo do ensino público, podemos imaginar que possam existir muitas escolas públicas do Ensino Fundamental nestes mesmos moldes, o que nos faz pensar que precisamos de mais investimentos das políticas públicas para que a Educação Sexual, a exemplo da proposta dos PCNs, além de ser legalizada, venha a ser implantada e efetivada como realidade nas escolas. Ainda é preciso sensibilizar alguns (umas) educadores (as) para a abordagem da educação sexual, mas, pelo que foi observado no estudo aqui realizado, alguns (umas) professores (as) se encontram dispostos a ultrapassar seus limites, suas dificuldades e falta de formação e enfrentar o desafio da Educação Sexual com seus (as) alunos (as). Reconhece-se que a colaboração da mídia na divulgação de experiências e pesquisas na área seria muito importante para a desmitificação do trabalho de educação sexual, um tema considerado polêmico, mas necessário e oportuno. Algumas iniciativas podem ser tomadas para tornar a Educação Sexual mais eficiente nas escolas. Hoje, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) já possibilitam a abordagem da educação sexual nas escolas, mas não existem políticas públicas que a garantam. 232 As pesquisas também mostram que o processo reflexivo para formação dos profissionais tem de ser coletivo e contínuo de forma a possibilitar a construção de vínculos, a abertura e o resgate do diálogo em relação ao tema, e o trabalho com as situações cotidianas vividas no contexto escolar, o que, além de tudo, com certeza irá contribuir com a revisão do papel do (a) professor (a) / educador (a). Em relação à formação inicial, é fundamental que na educação superior as faculdades e as universidades assumam a responsabilidade pela inclusão da educação sexual nos cursos em que os profissionais estão mais diretamente envolvidos com tal abordagem: pedagogia, medicina, enfermagem, psicologia, serviço social, biologia e todos os cursos que formam docentes para atuarem no Ensino Fundamental. Para isso, é necessário que seja garantido aos (às) professores (as) da educação superior o espaço para formação continuada. E a inclusão também no ensino médio, nos cursos de habilitação ao magistério e cursos técnicos da área da saúde, já que a realidade mostra que estes últimos, quando profissionais, poderão abordar o tema nas escolas e também deverão ser preparados. No preparo de educadores (as) deve ser considerada não apenas a produção teórico-científica que embasa o conhecimento sobre os (as) alunos (as), mas também quanto ao autoconhecimento. A capacitação dos (as) educadores (as) implica o despertar de suas potencialidades, favorecendo a expressão de sua criatividade, de sua sensibilidade. Os (as) educadores (as), nesse movimento da transformação social, necessitam de espaço para processar, entender, tomar consciência da mudança, da diversidade, da multidimensionalidade que estão implícitas no processo de educar. 233 Entende-se que é grande a necessidade de se discutir, implementar a Educação Sexual na escola. A grande dificuldade da implantação da proposta dos PCNs com o tema Educação Sexual é que com a atual estrutura escolar, a transversalidade do ensino dentro da escola fica muito contraditória e pode ser até inoperante. Se não houver mudanças nas estruturas escolares, não haverá como introduzir de modo eficaz a proposta dos PCNs devido às dificuldades dos (as) professores (as) para abordar o tema de Educação Sexual. Toda a escola teria que se mobilizar para que o (a) professor (a) possa ter condições de assumir o trabalho com a Educação Sexual. Para Arrilha (1998), do ponto de vista das políticas governamentais, a aplicabilidade dos PCNs e seu monitoramento tornam-se um desafio, na medida em que o país representa uma trajetória de infrutíferas tentativas de promoção oficial da Educação Sexual. Este estudo nos responde, teoricamente, o que estamos pesquisando: se os (as) professores (as) estão ou não implementando ações de Educação Sexual segundo a proposta dos PCNs. Pela análise dos questionários respondidos por educadores (as) de duas escolas de Ensino Fundamental, foi possível abstrair a concepção da Educação Sexual destes (as) professores (as) investigados (as), assim como ter conhecimento das necessidades e dificuldades que os (as) professores (as) sentem quanto ao tema sexualidade e a concluir que, embora muitos (as) investigados (as) percebam a importância da Educação Sexual na escola e de posse do conhecimento da legalização da proposta dos PCNs como sendo a Educação Sexual um dos Temas Transversais, mesmo assim, não são implementadas ações nos moldes propostos da transversalidade e que, inclusive na escola que possui projeto de sexualidade, 234 não o faz conforme proposta dos PCNs, mas como uma Educação Sexual formal e tradicional, numa concepção médico-higienista, de professores (as) e alunos (as) como multiplicadores (as). O que pudemos constatar, com base nas categorias apreendidas de acordo com as respostas do questionário, é que os (as) poucos (as) professores (as) que implementam ações de Educação Sexual nestas escolas pesquisadas têm uma atuação limitada, em comparação ao que poderiam executar caso se sentissem preparados para atuar de acordo com a proposta dos PCNs. Embora tenham essa atuação limitada, o fazem a seu modo, ou seja, como podem, pois a vivência dos (as) educadores (as) nesta área da Educação Sexual origina-se no conhecimento que, na sua maioria, tem origem social e é transmitida de geração em geração por pessoas significativas, constituindo sua bagagem de conhecimentos. Mesmo assim, puderam constituir saberes em suas práticas pedagógicas cotidianas no que se refere ao desafio da Educação Sexual na escola. Além da Educação Sexual na instituição de ensino ser um grande desafio para o (a) professor (a), é também para a própria escola, uma vez que os PCNs estão postos e, com eles, o ensino da sexualidade necessita do envolvimento de todos os profissionais da escola. É preciso, então, olhar para o (a) professor (a) que recebeu legitimação como sendo o mais indicado a atuar na escola como educadores (as) sexuais, como pessoa, fazendo com que tanto a formação inicial quanto a continuidade estejam alicerçadas em seu crescimento pessoal. Nisso está incluída a atenção ao autoconhecimento e a compreensão da história de vida do (a) professor (a). As universidades, por sua vez, também devem estar comprometidas com este desafio, da construção do saber e do saber fazer. 235 Conclui-se este estudo com uma reflexão: reconhece-se que toda mudança na política pedagógica depende, primordialmente, dos esforços para consolidar a profissão docente e da luta por condições dignas de trabalho. A renovação do ensino deve, ainda, conforme defende Silva Júnior (1995), pautar-se na luta pela delimitação da escola como local de trabalho, para que cada professor possa estar vinculado a um único estabelecimento, para que tenha tempo e condições adequadas para desenvolver seu trabalho com qualidade e satisfação. Como afirma Caldeira (1995, p. 11), “as condições materiais institucionais são elementos possibilitadores ou limitadores da prática docente”. Sobre alternativas de Educação Sexual, Nunes (1996, p. 237) se posiciona: “Ainda que haja abismos provocadores entre as múltiplas formações, acredito que o encaminhamento mais adequado seja o de provocar uma exigente e rigorosa especialização em educação sexual junto ou além das graduações e licenciaturas”. Evidentemente, a mera inclusão do tema Educação Sexual nos cursos de formação de professores (as) é somente o começo. Promissor, mas insuficiente. As questões apresentadas neste trabalho apontam para uma discussão permanente, que permite uma paulatina modificação dos preconceitos e estereótipos sobre a sexualidade e que, nesse sentido, extrapola o espaço escolar. Quando falamos em discussão permanente, temos em mente a possibilidade de um diálogo em que valores e preconceitos, idéias e propostas possam estar em pauta e sejam avaliados coletivamente, incorporando a contribuição das várias áreas envolvidas no abrangente e complexo tema da Educação Sexual na escola. Fica aqui a reflexão da necessidade de estudos acerca da capacitação de professores do Ensino Fundamental de escolas públicas em Curitiba. 236 Como profissionais do campo da sexualidade humana e da Educação Sexual, atuantes nas diferentes áreas do conhecimento, precisamos refletir as seguintes questões: - Por que os cursos de Pedagogia, em sua maioria, ignoram a necessidade e a importância de se incluir em sua grade curricular disciplinas de Sexologia e Educação Sexual? - E, finalmente, que propostas podemos fazer às diversas esferas dos órgãos governamentais no sentido de conquistarmos cada vez mais espaço e efetivarmos propostas de ação e atuação no campo da Educação Sexual? Goldberg (1997) destaca que a pesquisa é uma atividade que precisa ser vivida com criatividade, organização e clareza. A autora também afirma que é preciso saborear cada momento, da construção do problema à formulação do texto final. Durante o processo de elaboração deste trabalho, foram vividos todos os sabores de uma tentativa de construir conhecimento a partir de um objeto pouco explorado pela educação. Ao final, sobressai a esperança de que as mudanças sociais acompanhem o ritmo de mais e mais pesquisas! 237 REFERÊNCIAS ALVES, A. J. O planejamento de pesquisas qualitativas em educação. Cadernos de pesquisa, nº 77. São Paulo, maio, 1991. ALVES, G. A produção da escola pública contemporânea. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, 1998. ALVES, R. O preparo do educador.In: BRANDÃO, C. R. O educador: vida e morte. Rio de Janeiro: Graal, 1983. ALTMANN, H. Orientação sexual em uma escola: recortes e de gênero. Cadernos Pagu. Campinas, SP, V. 21, p. 281-315, 2003. ___________ . Verdades e pedagogias na educação sexual em uma escola. Tese de doutorado. Rio de Janeiro, 2005. ___________ . Orientação sexual nos PCNs. Revista Estudos Feministas. V. 09, nº 02, 2001. AQUINO, J. G. (org). 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Qual seu entendimento sobre sexualidade? ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ 2. Na sua opinião, o que é educação sexual? ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ 3. O que é tema transversal? ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ 4. Como se deve trabalhar na transversalidade? ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ 5. A escola realiza atividades de educação sexual com seus alunos? ( )SIM – Como? _________________________________________________ ( ) NÃO 6. Por que a escola trabalha ou não com o tema? ( ) Trabalha com o tema. Justifique: _____________________________________ ( ) NÃO trabalha com o tema. Justifique: _________________________________ 7. Quais são os professores ou profissionais responsáveis por esta questão? ___________________________________________________________________ 248 8. Você trabalha com educação sexual? ( ) SIM – De que maneira? ____________________________________________ ( ) NÃO 9. Você recebeu algum treinamento para trabalhar com este assunto? ( ) SIM – Especifique: ________________________________________________ ( ) NÃO 10. A escola promove algum curso para habilitá-lo a trabalhar com este assunto? ( ) SIM – Especifique:________________________________________________ ( ) NÃO 11. Se você fosse designado a trabalhar este assunto com seus alunos, como faria? Proponha atividades e metodologias para abordar o tema ou deixe comentários, depoimentos ou sugestões. ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ 249 ANEXO 250 A ONG “Rede da Vida” com o apoio CEFURIA – Centro de Formação Urbana Rural Irmã Araújo: O projeto foi apresentado em 2002 ao Ministério da Saúde mediante a Coordenação Nacional de DST/AIDS, encaminhado pela CEFURIA. E passou a ser realizado em algumas escolas públicas. Os objetivos da Rede da Vida são: - Contribuir para que as crianças, jovens, homens e mulheres se tornem capazes de refletir e escolher, intelectualmente e emocionalmente, formas de viver a sexualidade com mais saúde e prazer, respeitando as diferenças e escolhas dos outros. - Constituir na escola uma comunidade, um núcleo permanente de sujeitos para manter/ampliar o trabalho de educação sexual. Os (as) estudantes podem participar de oficinas como teatro, rádio, jornal, pintura, poesia, fotografia, vídeo, fantoche, dança, reciclagem, música, entre outros. As oficinas são realizadas no contraturno, ou seja, nos horários em que os (as) alunos (as) não têm aulas. Cada oficina tem 25 vagas, o que propicia melhor aproveitamento por parte dos (as) estudantes. Apoio do Projeto Rede da Vida: - CEFURIA - Ministério da Saúde - Unesco CEFURIA: Uma organização da Sociedade Civil, sem fins lucrativos, cuja finalidade é fortalecer a organização popular e as lutas do povo por melhores condições de vida. Seu nome é uma homenagem à Irmã Araújo, cuja vida foi dedicada à organização dos pobres da região sul de Curitiba para resolução de seus problemas concretos, principalmente aqueles relacionados à saúde.