PLANEJAMENTO EDUCACIONAL: UMA ABORDAGEM PEDAGÓGICA NA ESCOLA DO HOSPITAL SOUZA, Luciane do Rocio dos Santos de [email protected] Eixo Temático: Pedagogia Hospitalar Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo O referido artigo busca relatar uma vivência no campo educacional envolvendo um espaço não formal de escolarização, tendo como porta de acesso uma política pública adotada pelo Governo do Estado do Paraná, apresentando as reflexões desenvolvidas na implementação de uma pesquisa no campo da educação hospitalar no ano de 2010 na escola do hospital. Esta pesquisa pautou-se na realização de um estudo sobre o processo de construção de um planejamento fundamentado numa perspectiva histórico-crítica no Hospital de Clínicas de Curitiba, na qual possui convênio com a SEED-Secretaria do Estado da Educação do Paraná, através do Programa Sareh – Serviço de Atendimento à Rede de Escolarização Hospitalar no sistema educacional do Estado do Paraná. O objetivo central deste estudo, foi o de propor encaminhamentos didáticos metodológicos, com ênfase na elaboração de um planejamento educacional, fundamentado em leituras de autores histórico-críticos, principalmente, Saviani (2005, 2007) e Gasparin (2005), que fornecem subsídios para discussão de uma metodologia de trabalho focado num movimento dialógico e nas contradições existentes entre saúde e educação. Neste estudo ressalta-se a importância da formação continuada dos educadores do Sareh e esclarece a necessidade legal e social do atendimento pedagógico em ambiente hospitalar, através do estudo e reflexões realizadas com os professores na Hora Atividade. O trabalho realizado, buscou reforçar o papel político pedagógico do planejamento, com o objetivo de sensibilizar o leitor sobre a realidade hospitalar, a situação do aluno paciente, bem como destacar a participação política/pedagógica dos profissionais envolvidos no processo de escolarização e a importância do planejamento na prática diária destes profissionais e sua presença nas políticas de humanização hospitalares. Apresenta conclusões positivas a respeito dessa Intervenção Pedagógica realizada em ambiente hospitalar e sugere continuidade do estudo dessa temática. Palavras - chave: Escolarização Hospitalar; Planejamento; Humanização Hospitalar; Inclusão. 14638 Introdução Educação e Saúde A Constituição brasileira promulgada em 1988 explicita em seu Art. 6º que “são direitos sociais: a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, e assistência aos desamparados.” A efetivação do exercício desses direitos requer, por parte do Estado, a elaboração de políticas públicas adequadas à sua promoção. O atendimento pedagógico em ambiente hospitalar atende a dignidade do indivíduo e efetiva os direitos sociais da saúde (Art.196) 1 visto que pode contribuir para a redução da doença, e da educação (Art.205), pois oferece a oportunidade de acesso e permanência, evitando o fracasso escolar e a evasão. Neste sentido analisar as relações entre saúde e educação em ambiente hospitalar requerem um novo olhar sobre o atendimento da criança, jovem e adolescente que encontra-se por motivo de enfermidade, afastado de sua realidade e privado de sua convivência social e cultural. A implementação do projeto ocorreu no Hospital de Clínicas/UFPR porque, além de fazer parte de uma das oito unidades em que está implantado o programa do Sareh Serviço de Atendimento à Rede de Escolarização Hospitalar, ele mostra grande preocupação com a melhoria da qualidade do contato pessoal no atendimento hospitalar estando, desde 2001, integrado à Rede Nacional de Humanização, do Ministério da Saúde. Essa política de humanização é muito importante para o bom desenvolvimento da prática pedagógica que ocorre com os alunos que permanecem em tratamento prolongado, principalmente nos casos de neoplasia, ofertando a esses alunos atendimento educacional público. 1 A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas públicas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção e recuperação. 14639 Este processo de inserção da educação nas unidades hospitalares é recente, e até pouco tempo atrás estes dois ambientes não se “conversavam” tanto pelas restrições adotadas nas unidades hospitalares como pela inexistência de políticas públicas que permitissem a realização desse atendimento educacional dos alunos pacientes. Nesse sentido, as políticas de Humanização surgem nos hospitais como elemento fundamental para assegurar a integração entre saúde e educação, bem como a ética profissional quanto às relações educacionais necessárias e de direito à criança, jovem e adulto enfermo. Desta forma, para propiciar condições de humanização no ambiente hospitalar, faz-se necessário levar em consideração o aluno paciente como sujeito histórico concreto, envolvendo diferentes aspectos, morais, legais e éticos, necessitando a reelaboração do pensamento do código de ética médica voltada para os profissionais da educação (CECCIM, 1997). Com a implantação de uma política pública voltada para a educação hospitalar são abertas novas perspectivas para a redução das desigualdades sociais, garantindo os princípios de defesa da educação básica e da escola pública, gratuita e de qualidade, como direito fundamental ao cidadão. O Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, Lei n. 8.069 de 13/07/90 com base nos princípios universais do direito da criança procura atender aos anseios da sociedade brasileira, estabelecendo: Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência. Art. “11° É assegurado atendimento integral à saúde da criança e do adolescente, por intermédio do Sistema Único de Saúde, garantido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde.” (Redação dada pela Lei nº. 11.185, de 2005.) O expresso nesses artigos leva a perceber o apoio integral e irrestrito a toda e qualquer iniciativa em favor da criança, principalmente daquela circunstancialmente desprotegida. 14640 “As determinações do ECA convergem para a afirmação de que o direito à educação: “ultrapassa os muros da escola; é dever da sociedade buscar alternativas à provisão dessas demandas diferenciadas” (MATTOS & MUGGIATTI, 2001, p. 26)” Neste sentido, a educação do aluno hospitalizado, segue os mesmos objetivos da educação ofertada aos demais cidadãos. Algumas modificações são necessárias na organização e flexibilização curricular e no funcionamento, para que tal aluno usufrua dos recursos escolares dos quais necessitam e sejam alcançados os objetivos educacionais inclusivos. O tratamento de saúde não envolve apenas os aspectos biológicos da tradicional assistência médica à enfermidade. A experiência de adoecimento e hospitalização implica várias mudanças nas rotinas; a separação dos familiares, amigos e objetos significativos; submeter-se a procedimentos evasivos e dolorosos e, ainda, sofrer com a solidão e o medo da morte, o que ocorre muito nos hospitais. Reorganizar a assistência hospitalar, para que dê conta desse conjunto de experiências, significa ofertar também, entre outros cuidados, o acesso ao lazer, ao convívio com o meio externo, às informações sobre seu processo de adoecimento, cuidados terapêuticos e ao exercício intelectual. Na impossibilidade de freqüência à escola, durante o período sob tratamento de saúde ou de assistência psicossocial, as pessoas necessitam de formas alternativas de organização e oferta de ensino de modo a cumprir com os direitos à educação e à saúde, tal como definidos na Lei e demandados pelo direito à vida em sociedade. Esta atenção também diz respeito ao paradigma de inclusão e contribui para com a humanização da assistência hospitalar onde a educação neste ambiente, procura garantir a esse aluno-paciente o direito a uma infância saudável, ainda que associada à doença. Na escola do hospital é necessário compreender que a situação da doença e suas diferentes patologias levam o aluno paciente a secundarizar sua escolarização, bem como, um apego ao processo pedagógico na tentativa de manter preservado o seu desenvolvimento cognitivo e suas relações sociais, no que refere-se ao afastamento temporário ou duradouro de sua escola de origem. A Escolarização Hospitalar tem como meta básica a igualdade de direitos inclusivos e educacionais. A igualdade de direitos em todas as diversidades estabelece condições necessárias para o desenvolvimento de todos os cidadãos. Assim, o problema de saúde, 14641 qualquer seja ele, não pode constituir impedimento para incluir os estudantes no processo de escolarização. Dispor de atendimento educacional no hospital, mesmo que por um tempo mínimo e que talvez pareça não significar muito para uma criança que atende à escola regular, tem caráter fundamental para a criança hospitalizada, uma vez que esta pode trabalhar suas necessidades, amenizando a situação de estresse, e adquirir conceitos importantes tanto para sua vida escolar quanto para a vida pessoal. (MENEZES, 2004, p.66). Muitos caminhos foram trilhados, políticas públicas implantadas, formação continuada aos professores da rede pública e elaboração de diretrizes que buscam esta emancipação pedagógica. O planejamento pode ser considerado com um forte instrumento de luta contra todas as injustiças sociais, porém, é necessário que o professor saiba qual o seu papel neste processo, e saiba como, por que e para quem é preciso utilizar um planejamento fundamentado numa pedagogia materialista histórica2, através de um método dialético, que significa o modo de pensarmos as contradições da realidade, o modo de compreendermos a realidade como essencialmente contraditória e em permanente transformação. No caso da Escolarização Hospitalar, além de garantir o processo educativo, promove o fortalecimento do direito ao acesso e permanência à educação com qualidade. Ao se pensar em planejar os conteúdos a serem trabalhados com os alunos pacientes surgem vários questionamentos como: o que e de que forma promover a aprendizagem para alunos com pequeno, médio e longos períodos de internamento? Como incluir aqueles alunos que estavam oficialmente matriculados nas escolas, mas que socialmente tornaram-se excluídos do ambiente formal de aprendizagem? Como mobilizar o aluno paciente frente ao desafio do tratamento de saúde? Enfim, as demais questões emergem num ambiente tão carregado de emoções, tendo o professor que encontrar mecanismos de elaboração e de mediação para aprendizagem. Compreende-se claramente que o ponto de partida deve ser o que o aluno traz em sua bagagem enquanto conhecimento curricular, e em como prepará-lo e mobilizá-lo para a construção do conhecimento, de acordo com o atendimento proposto por cada área de 2 Segundo Triviños (1987, p.51), o materialismo histórico estuda as leis sociológicas que caracterizam a vida em sociedade, de sua evolução histórica e da prática social dos homens, no desenvolvimento da humanidade. Essa vertente do marxismo considera que para o momento histórico se transformar, terá que transformar a própria forma de pensar do ser social, porque é um processo intrínseco na relação homem, produção e prática social. 14642 conhecimento, e a partir dela encaminhar a elaboração do plano de trabalho docente. Sendo o hospital um local, onde ocorrem às diversas manifestações dos sentimentos humanos de forma explícita e volúvel, a escolarização caminha de forma diferenciada, num processo de compreensão, por parte dos professores, que aquele sujeito que ali se encontra de forma a negar a escolarização é um sujeito social, fruto de diversas manifestações de seu meio e, portanto, necessita de um enfoque primeiro humanizador para que, em outro momento, possa ser abordado com as questões de escolarização. Através deste enfoque, os professores buscam uma prática de elaboração de um planejamento, para estes alunos pacientes numa perspectiva histórico-crítica, através da prática-reflexão-prática, tendo como ponto de partida a prática social. Para Vasconcellos, [...] o trabalho inicial do educador é tornar o objeto em questão, objeto de conhecimento para aquele sujeito”, isto é, para o aluno. Para que isso ocorra, o educando deve ser desafiado, mobilizado, sensibilizado; deve perceber algumas relações entre o conteúdo e sua vida cotidiana, problemas e interesses. Torna-se necessário criar um clima de predisposição favorável à aprendizagem. (1993, p.42): Partir da análise da realidade encontrada (onde estamos), projetar finalidades (para onde queremos ir) e elaborar mecanismos de mediação (o que fazer para chegar lá) é a estrutura básica de um planejamento. Para Vasconcelos (2002, p. 75) é fundamental que o professor compreenda a necessidade de reflexão constante e de apropriação de seu papel de mediador do conhecimento, para que possa avançar num método de trabalho pedagógico que se fundamente numa relação dialógica do conhecimento em ambientes de escolarização, focando na elaboração de um planejamento que tenha clareza dos aspectos da prática social maior e dos sujeitos concretos nele inseridos. Desenvolvimento A implementação da pesquisa no Hospital de Clínicas A implementação do projeto na unidade conveniada HC foi de caráter exploratória, descritiva e explicativa, com fundamentação bibliográfica e análises documentais envolvendo o problema proposto, tendo como procedimento a pesquisa-ação, onde, todos os envolvidos no problema atuaram de modo participativo e cooperativo. 14643 Os textos, as atividades propostas e os encaminhamentos partiram do conteúdo dos textos selecionados no Caderno Pedagógico (SOUZA e SZENCZUK, 2010) e adaptados à necessidade de cada encontro. Entretanto, nem sempre foi possível ter a participação de todos os integrantes da equipe nas 48 horas de formação propostas. Na tentativa de elaborar um planejamento que atenda a demanda na instituição hospitalar, os professores definem os conteúdos, objetivos, metodologias e critérios de avaliação de acordo com a concepção posta nas Diretrizes Curriculares Orientadoras Estaduais. Assim, procura-se seguir um currículo para o processo educativo no âmbito hospitalar de acordo com o referencial apresentado pelo aluno paciente para que este possa receber um atendimento pedagógico em consonância com o currículo que as escolas de origem enviam ao hospital. No entanto, a ação de planejar, no hospital, encontra muitas barreiras em relação à transposição didática e à dificuldade de realizar um projeto educativo no qual esteja, presente o exercício da autonomia, da reflexão e da crítica, provocados pela situação de enfermidade ao qual o aluno paciente encontra-se ao participar dos atendimentos pedagógicos. Em função disso, outros questionamentos surgem no meio da prática pedagógica hospitalar no que se refere ao resultado esperado em relação aos planejamentos realizados pelas equipes de escolarização. São eles: A ação real produz alguma alteração no objeto do ato de planejar? As finalidades postas para o planejamento, de caráter mais abrangente, apontam para a função social que a escola tem a desempenhar? Eles atingem os objetivos e metas imediatos, que indiquem caminhos viáveis para a realização do trabalho educativo em ambiente hospitalar, atendendo a especificidade do papel da escola? As adaptações atendem ao esperado pelo currículo da escola de origem? Os alunos ao realizarem a reinserção para a escola de origem acompanham curricularmente a escola de forma significativa? Quais as perdas pedagógicas que o aluno das classes hospitalares sofre ao reinserirem na escola regular? Saviani (1991, p.22). assevera que: [...] a escola é uma instituição cujo papel consiste na socialização do saber sistematizado. Portanto a escola diz respeito ao conhecimento elaborado e não conhecimento espontâneo, ao saber sistematizado e não ao saber fragmentado; à cultura erudita e não á cultura popular . 14644 Dessa forma, planejamento na perspectiva histórico-crítica requer rever a sua prática de construção e sua utilização como meio de emancipação humana e, no caso do ambiente hospitalar, de humanização do aluno paciente. Mas para tanto é necessário ter clareza da função social da escola, das finalidades da educação básica, do papel do planejamento e principalmente do papel da escolarização em ambiente hospitalar. Assim, o professor deve ser um constante pesquisador do processo de aprendizagem em qualquer modalidade da educação, mas, principalmente, deve buscar voltar-se para as finalidades postas para a Escolarização Hospitalar, a qual está naquele momento desempenhando seu papel precípuo de mediador do conhecimento. O ato de planejar deve seguir uma unidade entre pensamento e ação, com uma busca intencional da convergência entre teoria e prática na ação humana, seja onde for. A relação entre ambos deve avançar, não apenas como princípio metodológico inerente ao ato de planejar, mas como princípio epistemológico3, no processo de aprendizagem em qualquer ambiente onde haja a escolarização. Neste sentido, o planejamento não comporta o aligeiramento, a superficialidade e ao esvaziamento dos conteúdos. Seu foco principal consiste em tornar acessível o saber erudito, sistematizado, bem como, ao mesmo tempo, possibilitar a elaboração de conteúdos da cultura popular na perspectiva emancipadora, onde, em relação tempo-espaço4, não pode significar o empobrecimento da qualidade do processo educativo. O estudo realizado desprendeu a necessidade de discutir e compreender o papel da educação hospitalar, o papel do professor, a concepção de educação que embasa o trabalho na escola do hospital e principalmente a capacidade de desenvolver habilidades apropriadas, ou seja, ter consciência dos enfrentamentos que estão por vir, como: o equilíbrio emocional, a administração das emoções, a empatia, a ética profissional e a sensibilidade. Buscou conhecer as discussões teóricas que se fazem no campo da Escolarização Hospitalar, bem como, articular seu trabalho com as Diretrizes Curriculares Orientadoras da Educação do Estado, num movimento constante de atualização, pois, como profissional capacitado para promover a aprendizagem, deve ter domínio das ferramentas pedagógicas necessárias para o processo de aquisição do conhecimento, ao qual se propõem dedicar-se. De acordo com Vasconcellos (2003 p. 50): 3 Entende-se como princípio epistemológico o princípio orientador do modo como compreendemos a ação humana de conhecer uma determinada realidade e intervir sobre ela no sentido de transformá-la. 4 Os alunos pacientes, não têm o mesmo tempo da escola regular, em função das intervenções médias e estado de saúde, bem como, o espaço no escolar no hospital, restringe-se ao leito ou nas classes hospitalares multiseriadas. 14645 O professor trabalha com a produção do sentido, onde considerando a teoria da atividade humana, pode-se dizer que, a princípio, o sentido pode ser elaborado pelo sujeito através da relação que estabelece entre objeto (ou situação) e alguma sua necessidade, finalidade ou plano de ação. Mas a construção do sentido passa também pela reflexão que acompanha a ação, bem como pela avaliação que destes processos se faz. Ao trabalhar na Escolarização Hospitalar, o professor desenvolve um profissionalismo comprometido com a formação do aluno, realizando seu trabalho de forma dinâmica e criativa, buscando o re-despertar do interesse para a aprendizagem, até pela situação5 que o aluno paciente se encontra. A importância do uso do diálogo para uma comunicação acessível em sua prática pedagógica, de forma afetuosa, ética e crítica, estando atento às peculiaridades de seus alunos e ter discernimento para as necessárias intervenções no processo de ensino e aprendizagem, configura o papel do professor como elo com a realidade social ao qual o aluno paciente encontra-se, naquele momento de sua vida, separado de suas relações sociais, em função do tratamento de saúde. Durante o processo de estudo, surgiram discussões importantes sobre os assuntos tratados, mas principalmente, a necessidade de uma nova postura do professor, um novo olhar, no qual é necessário compreender os conteúdos a partir de uma produção histórica de como os homens conduzem suas vidas nas relações de trabalho e de como se pode, através das flexibilizações curriculares, adequá-las à escola do hospital. Segundo Gasparin (2003, p.2), “Os conteúdos reúnem dimensões conceituais, científicas, históricas, econômicas, ideológicas, políticas, culturais, educacionais que devem ser explicitadas e apreendidas no processo ensino-aprendizagem.” Partindo do exposto, o estudo realizado com a equipe do Hospital de Clínicas, fortaleceu a compreensão de que a escola no hospital deve procurar instituir um novo olhar na forma do fazer pedagógico. E para compreender a dimensão da totalidade de trabalhar com os conteúdos é necessário um novo método, que não é o mesmo aplicado em sala de aula e nem na escola, mas a uma realidade social mais ampla. Ao contextualizar historicamente o processo do fazer pedagógico para ensinar conteúdos, importa partir da compreensão das tendências pedagógicas que fundamentaram as práticas escolares e avançar para uma proposta pedagógica numa perspectiva histórico-crítica, 5 O aluno encontra-se fragilizado e desmotivado escolarmente, em função do afastamento do seu meio social, tendo que priorizar o tratamento de saúde e ou internamento. 14646 tendo como princípio o marco referencial epistemológico e a teoria dialética do conhecimento, tanto para fundamentar a concepção metodológica como para o planejamento de ensino-aprendizagem. Saviani, ao correlacionar a teoria dialética do conhecimento com a correspondente metodologia de ensino-aprendizagem, diz: O movimento que vai da síncrese (“a visão caótica do todo”) à síntese (“uma rica totalidade de determinações e de relações numerosas”), pela mediação da análise (“as abstrações e determinações mais simples”) constitui uma orientação segura tanto para o processo de descoberta de novos conhecimentos (o método científico) como para o processo de transmissão–assimilação de conhecimentos (o método de ensino). (1999, p.83) A partir deste ponto, foram projetadas, focando a proposta de trabalho na teoria dialética do conhecimento, considerando a prática social dos sujeitos, perseguindo os três passos do método dialético: prática-teoria–prática, numa metodologia, na qual é necessário a partir da prática, teorizar sobre ela e voltar para a prática e transformá-la. Esse teorizar promove a apropriação crítica da realidade, iluminando e superando o conhecimento imediato e conduzindo à compreensão da totalidade social. Considerações finais Ao final do estudo realizado, houve um consenso sobre a necessidade de se partir da análise crítica da realidade social, sustentando, implicitamente as finalidades sociais e políticas da educação e dando sustentação e fundamentação à Pedagogia histórico-crítica. Nessa pedagogia, o planejamento, deve considerar o saber crítico, buscando captar o movimento objetivo do processo histórico de formação do homem, direcionando o ensino para a superação dos problemas cotidianos da prática social e, ao mesmo tempo, buscando a emancipação intelectual do aluno. Portanto, o papel do professor é identificar e trabalhar as dificuldades que os alunos apresentam, fazendo relações com o conhecimento e mediando este processo com o currículo escolar na escola do hospital. Assume uma postura que permite aos alunos a investigação, a exploração, a reflexão, o questionamento e a organização de seus conhecimentos, de acordo com suas vivências, atendendo as reais necessidades de aprendizagem numa relação recíproca 14647 de valorização humana e por conseqüência, um atendimento integral e humanizador do aluno naquele momento de tratamento de saúde ou internamento. Se, de acordo com os amplos consensos pedagógicos, a escola deve ser ligada á vida, ou, mais do que isto, deve ser vida, não há por conseqüência, questão mais decisiva para orientar a função da escola do que esta: a humanização. A tarefa pedagógica seria contribuir com a humanização. (VASCONCELLOS, 2003, p. 40). Ficou esclarecido que o princípio do trabalho pedagógico no trabalho na escola do hospital é educar para humanizar; ou seja, um trabalho que procure realizar uma educação humanizadora em ambiente hospitalar, o qual exige um processo intencional e sistemático, baseado em finalidades e planejamento, envolvendo a análise da realidade hospitalar e a relação entre os sujeitos inseridos e o processo de escolarização. Concluiu-se pela equipe do Programa Sareh HC, que o planejamento no hospital deve contemplar diferentes formas de encaminhamento metodológico, os quais atendam efetivamente as necessidades educacionais especiais dos alunos-pacientes, através de processos de flexibilização curricular, propostos pelo MEC, onde ocorram adaptações curriculares, enriquecimento curricular e avaliação diferenciada, com fundamentos teóricometodológicos necessário à organização didática hospitalar, pautada numa Teoria Histórico Crítica, que enxergue o aluno paciente como sujeito concreto e ator principal no processo educativo de cunho transformador, permeado pela humanização, dignidade e emancipação humana. A partir da elaboração de um planejamento calcado na pedagogia histórico-crítica, delineou-se encaminhamentos didático-metodológicos, através de seus limites e possibilidades no campo hospitalar. Propôs-se encontrar respostas às diferentes angústias que se relacionam entre saúde e educação, principalmente no que tange a elaboração de plano de ensino que atenda ao processo de escolarização, porém de forma significativa tanto para o professor quanto para o aluno paciente. Para atender as finalidades da educação hospitalar, como sendo um espaço de resgate da subjetividade do aluno paciente, através de diferentes formas de interações sociais que o professor possa utilizar, o planejamento torna-se ferramenta dialética e política, portanto, essencialmente pedagógica. Avaliar constantemente seu planejamento, numa relação prática-teoria-prática, é fundamental para que os resultados sejam atingidos, ou seja, para que as finalidades postas no 14648 ato de planejar na escola do hospital sejam atingidas de forma a promover a reinserção do aluno paciente à sua escola de origem e com qualidade, tanto para o professor quanto para os alunos envolvidos. Desta forma, faz-se necessária muita leitura e compreensão de formas de transposição de uma pedagogia histórico-crítica, pois, não é uma prática que se estabeleça apenas como um modelo de como fazer o planejamento na escola do hospital, mas sim, há uma exigência sobre a necessidade de pensar sobre a realidade hospitalar. Enfim, todo o estudo realizado propôs uma grande reflexão sobre o processo de escolarização hospitalar e, principalmente, sobre o papel do professor nesse ambiente não formal de educação. Para todos os envolvidos, neste estudo, concluiu-se, fundamentalmente, que ser educador é ter um compromisso técnico, político, ético e social, mas na escola do hospital se contempla aspectos importantes, pois, envolve profissionais capazes de administrar suas emoções, na relação com o sentimento do outro, fato este, fundamental para a construção de uma sociedade mais humana, inclusiva e de acolhimento. REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 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