Capítulo 14

Propaganda
Unidade 3 - Ginecologia
Infertilidade Masculina
CAPÍTULO 14
InFERTILIDADE MASCULInA
1. INTRODUçãO
Aproximadamente 15% dos casais se tornam incapazes de conceber após
um ano de relações sexuais desprotegidas. O fator masculino é responsável exclusivo
em cerca de 20% dos casos de casais inférteis e contribui para outros 30-40%. Se
um fator de infertilidade masculina está presente, ele é quase sempre deinido pelo
achado de anormalidades na análise do sêmen, ainda que outros fatores possam
inluir mesmo quando a analise do sêmen é normal. A infertilidade masculina
pode ser devido a diversos fatores. Algumas desses fatores são identiicáveis e
reversíveis, como obstrução ductal e hipogonadismo hipogonadotróico. Outras
condições são identiicáveis, porém não reversíveis, como atroia testicular
bilateral secundária a orquidite viral. Quando a identiicação da etiologia da
anormalidade da análise do sêmen não é possível, como acontece em diversos
pacientes, ela é denominada idiopática. Raramente pacientes com análise seminal
normal tem espermas que não funcionam de maneira adequada à fertilidade.
O propósito da avaliação masculina é identiicar estas condições quando
presentes. Identiicação e tratamento das condições reversíveis pode aumentar a
fertilidade masculina e permitir a concepção por ato sexual. Mesmo em pacientes
azoospérmicos, podemos ter produção espermática ativa ou com produção
espermática induzida por tratamento. Detecção de condições para as quais o
tratamento não é eicaz pode poupar casais do estresse de diversas tentativas
com terapias ineicazes. Detecção de causas genéticas de infertilidade masculina
permite aos casais ser informados quanto ao potencial de transmissão genética que
pode afetar a saúde da sua prole. Além disso, uma avaliação masculina apropriada
possibilita ao casal um melhor entendimento acerca das bases de sua infertilidade
e na obtenção de aconselhamento genético quando apropriado.
Se o tratamento corretivo especíico não se encontra disponível, ainda pode
ser possível aplicar técnicas de reprodução assistida, como obtenção testicular ou
epididimal do esperma para injeção intracitoplasmática (ICSI). Alternativamente,
201
Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas
Maternidade Escola Assis Chateaubriand
estes casais podem considerar a possibilidade de terapia de inseminação com
esperma de doador ou adoção. Finalmente, a infertilidade masculina pode
ocasionalmente ser a manifestação presente de uma condição de ameaça à vida. A
falha ao identiicar doenças como o câncer testicular ou tumores pituitários pode
ter sérias consequências, incluindo, em casos raros, a morte.
2. OBJETIvOS
Os objetivos da avaliação do homem infértil são identiicar:
» circunstâncias potencialmente corrigíveis;
» circunstâncias irreversíveis que são favoráveis às técnicas reprodutivas
ajudadas usando o esperma do parceiro masculino;
» circunstâncias irreversíveis que não são favoráveis às técnicas
reprodutivas, e para as quais a inseminação ou adoção são opções
possíveis;
» circunstâncias de vida ou saúde ameaçadas, que podem ser a base da
infertilidade e exigir a atenção médica; e anomalias genéticas que podem
afetar a saúde da prole se as técnicas reprodutivas forem empregadas.
3. INDICAçÕES
Um casal que tenta conceber deve ter uma avaliação para a infertilidade se a
gravidez não ocorrer dentro de um ano de relações sexuais regulares desprotegidas.
Uma avaliação deve ser feita antes de um ano se: 1) infertilidade com história de
criptorquidismo bilateral previamente conhecida; 2) fatores de risco femininos da
infertilidade, incluindo idade avançada da mulher (acima de 35 anos). Além disso,
os homens que questionam seu status da fertilidade apesar da ausência de uma
parceira atual devem ter uma avaliação de seu potencial da fertilidade. A avaliação
inicial da seleção do parceiro masculino de um casal infértil deve incluir, pelo
menos, uma história reprodutiva e duas análises do sêmen. Se possível, as duas
análises do sêmen devem ser separadas em um período de tempo de um mês.
A história reprodutiva deve incluir 1) frequência e sincronismo do coito;
2) duração da infertilidade e da fertilidade prévia; 3) doenças de infância e
desenvolvimento da história; 4) doenças médicas sistêmicas (doenças respiratórias
por exemplo, diabetes mellitus e doenças das vias aéreas superiores) e cirurgias
prévias; 5) história sexual que inclui doenças sexualmente transmissíveis; e 6)
exposição gonadal a agentes tóxicos, dentre os quais se inclui o calor. Quando o
homem tiver uma história da fertilidade prévia, esta não exclui a possibilidade que
ele tenha adquirido uma nova, ou um fator secundário, masculino da infertilidade.
202
Unidade 3 - Ginecologia
Infertilidade Masculina
Os homens com infertilidade secundária devem ser avaliados da mesma maneira
que os homens que nunca deram início a uma gravidez (infertilidade primária).
A avaliação completa para a infertilidade masculina deve incluir uma história
médica e reprodutiva completa, uma avaliação física por um urologista ou por
outro especialista na reprodução masculina, e pelo menos duas análises do sêmen.
Baseado nos resultados da avaliação completa, o médico pode recomendar
outros procedimentos e testes. Estes testes podem incluir análises adicionais do
sêmen, avaliação da glândula endócrina, e a seleção genética.
4. AvALIAçãO BÁSICA
HISTóRIA MéDICA
A história médica do paciente é usada para identiicar fatores de risco e
testes padrões de comportamento que poderiam ter um impacto signiicativo na
infertilidade masculina. A história deve incluir
1) uma história médica e cirúrgica completa;
2) medicamentações (prescrição e não-prescrição) e alergias;
3) revisão dos sistemas;
4) história reprodutiva da família;
5) um exame de infecções passadas tais como doenças sexualmente
transmissíveis e infecções respiratórias.
AvALIAçãO fÍSICA
Uma avaliação física geral é uma parte integrante da avaliação da
infertilidade masculina. Além da avaliação física geral, o foco particular deve ser
dado à genitália que incluem:
1) exame do pênis; incluindo a posição do meato uretral;
2) palpação dos testículos e medida de seu tamanho;
3) presença e consistência dos vasos e de epidídimo;
4) presença de varicocele;
5) características de sexo secundário que incluem o aspecto do corpo, a
distribuição do cabelo e o desenvolvimento das mamas;
6) exame de toque retal.
O diagnóstico da ausência congênita bilateral dos vasos deferentes
(ABCVD) é estabelecido pela avaliação física. A exploração escrotal não é
necessária para se fazer este diagnóstico.
203
Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas
Maternidade Escola Assis Chateaubriand
ANÁLISE DO SÊMEN
A análise do sêmen é indispensável na avaliação do laboratório do
homem infértil e ajuda a deinir a severidade do fator masculino. Os médicos
devem fornecer aos pacientes as instruções padrão para a coleta do sêmen.
Estas instruções devem incluir um período deinido de abstinência de dois a três
dias. O sêmen pode ser coletado pela masturbação ou pelo ato sexual usando
os preservativos especiais da coleção do sêmen que não contêm as substâncias
prejudiciais ao esperma. O espécime pode ser coletado em casa ou no laboratório.
O espécime deve ser mantido na temperatura do quarto ou de corpo durante o
transporte e ser examinado dentro de uma hora da coleção.
Para assegurar resultados exatos, o laboratório deve ter um programa de
controle da qualidade para a análise do sêmen.
A análise do sêmen fornece informações sobre o volume do sêmen, assim
como a concentração, a mobilidade e a morfologia do esperma. A azoospermia não deve
ser diagnosticada até que o espécime seja centrifugado na velocidade máxima por 15
minutos.
Embora os métodos para a medida rotineira da concentração e da mobilidade
do esperma tenham mudado pouco durante as duas décadas passadas, a avaliação
da morfologia do esperma evoluiu consideravelmente. A avaliação da morfologia
do esperma por critérios restritos é usada para identiicar os casais que têm uma
possibilidade com fecundação do padrão in vitro (FIV) ou uma melhor possibilidade
da fecundação com injeção intracitoplasmática de espermatozóides (ICSI).
As escalas de referência verdadeiras não foram estabelecidas para
parâmetros do sêmen. Os valores de referência no Quadro 1 são baseados na
literatura clínica. Os valores que não se situam nesta escala sugerem um fator
masculino da infertilidade e indicam a necessidade de avaliação adicional clínica
e/ou laboratorial do paciente. Deve-se enfatizar que os valores de referência para
parâmetros do sêmen não são os mesmos que os valores mínimos necessários
para a concepção, e que os homens com variáveis do sêmen fora das escalas de
referência podem ser férteis. Inversamente, os pacientes com valores dentro da
escala de referência podem ser inférteis.
204
Unidade 3 - Ginecologia
Infertilidade Masculina
Quadro 1
Volume do Ejaculado
1,5 - 5 ml
pH
>7,2
> 20 milhões/ml
> 40 milhões/ejaculação
>50%
>2 (escala 0-4)
> 50% normal
> 30% normal
> 14% normal
< 2 (escala 0-3)
Concentração do esperma
Número total de espermas
Porcentagem de mobilidade
Progressão avançada
Morfologia Normal
Aglutinação espermática
Viscosidade
5. AvALIAçãO ESpECIALIzADA
TESTES CLÍNICOS ESpECIALIzADOS NO SÊMEN E NO ESpERMA
Em alguns casos, as análises do sêmen não podem prever exatamente a
fertilidade do homem. Consequüentemente, houve uma busca para que outros
testes melhorem a avaliação do homem infértil. Geralmente, estes testes clínicos
especializados devem ser reservados somente para aqueles casos em que a
identiicação da causa da infertilidade masculina dirigirá o tratamento. Estes são:
quantiicação dos leucócitos no sêmen, testes para anticorpos antiesperma, testes
da viabilidade do esperma, testes da interação esperma- muco cervical, teste da
zona livre do oócito do hamster, análise computadorizada do esperma. Há também
outros testes especializados que são menos utilizados geralmente, como medidas
da creatina quinase do esperma e das espécies reativas do oxigênio (ROS). O
ROS parece ser gerado por leucócitos seminais e por células do esperma, e pode
interferir na função do esperma pela peroxidação das membranas lipídicas do
esperma e pela criação de peróxidos tóxicos do ácido graxo.
SELEçãO GENéTICA
As anomalias genéticas podem causar a infertilidade afetando a produção
transporte do esperma. Os três fatores genéticos mais comuns relacionados à
infertilidade masculina são:
205
Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas
Maternidade Escola Assis Chateaubriand
1) mutações no gene da ibrose cística associadas a ausência congênita
dos vasos deferentes;
2) anormalidades cromossomiais relacionadas a uma função testicular
deiciente;
3) microdeleções do cromossomo-Y associadas com o prejuízo
espermatogênico isolado.
A azoospermia e o oligospermia severas podem estar associadas a
anomalias genéticas.
AvALIAçãO ENDóCRINA
As anomalias hormonais do eixo hipotalâmico-hipoisário-testicular
são causas bem conhecidas, embora não comuns da infertilidade masculina. As
desordens endócrinas são extremamente raras nos homens com parâmetros normais
do sêmen. Uma avaliação da glândula endócrina deve ser executada se há:
1) uma análise anormal do sêmen, especialmente se a concentração do
esperma é menos de 10 milhões/ml;
2) função sexual deiciente;
3) outros resultados clínicos sugestivos de uma endocrinopatia especíica.
Alguns especialistas acreditam que todos os homens inférteis devem ter
uma avaliação da função endócrina, mas não há nenhum consenso de opinião nesta
controvérsia. A avaliação hormonal inicial mínima deve consistir em medidas de
níveis da testosterona, do hormônio folículo-estimulante (FSH) e dos níveis de
testosterona. Se o nível da testosterona é baixo, deve-se realizar uma repetição
da medida da testosterona total e livre, assim como a determinação de níveis do
hormônio luteinizante (LH) e dos níveis de prolactina. Embora a dosagem sérica
dos níveis da gonadotroina seja variável, uma vez que sua liberação ocorre de
maneira pulsátil, uma única medida é geralmente suiciente para determinar a
condição endócrina clínica de um paciente. O relacionamento da testosterona, do
LH, do FSH e da prolactina ajuda a identiicar a condição clínica. Muitos homens
com espermatogênese anormal têm um FSH normal, mas uma elevação marcada
do FSH é claramente indicativa de uma anomalia na espermatogênese.
Análise urinária pós-ejaculatória
O volume diminuído ou ausente sugere a ejaculação retrógrada, a falta da
emissão, a obstrução do ducto ejaculatório, o hipogonadismo ou o CBAVD. A im
de diagnosticar uma possível ejaculação retrógrada, o médico deve executar uma
análise urinária pós-ejaculatória para todo o homem cujo volume do ejaculado
é menor de 1.0 ml, e que não for diagnosticado hipogonadismo ou ABCVD. É
206
Unidade 3 - Ginecologia
Infertilidade Masculina
igualmente importante assegurar que a coleção imprópria ou incompleta, ou um
período muito curto de abstinência (menos de 1 dia) não são a causa da diminuição
do volume ejaculado. A presença de algum esperma em uma urinanálise pósejaculatório de um paciente com azoospermia ou aspermia é sugestiva do
diagnóstico da ejaculação retrógrada.
ULTRASSONOGRAfIA
Ultrassonografia transrretal
As vesículas seminais normais são menores que 1,5 cm no diâmetro
ântero-posterior. O achado de vesículas seminais dilatadas, de ductos ejaculatórios
dilatados e/ou de estruturas císticas prostáticas na ultrassonograia transretal (USTR)
é sugestivo, mas não diagnóstico, de obstrução completa ou parcial do ducto
ejaculatório. Os pacientes com obstrução completa do ducto ejaculatório produzem
uma ejaculação de menor volume, com ausência de frutose, ácida e azoospérmica.
Os pacientes com ABCVD podem igualmente ter estes resultados, uma vez que
eles têm frequentemente vesículas seminais ausentes ou atróicas. Pacientes com
obstrução parcial do ducto ejaculatório frequentemente apresentam sêmen de
volume diminuído, oligoastenospermia ou uma fraca progressão frontal. Alguns
especialistas recomendam rotineiramente TRUS em pacientes oligospérmicos com
ejaculado de volume diminuído, vasos palpáveis e tamanho testicular normal.
Ultrassonografia escrotal
A maioria das patologias escrotais é palpável ao exame físico. Isto inclui
varicoceles, espermatoceles, ausência dos vasos, endurecimento epididimal e
massas testiculares. A ultrassonograia escrotal pode identiicar varicoceles nãopalpáveis, mas estas não se mostraram clìnicamente signiicativas. A US escrotal
pode ser útil para esclarecer resultados ambíguos no exame, como pode ocorrer
nos pacientes com testes que estão no escroto superior, sacos escrotais pequenos e
em variações anatômicas que fazem a avaliação do escroto difícil.
207
Download