Modelagem Numérica da Eliminação das Tensões Residuais Através de Deformação Plástica por Tração Carlos Augusto dos Santos Mestrando de Pós-Grad. Eng. Metalúrgica e de Materiais da UFMG, Belo Horizonte, MG Elaine Carballo Siqueira Corrêa Doutoranda de Pós-Grad. Eng. Metalúrgica e de Materiais da UFMG, Belo Horizonte, MG Maria Teresa Paulino Aguilar Profa. Adjunta do Dep. Eng. de Materiais e da Construção Civil, UFMG Gerais, B. Horizonte, MG Antônio Eustáquio de Melo Pertence Prof. Adjunto do Dep. de Eng. Mecânica, UFMG, Belo Horizonte, MG. Paulo Roberto Cetlin Prof. Titular do Dep. Eng. de Metalúrgica e de Materiais da UFMG, Belo Horizonte, MG Resumo. A presença de tensões residuais é uma característica inerente quando da fabricação de alguns produtos obtidos por processos de soldagem, conformação, etc. Seu efeito pode ser traduzido em comportamentos não desejados no produto final. Uma das formas sugeridas na literatura para se eliminar essas tensões seria o uso de deformação plástica. No presente artigo, utilizando-se a simulação pelo método de elementos finitos, introduziu-se um perfil de tensões residuais em um corpo de prova cilíndrico, que foi posteriormente tracionado, até atingir deformações plásticas no mesmo. Através desse procedimento, foi possível acompanhar o comportamento do perfil de tensões residuais ao longo do ensaio, determinando-se a relação do nível de deformação aplicada e o perfil de tensões residuais vigente. Considera-se que este trabalho corresponde a uma etapa importante no estudo da aplicação desta técnica na eliminação das tensões residuais em componentes mecânicos. Palavras-chave: Tensões Residuais, Eliminação de Tensões, Elementos Finitos 1. INTRODUÇÃO As tensões residuais podem resultar da aplicação de processos de conformação que produzem diferentes níveis de deformação entre as várias regiões do material. Considerando por exemplo o processo de trefilação, observa-se que a deformação das camadas superficiais da barra trefilada do material é frequentemente maior do que das camadas mais centrais (Backofen, 1972). Entretanto, estas camadas não são independentes, e assim, as mais superficiais tendem a tracionar longitudinalmente as centrais, que por sua vez tendem a restringir a deformação daquelas. Isto promove o aparecimento das tensões residuais longitudinais que serão de tração ao longo das regiões centrais do material e de compressão nas camadas mais superficiais (Hosford & Caddell, 1993). A figura 1 ilustra uma situação típica de tensão residual em barra trefilada com fieira de semi ângulo grande e baixa redução de diâmetro. É importante observar que, à medida que se faz a aplicação controlada de tensões externas de tração ao longo da seção da peça, as tensões residuais de compressão existentes nas regiões superficiais serão gradualmente anuladas, sem a ocorrência de deformação plástica. Deve-se também recordar que as tensões residuais são sempre menores do que a tensão de escoamento do material. Tensão Residual, MPa 276 tração 0 compressão − 276 50.8 25.4 0 25.4 50.8 distância do centro, mm Figura 1. Tensão residual em barra trefilada (Hosford & Caddell, 1993) A figura 2 mostra uma barra submetida a tensões residuais. Os pontos ao longo do segmento DAB estão inicialmente submetidos a uma tensão residual de tração. Por outro lado, o material das regiões DE e BC inicialmente sofrem tensões residuais de compressão. Se a barra for tracionada de forma controlada ao longo da seção, até atingir a região plástica, o material das regiões entre os pontos D e B será o primeiro a alcançar valores de tensão iguais à tensão de escoamento e começará a deformar-se. Só posteriormente o material das regiões DE e BC poderá atingir o mesmo nível da tensão de escoamento. Dependendo da tensão externa aplicada toda a seção sofrerá deformação plástica. Tensão residual de tração E Tensão residual de compressão D A B C Figura 2. Barra submetida a tensões residuais A figura 3 indica que as tensões residuais estabelecidas pelo fluxo plástico não uniforme podem ser aliviadas pelo fluxo uniforme de tração, ou seja, há possibilidade da redução ou eliminação das tensões residuais com o uso de deformações plásticas de tração (Polakowski & Ripling, 1966). 2. MODELAGEM NUMÉRICA Considerou-se a simulação numérica por elementos finitos em duas dimensões de uma barra cilíndrica que continha tensões residuais iniciais. A barra foi definida com comprimento de 40 mm e raio de 5 mm. O material considerado foi o aço inoxidável austenítico AISI 304 no regime elastoplástico considerando-se a tensão de escoamento de 248 MPa e módulo de Young 225 Gpa (Nagtegaal and Veldpaus, 1984), sem anisotropia, cuja curva tensão efetiva x deformação efetiva total, determinada experimentalmente, é mostrada na figura 4. A simulação foi feito utilizando o programa Deform 2D® considerando as condições axisimétricas e isótermicas e carregamento uniforme nos nós das extremidades considerando-se velocidade de deformação de 0,00667 mm/s. Foram utilizados 200 elementos do tipo retangular. Cinco pontos, espaçados igualmente ao longo do raio na seção transversal no meio do comprimento da barra, foram escolhidos a fim observar a evolução das tensões residuais iniciais ao longo do procedimento do tração. Foi definido um estado triaxial de tensões residuais nas direções longitudinal (Z), circunferencial (θ) e radial (R), representativo daquele obtido em processo de trefilação com fieira de semi ângulo grande e baixa redução de diâmetro, como indicado na figura 5. A figura 6 mostra esquematicamente a posição dos pontos, com as direções das três tensões residuais consideradas, e a figura 7 ilustra a simulação da barra pelo método de elementos finitos. F2 F1 σο σο 0 (a ) (b ) (c ) (d ) Figura 3. (a) Tensões residuais iniciais, (b) Distribuição das tensões com o inicio da deformação plástica, (c) Distribuição de tensões com a deformação plástica ao longo de toda a seção, (d) Tensões residuais após a retirada da carga (Polakowski & Ripling, 1966). Tensão Efetiva (MPa) 2000 1600 1200 800 400 0 0 0,3 0,6 0,9 1,2 1,5 Deformação Efetiva Figura 4. Curva tensão efetiva x deformação efetiva do aço inox. austenítico AISI 304 com correção de Bridgman Perfis de Tensões Residuais Iniciais 300 Tensão (MPa) 200 100 0 0 1 2 3 -100 5 6 Tens. Longitudinal Tens.Circunferencial Tens.Radial -200 -300 4 Região Figura 5. Estado de tensões residuais iniciais obtido em processo de trefilação Z θ R 54 3 2 1 Figura 6. Posição dos pontos de observação e as direções das tensões residuais consideradas Figura 7. Simulação das tensões residuais iniciais na direção z (longitudinal) da barra pelo método de elementos finitos obtido pelo programa Deform 2D® 3. EVOLUÇÃO DAS TENSÕES RESIDUAIS A figura 8 mostra a evolução das tensões residuais longitudinais ao longo da seção transversal da barra deformada. A variação das tensões ao longo do raio da barra é completamente eliminada após a aplicação de uma deformação externa de 0.0035. Após este processo as tensões aplicadas crescerão uniformemente em resposta às características de endurecimento do material. As figuras 9 e 10 indicam os resultados obtidos para as tensões residuais circunferenciais e radiais, respectivamente. Como pode-se observar, após a deformação longitudinal externa total de 0.0035, as variações de tensão ao longo do raio da barra desapareceram. Tensão Longitudinal (MPa) direção Z 400 Deformação Axial 300 0 200 0.00050 0.00275 100 0.00350 0 -100 0 1 2 3 4 5 0.01101 6 0.01651 0.02311 -200 Distribuição Inicial de Tensão -300 Região Figura 8. Evolução das tensões residuais na direção longitudinal Tensão Circunferencial (MPa) direção 150 Deformação Axial 0 100 0.00050 50 0.00275 0.00350 0 0 1 2 3 4 5 6 0.01101 -50 0.01651 0.02311 -100 Distribução Inicial de Tensão -150 Região Figura 9. Evolução das tensões residuais na direção circunferencial 100 Deformação Axial Distribuição Inicial de Tensão 0 0.00050 0.00275 0.00350 Tensão Radial (MPa) direção R 80 60 40 0.01101 0.01651 0.02311 20 0 -20 0 1 2 3 4 5 6 -40 Região Figura 10. Evolução das tensões residuais na direção radial A figura 11 mostra que o comportamento das tensões efetivas obtidas pelo critério de Von Mises seguem os resultados obtidos para as tensões residuais na direção longitudinal. Desta forma os resultados da simulação pelo método de elementos finitos mostram que os efeitos das tensões residuais pré-existentes são eliminadas rapidamente através da aplicação de pequenas deformações plásticas de tração. Tensão Efetiva (MPa) 350 Deformação Axial 300 0.00011 250 0.00050 200 0.00275 0.00350 150 0.01101 100 0.01651 50 0.02311 0 0 1 2 3 4 5 6 Região Figura 11. Evolução das tensões efetivas A figura 12 mostra os valores das tensões residuais após descarga da tração imposta ao material. Fica claro que os valores das tensões remanescentes são nulos ou muito baixos. Tensões Residuais após Descarregamento 3,5 3 Tensões (MPa) 2,5 2 1,5 Longitudinal Circunferencial Radial 1 0,5 0 -0,5 0 1 2 3 4 5 6 -1 -1,5 Ponto Figura 12 Estado de tensões residuais finais após o descarregamento da carga por tração 3. CONCLUSÕES A simulação numérica da deformação por tração de uma barra que apresentava uma distribuição inicial de tensões residuais permitiu acompanhar a rápida eliminação dessas tensões através da deformação plástica. Deformações externas de tração da ordem de 0.0035 parecem ser suficientes, no caso analisado, para eliminar as tensões residuais inicialmente introduzidas no material. 5. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao Programa de Núcleos de excelência (PRONEX) da FINEP/CNPq, e ao CNPq, através de seu Edital Universal de apoio à pesquisa no Brasil, pelo apoio financeiro das presentes atividades. REFERÊNCIAS Backofen, W. A.,1972, “Deformation Processing”, Addison Wesley. Hosford,W. F., Caddell, R. M., 1993, “Metal Forming: Mechanics of Metallurgy”, Second Edition, London, Prentice Hall, p. 239-240. Polakowski, N. H., Ripling, E. J., 1966, “Strenght and Structure of Engineering Materials, First Edition, New Jersey, Prentice Hall, p. 481-482. Nagtegaal, J.C., and Veldpaus, F.E., 1984, On the Implementation of Finite Strain Plasticity Equations in a Numerical Model, “Numerical Analysis of Forming Processes,” edited by J. F. T. Pittman et al., Wiley, New York, p.351. Numerical Modeling of the Elimination of Residual Stresses Through Tensile Plastic Deformation Carlos Augusto dos Santos Post Graduate student in Metallurgical and Materials Engineering, UFMG, Brazil Elaine Carballo Siqueira Corrêa Post Graduate student in Metallurgical and Materials Engineering, UFMG, Brazil Maria Teresa Paulino Aguilar Associate Professor in the Department of Materials and Civil Construction Engineering, UFMG, Brazil Antônio Eustáquio de Melo Pertence Associate Professor in the Department of Mechanical Engineering, UFMG, Brazil Paulo Roberto Cetlin Professor in the Department of Metallurgical and Materials Engineering, UFMG, Brazil Abstract. The development of residual stresses is usually inherent to fabrication processes such as welding, forming, etc. Such stresses may lead to undesirable effects in the final product. One of the suggested techniques in the literature for the elimination of residual stresses is the external application of plastic strains. In the present paper, a numerical simulation of such procedure is discussed. A typical residual stress pattern originated in axisymmetric drawing was initially introduced in a cylindrical bar, which was pulled in tension into the plastic range. The evolution of the initial residual stresses was followed during the tension, allowing a clear picture of their elimination. Numerical simulation proved to be a powerful tool in the analysis of the proposed problem. Keywords: Residual Stresses, Stresses Elimination, Finite Elements Method