Física Laboratorial I Ano Lectivo 2002/03 TRABALHO PRÁTICO ESTUDO DE LENTES Objectivo – Estudo da refracção da luz incidente em lentes convergentes e divergentes. Verificação experimental da equação dos focos conjugados para lentes convergentes delgadas, utilizando um objecto real e um objecto virtual. 1. Introdução Lentes convergentes Uma lente convergente é uma associação de duas superfícies esféricas refringentes ou dióptros (superfícies onde se dá o fenómeno da refracção da luz), mais espessa no centro do que nos bordos e que faz convergir num dos focos os raios luminosos que nela incidam paralelamente ao eixo principal. A figura 1 representa esquematicamente uma lente convergente ideal, ou seja, de espessura desprezável. Aproveitaremos a figura 1 para definir os parâmetros, conceitos e convenções com utilizaremos no estudo proposto. F (a) C f ' >0 f<0 (b) C (-) F' C eixo principal 0 sentido da luz (+) Figura 1 Lente convergente ideal. (a) Definição do foco objecto (F) e do foco imagem (F’) e das distâncias focais, f e f’ ( f = f ' ), medidas relativamente ao centro óptico C. (b) Convenção de sinais utilizada (⇒ f < 0 e f’ > 0). Chama-se eixo principal à linha que atravessa o centro da lente (centro óptico, C) e que é perpendicular às suas superfícies. Foco Imagem (F’) é o ponto do eixo principal para o qual convergem os raios que incidem na superfície da lente paralelamente ao eixo principal e corresponde à posição onde se forma a imagem de um objecto no infinito. Foco Objecto (F) é o ponto objecto (ponto de onde partem os raios luminosos) cuja imagem se forma no infinito; ou seja, os raios que emergem da lente são paralelos ao eixo principal. Distância focal da lente ( f = f ' ) é a distância entre o centro óptico da lente e um dos focos. Departamento de Física da FCTUC 1/9 Física Laboratorial I Ano Lectivo 2002/03 O inverso da distância focal (expressa em metros) dá-nos a potência da lente (expressa em dioptrias). Quando a espessura da lente pode ser considerada pequena relativamente aos parâmetros que a caracterizam – o raio de curvatura das suas superfícies esféricas e a distância focal –, a lente diz-se delgada. Se esta aproximação é possível e se os raios luminosos forem centrais (incidirem perto do centro óptico da lente) pode mostrar-se que: − 1 1 1 + = p p' f ' (1) onde p, p' e f' são as abcissas, respectivamente, do objecto O, da imagem I e do foco imagem F' em relação à lente (figura 2). Esta equação é chamada equação dos focos conjugados. 2 O 1 2 C 3 F 3 f<0 1 F' I f'>0 Figura 2 Imagem I de um objecto O obtida através de uma lente delgada. Construção da imagem I a partir de três raios principais (1, 2 e 3). Os parâmetros da lente e as posições do objecto O e da imagem I são medidos a partir do ponto C e, de acordo com a convenção indicada na figura 1-b)), serão considerados positivos quando medidos no sentido da luz incidente (fig. 1 e 2). Assim, na figura 2, temos: p = − CO < 0 p ' = CI > 0 f = − CF < 0 f ' = CF ' > 0. A construção gráfica da imagem I do objecto O realizou-se considerando que (figura 2): Raio 1 - um raio luminoso que incida sobre o centro óptico C da lente não é desviado; Raio 2 - um raio luminoso que incida na lente convergente paralelamente ao seu eixo principal passa pelo foco imagem; Raio 3 - um raio luminoso que incida na lente numa direcção que passe pelo foco objecto emerge da lente paralelamente ao seu eixo principal. NOTA - Repare que, se os raios luminosos forem paralelos entre si (objecto no infinito) mas não incidirem na lente paralelamente ao seu eixo principal, a imagem não se forma no foco mas forma-se ainda no plano focal, ou seja, no plano que é perpendicular ao eixo principal e que o intersecta no foco. A partir dos triângulos semelhantes abC e deC da figura 3, pode escrever-se: Departamento de Física da FCTUC 2/9 Física Laboratorial I Ano Lectivo 2002/03 b O a d C F’ F I e Figura 3 Imagem I de um objecto O obtida através de uma lente delgada. de dC = ab aC O lado direito da equação é o mesmo que p' e o lado esquerdo dá-nos uma medida da p amplificação transversal linear (m). Convenciona-se que m>0 se a imagem é direita e m<0 se a imagem é invertida. Podemos então escrever: p' m= (2) p Objectos e Imagens. Os objectos podem ser reais ou virtuais. Chama-se ponto objecto real, ao ponto de onde partem os raios luminosos que incidem na lente divergindo (fig. 4-a)) e ponto objecto virtual, ao ponto para onde os raios luminosos parecem convergir quando incidem na lente (fig. 4-b)). O. V. O. R. a) b) Figura 4 a) Ponto objecto real; b) Ponto objecto virtual As imagens obtidas podem igualmente ser reais ou virtuais. No caso de uma imagem real os raios luminosos provenientes de um ponto objecto e emergentes da lente convergem para um ponto imagem e esta pode ser obtida num alvo. Quando os raios luminosos provenientes de um ponto objecto e emergentes da lente divergem dela, o ponto de onde os raios parecem vir é o ponto imagem virtual. Uma imagem virtual não pode ser obtida num alvo, uma vez que a energia luminosa parece passar mas, de facto, não passa naquele ponto. Na figura 5 representa-se a construção da imagem I de um objecto real O. Como se pode ver, quando o objecto se situa para lá do foco F da lente convergente, a imagem é real; quando o objecto se situa entre o foco e a lente, a imagem é virtual. Além de reais ou virtuais, as imagens podem ainda ser direitas (orientadas como o objecto) ou invertidas (no caso contrário) e maiores ou menores do que o objecto. Departamento de Física da FCTUC 3/9 Física Laboratorial I Ano Lectivo 2002/03 I O F F' C F O I p<0 C F' p<0 p'>0 p'<0 (b) (a) Figura 5 Construção da imagem de um objecto real: (a) p > f – imagem real – os raios emitidos pelo objecto convergem; (b) p < f – imagem virtual – os raios emitidos pelo objecto não convergem; Associação de lentes convergentes. Construção de um objecto virtual. As lentes podem associar-se de modo a que a imagem de uma primeira lente, a que chamaremos L1, possa tornar-se o objecto da segunda lente, que designaremos por L2. Vamos considerar duas situações. Objectos O1 e O2 reais A figura 6-a) ilustra a situação em que a lente convergente L1 cria uma imagem real I1 do objecto O1. Na figura 6-b) essa imagem real I1 é usada como objecto real O2 para a segunda lente L2, uma vez que, como se pode constatar na representação, a lente L2 foi colocada depois da imagem I1. Assim, podemos dizer que a associação das duas lentes L1-L2 funciona como uma única lente, permitindo obter a imagem I2 do objecto O1. A associação das lentes está feita de tal modo (determinada distância entre elas) que a imagem final I2 é real, direita e menor que o objecto O1. L1 2 (a) O1 2 1 C F1 F'1 1 I1 L1 L2 2 (b) O1 3 2 1 F1 C I1-O2 F'1 1 3 1 I2 F'2 F2 1 Figura 6 Construção de uma imagem formada pela associação de duas lentes convergentes, L1 e L2. L2 situa-se depois da imagem de O1. (a) L1 cria uma imagem real I1 do objecto real O1. (b) A imagem real I1 é usada como objecto real O2 para a segunda lente L2. Departamento de Física da FCTUC 4/9 Física Laboratorial I Ano Lectivo 2002/03 Objecto O1 real mas objecto O2 virtual A figura 7-a) ilustra novamente a situação em que a lente convergente L1 cria uma imagem real I1 do objecto O1. Na figura 7-b), no entanto, essa imagem real I1 torna-se um objecto virtual O2 para a segunda lente L2, uma vez que L2 foi colocada entre a lente L1 e a imagem I1. Esta é, na verdade, uma forma de se obter um objecto virtual através da associação de duas lentes convergentes. Neste caso, a associação das lentes está feita de tal modo (determinada distância entre elas) que a imagem final I2 é real, invertida e menor que o objecto O1. L1 2 O1 (a) 2 1 C F1 I1 F'1 1 L2 L1 2 (b) O1 2 1 3 1 I2 F2 F'1 F1 F'2 1 I1-O2 Figura 7 Construção de uma imagem formada pela associação de duas lentes convergentes, L1 e L2. L2 situa-se entre a lente L1 e a imagem I1. (a) L1 cria uma imagem real I1 do objecto real O1. (b) A imagem real I1 é usada como objecto virtual O2 para a segunda lente L2. Lente divergente Uma lente divergente é uma associação de duas superfícies esféricas refringentes ou dióptros, mais fina no centro do que nos bordos e que faz divergir os raios luminosos que nela incidem paralelamente ao eixo principal da forma ilustrada na figura 8-a). F' F' F C F C eixo principal f'<0 f>0 f'<0 f>0 a) b) Figura 8 Lente divergente ideal. f = f ' mas, ao contrário da lente convergente, f > 0 e f’ < 0. a) Definição do foco imagem (F’); b) Definição do foco objecto (F). Departamento de Física da FCTUC 5/9 Física Laboratorial I Ano Lectivo 2002/03 Neste tipo de lente, ao contrário da lente convergente, o foco imagem situa-se do lado da luz incidente e o foco objecto do lado da luz transmitida. O foco imagem F’ define-se como o ponto onde se intersectam os prolongamentos dos raios divergentes que correspondem a raios incidentes paralelos ao eixo principal (fig. 8-a). O foco objecto F define-se como o ponto geométrico para onde convergem os prolongamentos dos raios incidentes que emergem paralelamente ao eixo principal (fig. 8-b). 2. Execução experimental 1ª Parte Lentes convergentes e divergentes - refracção de raios luminosos paralelos Material necessário – fonte luminosa de raios paralelos, lente convergente, lente divergente, folha de papel branco e régua auxiliar. Procedimento 1 - Coloque a fonte de raios paralelos sobre um folha de papel A4 branca. Prepare a fonte luminosa seleccionando a saída de 5 raios luminosos paralelos. 2 - Coloque a lente convergente em frente dos raios, de modo a que eles fiquem paralelos ao eixo principal da lente. 3 - Explique e desenhe o que vê. Como designa o ponto onde os raios luminosos se encontram? Complete a tabela I. 4 - Substitua a lente convergente por uma lente divergente, também com o cuidado de a colocar de modo a que o eixo principal da lente fique paralelo aos raios incidentes. Repita o procedimento indicado no ponto 3. Tabela I Lente convergente Lente divergente Distância focal (m) 2ª Parte Determinação directa da distância focal da lente convergente L Material necessário - banco de óptica, objecto no infinito, lente convergente L e alvo. Procedimento 1 Coloque a lente L e o alvo sobre o banco de óptica. Oriente o banco de óptica de modo a que a luz proveniente de uma janela incida directamente sobre a lente. Desloque o alvo sobre o banco de óptica a fim de obter nele a imagem nítida de um objecto distante, visível através da janela. Nestas condições, qual a relação entre a distância da lente ao alvo (p’) e a distância focal da lente? Justifique. 2 Note que o valor de p' vem afectado de um erro acidental, uma vez que, se forem realizadas várias determinações de p' para a mesma posição do objecto, não se encontrará sempre o mesmo valor. É aconselhável, portanto, obter vários valores de p' tomando como resultado mais provável Departamento de Física da FCTUC 6/9 Física Laboratorial I Ano Lectivo 2002/03 a sua média, p' . Retire então o alvo do banco de óptica e repita a operação descrita em 1 para o mesmo objecto mais duas vezes. 3 Determine o valor mais provável para a distância focal e o respectivo erro. Consulte o ponto 7 das notas sobre “Introdução ao cálculo de erros nas medidas de grandezas físicas”. 3ª Parte Verificação da equação dos focos conjugados para a lente L, através de um método gráfico Material necessário - banco de óptica, objecto luminoso, lente convergente L, lente convergente auxiliar La, alvo e papel . NOTA - Antes de realizar qualquer medida verifique que as lentes e o alvo utilizados no trabalho estão orientados perpendicularmente à direcção da luz incidente. Se assim não for, e como facilmente compreenderá, os resultados serão falseados. Procedimento A) Utilizando um objecto real 1 Fixe o objecto luminoso O e a lente L sobre o banco de óptica. Desloque o alvo de forma a obter nele uma imagem I com a maior nitidez possível (fig. 5-a)). Meça, na escala associada ao banco de óptica, os valores de p e p’. Elabore uma tabela semelhante à tabela II, registe esses valores, não esquecendo os seus sinais, de acordo com a convenção utilizada, e calcule (–1/p) e (1/p’). 2 Mantendo fixo o objecto luminoso, escolha para a lente L três novas posições no banco de óptica, registando, para cada uma delas, os valores de p e p’ correspondentes. Para cada par de valores (p, p’) encontrado, determine (–1/p) e (1/p’). Complete a tabela II. 3 Represente graficamente os valores obtidos para (1/p') em função de (–1/p). Atendendo aos sinais de p e p’ os pontos marcados no gráfico devem situar-se no 1º quadrante, tal como é apresentado na figura 9. Tabela II Objecto real O p (m) p’(m) [–1/p] (m-1) [1/p’] (m-1) B) Utilizando um objecto virtual 1 Com o objecto O na mesma posição, retire a lente L do banco de óptica, coloque nele a lente convergente auxiliar La e desloque o alvo até obter uma imagem nítida Ia. Registe a localização da imagem Ia na escala graduada. Departamento de Física da FCTUC 7/9 Física Laboratorial I Ano Lectivo 2002/03 2 À semelhança do que está ilustrado nas figuras 7-a) e b), coloque agora a lente L entre La e o alvo, de modo a que a imagem Ia passe a constituir um objecto virtual O’ para o lente L (Ia ≡ O’). Sem mover o alvo, anote a distância de L ao alvo onde se formou Ia. Esta distância é igual a p, ou seja, é, em módulo, a abcissa do objecto virtual O’. Qual o sinal de p, de acordo com a convenção adoptada? Prepare a tabela III. 3 Desloque o alvo até obter nele a imagem nítida de O', (I2, na figura. 7-b)). Meça a distância de L à nova posição do alvo, a qual corresponde, em módulo, ao valor de p’. Qual o sinal de p’? 4 Sem mover La, escolha três outras posições para a lente L (sempre entre La e a posição do objecto virtual O’ (registada em 1) e para cada uma delas determine os pares de valores (p, p’). Tabela III Objecto virtual O’ p (m) p’(m) [–1/p] (m-1) [1/p’] (m-1) 5 Calcule os pares de valores (–1/p, 1/p’) e represente-os no gráfico anterior. Atendendo aos sinais de p e p’ os pontos obtidos devem situar-se no 4º quadrante (fig. 9). 6 Trace a melhor recta de ajuste aos pontos do gráfico, “quer a olho” (tendo em conta que os desvios dos pontos experimentais que ficam acima e abaixo dessa recta devem compensar-se), quer através de um tratamento matemático rigoroso (consulte o ponto 9 das notas sobre “Introdução ao cálculo de erros nas medidas de grandezas físicas”). A partir dos parâmetros da melhor recta de ajuste (declive e ordenada na origem) e tendo em conta a equação dos focos conjugados (eq. 1) determine a distância focal e a potência da lente L a partir do gráfico. Pode dizer-se que se verificou experimentalmente a equação dos focos conjugados? Justifique. 1 p' O.V. O.R. − 1 p Figura 9 Ajuste de uma recta aos pontos experimentais (-1/p, 1/p’), obtidos com uma lente convergente L, utilizando um objecto real (O.R.) e um objecto virtual (O.V.). Departamento de Física da FCTUC 8/9 Física Laboratorial I Ano Lectivo 2002/03 7 Compare o valor obtido para a distância focal a partir do gráfico com o valor que tinha sido obtido pelo método directo descrito na 2ª parte da execução experimental. 4ª Parte Aplicação da equação de amplificação linear Material necessário - banco de óptica, objecto luminoso, lente convergente L, alvo e régua auxiliar. Procedimento a) Repita a operação mencionada na 3ª parte, A) - 1, medindo, para além dos valores de p e p’, a altura h' da imagem obtida (use uma régua auxiliar para o efeito). b) Aplicando a equação de amplificação transversal linear (eq. 2) determine a altura h do objecto utilizado. c) Meça agora directamente a altura da seta que utiliza como objecto e compare os valores obtidos, comentando-os. 3. Relatório Elabore um relatório deste trabalho prático, não se esquecendo de incluir: • a tabela I, os desenhos e a explicação do que observou quanto à refracção de raios luminosos paralelos com uma lente convergente e outra divergente; • o valor da distância focal da lente convergente L, medido directamente; • as tabelas II e III e o gráfico de 1/p’ em função de –1/p; • a altura do objecto luminoso, directamente e através da aplicação da eq. de amplificação transversal linear. N.B.: Antes de elaborar o relatório, deve consultar a folha com instruções para a elaboração de relatórios, bem como o relatório modelo. Bibliografia [1] M.M.R.R. Costa e M.J.B.M. de Almeida, Fundamentos de Física, Coimbra, Livraria Almedina (1993). [2] Paul Tipler, Óptica e Física Moderna, Editora Guanabara-Koogan, 4ª Edição (2000). [3] Jenkins F.A. & White H.E. - Fundamentals of Optics. [4] M. Alonso e E. Finn, Física, Addison-Wesley Iberoamericana (1999) [5] Introdução ao cálculo de erros nas medidas de grandezas físicas, Coimbra, Departamento de Física da Universidade (2002/2003). Departamento de Física da FCTUC 9/9