Estudo de Alterações Eletrocardiográficas em Futebolistas Profissionais Autor: Michel Batlouni Tese de Livre-Docência, defendida em Goiás, 1977 Instituição: Faculdade de Medicina – Universidade Federal de Goiás Correspondência: Michel Batlouni – Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia Av. Dr. Dante Pazzanese, 500 – CEP: 04012-909 – Ibirapuera – São Paulo, SP Resumo Alterações eletrocardiográficas são comuns em atletas de elite, submetidos a treinamento físico intensivo e prolongado, e podem simular as encontradas em cardiopatias. Para investigar sua prevalência e seu significado, foram examinados aleatoriamente 70 futebolistas profissionais, idades de 19 a 33 anos, 49 brancos e 21 negros ou pardos, em período de atividade atlética plena. Vinte indivíduos normais, não atletas, com idade, peso, altura e superfície corpórea comparáveis constituíram grupo controle. Além da história atlética e do exame físico, todos foram submetidos aos seguintes exames: eletrocardiograma em repouso, vetocardiograma, radiografias do coração, fonocardiograma, teste ergométrico Maximo e procedimentos farmacológicos. Resultados: 1) distúrbios do ritmo e da condução – bradicardia sinusal, com freqüência cardíaca (FC) variável de 36 a 59 ciclos por minuto, 50 casos; marca-passo mutável; dois; ritmo juncional, dois; extra-sístoles supraventriculares, três; bloqueio atrioventricular (BAV) de 1º grau, sete; BAV de 2º grau tipo I de Mobitz, quatro; bloqueio incompleto de ramo direito (BIRD), oito casos. Esses distúrbios mostraram-se lábeis, com elevação da FC, restauração do ritmo sinusal e desaparecimento das extra-sístoles e dos BAV tanto com o exercício como após a administração de atropina; 2) sobrecargas ventriculares – critérios eletrocardiográficos para o diagnóstico de sobrecarga ventricular direita (SVD) foram observados em 12 futebolistas (17,1%) e de sobrecarga ventricular esquerda (SVE) em 15 (21,4%). Os padrões mais comumente encontrados foram os de sobrecarga de volume. Critérios vetocardiográficos para SVD foram observados em 18 atletas (25,7%) e de SVE em 16 (22,8%). Nenhum indivíduo do grupo controle preencheu critérios de SVD ou SVE. A análise ecocardiográfica mostrou: aumento da dimensão diastólica (Dd) do VD em 26 futebolistas (37,1%) e da DdVE em 14 (20%); aumento das espessuras diastólicas do septo intraventricular em 11 (15,7%) e da parede posterior do VE (PPVE) em sete atletas (10%). As médias dessas variáveis no grupo atleta foram significantemente maiores do que no grupo controle (p < 0,001). A relação SIV/PPVE foi maior que 1,3 em cinco futebolistas, porém não havia evidência de miocardiopatia obstrutiva. Ao estudo radiográfico, o índice cardiotorácico estava aumentado em 12 (17,1%) e o volume cardíaco relativo em 234 (34,3%) atletas, e em nenhum caso-controle. O teste ergométrico foi normal em todos os atletas e controles; 3) anomalias da repolarização ventricular – as seguintes alterações foram encontradas no ECG dos futebolistas: a) padrão de repolarização precoce (elevação côncava do segmento ST 1 mm e ondas T altas e pontiagudas), 21 casos; b) padrão juvenil (onda T negativa ou bifásica, com ST supra e convexo, em precordiais direitas e até V3 ou V4), dez casos; c) outros padrões (ondas T negativas em derivações periféricas e/ou precordiais esquerdas); dez casos. Combinações de diferentes padrões ocorreram em alguns atletas, que exibiam alterações difusas da repolarização ventricular. As alterações de ST-1 normalizaram-se sistematicamente durante o TE, tenderam à normalização sob efeito da atropina intravenosa e regrediram parcial ou completamente nos futebolistas que interromperam a prática esportiva por mais de 15 dias. Conclusões: 1. A avaliação eletrocardiográfica rotineira de futebolistas profissionais, em período de atividade atlética plena, revelou alterações similares às encontradas em atletas praticantes de vários esportes de resistência. 2. Distúrbios do ritmo e da condução AV relacionaram-se estreitamente com a intensidade do treinamento físico. Mostraram-se lábeis, reversíveis, como sendo de natureza funcional e decorrentes de acentuada preponderância vagal. 3. Sobrecarga ventricular ocorreu tanto em relação ao VD como ao VE, isolada ou conjuntamente, refletindo dilatação e/ou hipertrofia. Os padrões predominantes foram os de sobrecarga de volume. 4. A SVE não comprometeu a função ventricular e não determinou resposta isquêmica do miocárdio em teste ergométrico máximo. 5. Anomalias da repolarização ventricular assemelharam-se às encontradas na cardiopatia isquêmica, porém normalizaram-se sistematicamente durante o exercício (TE), regrediram parcialmente sob o efeito da atropina IV e desapareceram, em vários casos, fora do período de treinamento intensivo.