INFORME ECONÔMICO Segunda-feira, 30 de junho de 2008 / Nº 27 ARTIGOS Matei as aulas do primeiro ano de economia A combinação de políticas econômicas equivocadas na Argentina produz bons “cases” sobre o quê não fazer. Palavras-Chave: Economia internacional, vantagens comparativas Vietnã: o próximo tigre asiático em construção O País segue a receita dos vizinhos e começa a apresentar uma trajetória de crescimento que já dura 20 anos. Palavras-Chave: Crescimento econômico, tigres asiáticos. FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO RIO GRANDE DO SUL Av. Assis Brasil, 8787 Fone: (051) 3347.8731 Fax: (051) 3347.8795 UNIDADE DE ESTUDOS ECONÔMICOS www.fiergs.org.br As opiniões emitidas nesta publicação são de exclusiva e inteira responsabilidade dos autores, não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista desta Federação. É permitida a reprodução deste texto e dos dados contidos, desde que citada a fonte. Reproduções para fins comerciais são proibidas. I N F O R M E E C O N Ô M I C O F I E R G S Matei as aulas do primeiro ano de economia A combinação de políticas econômicas equivocadas na Argentina produz bons “cases” sobre o quê não fazer. Por vezes se escuta alguém dizer que o Brasil deveria seguir o exemplo da Argentina no que diz respeito à política econômica. Pois bem, por pelo menos duas vezes em menos de 10 anos, nossos vizinhos nos provam o contrário. A Argentina adotou antes do Brasil um controle cambial para dar fim às altas taxas de inflação. Funcionou lá e aqui. Mas, os políticos não conseguiram se ver livres da tentação de gastar os recursos que não tinham, e o descaso em controlar os gastos. Felizmente o Brasil aprovou a Lei de Responsabilidade Fiscal, decretou o fim do regime de câmbio fixo ao final de 2001 e silenciou os poucos que ainda defendiam o modelo Argentino. Aos que ainda nutrem alguma dúvida, de 1994 a 2008 o PIB do Brasil e da Argentina cresceram na mesma magnitude, com uma diferença, por lá a emoção foi maior, com uma queda do PIB de quase 11% em 2002 (veja gráfico que fixa o ano de 1994=100). Sete anos depois, a história se repete. A atual crise política no País, que deve resultar em problemas econômicos de difícil solução, ou pelo menos, de elevado custo para a sociedade, não está sendo muito bem entendida por parte dos analistas que ainda teimam em defender a combinação de políticas econômicas que são, no mínimo, estranhas. Destacase que a origem dessa crise vai muito além da elevação da retenção das exportações de produtos (prática antiga naquele País). Sua origem remonta ao calote da dívida, à perda de credibilidade do setor público e ao conjunto das políticas heterodoxas “a la Brasil dos anos 1980”, como o congelamento de preços. Ao controlar preços, o governo inibe os investimentos e a expansão da oferta em pontos chave para o bom funcionamento dos mercados, como a oferta de energia e o equilíbrio dos custos dos fatores de produção, como capital e trabalho. Além disso, ao tentar aplicar o planejamento da produção e comercialização, contribui para inibir o “espírito animal” do empreendedor que quer investir e correr riscos, mas também quer um retorno para isso. A restrição de exportações vai contra o imaginário dos livros de economia e a experiência internacional, e atinge em cheio uma veia importante da produção de riqueza local, os produtores primários. Responsáveis por 9,5% do PIB do País, e gerando receitas da ordem de US$ 14 bilhões/ano com exportações, nada mais correto aos produtores argentinos reclamarem a liberdade de comercialização do fruto de seu trabalho. Escolheram produzir e correr o risco sistêmico da atividade, e agora querem colher os resultados comercializando onde os preços são maximizadores do lucro. Poucos estão se dando conta de que a maior receita do produtor primário será a garantia de novos investimentos no aumento da produção e com impactos sobre o mercado de trabalho, na arrecadação de impostos e, na própria determinação dos preços no futuro. Seria fácil controlar as exportações como uma torneirinha a ponto de determinar o exato equilíbrio entre oferta e demanda interna que não prejudique a evolução dos preços e mantenha o nível de retorno para o produtor? Ainda mais, tudo isso em um ambiente de câmbio desvalorizado e saldo positivo em transações correntes. Porque ninguém pensou nisso antes? As primeiras aulas de graduação dos cursos de economia nos ensinam o contrário. Sendo proibido de exportar seu produto, a solução para o produtor é o mercado clandestino ou a venda legal no mercado interno. Vale lembrar que a restrição à comercialização de produtos no mercado externo só deve acontecer em duas ocasiões: (a) quando a economia não mantém relações com o exterior; (b) quando a demanda está maior que a oferta e, portanto, o equilíbrio somente se dará via aumento de preços. É natural supor que esse movimento irá representar um aumento da oferta no mercado interno, derrubando preços. Entretanto, os agentes são racionais, como podemos verificar inclusive na Argentina, onde há a formação de ágio para compensar a venda do produto, gerando pressões inflacionárias ou, simplesmente, a falta de mercadorias nas prateleiras (alguma semelhança com o Plano Cruzado?) A retenção de exportação é um inimigo da rentabilidade do produtor e vai contra a eficiência alocativa. Também se escuta falar que a retenção é boa para o produtor, pois o mesmo fica livre das variações dos preços internacionais. Mas, esse mesmo produtor já está no mercado há anos, conhece os riscos e os instrumentos financeiros que estão disponíveis para se proteger de oscilações na taxa de câmbio, como o mercado de derivativos. Deixe que ele corra os riscos de perda e lucro. Os eventos dos últimos anos na Argentina são úteis para ilustrar os resultados de políticas econômicas equivocadas em livros de macroeconomia, microeconomia e economia internacional de cursos de graduação. Parece que as salas de aula do primeiro ano de economia andam um pouco vazias por lá. Evolução do PIB do Brasil e da Argentina 138 Argentina 128 Brasil 118 108 98 88 1994 Unidade de Estudos Econômicos www.fiergs.org.br 1996 1998 2000 2002 2004 2006 I N F O R M E E C O N Ô M I C O F I E R G S Vietnã: o próximo tigre asiático em construção. O País segue a receita dos vizinhos e começa a apresentar uma trajetória de crescimento que já dura 20 anos. O Vietnã obteve taxas de crescimento econômico nos últimos cinco anos comparáveis à China e Índia. Após iniciar um processo desenvolvimento voltado para o mercado interno, o país, também, começa a buscar seu espaço no mercado internacional. Depois da reunificação em 1975, as economias do norte e do sul se integraram em uma economia centralizada-planificada e fechada. O início das reformas econômicas ocorreu com a aprovação do Dói Moi (renovação) pelo governo em 1986. Nos anos subseqüentes, o governo deu início a uma série de reformas para reduzir a quantidade de setores que estavam sob sua propriedade (desde o início de 1987), ainda destacam-se descoletivização do direito do uso da terra (em 1988), a quase completa liberalização dos preços (em 1989), redução das barreiras ao comércio interno e a abertura ao comércio e investimento externo (desde o final de 1987). Essas reformas estabeleceram as condições básicas para o país criar uma economia orientada para o mercado interno na década seguinte. Nem mesmo a crise da financeira da Ásia (1997/99) que atingiu muitos vizinhos brecou o crescimento vietnamita. A conseqüência foi “apenas” de desaceleração, o PIB real que cresceu 9,6% em 1996 apresentou a taxa mais baixa, 4,8%, em 1999. Nos anos 2000, o restabelecimento do rápido crescimento econômico foi acompanhado de um alto comprometimento do governo com as privatizações. Além disso, foram firmados acordos bilaterais de comércio com os EUA e a criação de instituições legais para o desenvolvimento empresarial. A despeito do sucesso econômico proporcionado pelas reformas, essa performance não descola muito do padrão observado em muitos países da Ásia nos últimos 20 anos. Na comparação das taxas de crescimento, outras economias da região obtiveram resultados semelhantes ou mais expressivos como é o caso da China, Índia, Indonésia, Coréia e Singapura. Sempre que uma economia começa a apresentar expressivas taxas de crescimento surge uma indagação: esse dinamismo é construído com base em acréscimo na produtividade total dos fatores da economia ou consiste apenas em acumulação de capital? A resposta para essa pergunta é importante, pois dirá sobre a sustentabilidade desse crescimento no longo prazo. Economias que crescem fortemente baseadas no aumento da proporção capital/trabalhador podem apresentar o que os economistas chamam de “crescimento a lá Solow”, em referência ao economista ganhador do prêmio Nobel em 1987. Essa teoria mostra que, para um dado nível de produtividade, a expansão de uma economia com mão-de-obra farta acelera-se até um ponto, chamado de estado estacionário, a partir do qual a economia passa a expandir com uma taxa semelhante a do crescimento da população. Grosso modo, pode se pensar no caso em que todos os trabalhadores são dotados de bens para produzir bens, mas são incapazes de produzir endogenamente inovações ou formas de produção mais eficientes. Portanto, essa economia expande com altas taxas de crescimento até convergir para um nível em que o produto se expandirá a taxas menores. Por outro lado, o crescimento com base no aumento na produtividade dos fatores torna os agentes da economia capazes de gerar conhecimento e inovar, elementos essenciais para a competição no mercado externo. Claro que o acumulo do capital é um condicionante para o crescimento, mas quando o aumento do PIB é acompanhado de maior nível de desenvolvimento humano, esse processo tende a ocorrer de forma menos volátil e mais duradoura. Ao que tudo indica, a performance que a economia do Vietnã apresenta nas últimas décadas parece ser do segundo tipo, voltada para o aumento da produtividade. Estima-se que entre 1986 e 2006 a produtividade total dos fatores da economia vietnamita cresceu em média 3,05% por ano. Os fatores chave que possibilitaram essa expansão foram a abertura a empresas estrangeiras e ao investimento externo direto, que possibilitaram alocações mais eficientes dos recursos, reduzindo as perdas de eficiência comuns no setor público. Além disso, o país possui a população mais jovem da região, 40% situa-se na faixa de 5-24 anos, e cerca de 99% das crianças na idade do ensino primário estão matriculadas, entretanto essa taxa cai para 63% nas matrículas do ensino secundário. É fácil fazer uma relação entre o Vietnã e a China, dadas as similaridades dos dois países, as quais vão além de aspectos culturais e sociais. Para realizar a transformação de uma economia planificada para uma economia mais orientada para o mercado, ambos os países começaram pela descoletivização do uso da terra e iniciaram um processo de privatização e abertura ao comércio e investimento externo. A transformação e liberalização econômica dos dois países não foram precedidas ou acompanhadas de liberalização política. Assim como a China, o Vietnã também experimentou uma rápida urbanização durante o processo de reformas, a redução da pobreza e da desigualdade de renda também veio a passos largos. Dessa forma, o Vietnã é candidato a escrever uma história de crescimento sustentável do mesmo modo que a China fez. Entretanto, deve-se ter claro que a economia Vietnamita ainda é cerca de quarenta vezes menor que a da China. Fonte: Global Economics Papers Nº 165, Goldman Sachs. Unidade de Estudos Econômicos www.fiergs.org.br