DIAGNOSE DO ESTADO DA ISOLAÇÃO SÓLIDA DE TRANSFORMADORES ATRAVÉS DO ENSAIO DE ÍNDICE DE POLARIZAÇÃO (RVM) Jayme L. Nunes Jr. EPTE Emp. Paulista de Transmissão de Energia Elétrica S.A. Antonio Carlos T. Diogo CTEEP Cia Transmissão de Energia Elétrica Paulista S.A. 1 1. INTRODUÇÃO Nos últimos anos, tem havido um crescente interesse na diagnose de transformadores por diversas razões. Primeiramente pela consciência do alto custo de operação das Companhias de Energia, especialmente onde o processo de privatização destas Empresas dá grande ênfase ao alto custo dos equipamentos. Além disso, há um crescente envelhecimento dos equipamentos de nosso Sistema Energético. Devido aos grandes investimentos feitos no Brasil durante processo de desenvolvimento ocorrido nas décadas de 60 e 70, hoje temos grande número de transformadores com idade acumulada de 30 ou mais anos de operação. Uma alta confiabilidade de operação do sistema é esperada pelos consumidores e transformadores são partes vitais de um grande número de sistemas em hospitais, transportes públicos, grandes indústrias, etc. Falhas em transformadores podem causar danos devido à incêndios, poluição ambiental ou explosão na área da subestação ou em áreas adjacentes. No sistema de isolação de transformadores, o óleo mineral em associação ao papel isolante é o conjunto utilizado em 95% da quantidade total de equipamentos. Este fato pode parecer estranho, face aos recentes avanços na área de materiais sintéticos que, a primeira vista deveriam substituir a velha dupla papel-óleo , que vem sendo utilizada em transformadores desde 1890. Esta aparente indiferença deve-se às excelentes características, face às solicitações elétricas, mecânicas e térmicas no transformador.(1). No processo de fabricação de equipamentos elétricos, ou mesmo durante a operação, a isolação sólida pode adquirir umidade, o que contribui para a diminuição de sua vida útil, caso não seja reduzida a níveis satisfatórios. A umidade presente na celulose, em níveis elevados, pode ser originada no processo de fabricação dos equipamentos ou adquirida pelo óleo e, posteriormente transferida para a celulose durante a operação do transformador. A presença de oxigênio atua como poderoso agente acelerador da degradação do óleo ou do papel. A atuação de um sistema de preservação do equipamento é 1 Rua Paula Souza, 529 01027-001 São Paulo – SP fone +5511-227.0483 importante para isolar a umidade e o oxigênio provenientes do ar atmosférico do sistema papel-óleo. 2. TEOR DE UMIDADE DA ISOLAÇÃO SÓLIDA 2.1 Controle do Teor de Umidade O controle da umidade da isolação sólida contribui sobremaneira, para a minimização dos efeitos do oxigênio e da umidade sobre a degradação da celulose e, como consequência, da obtenção de uma significativa extensão da vida útil dos equipamentos.(2) Este controle possibilita o estabelecimento de normas e procedimentos para o manuseio de montagem, inspeção interna, desmontagem e demais operações que expõem a parte interna dos equipamentos às condições atmosféricas, bem como o acompanhamento da isolação sólida. Temos portanto um sistema de isolação composto de 2 materiais completamente diferentes. Enquanto um, o óleo, flui através do transformador , pode ser facilmente acessível e substituído. A isolação sólida não somente está posicionada internamente ao transformador como é de acesso extremamente difícil. Pode-se dizer que a vida útil de um transformador é a vida útil de sua isolação sólida. 2.2 Métodos de avaliação Os métodos mais tradicionais de avaliação envolvem um grande número de ensaios em óleo isolante, que é então física e quimicamente testado. Os ensaios mais conhecidos são Rigidez Dielétrica, Fator de Dissipação, Tensão Interfacial, Índice de Neutralização, Teor de Água em Óleo e Análise de Gases Dissolvidos. Contagem de Partículas e a Análise de Produtos de Decomposição do Papel dissolvidos no óleo são também utilizados. A maior vantagem destes ensaios, baseados em amostras de óleo, é que eles não interferem com a operação normal do equipamento. Seu maior problema é que esta amostra de óleo pode não representar a real situação da isolação sólida, já que em condições de operação, dificilmente teremos uma situação de equilíbrio do sistema papel-óleo, principalmente considerando o fato de que o papel é cerca de 800 vezes mais higroscópico que o óleo. Não existem muitos métodos diretos de avaliação do estado do papel. O maior obstáculo aqui é, além de exigência da retirada do transformador de operação, a acessibilidade limitada, já que uma amostra de papel pode não ser representativa das condições gerais de toda a isolação sólida. O método tradicionalmente utilizado por Empresas de Energia para a medição do teor de umidade da isolação sólida é conhecido como URSI (Umidade Relativa da Superfície da Isolação). A URSI é medida com o preenchimento do transformador com Nitrogênio ou Ar Sintético super-seco e após um período de equilíbrio de, no mínimo, 24 horas, mede-se ponto de orvalho do gás para, juntamente com a temperatura da parte ativa, através de um diagrama obter-se a umidade do papel. As restrições ao método são, além da exigência de retirada do óleo isolante, como o próprio nome já diz, avalia apenas a umidade da superfície e não de toda a massa do papel,. Este ensaio foi originariamente desenvolvido por um fabricante de transformadores para ensaios de campo em transformadores recém saídos de fábrica, onde devido ao processo de secagem, após montagem, em que corpos de prova são inseridos junto com a parte ativa na estufa e posteriormente ensaiados, tem-se a garantia de que a parte ativa está com baixos valores de umidade. Se durante a instalação em campo, com a montagem de radiadores, buchas e outros acessórios alguma contaminação por umidade ocorrer, esta será superficial e nestas condições, em particular, a medição por URSI é satisfatória. Já para equipamentos em operação, mesmo após sofrerem tratamento termovácuo, que apresenta uma eficiência relativa para remoção da umidade, pois remove a umidade apenas das camadas superficiais da isolação, a medição por URSI pode levar a falsas interpretações quanto ao real estado da isolação celulósica Na tentativa de resolver este impasse, a Tettex, fabricante suíço de instrumentos de medição desenvolveu um método para determinação do teor de umidade da isolação sólida de transformadores através da determinação do Índice de Polarização pela Medição da Tensão de Retorno (Recovery Voltage Method – RVM) 3. MEDIÇÃO DO ÍNDICE DE POLARIZAÇÃO 3.1 Conceituação do Método Polarização é um processo bem conhecido em Física. Na Área Elétrica existe algum histórico em relação à cabos de alta tensão isolados à óleo onde foi descoberto que em ensaios usando-se corrente contínua, mesmo após descarga da Capacitância do cabo, alguma Tensão residual era encontrada. Esta tensão é identificada como Tensão de Retorno devido a polarização do material isolante. Este efeito era descrito mas não avaliado como indicador das características da isolação até que uma grupo de estudo húngaro, sob a direção do Prof. Csernatony Hoffer começou a pesquisá-lo a cerca de 25 anos atrás. (3) Polarização é um processo de orientação. Neste caso vamos considerar somente a polarização da isolação causada pela orientação do campo elétrico. O efeito de polarização requer 2 componentes: Um campo elétrico para prover a energia necessária e moléculas que fornecem o meio ao qual o fenômeno se manifesta. O exemplo mais simples de descrever o fenômeno é o alinhamento de dipolos em um campo elétrico. A molécula de água forma um dipolo distinto com os íons O- em um lado, negativamente carregados por 2 elétrons adicionais provenientes do Hidrogênio atômico e os 2 íons H+ do outro lado, que “cedeu” estes elétrons para o Oxigênio e tem uma carga positiva. Esta molécula com uma carga positiva de um lado e negativa de outro é considerada um dipolo. Assumindo que um dipolo isolado seria exposto a um campo elétrico constante, podemos imaginar que as cargas negativas serão atraídas pelo eletrodo positivo e vice-versa. Assim, sobre condições elétricas e geométricas balanceadas, o dipolo apresentaria tendência a orientar-se na direção do campo elétrico. Este processo inclui uma troca de energia, pois a orientação direcional (mecânica) por si mesma é Trabalho. Esta energia provem do campo elétrico através da Corrente. Este processo precisa obviamente de alguns portadores de carga (elétrons ou íons). E finalmente o processo de orientação requer algum tempo. Este tempo é influenciado por 2 fatores. Ambos relacionados com o nível de energia da molécula. A energia inerente à própria molécula expressa pela temperatura e a quantidade de energia que pode ser transportada pela molécula em um dado tempo, influenciada pela concentração de portadores de cargas. Finalmente o dipolo no campo elétrico tem, após completa orientação no campo, armazenada a energia necessária que ele precisa para esse processo. Quando retirado o campo elétrico, a molécula pode então retornar à sua posição arbitrária (aquela com mais baixo nível de energia) e a energia armazenada pode então ser devolvida ao ambiente. Medições mostram que o efeito de polarização segue uma função exponencial e apresenta saturação após todos os dipolos terem completado a orientação no campo elétrico. Um circuito equivalente pode ser montado para representar o processo pela simples combinação de elementos resistivos e capacitivos. A característica dominante é dada pela constante de tempo formada pelo produto dos valores do capacitor e do resistor. A próxima consideração a ser feita é que o processo de polarização em um sistema isolado à óleo não pode ser considerado como um único dipolo, mas como um grande número de dipolos distribuídos através de uma larga geometria. Desde que os valores característicos de polarização estejam cobertos pela constante de tempo, parece ser possível a medição desses valores. Podemos assumir que os valores das constantes de tempo de polarização são muito diferentes de uma constante de tempo formada por um circuito equivalente R-C, e as várias constantes dos processos de polarização serão consideravelmente diferente umas das outras. Em aplicações práticas, encontraremos um grande número de diferentes comportamentos de polarização através da isolação, entretanto estas diferenças são muito pequenas. É seguro considerar este comportamento como pequenas variações de uma única constante de tempo, embora isso possa inibir um erro estatístico. Somente substanciais diferenças formarão uma segunda ou terceira constante de tempo e criar uma situação não-homogênea. 3.2 Aplicações práticas O Método da Tensão de Retorno aplicado à transformadores fornece um espectro obtido por ciclos. Cada ciclo consiste de 3 passos e por um período de relaxação. A aplicação de uma tensão DC (UC) por um tempo fixo de carga (tC); um curto circuito parcial aplicado na metade do tempo de aplicação da carga (tD). Esta etapa remove a polarização da isolação para que se possa obter a energia armazenada nos dipolos; na terceira etapa os terminais do circuito são abertos e um voltímetro é aplicado, obtendo-se então um valor de tensão de retorno (UR) para um dado tempo de carga (tC). Fig.1 – Aplicação da Tensão UC para um tempo de carga = tC Fig. 2 – Aplicação de curto circuito com tD = ½ tC O processo inicia-se com tC = 0,02 s obtendo-se o correspondente UR , e repete-se o ciclo à tempos de carga cada vez maiores até que um valor máximo de tensão de retorno é obtido (URmax). A partir daí, tempo de cargas maiores vão gerar valores de tensão de retorno menores que URmax , até um tC de 1000 s, quando se encerra o processo Fig.3 – Obtenção da UR (Tensão de Retorno) O esquema típico de aplicação do ensaio em um transformador monofásico é o de aplicar-se tensão no enrolamento mais interno, curto-circuitando-se à terra os demais enrolamentos e o tanque do transformador. Obviamente o equipamento deve estar desconectado do sistema e com as bombas de circulação de óleo (se houver) desligadas, de forma a evitar-se a criação de carregamento eletrostático, que influenciaria os valores de UR, principalmente nos ciclos iniciais do ensaio. Para minimizar distúrbios é necessário que todas as bobinas que não estejam sofrendo aplicação de tensão estejam aterradas. Para um transformador trifásico, todas as bobinas de um mesmo nível de tensão devem ser medidas juntas, por exemplo: a aplicação de tensão através das 3 buchas de saída do secundário contra as 3 buchas do primário aterradas juntamente com o tanque do transformador. Ao final do ensaio obtemos uma curva que correlaciona UR X tC em escala logarítmica. Fig.4 – Espectro de Polarização Típico 3.3 Relação do Índice de Polarização com o teor de umidade da isolação A partir das considerações acima, em termos práticos, podemos relacionar o teor de umidade da isolação celulósica com a constante de tempo tC,, quanto menor o teor de umidade da isolação, são necessários tempos de aplicação de carga, ou seja, constantes de tempo proporcionalmente maiores, até que se atinja o valor máximo de tensão de retorno URmax. A influência da temperatura da isolação na constante de tempo é um parâmetro importante no ensaio de RVM. Lembre-se que a temperatura é uma expressão do nível de energia contido na isolação. Quanto maior esta energia, mais facilmente os efeitos da polarização se manifestam. Fica claro portanto que o valor da temperatura deve ser bem conhecido e assumido como uniforme através da isolação. Um gradiente de temperatura elevado durante a duração do ensaio causa uma significativa influência no valor de tC correspondente à URmax . No caso de extremas mudanças de temperatura durante o ensaio, os valores de temperatura, para cada ciclo do processo, devem ser anotados. Após o RVM, podemos introduzir na tabela de dados do software de interpretação os valores anotados e o software automaticamente normalizará a curva para 20ºC. A escolha do melhor valor de tensão de aplicação (o parâmetro pré definido para ensaio é de 2000 VDC), não deve seguir a regra do “quanto mais, melhor”, já que a tensão máxima prevista para cada nível de isolação jamais deve ser excedida. A variação da tensão afeta o valor absoluto da polarização, ou seja da tensão de retorno UR, mais não influencia a constante de tempo dominante tC. A obtenção do teor de umidade contida na isolação sólida a partir dos valores de URmax e da temperatura da isolação requer a obtenção de um fator de correlação, obtido empiricamente já que o processo de polarização de isolação papel-óleo, sob condições reais ainda não é completamente compreendido e matematicamente descrito. Fig.5 – Gráfico de Correlação UR X tC 4. ENVELHECIMENTO DO PAPEL ISOLANTE 4.1 Mecanismo de Envelhecimento Para um transformador provido de sistema de preservação selado (manta/bolsa de borracha ou pulmão com N2) operando em boas condições, poderia se assumir que nenhum incremento significativo do teor de umidade ocorreria com o tempo. Entretanto pode ser observado um aumento constante do teor de umidade que unicamente pode ser atribuído à reação química de envelhecimento do papel isolante que tem a água como um de seus subprodutos. Papel é um material celulósico formado pelos elementos orgânicos Carbono, Hidrogênio e Oxigênio, que formam a molécula de celulose, que por sua vez, formam cadeias – polimerização. O envelhecimento causa a quebra dessas cadeias. Como resultado, encontramos um comprimento médio das cadeias reduzido, expresso como um decréscimo do grau de polimerização. Como a ligação entre as moléculas de celulose consiste de íons H+ e O-, sua ruptura irá formar H2O molecular – “Água”. Esta água incrementa o teor de umidade do papel e a cinética deste processo depende diretamente das condições de operação do transformador. 4.2 Correlação do Teor de Umidade e o Grau de Envelhecimento da Isolação O óleo envolve e impregna o papel. Naturalmente haverá uma troca de umidade entre óleo e papel. Entretanto como o óleo somente pode absorver uma fração da água que o papel contém, o teor de água no óleo será muito menor que no papel. De fato, somente uma pequena parte da água da isolação sólida passa para o óleo. O processo depende, novamente, da temperatura. Óleo “quente” pode absorver mais umidade que óleo “frio” além disso, a troca de umidade entre papel e óleo é um processo extremamente lento. A tabela abaixo mostra uma situação hipotética para um transformador com 25 anos de operação: Transformador 133, 345 kV, após 25 anos de operação no papel No óleo (20ºC) No óleo (60ºC) No óleo (80ºC) Teor umidade: 2,5% 5 ppm 25 ppm 100 ppm de Rigidez Dielétrica 32 kV/mm 32 kV/mm 16 kV/mm A conclusão é que a umidade do sistema papel-óleo, medida pelo método da Tensão de Retorno, representa basicamente o teor de umidade do papel. Enquanto o teor de umidade no papel mostra o estado de envelhecimento da isolação sólida, o teor de água no óleo é muito mais um indicador do estado atual da rigidez dielétrica do sistema. Ambos os parâmetros são necessários para uma avaliação representativa da isolação. Qualquer método de ensaio seria dúbio se não houvessem meio de verificação dos resultados encontrados. No caso do RVM, temos afirmado que a principal fonte de polarização do sistema de isolação é a água presente no papel, e que com a análise da constante de tempo de polarização, teremos um indicador do teor de umidade do papel. Estes resultados podem ser verificados por métodos físicos ou eletroquímicos em amostras de papel. Em adição a produção de água, o processo de envelhecimento gera outros produtos de decomposição, solúveis no óleo isolante, que podem ser checados por alguns ensaios como: Teor de Furfuraldeido, Karl Fisher, Cromatografia de Gases Dissolvidos. Finalmente, a resistência mecânica do papel depende do comprimento da cadeia molecular, ou em outras palavras, do grau de polimerização. Portanto papel “envelhecido” irá apresentar muito baixa resistência mecânica, e após a retirada de operação do transformador esses parâmetros podem ser comparados com os obtidos pelo RVM. 5. LIMITAÇÕES NA APLICAÇÃO DO MÉTODO Na prática, a influência de uma série de fatores e a metodologia do ensaio em si causa uma série de inconveniências com que o analista terá que lidar: O ensaio de RVM só pode ser executado com o transformador fora de serviço; a duração do ensaio pode chegar a 10 horas (no caso de equipamentos novos e/ou com valores de umidade muito baixos (< que 0,5%); finalmente a temperatura do enrolamento deve estar homogênea e manter-se o mais constante possível durante o teste, sem a circulação do óleo devido a recirculação forçada por bombas ou pela operação dos ventiladores. Métodos de diagnose on-site são processos cada vez mais aplicados em todo o Mundo. É seguro afirmar que os teste on-site demandam um certo tempo de impedimento do equipamento, embora o RVM possa ser realizado concomitantemente a outras operações. O tempo médio requerido para a estabilização da temperatura é de normalmente 6 a 8 horas após o desligamento do transformador. Este período pode ser usado para a desconexão de barramentos, limpeza de contatos e buchas e a execução de outros ensaios como a medição do fator de potência. Ao fim deste período o transformador está pronto para ensaio. O monitoramento do decréscimo da temperatura após o desligamento vai comprovar o estado de resfriamento do sistema. O instrumento de teste pode ser então rapidamente conectado ao transformador, por exemplo durante o período noturno, obviamente após a conclusão de todos os ensaios AC. 6. INTERPRETAÇÃO DOS ESPECTROS DE POLARIZAÇÃO A correta interpretação dos resultados obtidos com o RVM deve sempre ser complementada com todos os dados disponíveis sobre o equipamentos, por exemplo: histórico de falhas e/ou de manutenção, outros tipos de ensaios, RVM´s executados anteriormente, dados de projeto, etc. O resultado do ensaio de RVM isoladamente tem um valor restrito. Desde que o resultado do ensaio apresente um único pico de máxima tensão de retorno correspondente à uma única constante de tempo, a análise do resultado é muito simples. Software de interpretação ou mesmo tabelas de referência podem fornecer o teor de umidade. Considerando que a maioria dos fabricantes e Operadores admite um valor máximo inicial de umidade de 0,5% para transformadores novos, sobre condições normais de operação é aceitável um acréscimo de 0,05 à 0,1% do teor de umidade do papel. Frequentemente transformadores novos tem um grau de envelhecimento mais alto inicialmente, que decresce após alguns anos. É uma boa prática um monitoramento anual em relação ao valor inicial. As figuras abaixo mostram 2 resultados típicos de ensaio em transformadores com isolação celulósica homogeneamente envelhecida. Se obtivermos curvas com mais de um pico, curvas “planas” ou outros comportamentos estranhos, não podemos assumir que o valor obtido para o teor de umidade seja preciso em relação ao real teor de umidade da isolação. Se o RVM for corretamente conduzido e obtivermos resultados similares em medições subsequentes ou em outros transformadores de mesmo modelo, neste caso, o resultado pode ainda ser representativo do equipamento testado, ou seja, caracteriza seu objeto de teste. Para validação desses resultados, precisamos de mais dados ou de ensaios complementares (Cromatografia de Gases Dissolvidos, Resistência de Isolação, etc.). Um desenho de curva diferente como, por exemplo, a presença de 2 picos distintos pode indicar não-homogeneidade da distribuição de umidade através da isolação. A interpretação correta, nestes casos é uma tarefa bastante difícil. Á princípio, qualquer polarização à esquerda do pico dominante (o de maior tensão de retorno) pode somente ser causada por altas concentrações de umidade em uma parte localizada da isolação (assumindo temperaturas balanceadas durante o teste). Para encontrar a razão deste teor elevado, pesquisas adicionais são necessárias. Casos clássicos são pontos quentes, ou a exposição de partes da isolação ao ar durante operações de manutenção, secagem inadequada ou incompleta. Na maioria dos casos uma revisão no histórico do transformador pode indicar a resposta. Polarização à direita do pico dominante representam processos de constante de tempo exageradamente altas causadas normalmente por moléculas maiores que água. O RVM não tem qualquer instrumento para determinação da origem deste picos. Alguns motivos podem ser detectados pelo histórico do equipamento, cromatografia de gases dissolvidos, fator de dissipação ou teste de impedância sobre curto circuito. Possíveis causas para baixas velocidades de polarização são despolimerização do papel, descargas parciais (especialmente em transformadores de instrumento) e borra. 7. COMPROVAÇÃO PRÁTICA 7.1 Exemplo 1 Para comprovar a validação do ensaio de RVM, fizemos uma comparação entre os resultados de URSI (Umidade Relativa da Superfície de Isolação) e do RVM (Medição da Tensão de Retorno) em transformadores da EPTE, novos, armazenados com nitrogênio super seco por períodos superiores a um ano, considerando portanto que o teor de umidade da isolação sólida com um todo está em equilíbrio com a umidade do gás. Os resultados são tabelados abaixo: Identificação TRAFO 1 TRAFO 2 TRAFO 3 TRAFO 4 Tensão (kV) 88/13 88/13 88/13 88/13 Potência (MVA) 60 60 60 60 Teor de Água por URSI (%) 1,0 0,75 0,8 1,1 Teor de Água por RVM (%) 1,2 0,78 0,9 1,2 Tabela 1 –Comparativo URSI x RVM – TR’s armazenados c/ N2 Vale ressaltar que o ensaio de RVM, originariamente, é previsto para ser feito em transformadores cheios com óleo. Como foi realizado em transformadores com N2, seria de se esperar alguma alteração na curva obtida em virtude de interferências, pela menor rigidez dielétrica e estabilidade térmica do conjunto, o que de fato ocorreu sem contudo comprometer o diagnóstico. 7.2 Exemplo 2 Transformadores da CTEEP, acompanhados em processo de comissionamento. Nota-se uma maior dispersão dos valores devido ao fato dos equipamentos já se encontrarem em processo de intervenção para montagem. Identificação TRAFO 1 TRAFO 2 TRAFO 3 TRAFO 4 TRAFO 5 TRAFO 6 Teor de Água por URSI (%) 06, 0,9 0,6 0,7 0,5 0,5 Teor de Água por RVM (%) 0,6 0,6 0,9 0,4 0,9 1,1 Tabela 2 - Comparativo URSI x RVM – TR’s em comissionamento 7.3 Exemplo 3 No comissionamento de um transformador de 345 kV/133 foram obtidos os seguintes valores de umidade da parte ativa: URSI Antes da montagem das buchas e radiadores: 0,9 Após montagem de buchas e radiadores: 1,5 Após tratamento termovácuo: 0,8 Após enchimento: - MVA na ETT Norte, RVM 0,94 e 1,6 0,8 Se o diagnóstico fosse feito apenas com o resultado de URSI, poderíamos supor, considerando o resultado de 1,5% antes da montagem das buchas em relação ao 0,9% anterior, que a abertura do transformador, mesmo tendo sido executada com os cuidados necessários, causou o aumento do teor de umidade em quase 50%, com a inserção de cerca de 50 L de água na isolação sólida e que o simples tratamento termovácuo conseguiu retirar toda essa umidade. É muito mais razoável concluir, considerando-se os ensaios de RVM que, durante a montagem, houve uma contaminação superficial, talvez de alguns poucos litros de água, que foi retirada pelo tratamento, trazendo o transformador à uma condição muito próxima da inicial. O resultado (curva com a presença de 2 picos discretos) indica a ocorrência de áreas da isolação sólida com teores de umidade diferentes, provavelmente resultantes da contaminação superficial da isolação quando da abertura do equipamento para montagem de buchas e radiadores. No ensaio realizado após tratamento termovácuo, nota-se homogeneização da curva, devido a retirada da contaminação superficial da isolação sólida pelo umidade. 7.4 Exemplo 4 Comissionamento de Trafo 440 kV, 100 MVA Antes da montagem das buchas e radiadores: Após montagem de buchas e radiadores: Após tratamento termovácuo: Após enchimento: URSI 0,9 1,3 0,7 - RVM 2,2 0,8 e 3,1 2,1 Aqui pode-se notar uma situação semelhante à anterior, com a diferença que a condição inicial de umidade medida pelo RVM era pior que a indicada pela URSI, situação que se manteve inalterada mesmo após tratamento termovácuo. 7.5 Exemplo 5 Manutenção de Trafo 138 kV/ 48,7 MVA – 31 anos Antes da secagem: Após 1 mês de vácuo: Após 4 meses de vácuo: Após enchimento: URSI 1,7 RVM 2,2 0,9 0,9 - 0,9 e 1,8 1,8 Neste caso, optou-se por manter o transformador submetido à um longo período de vácuo, de forma a comprovar que o simples tratamento termovácuo tem eficiência restrita na remoção da umidade, e que a URSI pode fornecer resultados, nessas condições, excessivamente otimistas. 7.6 Exemplo 6 Manutenção em campo para troca do comutador em Trafo da EPTE de 345 kV, 133 MVA, 1 ano de operação Antes da intervenção: Após intervenção: Após tratamento: Após enchimento: URSI 1,6 1,0 - RVM 1,35 1,74 1,54 Os resultados indicam que mesmo após um aumento no teor de umidade superficial (1,6%) o tratamento termovácuo foi suficiente apenas para se obter um teor de umidade superficial de 1,0%, tendo havido um aumento global da umidade da isolação sólida do transformador (1,35 para 1,54%) 8. CONCLUSÃO Os resultados práticos parecem confirmar que o ensaio de URSI não pode ser usado como parâmetro de avaliação do estado da isolação sólida de transformadores em operação, exceto em situações onde seja seguro afirmar que a isolação sólida apresenta-se com a umidade homogeneamente distribuída, para que se possa admitir que o valor de umidade da superfície da isolação é representativo de toda a massa de papel. O RVM apresenta-se como o primeiro método a avaliar a umidade de toda a isolação sólida. Isto qualifica o RVM, mais como um método de diagnose do que de monitoramento. O valor do método é a precoce detecção de problemas na isolação, antes que quaisquer outros indicadores e a avaliação e acompanhamento do estado de envelhecimento da isolação celulósica sem intervenção interna no equipamento, sendo até o momento a única opção não invasiva e não destrutiva de avaliação do estado da isolação sólida. As 3 aplicações principais para o Método são: ♦ teste de aceitação de transformadores novos para verificação da minuciosa, homogênea e completa secagem da isolação, ♦ Diagnóstico de campo para verificação das condições de operação de transformadores para determinação dos limites de operação (sobrecarga, temperatura máxima, etc.) e de sua vida útil residual, ♦ Ensaios antes e após intervenções de Manutenção, para verificação da correta execução dos trabalhos. A EPTE e a CTEEP vem realizando o ensaio de RVM em seus transformadores reserva, em comissionamentos e antes e após intervenção da Manutenção de forma a montar um banco de dados do estado da isolação sólida de todos os seus transformadores. 9. BIBLIOGRAFIA (1) Jayme L. Nunes Jr. - O Óleo Isolante do Ponto de Vista Químico - IV SEMEL – Seminário de Materiais do Setor Elétrico Curitiba, 1994 (2) GCOI, Comissão de Estudos Físicos – SCM 093 Metodologia da Avaliação da Umidade da Superfície do Isolamento Ago/91 (3) Alexander G. Schlag – The Recovery Voltage Method for Transformer Diagnosis