8º Imagem da Semana: Ressonância Magnética Enunciado Paciente de 57 anos, sexo masculino, etilista crônico, com relato de aparecimento de diabetes mellitus no último ano. Pergunta Com base nas imagens apresentadas e na história clínica, qual o diagnóstico mais provável? Respostas a) b) c) d) Adenocarcinoma de pâncreas Pancreatite crônica Pancreatite autoimune Neoplasia papilar mucinosa intraductal Análise da Imagem As imagens de Ressonância Magnética (RM) mostram um pâncreas difusamente hipotrófico com dilatação irregular de toda a extensão do ducto pancreático principal e ductos secundários. Não se observam lesões expansivas, sejam elas sólidas ou císticas. Figura A: CPRM (colangiopancreatografia por RM) - corte transversal: dilatação irregular de toda a extensão do ducto pancreático principal, ducto de Wirsung e ductos secundários. Figura B: Seqüência ponderada em T2 com supressão de gordura: pâncreas difusamente hipotrófico, com leve hipersinal difuso e com dilatação irregular de toda a extensão do ducto pancreático principal. A sequência ponderada em T2 tem alta sensibilidade para detecção de tecidos lesados. Figura C: Seqüência ponderada em T1 pós-gadolínio: pâncreas hipotrófico com dilatação de toda a extensão do ducto pancreático principal. As sequências ponderadas em T1 tem excelente definição anatômica, mas são menos úteis para detectar doenças. O gadolínio é uma substância paramagnética usada como contraste intravascular e aparece na imagem como hipersinal (branco). Diagnóstico Os achados à Ressonância Magnética são sugestivos de pancreatite crônica, o que é corroborado pela história de etilismo e o aparecimento de diabetes mellitus (DM) em paciente nessa idade. - Adenocarcinoma de pâncreas: apesar de poder ser a causa do DM (cerca de 1% dos casos de aparecimento de DM em adultos está relacionado a um câncer pancreático oculto1), as imagens não mostram massas obstruindo o ducto pancreático. Sintomas típicos dessa patologia incluem anorexia, mal estar, náusea, fadiga e dor em região epigástrica ou nas costas. Perda de peso importante é freqüente. Icterícia obstrutiva pode ser o sintoma inicial de um tumor na cabeça do pâncreas. - Pancreatite autoimune: é bastante incomum, sendo responsável por menos de 1% dos casos de pancreatite crônica. Pode ser sintomática ou assintomática. Apresenta-se em estudos de imagem como aumento difuso do pâncreas e estreitamento difuso e irregular dos ductos pancreáticos, o que não confere com os achados desse caso. - Neoplasia papilar mucinosa intraductal: corresponde a neoplasias de graus variáveis de malignidade, originadas do epitélio do ducto pancreático principal ou de ductos secundários, que produzem excessiva quantidade de mucina. O tipo chamado de “ducto principal” está associado a dilatação irregular do ducto principal, com tortuosidade. Em geral, não se associa a atrofia do parênquima pancreático. Discussão do Caso A pancreatite crônica pode ser definida como um processo inflamatório crônico e contínuo que cursa com alterações irreversíveis do parênquima pancreático. Está associado ao etilismo crônico em cerca de 70% dos casos2. A colelitíase, apesar de ser causa comum de pancreatite aguda, parece estar associada à forma crônica em 20-25% dos casos. Outras causas existem, mas são mais raras. A doença é duas vezes mais comum em homens e a idade de aparecimento usualmente está entre os 45 e 54 anos. Do ponto de vista fisiopatológico, a associação com o etilismo pode ser explicada pela alteração que o álcool e seus derivados induzem na secreção pancreática, favorecendo a formação de cálculos, obstrução dos ductos pancreáticos, lesão dos ácinos e fibrose. O estresse oxidativo provocado pela constante metabolização de etanol também causa dano celular e fibrose. Clinicamente, o paciente costuma apresentar crises intermitentes de forte dor abdominal, no abdome superior, às vezes irradiada para as costas, podendo ou não estar associada às refeições. Esteatorréia e perda de peso podem estar presentes na fase avançada da doença. Uma pequena porcentagem dos pacientes pode não ter sintomas e o primeiro sinal da doença pode ser o aparecimento de Diabetes Mellitus. Exames laboratoriais podem mostrar discreto aumento sérico de lipase e amilase nas fases intercrises, com grandes elevações nas crises e diminuição na fase avançada da doença. Exames de imagem usualmente mostram alterações apenas na fase moderada e avançada da doença. A radiografia simples de abdome, um método disponível e barato, pode revelar calcificações pancreáticas, um sinal patognomônico da doença, em 25-59% dos pacientes. A ultrassonografia do abdome não é muito útil para o diagnóstico da doença, mas pode elucidar suas causas (ex: cálculos biliares, hepatopatia alcoólica) ou complicações (pseudocistos, ascite, etc). A tomografia computadorizada (TC) é o método de escolha para avaliação inicial de suposta pancreatite crônica, apresentando acurácia de 59-95% no diagnóstico da doença. A ultrassonografia endoscópica tem mostrado resultados promissores. Para demais exames, ver o próximo item. Sobre a técnica de imagem A colangiopancreatografia por ressonância magnética (CPRM) é uma técnica radiológica usada para produzir imagens dos ductos biliares e pancreáticos através da ressonância magnética (RM - ver mais informações no caso 3). Ela resulta em uma imagem semelhante à da colangiopancreatografia endoscópica retrógrada (CPER). No entanto, diferente desse método, a CPRM é não-invasiva e não requer o uso de nenhum meio de contraste, fazendo uso das propriedades contrastantes inerentes à bile e aos fluidos pancreáticos. Essa técnica é relativamente segura, razoavelmente acurada, não-invasiva, rápida e muito útil no planejamento de uma intervenção endoscópica ou cirúrgica. Aspectos relevantes -Incidência: -Associado 4 a em etilismo 100.000 crônico em hab 70% /ano. dos casos. -Dor em abdome superior é o sintoma mais comum, pode irradiar para as costas. -Disfunção endócrina pode ser o primeiro sintoma (DM). -Em exames de imagem, doença se apresenta usualmente com pâncreas atrófico e fibrótico, com ductos dilatados e calcificações. -O RX de abdome é útil, mas apresenta baixa sensibilidade - calcificações pancreáticas são patognomônicas da doença. -TC é o método de escolha para avaliação inicial na suspeita de pancreatite crônica. -Exames podem estar normais em estados iniciais da doença. Referências 1- Chari ST, Leibson CL, Rabe KG, et al. Probability of pancreatic cancer following diabetes: a population-based study. Gastroenterology. Aug 2005;129:504-11. 2- Dähnert W. Radiology Review Manual. 6th Edition. Philadelphia: Wolters Kluwer Health. 2006:741-742. 3- Erickson RA, Larson CR, Shabahang M. Pancreatic Câncer. New York: Medscape, 2010. [acesso em novembro de 2010]. Disponível em: http://emedicine.medscape.com/article/280605-overview. 4- Obideen K, Wehbi M. Chronic Pancreatitis. New York: Medscape. 2010. [acesso em novembro de 2010]. em: http://emedicine.medscape.com/article/181554-overview. Disponível 5- Juhl JH, Crummy AB, Kuhlman, JE. Paul & Juhl\'s Essentials of Radiologic Imaging. 7ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 1998. Responsável Manuel Schutze - Acadêmico de medicina do 10º período da FM-UFMG. E-mail: mschutze[arroba]gmail.com. Orientadores Luciana Costa Silva - Professor-Assistente do Departamento de Propedêutica Complementar, Faculdade lucianacosta[arroba]me.com. de Medicina da UFMG. E-mail: